MINISTÉRIO DA FAZENDA Secretaria de Acompanhamento Econômico Parecer no 06110/2006/RJ COGAM/SEAE/MF Rio de Janeiro, em 16 de março de 2006. Referência: Ofício SDE/GAB nº 5357, de 31 de outubro de 2005. Assunto: ATO DE CONCENTRAÇÃO n.º 08012.009328/2005-87. Requerentes: Carrefour Comércio e Indústria LTDA. e Mercantil São Jose S.A. Indústria. Operação: aquisição, pelo Carrefour, de três lojas do Mercantil São José, em Fortaleza. Recomendação: aprovação sem restrições. Versão Pública. O presente parecer técnico destina-se à instrução de processo constituído na forma da Lei nº 8.884, de 11 de junho de 1994, em curso perante o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência - SBDC. Não encerra, por isso, conteúdo decisório ou vinculante, mas apenas auxiliar ao julgamento, pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica - CADE, dos atos e condutas de que trata a Lei. A divulgação do seu teor atende ao propósito de conferir publicidade aos conceitos e critérios observados em procedimentos da espécie pela Secretaria de Acompanhamento Econômico - SEAE, em benefício da transparência e uniformidade de condutas. A Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça solicita à SEAE, nos termos do art. 54 da Lei n.º 8.884/94, parecer técnico referente ao ato de concentração entre as empresas Carrefour Comércio e Indústria LTDA. e Mercantil São Jose S.A. Indústria. I. Das Requerentes I.1 - Carrefour Brasil Comércio e Indústria Ltda. Versão Pública Ato de Concentração n.: 08012.009328/2005-87 O Carrefour Brasil Comércio e Indústria Ltda. (doravante “Carrefour”) é uma empresa sediada na cidade de São Paulo, atuante no comércio varejista de supermercados e hipermercados no Brasil, pertencente ao Grupo francês Carrefour. O Grupo Carrefour, por sua vez, também atua no comércio varejista de supermercados e hipermercados e em atividades de apoio logístico às suas atividades principais. O capital social do Carrefour apresenta-se distribuído da seguinte forma: Quadro I Composição do Capital Social do Carrefour Quotistas Brepa Com. Part. Ltda. Quotas em Tesouraria Tonipart Part. S/C Ltda. Total Quotas Quotas classe A* Quotas classe B** 90.094.608.832 6.101.889.645 381.368.103 96.577.866.580 130.608.187.647 0 0 130.608.187.647 % 97,14 2,69 0,17 100 Fonte: Requerentes. *Quotas Classe A: direito a um voto nas deliberações de quotistas. **Quotas Classe B: sem direito a voto. O Grupo Carrefour possui participação nas seguintes empresas no Brasil e no Mercosul: Agropecuária Labrunier Ltda., Agropecuária Orgânica do Vale S.A., Agropecuária Vale das Uvas Ltda., Brepa Comércio e Participação Ltda., Carrefour Administração de Cartões de Crédito Comércio e Participações Ltda., Carrefour Comércio e Indústria Ltda., Carrefour Galerias Comerciais Ltda., Carrefour Participações S.A., Carrefour Participações e Administrações S.A., Contpar Participações e Administração S.A., Eldorado S.A., Faro Trading S.A., Fazenda São Marcelo Ltda., HDE Participações S.A., Imopar Participações e Administrações e Administração Imobiliárias Ltda., Lojipart Participações S.A., Mauá S.A. Participações, Nova Gaule Comércio e Participações S.A., Tonipart Participações Empresariais Ltda., Mapar Participações Ltda., Carrefour Prev-Sociedade de Previdência Complementar, RDC Foccar Factoring Fomento Comercial, Carrefour Revendedora de Combustíveis Ltda., Dia Brasil Sociedade Limitada e Carrefour Argentina. Nos últimos três anos, o Grupo Carrefour submeteu duas operações à análise do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC): (i) Ato de Concentração nº 08012.004997/2003-09, aprovado sem restrições pelo Cade em 21.10.2004; e (ii) Ato de Concentração nº 08012.004692/2005-51, ainda em análise no SBDC. O faturamento nacional do Carrefour1, no exercício financeiro de 2004, foi de confidencial, ressaltando que não houve faturamento no Mercosul e no mundo. Em relação ao faturamento do Grupo Carrefour, no mesmo período, este foi no Brasil, no 1 As Requerentes não apresentaram, no requerimento inicial, relatório anual, tendo em vista que o Carrefour é uma sociedade de responsabilidade limitada, não estando, por este motivo, obrigada a elaborar ou publicar relatórios. 2 Versão Pública Ato de Concentração n.: 08012.009328/2005-87 Mercosul e no mundo, respectivamente, de confidencial, confidencial e confidencial. No Brasil, especificamente, além das atividades primordiais de comércio varejista de supermercados e hipermercados, as empresas do Grupo Carrefour desenvolvem atividades de apoio logístico, tais como, administração de cartões de crédito para compras a prazo no âmbito das lojas Carrefour, prestação de serviços e administração de locações de lojas, prestação de serviços de gestão comercial, exploração da atividade agrícola e pastoril, comércio de seus produtos e exportação de produtos agrícolas e pecuários, importação e exportação de mercadorias e empreendimentos imobiliários. Já o Carrefour atua, como já dito, tão somente no comércio varejista de supermercados e hipermercados. I.2 – Mercantil São José S.A. Indústria O Mercantil São José S.A. Indústria (doravante “Mercantil São José”) é uma empresa atuante no setor de comércio atacadista e varejista de gêneros alimentícios, bebidas, artigos de higiene e perfumaria, brinquedos, utilidades do lar e mercadorias em geral, por meio de supermercados localizados no estado do Ceará. A empresa não pertence a nenhum Grupo econômico. O capital social do Mercantil São José está distribuído da seguinte maneira: Quadro II Composição do Capital Social do Mercantil São José Acionista Participação Lílian Frota Ximenes Mara Fátima Frota Ximenes Francisco Eudes Ximenes Filho Antonio Tales Frota Ximenes Michelle Maria Frota Ximenes Morgana Maria F. X. Dias Branco João Rony Frota Ximenes Antonio Cassiano Frota Ximenes Total 50,847 7,0228 7,0228 7,0228 7,0228 7,0228 7,0228 7,0228 100% Fonte: Requerentes. O Mercantil São José não possui participação em nenhuma empresa no Brasil ou no Mercosul, bem como não apresentou nenhuma operação ao SBDC. O faturamento nacional do Mercantil São José2, no exercício financeiro de 2004, foi de confidencial, ressalvando-se que não houve faturamento no mundo e no Mercosul. 2 O faturamento do Mercantil São José foi confirmado no Relatório da Administração relativo ao exercício financeiro de 2004, apresentado no requerimento inicial. 3 Versão Pública Ato de Concentração n.: 08012.009328/2005-87 Em relação aos produtos e/ou serviços ofertados no Brasil e no Mercosul, o Mercantil São José atua essencialmente no setor de supermercados e hipermercados. II. Da Operação Mediante os termos e condições estabelecidos no Instrumento Particular de Compra e Venda de Ativos, Fundo de Comércio e Outras Avenças (doravante “Instrumento”), o Carrefour pretende adquirir e o Mercantil São José pretende vender o fundo de comércio e determinados ativos (bens móveis indicados no instrumento como “Ativos Negociados”) relacionados a 03 (três) lojas de propriedade do Mercantil São José. As lojas objeto da operação em tela são destinadas ao comércio varejista de supermercados na cidade de Fortaleza, Ceará. As lojas objeto da operação estão localizadas nos seguintes endereços: a. Loja 1: Av. Barão de Stuart, nº 2200; b. Loja 2: Av. José Bastos, n 4400; c. Loja 3: Av. Washington Soares, nº 2200. O Instrumento foi celebrado entre as Requerentes em 07/10/2005. Todavia, as Requerentes informaram que a consumação da operação está condicionada aos termos e condições estabelecidas no próprio Instrumento. O valor estimado da operação é de aproximadamente confidencial. A operação ora em análise foi submetida ao SBDC em 27 de outubro de 2005 e, como se trata de uma operação nacional, a mesma não foi submetida a nenhuma outra jurisdição antitruste. Dentre as razões consideradas decisivas para a realização da presente operação, o Carrefour informou que o Grupo tem atuação no ramo de supermercados e hipermercados no país e no exterior e tem como objetivo ampliar e incrementar as sua atividades em tal ramo em Fortaleza. Para o Mercantil São José, a operação traduz a intenção de focar suas atividades em suas lojas de menor porte no Estado do Ceará. Cabe mencionar, por fim, que na análise do Instrumento não há a previsão de cláusula de não-concorrência. III. Da Definição do Mercado Relevante Cumpre salientar, preliminarmente, que, apesar de uma das Requerentes apresentar faturamento nacional inferior ao valor de R$ 400 milhões estipulado na Portaria Conjunta nº 08/2004/SEAE/SDE, os dados apresentados no requerimento inicial não foram suficientes para uma definição precisa da dimensão geográfica da operação. Para as operações que envolvem o setor de comércio varejista (super e hipermercados), a definição da dimensão geográfica torna-se de suma importância uma vez que é através dessa que se concluirá pela existência ou não de 4 Versão Pública Ato de Concentração n.: 08012.009328/2005-87 sobreposição horizontal entre as atividades das Requerentes. Como será visto nos itens adiantes, tal definição é trabalhosa e minuciosa, exigindo um esforço maior por parte dessa Secretaria. Importante frisar, também, que esta SEAE encontrou algumas dificuldades na obtenção de informações para a elaboração do presente Parecer, acarretando, portanto, um prazo maior de análise. III.1. Dimensão Produto As empresas envolvidas na presente operação comercializam mercadorias típicas de supermercados e hipermercados: bens de consumo não-duráveis (produtos alimentícios em geral, de higiene e limpeza, bebidas etc.) e duráveis (eletroeletrônicos, têxteis, utilidades domésticas, bazar etc.), dispostos de forma departamentalizada, em que o próprio consumidor escolhe os produtos que deseja adquirir - que se encontram acondicionados em gôndolas e/ou balcões - e efetua o pagamento diretamente nos caixas (check-outs). Esse tipo de comércio varejista é conhecido como de auto-serviço ou de auto-atendimento, contrastando com a loja tradicional, em que há a presença do vendedor ou balconista. O mercado relevante na dimensão produto considerado na presente análise consiste, portanto, num serviço de venda integrada oferecido pelos supermercados e hipermercados3. Baseado em análises anteriores realizadas por esta Secretaria no segmento de supermercados e hipermercados4, e jurisprudência já firmada pelo CADE, lista-se, a seguir, as principais hipóteses que balizarão a constituição do mercado relevante de produto: i) consideram-se supermercados e hipermercados os estabelecimentos que apresentam, em geral, as seguintes características: - supermercados principais seções de vendas constituídas de mercearia, bazar e perecíveis; cerca de 1.500 a 5.000 itens em exposição; de 03 a 40 check-outs e mais de 300 m2 de áreas de vendas; e - hipermercados - principais seções de vendas constituídas de mercearia, bazar, perecíveis, têxteis e eletrodomésticos; mais de 5.000 itens em exposição; mais de 40 checkouts e mais de 5.000 m2 de área de vendas; ii) nesse mercado relevante de produto excluem-se as mercearias, padarias, açougues, feiras-livres, que constituem o pequeno varejo. A exclusão leva em conta que o tipo de consumo que se pratica nesses pequenos estabelecimentos, via de regra, é o de “conveniência”, ou seja, pequenas compras que suprem necessidades imediatas dos consumidores. Em outras palavras, nesses estabelecimentos o consumidor não pode efetuar o mesmo tipo de compra integrada proporcionada pelo supermercado ou hipermercado. Essa realidade os coloca numa situação de substitutibilidade incompleta; 3 As autoridades antitruste americanas têm se manifestado de forma semelhante. Veja-se, por exemplo, o caso de fusão das redes de supermercados Albertson’s, Inc. e American Stores Company, analisada pela FTC – Federal Trade Comission, em 1999. Na definição do mercado relevante de produto esta desprezou o pequeno comércio, tendo sido considerados apenas os supermercados. 4 Atos de Concentração n.º 08012.004897/2002-93 e 08012.004997/2003-09. 5 Versão Pública Ato de Concentração n.: 08012.009328/2005-87 iii) nesse mercado excluem-se também os tipos de auto-serviço representados pelas chamadas lojas de conveniência e as de sortimento limitado. Embora estes operem com o sistema de auto-serviço, oferecem basicamente o mesmo conjunto de bens e, portanto, de possibilidade de compras ao consumidor, abordados no item (ii); iv) parte-se do princípio de que um consumidor, a partir da necessidade de adquirir um conjunto inicial de bens, decide, posteriormente, onde fazer suas compras. Para tomar esta última decisão, supõe-se que o consumidor - a menos que deseje efetuar uma compra de conveniência não irá se dirigir, seguidamente, a vários estabelecimentos do pequeno comércio (mercearias, frutarias, padarias, açougues, papelarias e outros), fazendo várias paradas e pesquisas de preços para comprar uma cesta de bens. Em outras palavras, a tendência de um consumidor é decidir entre um supermercado/hipermercado e outro supermercado/hipermercado, objetivando comprar todos os bens numa única parada (one stop shopping); v) parte-se do princípio de que uma elevação de preços de um, ou de uns poucos produtos, vendidos pelos supermercados ou hipermercados não faz com que o consumidor destes procurem um outro concorrente. Porém, a troca de um supermercado/hipermercado por outro pode ocorrer quando há uma elevação significativa e não transitória dos preços da cesta básica de bens - justamente aquela que faz com que os consumidores efetuem suas compras em um supermercado ou hipermercado e não na “mercearia da esquina”5; vi) existe diferenciação dos produtos oferecidos pelos super e hipermercados, constituídos pelos serviços extras que estes oferecem, tais como: estacionamento; ar condicionado; atendimento “24 horas”; vendas virtuais (delivery); aceitação de cartão de crédito ou cartão próprio da loja; aceitação de cheques pré-datados; parcelamento dos pagamentos; prestação de serviço de limpeza, corte e embalagem de hortifrutis (com o intuito de facilitar a vida do consumidor); maior quantidade e variedade de itens vendidos; melhores técnicas para exposição dos produtos; automação das lojas; condições de atingir o consumidor por meio de propaganda; oferta de marcas próprias, com preços inferiores aos produtos substitutos; maior nível de qualificação dos funcionários; fraldário; sanitários; combinação de outros serviços no mesmo espaço físico; vii) por fim, os supermercados apresentam-se como substitutos quase que perfeitos para hipermercados, não dispondo em geral, apenas de algumas 5 Confirmando essa hipótese, é interessante observar os resultados de pesquisa realizada pela Global Research com 1340 consumidoras de Porto Alegre, Curitiba e São Paulo (capital, Grande São Paulo e interior) e publicada na edição de Fevereiro de 2004 do “Supermercado Moderno”. A pesquisa revelava a percepção de preços do consumidor em 145 categorias, ou seja, quanto ele estaria disposto a gastar para adquirir determinado produto. Um dos resultados da pesquisa foi justamente que não é simples o consumidor trocar de loja em função de aumento de preços. Segundo a pesquisa, “o concorrente tem de oferecer descontos realmente relevantes na maioria das categorias para que a consumidora caia no pecado da infidelidade.” Para maiores detalhes, veja www.sm.com.br. 6 Versão Pública Ato de Concentração n.: 08012.009328/2005-87 seções de têxteis e de eletrodomésticos, neste último caso, especialmente os de maior porte (a denominada “linha branca”). Isto posto, o mercado relevante da operação em tela consiste no serviço de venda integrada oferecido pelos supermercados e hipermercados. 3.2 Dimensão Geográfica De acordo com o Guia para Análise Econômica de Atos de Concentração – SEAE/SDE, a dimensão geográfica do mercado relevante é determinada de acordo com a área geográfica para a qual a venda dos produtos/serviços, definidos no mercado relevante do produto, é economicamente viável. Outra maneira de se definir o mercado relevante geográfico é considerá-lo como a menor área geográfica necessária para que um suposto monopolista hipotético esteja em condições de impor um “pequeno, porém significativo e não transitório” aumento de preços6. Nas averiguações instrutórias realizadas 08012.004897/2002-93, foi verificado que no Ato de Concentração n.º “No caso de supermercados, essa menor área geográfica (o “mercado relevante geográfico”) deve ser definida a partir da disposição do consumidor em se deslocar para realizar suas compras, caso um suposto monopolista hipotético aumente seus preços de maneira significativa e não transitória7. Na maior parte das situações o mais provável é que no caso das compras referentes ao mercado relevante de produto indicado, o consumidor não esteja disposto a deslocar-se mais do que alguns quilômetros, o que significa que na maior parte das vezes, quando se trata de populações urbanas, os consumidores não se deslocarão além da área urbana principal onde moram, e no caso das populações rurais, no máximo até o centro urbano mais próximo. Não parece provável que o consumidor urbano típico esteja disposto a se deslocar até uma cidade vizinha, dados os elevados custos de transação envolvidos (dificuldades de deslocamento, custos de transporte, etc). Segue que o mercado relevante geográfico, no caso de supermercados, coincide com os limites de um município (ou até mesmo de um distrito de um município, dependendo do caso).É importante lembrar que, a partir dessa hipótese, a análise deve 6 Para a definição do mercado relevante geográfico aplicamos o “teste do monopolista hipotético”. Este consiste em se considerar, para um conjunto de produtos e área específicos, começando com os bens produzidos e vendidos pelas empresas participantes da operação, e com a extensão territorial em que estas empresas atuam, qual seria o resultado final de um “pequeno porém significativo e não transitório” aumento dos preços para um suposto monopolista destes bens nesta área. Se o resultado for tal que o suposto monopolista não considere o aumento de preços rentável, o exercício é repetido, sucessivamente, até que sejam identificados um grupo de produtos e um conjunto de localidades para os quais seja economicamente interessante, para um suposto monopolista, impor um “pequeno, porém significativo e não transitório aumento” dos preços. O primeiro grupo de produtos e localidades identificado segundo este procedimento é considerado o menor grupo de produtos e localidades necessário para que um suposto monopolista esteja em condições de impor um “pequeno porém significativo e não transitório” aumento dos preços, sendo este o mercado relevante delimitado. 7 Esse aumento de preços deverá ser reduzido, porém significativo e não-transitório, podendo ser de 5%, 10% ou 15%, conforme o caso concreto, por um período não inferior a um ano. 7 Versão Pública Ato de Concentração n.: 08012.009328/2005-87 também levar em consideração as dimensões dos grupamentos urbanos. Pressupõe-se que nas cidades de grande porte, com problemas graves de trânsito, por exemplo, o consumidor típico não esteja disposto a percorrer toda a extensão da cidade, para efetuar suas compras de supermercado, o que implica a divisão desse tipo de cidade em áreas mais restritas (alguns bairros, ou mesmo quadras, por exemplo)”. Ainda no Parecer Técnico n.º 06137/2004/DF COGSE/SEAE/MF - expedido na análise do Ato de Concentração n.º 08012.004897/2002-93 – foi ressaltado que, embora as empresas envolvidas no negócio possuíssem lojas em várias cidades, de diferentes estados brasileiros, a análise deveria se ater apenas aos supermercados e hipermercados objeto da operação. Deste modo, no presente caso, a averiguação dos efeitos do negócio deve restringir-se às lojas adquiridas do Mercantil São José pelo Carrefour, localizadas no município de Fortaleza (estado do Ceará). Vale destacar que esta Secretaria, quando da análise do Ato de Concentração nº 08012.002665/00-77, de interesse das empresas Companhia Brasileira de Distribuição e J. Melo Importação e Exportação Ltda., envolvendo a aquisição de lojas no município de Fortaleza, concluiu que: “A delimitação do mercado relevante geográfico, para o setor supermercadista, tende a ser trabalhosa, na medida em que esse mercado é extremamente regionalizado, principalmente em cidades de médio e grande porte. Nesse sentido, algumas considerações quanto a determinadas particularidades da cidade de Fortaleza merecem ser feitas ... 15. Fortaleza, com população de 2.138.234 habitantes10, constitui-se em uma cidade de grande porte. O trânsito e o “traçado” da cidade, por sua vez, representam uma limitação ao deslocamento de seus habitantes. Nesse sentido, cumpre destacar alguns desses problemas citados na Síntese Diagnóstica do Município de Fortaleza”11: (i) “A infra-estrutura urbana no Município de Fortaleza apresenta uma distribuição bastante desequilibrada, com atendimento diferenciado, onde determinadas regiões concentram um maior número de serviços e equipamentos públicos, resultando em uma qualidade de vida diferenciada dos seus moradores”; (ii) “Os principais canais de tráfego hoje existentes apresentam configuração rádio-concêntrica, o que produz acentuada dependência dos demais municípios da RMF com relação ao centro da Cidade de Fortaleza”; (iii) “Analisando-se o subsistema de vias arteriais, observa-se que os traçados de muitas destas vias comportam-se como vias radiais, apresentando descontinuidade que dificultam a fluidez do tráfego. 10 Informação obtida no site www.ibge.gov.br, em 17/05/2001. A versão on line de referida síntese encontrava-se, em 17/05/2001, disponível no Site da Prefeitura de Fortaleza, em www.fortaleza.ce.gov.br. 11 8 Versão Pública Ato de Concentração n.: 08012.009328/2005-87 Nesta situação encontram-se as seguintes Avenidas: Bezerra de Menezes, Tristão Gonçalves, Imperador, Universidade e Perimetral, entre outras”; (iv) “As vias do subsistema de vias principais são as que mais apresentam descontinuidades nos seus traçados, destacando-se as avenidas Francisco Sá, Sargento Hermínio, Heráclito Graça, Pontes Vieira e Pasteur, como também as Ruas José Façanha, Érico Mota, Padre Anchieta, Osório de Paiva e Antonio Pompeu, entre outras”; (v) “Estudos realizados apontam para a necessidade de melhorias nos subsistemas de vias arteriais e principais, para evitarem-se deseconomias e impactos negativos decorrentes de congestionamento do tráfego urbano da Cidade de Fortaleza”. Pelas razões expostas acima, na análise do supracitado Ato de Concentração nº 08012.002665/00-77, esta SEAE não analisou a cidade de Fortaleza como um único mercado. Os fatos acima descritos levam a crer que os consumidores não estarão dispostos a se deslocar por grandes distâncias no intuito de efetuar suas compras de super/hipermercado. Na impossibilidade de se identificar e consultar todos os clientes de cada uma das lojas, buscou-se avaliar o poder de atração de cada loja das Requerentes e concorrentes, para, posteriormente, delimitar o(s) mercado(s) relevante(s) geográfico(s) na cidade de Fortaleza. Para definir o poder de atração das lojas, é utilizada a metodologia da “Área de Influência”, exposta por Juracy Parente em publicações da Associação Brasileira de Supermercados – ABRAS e Fundação Getúlio Vargas8. De acordo com essa metodologia, “a maior parte das vendas de uma loja vem de clientes que moram dentro de uma limitada área geográfica em torno da loja”9. Assim, a área geográfica constitui-se na área de influência da loja. O estudo demonstra que a capacidade de atração da loja diminui à medida que aumenta a distância de procedência de seus clientes. Para efeito desta análise, serão adotadas, entretanto, as “dimensões típicas de área de influência para supermercados”, ou seja, o raio em quilômetros em torno da loja – isocota – que contém 60% de seus consumidores, elaboradas especificamente para esta SEAE por Juracy Parente. Nesse estudo, o autor considerou as principais variáveis que afetam as dimensões das áreas de influência. No Quadro III estão demonstradas as seguintes variáveis: (a) o tamanho da loja (medido em quantidade de check-outs); e (b) a densidade populacional. 8 PARENTE, Juracy. “A Importância da Área de Influência nas Decisões de Localização”. in: SuperHiper. Revista da Associação Brasileira de Supermercados. Ano 26. nº 301. Setembro de 2000. pp. 136-141. Ver também: PARENTE, J. e KATO, Heitor T. “Área de Influência: um estudo no varejo de supermercados”. In: Revista de Administração de Empresas. São Paulo, V. 41, nº 2. AbrJun/2001. Pp. 46-53. 9 Versão Pública Ato de Concentração n.: 08012.009328/2005-87 QUADRO III Área de Influência de Supermercados e Hipermercados Quantidade de Check-outs Densidade Populacional 3a5 3a5 3a5 3a5 3a5 6a9 6a9 6a9 6a9 6a9 10 a 14 10 a 14 10 a 14 10 a 14 10 a 14 15 a 19 15 a 19 15 a 19 15 a 19 15 a 19 20 a 29 20 a 29 20 a 29 20 a 29 20 a 29 30 a 39 30 a 39 30 a 39 30 a 39 30 a 39 40 ou + 40 ou + 40 ou + 40 ou + 40 ou + muito baixa Baixa Média média alta Alta muito baixa Baixa Média média alta Alta muito baixa Baixa Média média-alta Alta muito baixa Baixa Média média-alta Alta muito baixa Baixa Média média-alta Alta muito baixa Baixa Média média-alta Alta muito baixa Baixa Média média-alta Alta Faixas por Densidade Populacional (hab/ha) até 50 50 – 100 100 – 150 150 – 200 mais de 200 até 50 50 – 100 100 – 150 150 – 200 mais de 200 até 50 50 – 100 100 – 150 150 – 200 mais de 200 até 50 50 – 100 100 – 150 150 – 200 mais de 200 até 50 50 – 100 100 – 150 150 – 200 mais de 200 até 50 50 – 100 100 – 150 150 – 200 mais de 200 até 50 50 – 100 100 – 150 150 – 200 mais de 200 Área de Influência (raio c/ 60% dos clientes) em metros 1.000 750 500 375 250 1.500 1.150 800 600 450 2.200 1.700 1.200 900 650 2.700 2.200 1.600 1.250 950 3.200 2.600 2.000 1.600 1.200 3.800 3.100 2.400 2.000 1.600 5.400 4.500 3.600 3.000 2.500 Fonte: PARENTE, Juracy. “Área de Influência de Supermercados”. Agosto/2003. 9 PARENTE, Juracy. “A Importância da Área de Influência nas Decisões de Localização”. in: SuperHiper. Revista da Associação Brasileira de Supermercados. Ano 26. nº 301. Setembro de 2000. pp. 136-141. 10 Versão Pública Ato de Concentração n.: 08012.009328/2005-87 Feitas essas considerações, para a delimitação dos mercados geográficos na cidade de Fortaleza foram seguidos os passos abaixo descritos. Primeiramente, esta SEAE solicitou às Requerentes, por meio do Ofício nº 7284/2005/RJ/COGAM/SEAE/MF, as coordenadas (latitude e longitude), no Sistema GPS, de todas as lojas objeto da operação no município de Fortaleza. Solicitou também, junto à Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Controle Urbano de Fortaleza (SEMAM), por meio do Ofício 7355/2005/ RJ/COGAM/SEAE/MF, reiterado pelo Ofício nº 6011/2006/RJ/SEAE/MF, as densidades demográficas de cada um dos bairros de Fortaleza, com a o intuito de traçar as áreas de influência de todas as lojas envolvidas na operação. Todavia, em resposta ao Ofício nº 7284/2005/RJ/COGAM/SEAE/MF, as Requerentes forneceram apenas o endereço completo das lojas objeto da operação, informando ainda que não dispunham internamente de “informações e/ou quaisquer estudos envolvendo as coordenadas de latitude e longitude no sistema GPS de suas lojas e/ou de suas concorrentes, pois tais dados não são utilizados pelas mesmas em suas atividades”. Esta SEAE, então, a fim de delimitar a abrangência geográfica do negócio ora analisado, solicitou novamente às Requerentes informações detalhadas das lojas objeto da operação, ou seja, solicitou informações referentes às ruas paralelas e perpendiculares que circundavam as lojas sob análise. Tal solicitação buscou uma melhor visualização da localização das lojas das Requerentes, como pode ser observado no Mapa 1, colacionado a seguir (Carrefour, em vermelho e Mercantil São José, em azul). 11 Versão Pública Ato de Concentração n.: 08012.009328/2005-87 Mapa 1 Lojas das Requerentes Carrefour e Mercantil São José no município de Fortaleza Carrefour São José Após a plotagem dos pontos que indicam a localização das lojas das Requerentes, o passo seguinte para a delimitação da área de abrangência geográfica foi a verificação das densidades demográficas e populacionais, objetivando, finalmente, traçar os raios de influência das lojas envolvidas na operação (em conformidade com o Quadro III). Contudo, vale ressaltar que esta SEAE, até a presente data, não recebeu resposta aos Ofícios expedidos para a SEMAM referentes às densidades demográficas de cada um dos bairros de Fortaleza. Dessa forma, diante da impossibilidade de obtenção de tais informações, esta SEAE poderia utilizar duas hipóteses para traçar os raios de influência de acordo com o Quadro III: (i) 10 utilizar a densidade demográfica média de Fortaleza. Neste particular, vale destacar que consta no site da Prefeitura do citado município10 que área do mesmo é de 313,8 Km², ocupada por uma população de cerca de 2 milhões de habitantes, o que confere uma densidade demográfica em torno de 6.818 habitantes por Km²; ou Informação obtida no site www.fortaleza.ce.gov.br, em 17/01/2006. 12 Versão Pública (ii) Ato de Concentração n.: 08012.009328/2005-87 considerar, como medida de extrema cautela, o cenário mais restritivo, qual seja, considerar o maior raio possível, que é obtido utilizando-se a mais baixa densidade populacional. Esta SEAE optou por adotar a segunda hipótese descrita, qual seja, considerar o cenário mais restritivo possível, utilizando, a partir da quantidade de check-outs das Requerentes, a densidade populacional mais baixa e conseqüentemente, o maior raio de influência. Dessa forma, os passos seguintes adotados por esta Secretaria foram: (i) (ii) traçar o raio de influência da loja da Requerente Carrefour, que possui 36 check-outs. Assim, em consonância com o Quadro III, utilizando a densidade populacional mais baixa, o raio utilizado foi de 3.800m (raio em verde, de acordo com o Mapa 2); traçar os raios para as lojas da Requerente Mercantil São José: d. loja da Av. Barão de Stuart, nº 2200, com 12 check-outs: em consonância com o Quadro III, utilizando a densidade populacional mais baixa, o raio utilizado foi de 2.200 m (raio em rosa, de acordo com o Mapa 2); e. loja da Av. José Bastos, n 4400, com 11 check-outs: em consonância com o Quadro III, utilizando a densidade populacional mais baixa, o raio utilizado foi de 2.200 m (raio em rosa, de acordo com o Mapa 2); f. loja da Av. Washington Soares, nº 2200, com 15 check-outs: em consonância com o Quadro III, utilizando a densidade populacional mais baixa, o raio utilizado foi de 2.700 m (raio em rosa, de acordo com o Mapa 2). 13 Versão Pública Ato de Concentração n.: 08012.009328/2005-87 Mapa 2 Áreas de Influência das Requerentes Carrefour São José raiosj raiocarrefour Assim, como pode-se depreender da observação do Mapa 2, não há intersecção entre as áreas de influência da loja da Requerente Carrefour com as lojas da Requerente Mercantil São José, destacando-se mais uma vez que foi utilizado o cenário mais restritivo de análise. A título ilustrativo, esta SEAE, com o intuito de corroborar a aludida conclusão acima, optou por apresentar o mapa abaixo (Mapa 3), utilizando a densidade populacional média de Fortaleza, que, como já mencionado, é de 6.818 habitantes por Km² 11. O procedimento para traçar os raios de influência das lojas das Requerentes foi o mesmo já exposto anteriormente: para a loja do Carrefour, com 36 check-outs e densidade populacional alta, utilizar-se-á o raio de 3.100 m (raio em verde); para as lojas do Mercantil São José foram utilizados 02 raios distintos, um de 2.200 m (loja com 15 check-outs) e outro de 1.700 m (para as lojas com 11 e 12 check-outs). 11 Cabe destacar que tal densidade foi convertida para hectare (de acordo como as medidas utilizadas no Quadro III), onde 1 ha= 10.000m². Assim a densidade demográfica de Fortaleza, após tal conversão, é de 68,18 hab/ha. 14 Versão Pública Ato de Concentração n.: 08012.009328/2005-87 Mapa 3 Áreas de Influência das Requerentes Carrefour São José raiosj raiocarrefour Como se pode visualizar no mapa acima, também não há interseção entre as áreas de influência da loja da Requerente Carrefour com as lojas da Requerente Mercantil São José. Isto posto, conclui-se que não existe sobreposição horizontal entre as atividades das Requerentes no município de Fortaleza. Logo, a presente operação não possui o condão de limitar ou de prejudicar o ambiente concorrencial nacional. 15 Versão Pública Ato de Concentração n.: 08012.009328/2005-87 4. Recomendação Após a análise da dimensão geográfica que envolvia a operação em tela, verificouse que não existe sobreposição horizontal entre as atividades das Requerentes. Destarte, recomenda-se a aprovação da operação sem restrições. À apreciação superior. MARINA LAVOCAT BARBOSA ERNESTO Assistente Técnica CECÍLIA VESCOVI DE ARAGÃO BRANDÃO Assessora Técnica MARCOS ANDRÉ MATTOS DE LIMA Coordenador-Geral de Análise de Mercados, Substituto De acordo. MARCELO BARBOSA SAINTIVE Secretário Adjunto 16