UNIJUI - UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL JEAN CARLOS DE QUADROS A DESIGUALDADE DA POSIÇÃO DO COMPANHEIRO NA SUCESSÃO EM CONDIÇÕES IDÊNTICAS AO DO CÔNJUGE Três Passos (RS) 2013 2 JEAN CARLOS DE QUADROS A DESIGUALDADE DA POSIÇÃO DO COMPANHEIRO NA SUCESSÃO EM CONDIÇÕES EDÊNTICAS AO DO CÔNJUGE Monografia final do Curso de Graduação em Direito objetivando a aprovação no componente curricular Monografia. UNIJUÍ – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul. DECJS – Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais. Orientador: MSc. Marcelo Loeblein dos Santos Três Passos (RS) 2013 3 Dedico este trabalho á Marlene, minha mãe, por ter sido quem mais acreditou em mim, quem mais sofreu nas minhas derrotas e quem mais vibrou nas minhas vitórias. 4 AGRADECIMENTOS Agradeço a Deus, por tudo que me tornei. Aos colegas de Direito, por muito contribuírem para o meu crescimento como profissional. Ao Mestre, incomensurável. Marcelo, pelo auxilio A namorada, Daniela, pelas ideias. Especialmente ao meu pai, Natálio, com um forte sentimento de gratidão, por todo o esforço que fez para que eu me tornasse um homem formado. A todos que colaboraram de uma maneira ou outra durante a trajetória de construção deste trabalho, o meu muito obrigado! 5 “Família é quem você escolhe pra viver, família é quem você escolhe pra você, não precisa ter conta sanguínea, é preciso ter sempre um pouco mais de sintonia.” O Rappa 6 RESUMO O presente trabalho de pesquisa monográfica faz apontamentos da importância da família na sociedade, trazendo uma análise de como se deu o surgimento da família, bem como sua evolução até chegar aos dias atuais. Aborda o advento de uma nova família, a união estável, demonstrando que de nova não há nada, sendo esta mais antiga que o casamento, busca toda a trajetória desta união livre até seu reconhecimento pela Constituição Federal, aponta os elementos necessários para a identificação desta pela sociedade como união estável e discute o regime de bens imposto pelo legislador aos sujeitos desta união. Examina a sucessão do companheiro, discorre sobre o tratamento dado ao cônjuge e ao companheiro no momento da sucessão, verificando as diferenças entre estes, nessa perspectiva, tece algumas considerações sobre a inconstitucionalidade do artigo 1790 do Código Civil de 2002 e sua repercussão jurisprudencial. Palavras-Chave: Família. União Estável. Direito Sucessório. Inconstitucionalidade. 7 ABSTRACT The present research makes notes on the importance of the family in society, bringing an analysis of how the emergence of the family occurred, as well as its evolution until the present day. This research discusses the advent of a new family, the stable union, demonstrating that there is nothing new, being this kind of relationship older than marriage, and the study also researches the entire trajectory of this union to its recognition by the Federal Constitution, it points out the necessary elements for its identification by society as a stable union and discusses property regime imposed by the legislature to the subjects of this union. Moreover, the study examines the succession fellow, discusses the treatment given to the spouse and to the companion at the time of succession, checking the differences between these, and, in this perspective, presents some considerations about the unconstitutionality of Article 1790 of the Civil Code of 2002 and its jurisprudence impact. Keywords: Family. Stable Union. Succession Law. Unconstitutionality. 8 SUMÁRIO INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 09 1 DA FAMÍLIA ...................................................................................................................... 12 1.1 A família como célula básica da sociedade .................................................................... 12 1.2 A origem da instituição ................................................................................................... 14 1.3 A família contemporânea ................................................................................................ 19 2 UMA NOVA ESPÉCIE DE FAMÍLIA ............................................................................ 24 2.1 O reconhecimento da união estável como entidade familiar pela Constituição Federal de 1988 .................................................................................................................................... 24 2.2 A família estabelecida pela união estável. ..................................................................... 28 2.3 O regime de bens da união estável ................................................................................. 32 3 DA SUCESSÃO DO COMPANHEIRO .......................................................................... 36 3 1 Do direito sucessório ....................................................................................................... 36 3.2 O direito do companheiro na sucessão e disparidade de direitos resguardados ao cônjuge .................................................................................................................................... 39 3.3 Da inconstitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil: uma análise jurisprudencial ....................................................................................................................... 47 CONCLUSÃO........................................................................................................................ 57 REFERÊNCIAS .................................................................................................................... 60 9 INTRODUÇÃO A presente pesquisa tem como tema a sucessão da família constituída pela união estável, que por anos vagou no limbo jurídico sem direitos reconhecidos, e que após tê-los, continuou havendo desigualdades, principalmente quanto a sua sucessão tratada pelo Código Civil, que de forma repugnante retroagem direitos já conferidos por lei ao companheiro, ferindo normas e princípios constitucionais. Pode-se afirmar hoje, que a relação da família atual (contemporânea) formada pela união estável é real para o direito, tendo em vista que a Constituição Federal de 1988 assegurou a escolha livre do indivíduo. Partindo desse entendimento, entra-se neste novo modelo de família. A união estável antes da Constituição Federal de 1988 era chamada de concubinato, este tipo de união, é muito mais antigo que o próprio casamento. Esta forma de família por muito tempo (e ainda hoje em casos isolados) foi repudiado pela sociedade tendo em vista os valores religiosos, os quais, só aceitava-se a família constituída pelo casamento. O Código Civil traz os requisitos necessários para configurar a união estável em seu artigo 1.723, que reconhece como entidade familiar a união estável entre homem e mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo da constituição de família. A união estável, após sua legalização teve seu regime de bens patrimoniais resguardados pela legislação pátria, que estipulou o regime de separação parcial de bens. A sucessão da união estável está regulada pelo artigo 1.790, do Código Civil, que diz que a companheira ou companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, observadas as condições dispostas em seus incisos. Assim, o companheiro não foi incluído no rol dos herdeiros legítimos, tampouco dos herdeiros necessários, cabendo a estes direitos diferentes dos reservados ao cônjuge, 10 deixando esse e aquele em posições distintas no momento de suceder. É evidente a inobservância do legislador da norma infraconstitucional aos princípios constitucionais, ao não levar em conta os direitos iguais entre cônjuge e companheiro. Deste modo, percebe-se a inconstitucionalidade do artigo 1.790, e incisos, do Código Civil, que não observa os princípios da igualdade e dignidade da pessoa humana, trazidos pela Constituição. Levando em consideração estas importantes questões, a presente pesquisa tem como objetivo identificar a (in)constitucionalidade do artigo 1790 do Código Civil, que trata da sucessão do companheiro. O trabalho contempla ainda objetivos mais específicos, tais como: a) Verificar como se deu a instituição da família, seu conceito e em específico, a união estável na história da humanidade até a contemporaneidade; b) Pontuar o regime de bens e como se da sucessão do companheiro em concorrência com os demais herdeiros; c) Diferenciar os direitos do companheiro e os do cônjuge na sucessão. Para o desenvolvimento da presente pesquisa, utiliza-se de método de abordagem hipotético-dedutivo, utilizando-se de seleção de bibliografia e documentos afins à temática e em meios físicos e na Internet, interdisciplinares, capazes e suficientes para a construção do trabalho; leitura, fichamento, reflexão crítica sobre o material selecionado e exposição dos resultados obtidos através de um texto escrito monográfico. No primeiro capítulo abordar-se-á ao estudo sobre a origem da família desde os primórdios da sociedade até a contemporaneidade, explorando o presente instituto, verificando-se como se constituíram as primeiras famílias e seguindo na análise das mudanças de sua formação hoje. No segundo capítulo, passar-se-á ao estudo da nova forma de família, a união estável, equiparada ao casamento pela Constituição Federal de 1988, apresentando as características para sua formação e regime de bens adotado pelo legislador do Código Civil de 2002, e por fim, no terceiro e último capítulo, far-se-á um breve estudo sobre o Direito das Sucessões, passando à análise do artigo 1.790 do Código Civil que trata de maneira desigual a tutela sucessória dos companheiros comparando-se com os cônjuges, tratando ao fim da inconstitucionalidade do referido artigo. 11 Em um país democrático como o nosso, tendo uma constituição com princípios e normas que garantem os direitos de cada cidadão, não se pode falar em tratamentos desiguais, devendo ser tratados cônjuges e companheiros igualmente. 12 1 DA FAMÍLIA A família é o berço de toda a vida, tanto física, como emocionalmente e espiritualmente, ela existe antes de todos os povos, raças e nações. Assim, a partir do posicionamento de doutrinadores, pretende-se analisar a estrutura familiar hoje, bem como o desenvolvimento que vem ocorrendo ao seu redor e as mudanças evolutivas que surgiram de acordo com o tempo e a modernidade da instituição familiar. 1.1 A família como célula básica da sociedade A família caracteriza-se pelo agrupamento de pessoas que vivem sob o mesmo teto e economia comum, pode ser composta por laços consanguíneos e laços afetivos. De acordo com o art. 226, da Constituição Federal de 1988, é considerada como a base da sociedade, e com especial proteção do governo. Quase todas as atividades humanas são desenvolvidas dentro da esfera social, é por isso que se diz que o núcleo familiar é tão essencial para o desenvolvimento do homem. Primeiramente, devem-se buscar alguns conceitos de família, para um melhor entendimento do tema proposto. Para Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2011, p. 43, grifo dos autores), “família é o núcleo existencial integrado por pessoas unidas por vinculo socioafetivo, teleologicamente vocacionada a permitir a realização plena de seus integrantes.” Por honestidade intelectual, sabe-se que não existe um conceito único e absoluto de tal instituição. Deste modo, conforme Gustavo Tepedino (1999, p. 326): O conceito de família é relativo, altera-se continuamente, renovando-se como ponto de referência do individuo na sociedade e, assim, qualquer analise não pode prescindir de enfocar o momento histórico e o sistema normativo em vigor. 13 De acordo com Jacques Lacan (apud GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2011, p. 36): Entre todos os grupos humanos, a família desempenha um papel primordial na transmissão da cultura. Se as tradições espirituais, a manutenção dos ritos e dos costumes, a conservação das técnicas e do patrimônio são com ela disputados por outros grupos sociais, a família prevalece na primeira educação, na repressão dos instintos, na aquisição da língua acertadamente chamada de materna. Nestes termos, pode-se compreender que a família tem um significado singular na vida, é a base, o grande alicerce que atravessa o tempo e o espaço, é onde se vive alegrias e frustrações. No mesmo sentido, Maria Berenice Dias (2009, p. 31, grifo da autora) diz o seguinte: [...] difícil sua definição sem incidir num vicio de logica. Como esse ramo do direito disciplina a organização da família, conceitua-se o direito de família com o próprio objeto a definir. Em consequência mais do que uma definição, acaba sendo feita a enumeração dos vários institutos que regulam não só as relações entre pais e filhos, mas também entre cônjuges e conviventes, ou seja, a relação das pessoas ligadas por um vinculo de consanguinidade, afinidade ou afetividade. Percebe-se que a família foi e ainda é à base da sociedade, desde as mais primordiais, tendo em vista a necessidade do ser humano viver em grupos para sua sobrevivência, seja para busca de comida, reprodução de sua própria espécie, como também para sua proteção. A família é muito maior que laços de sangue, ela representa o passado, o presente e o futuro. É ela quem da à essência do indivíduo, sua origem determinará a realidade do homem singular. Tem-se como primeiro grupo de pessoas que se tem conhecimento, é o lugar onde seus membros nascem e desenvolvem-se. Quando a família tem problemas, alegrias ou tristezas internas, refletem-se em todos os seus familiares, haja vista sua total união. Esta união tornase um castelo, que também serve como refugio para seus componentes, que defendem todos os ataques feitos a ela. 14 Igualmente é o entendimento de José Sebastiao de Oliveira (2002, p. 20): Sem sombra de duvidas que a família na sociedade destaca-se para o homem como o seu mais importante elo de ligação no relacionamento social, pois é no seio dela que ele surge, recebe a proteção indispensável para continuidade da vida e se prepara para os embates que o futuro lhe reserva em termos de subsistência, evolução pessoal e material que a humanidade busca sem cessar, como fator de seu desenvolvimento e progresso contínuo. Assim, sendo a família quem transmite virtudes e valores humanos, éticos, culturais, sociais, políticos, espirituais e religiosos, bem como os princípios de convivência tanto internos como externos que são essenciais para o desenvolvimento do bem estar de seus membros na sociedade, é ela que formara o homem, este homem formará outra família dando continuidade a suas crenças. Entendendo-se por sociedade, o grupo de pessoas formadas por semelhanças éticas, culturais, politicas, religiosas ou com objetivos comuns. Conforme Oliveira (2002, p. 22): Assim, a família, como instituição social, é uma entidade anterior ao estado, anterior à própria religião e também anterior ao direito que hoje a regulamenta, que resistiu a todas as transformações que sofreu a humanidade, quer de ordem consuetudinária, econômica, social, cientifica ou cultural, através da historia da civilização, sobrevivendo praticamente incólume, desde os idos tempos, quando passou a existir na sua estrutura mais simples, certamente de forma involuntária e natural, seguindo, paulatinamente, na sua primordial função natural que é a conservação e perpetuação da espécie humana. Portanto, a família é a base ou núcleo da sociedade que representa a formação da personalidade de cada um de seus membros. É o alicerce sobre o qual se baseia o psicológico, o ser humano social e físico. Feitas tais considerações, passamos a resgatar a origem da instituição no próximo tópico. 1.2 A origem da instituição Desde sua origem mais remota, até a atualidade, percebe-se que a instituição familiar sofreu grandes evoluções estruturais. 15 Conforme afirmação de Gagliano e Pamplona Filho (2011, p. 44, grifo dos autores), “para compreender o significado da família na contemporaneidade, faz-se necessário, primeiramente, contextualizarmos etimológica e historicamente a comunidade existencial humana denominada de família.” No início da civilização, o agrupamento de pessoas como já comentado anteriormente, era apenas um coletivo de indivíduos unidos em busca de comida, proteção e reprodução, estes norteados pelo instinto natural de sobrevivência. Começaram com pequenos clãs, os quais ao longo do tempo evoluíram para família. Neste sentido, Gagliano e Pamplona Filho (2011, p. 45): A depender da acepção da expressão, os primeiros grupamentos humanos podem ser considerados núcleos familiares, na medida em que a reunião de pessoas com a finalidade de formação de uma coletividade de proteção reciproca, produção e/ou reprodução, já permitia o desenvolvimento do afeto e da busca da completude existencial. Para compreensão da origem da família, deve-se observar a obra de Friedrich Engels, o qual organizou a origem da instituição familiar em uma ordem evolutiva da selvageria aos tempos contemporâneos. Partindo disso, o autor classificou a evolução da família de acordo com suas características e particularidades, sendo elas, a família consanguínea, panaluana, pré-monogâmica e monogâmica. Conforme o entendimento de Engels ([S.d.]) o início dos agrupamentos humanos era marcada por uma liberdade de escolha, verdadeira promiscuidade, todos mantinham relações com todos, seu pai poderia ser irmão ou filho de sua mãe. Tamanha era a liberdade da escolha do parceiro ou parceira no momento da reprodução, que não havia limites de idade, ou seja, a avó paterna poderia manter relações sexuais com o neto. No início não havia nenhum sentimento de posse, ou seja, ciúmes sobre determinada pessoa, todos eram livres. Do mesmo modo, segundo Engels ([S.d.], p. 43): A tolerância reciproca entre os machos adultos e a ausência de ciúmes constituíam a primeira condição para formar esses grupos maiores e duradouros que eram os únicos em cujo seio podia ocorrer a transformação 16 do animal em homem [...] o casamento grupal, forma em que grupos inteiros de homens e grupos inteiros de mulheres se possuem mutuamente, deixando bem pouca margem para o ciúmes [...] uma vez, porem, que as formas de casamento por grupos que conhecemos são acompanhadas de condições tão peculiarmente complicadas que apontam, necessariamente, para formas anteriores e mais simples de relações sexuais e, de modo, em ultima analise, para um período de relações promiscuas, correspondente a transição da animalidade para humanidade, então as referencias aos casamentos animais nos conduzem de novo ao mesmo ponto de onde nos deveríamos ter afastado de uma vez por todas. De estado primitivo de relações promiscuas, evoluiu-se para a família consanguínea. Aos poucos os gens foram se desenvolvendo em seus interiores, passou-se a existir a censura da prática do incesto. Diante de tais acontecimentos foi possível detectar uma significativa mudança no desenvolvimento do ser humano. Passou aqui, a ser reconhecido a linhagem materna, haja vista que apenas a mãe poderia reconhecer seus filhos, não podendo haver esse reconhecimento quanto ao pai. Seguidamente, para Engels ([S.d.], p. 45): A família consanguínea, a primeira etapa da família. Nela, os grupos conjugais se separam por gerações. Todos os avôs e avós, dentro dos limites da família, são, em seu conjunto, maridos e mulheres entre si. O mesmo ocorre com os respectivos filhos, quer dizer, com os pais e mães. Os filhos destes, por sua vez, constituem o terceiro circulo de cônjuges comuns e seus filhos, bisnetos dos primeiros, o quarto circulo. Nessa forma de família, portanto, só os ascendentes e dos descendentes, os pais e os filhos, estão reciprocamente excluídos dos direitos e deveres (como poderíamos dizer) do casamento. Irmãos e irmãs, primos e primas, em primeiro, segundo e restantes graus, são todos irmãos e irmãs entre si e, precisamente por isso, todos maridos e mulheres uns dos outros. Nesse estagio, o vinculo de irmão e irmã pressupõe por si a relação sexual entre ambos. O segundo momento da evolução, também a passos lentos, veio do que foi chamado de família punaluana, tendo como base costumes havaianos. É neste momento da história em que houve a proibição dos relacionamentos entre irmãos, o que proporcionou mais um degrau rumo à civilização. Por conseguinte, Engels ([S.d.], p. 50, grifo do autor), “[...] a partir de então, esse círculo se consolida cada vez mais por meio de instituições comuns, de caráter social e religioso, que o distingue das outras gens da mesma tribo [...]” 17 Tanto nessa fase como na consanguínea, falavam-se das famílias cujos chefes eram mulheres, elas que exerciam o poder familiar. A terceira forma familiar, denominada de pré-monogâmica, percebe-se uma evolução na civilização, muita mais avançada que nas outras, há nesta o repúdio das relações sexuais entre todos os entes familiares, o que ocasionou uma mudança no chefe da família, passou-se, a saber, quem é o pai das crianças, este passou a exercer o poder familiar. Neste momento, deixou de existir as famílias por grupos e passou-se a famílias por pares. No período pré-monogâmico, encontram-se também a poligamia e a poliadria, ou seja, um homem com mais de uma mulher e uma mulher com mais de um homem, essa ocorrendo poucas vezes em grupos isolados. As mulheres neste período eram tratadas como escravas pelos homens. Assim, conforme Engels ([S.d.], p. 54): Nesse estágio, um homem vive com uma mulher, mas de forma tal que a poligamia e a infidelidade ocasional permanecem um direito dos homens, embora a poligamia seja raramente observada, também por causas econômicas, ao passo que, na maioria dos casos, exige-se das mulheres a mais rigorosa fidelidade enquanto durar a vida em comum, sendo o adultério desta castigado de maneira cruel. O vínculo conjugal é, porém, facilmente dissolúvel por qualquer das partes e, tal como anteriormente, os filhos pertencem exclusivamente à mãe. Nota-se, que a partir do Império Romano surge a família monogâmica, a censura quanto à quantidade de parceiros e proibições entre os familiares, a qual veio afunilando de tal forma até chegarmos à família conhecida hoje, onde temos uma única mulher e um único homem, exclusivos entre si. Gagliano e Pamplona Filho (2011, grifo nosso) explicam que o poder familiar era exercido pelo ente masculino mais velho, conhecido como pater, e todos a ele deviam respeito, tendo em vista que mantinha a unidade familiar. Deste modo, se um de seus filhos casa-se, suas mulheres não estariam sob a autoridade exclusiva de seus maridos, mas também sob a autoridade do pater. 18 A família nesta época possuía um caráter patrimonial, onde, apenas herdava quem possuísse família. Após a morte do pater, extinguia-se o vínculo, ocorrendo um desmembramento dos componentes, onde as figuras masculinas formavam suas próprias famílias, passando então eles a serem os novos pater. A família chamada por Engels como gens, passa-se a ser denominada por família a partir de Roma, onde os romanos identificavam seus escravos por este nome. Porém, a conotação mais próxima do significado que se tem hoje, veio com o cristianismo, como ressaltam Gagliano e Pamplona Filho (2011, p 50) “fundada essencialmente no casamento, que, de situação de fato, foi elevado à condição de sacramento.” Ainda, de acordo com o renomado doutrinador Sílvio de Salvo Venosa (2003, p. 19) “[...] o cristianismo condenou as uniões livres e instituiu o casamento como sacramento, pondo em relevo a comunhão espiritual entre os nubentes, cercando a de solenidade perante a autoridade religiosa.” O cristianismo trouxe seus valores de respeito, afeto e a proibição do adultério, sacramentando a união perante Deus. Constata-se, que ainda hoje, existe além da monogamia, poligamia e a poliadria, como citado por Gagliano e Pamplona Filho (2011, p. 47) “[...] em tempos modernos, a poligamia no Oriente e a poliadria em povos na Índia e no Tibet.” Conclui-se, que assim como é antiga a história da humanidade, é a história da família, a qual passou por inúmeras transformações de função, natureza e composição ao longo do tempo para chegar a sua concepção atual. Assim sendo, no próximo subtítulo, seguindo no estudo da instituição familiar cabe aprofundar a pesquisa buscando a família contemporânea, tendo em vista que a mesma evolui em um ritmo muito acelerado, levando a sociedade acompanhar este. 19 1.3 A família contemporânea O ramo do direito de família, tendo como fim a regulamentação das relações ocorridas no seio familiar, passa-se constantemente por mudanças sociais, não podendo dar as costas para essas, devendo assim, adequar-se aos novos ditames da sociedade e ao tempo em que pertence, ou sofrerá com uma ineficácia diante das novas necessidades da sociedade. Na atualidade não existe mais apenas a família nuclear, a qual tinha como membros o pai, com função de sustento desta família, a mãe, que cuidava da casa e da educação e formação dos filhos, e os filhos que apenas tinham como dever o estudo. Tal família, por muito tempo foi regularizada pelo direito como única instituição. Hoje podemos constatar vários tipos de família, sejam elas formadas por um único genitor (pai ou mãe) e seu filho, ocorrendo tanto pelo divórcio, separação, pais que nunca quiseram uma vida conjunta tendo filhos em comum, pela morte, ou por pais que trabalham em cidades diferentes, até mesmo homossexuais. Diante disso, o direito deve acompanhar todas essas mudanças, para a nova realidade de valores políticos, econômicos, sociais, financeiros, históricos, religiosos e científicos. A família que temos hoje é muito diferente de tempos atrás, o que une seus componentes é o afeto. O papel de cada indivíduo também teve mudanças, o pai não é mais quem detém o poder máximo a qual todos devem respeitar, inclusive suas esposas. Pelo contraio, hoje em dia, o homem e a mulher têm seus direitos e importâncias iguais em uma família, ambos impõem regras em seus lares, a mulher não é apenas a dona de casa que cuida da educação dos filhos, ela adquiriu o papel de trabalhadora, trazendo renda para o lar. Do mesmo modo, para Venosa (2003, p. 20): A passagem da economia agraria à economia industrial atingiu irremediavelmente a família. A industrialização transforma drasticamente a composição da família, restringindo o número de nascimentos nos países mais desenvolvidos. A família deixa de ser uma unidade de produção na qual todos trabalhavam sob a autoridade de um chefe. O homem vai para a fábrica e a mulher lança-se para o mercado de trabalho [...] 20 Outra mudança perceptível é quanto à qualidade intelectual, antes os mais velhos eram considerados mais sábios do que os de tenra idade, tendo em vista a sua vivência, ou seja, obtiveram sabedoria pelos anos vividos e experiência adquirida. Atualmente, com a facilidade de troca de informações, e pela qualificação do ensino, os filhos encontram-se com uma capacidade intelectual muito mais aprimorada, ao passo que, quando adquirirem a idade de seus pais, aliando todo conhecimento com a experiência dos momentos vividos, terão uma grande vantagem quanto a estes. Quanto às mudanças de paradigmas da família moderna, entende Cristiano Chaves Farias (apud HIRONAKA, 2008, p. 61): É o ambiente ideal para a realização espiritual e física do ser humano, ou seja, somente se justifica a proteção da família para que se efetive a tutela da própria pessoa humana. É, por conseguinte, a família servindo como instrumento para a realização plena da pessoa humana e não mais vislumbrada como simples instituição jurídica e social, voltada para fins patrimoniais e reprodutivos. Giselda Maria Fernandes Novais Hironaka (2008) explica que a mulher reprimida na história, quanto aos seus sentimentos e desejos, tinha apenas a função de reprodução, vivia algumas vezes em regime de escravidão em tempos antigos, não podia ver seus sentimentos de prazer aflorar, sofriam verdadeira repressão da sociedade quanto sua virgindade, era condenada por suas traições (muito mais que os homens que de certa forma eram aceitos tendo em vista sua masculinidade) e toda a moral entorno de seu comportamento. Hoje não se tem mais essa rigidez, podendo a mulher ir à busca do prazer sexual em igualdade com os homens. Segundo Michele Perrot (2005, p. 81), “despontam novos modelos de família, mais igualitárias nas relações de sexo e idade, mais flexíveis em suas temporalidades e em seus componentes, menos sujeitas a regras e mais ao desejo.” A família contemporânea pode se constituir de diversas maneiras, sendo identificadas pelo direito sete formas de composição, passa-se a analise destas: 21 a) Matrimonial, constituída pelo casamento no registro civil de um homem e uma mulher. Assim, conforme Dias (2009, p. 44): Sob a justificativa de manter a ordem social, tanto o Estado como a Igreja acabaram se imiscuindo da vida das pessoas. Na tentativa de regular as relações afetivas, assumiram postura conservadora para preservar estrito padrão de moralidade. Assim, foram estabelecidos interditos e proibições de natureza cultural e não biológica, e os relacionamentos amorosos passaram a ser nominados de família. A Constituição Federal de 1916, apenas reconhecia como instituição familiar o matrimônio heterossexual. O poder de família era exercido apenas pelo homem, sendo chamado de pátrio poder. b) Informal, são as relações entre companheiros, ou seja, união estável. Esta família passou por sérias censuras, levando em considerações as regras de algumas religiões, principalmente a católica que condena tais relações perante Deus, aceitando apenas relações sexuais e formação da família através do casamento. As relações extramatrimoniais só tiveram seus direitos protegidos pela Constituição Federal de 1988, a qual equiparou o casamento à união estável. c) Homoafetiva é formada por pessoas do mesmo sexo que mantêm relações sexuais entre si, que vem ganhando verdadeiras batalhas para seu reconhecimento pela lei, a qual teve seu direito de união reconhecido recentemente. Em tempos não tão distantes, o preconceito era tanto que pessoas com opções sexuais diferentes das convencionais, e das impostas pela religião, viviam infelizes com seus sentimentos reprimidos, não podendo ser quem realmente eram. d) Monoparental é formada apenas por um dos pais e o(s) filho(s), ou seja, apenas um está presente na titularidade do vínculo familiar. e) Anaparental é formada por pessoas que não são ligadas por relações sexuais, nem tem por base a idade, seria uma possibilidade de família entre duas irmãs que vivem anos sobre o mesmo teto adquirindo bens patrimoniais. 22 Explica Dias (2009, p. 48, grifo da autora): O conceito atual de família não se restringe mais ao conceito de casamento. Também não se pode afirmar que é necessária a diversidade de sexo para gerar efeitos no âmbito do direito das famílias. Igualmente, a diferença de gerações não pode servir de parâmetro para o reconhecimento de uma estrutura familiar. Não é a verticalidade dos vínculos parentais de dois planos que autoriza reconhecer a presença de uma família merecedora da proteção jurídica. Mas olvidou-se o legislador de regular essas entidades familiares. A convivência entre parentes ou entre pessoas, ainda que não parentes, dentro de uma estruturação com identidade de propósito, impõem o reconhecimento da existência de entidade familiar batizada com o nome de família anaparental. f) Pluriparental, de acordo com Dias (2009) é formada por mais de uma família, essa instituição surgiu considerando o divórcio e a separação. Deste modo, os genitores se divorciam e adquirem novos companheiros, passando a ter outra família, mas ainda estão ligados à outra, seja pelo poder familiar quanto aos filhos ou pela pensão alimentícia. g) Paralela é o concubinato gerado do adultério, o qual sofre repúdio pela sociedade, mas encontra partida geram direitos. O não reconhecimento do concubinato gera enriquecimento ilícito de uma das partes. Segundo Dias (2009) o STJ vem reconhecendo o concubinato, não como união estável, mas sim os direitos pela vida em comum, deferindo ao concubino indenização por serviços domésticos prestados, divisão do seguro de vida e partilha de pensão por morte. Se antes a família era pautada apenas no casamento, hoje não é possível apresentar uma definição única e exclusiva de tal instituição, tendo em vista a grande gama de relações formadas entre seus indivíduos. Para Paulo Luiz Netto Lôbo (2006, p. 99), “a família atual parte de três princípios básicos, de conteúdo mutante segundo as vicissitudes históricas, culturais e políticas: a liberdade, a igualdade e a afetividade. Sem eles, é impossível compreendê-la.” Tão correta quanto a mais apurada definição de família atual, é a percepção do grupo musical O Rappa, quando canta: “família é quem você escolhe pra viver, família é quem você 23 escolhe pra você, não precisa ter conta sanguínea, é preciso ter sempre um pouco mais de sintonia.” Logo, os membros da família contemporânea buscam o prazer em viver, felicidade e amor, não apenas o patrimônio. No próximo capítulo abordar-se-á o estudo da família que se unem apenas buscando esta felicidade em estar junto, passa-se a abordar a família composta pela união estável. 24 2 UMA NOVA ESPÉCIE DE FAMÍLIA A família, concluindo-se do capítulo anterior, é composta por pessoas que escolhemos para estar por perto, dividindo afeto, emoções e momentos. Para que essa relação se concretize aos olhos da sociedade e juridicamente, ela envolve um contrato de vontade, ou seja, um contrato em que as partes acordam o desejo de estar junto e constituir uma família, mas esse acordo pode ser formal diante de autoridade competente (casamento ou união estável reconhecida em registro público) ou informal apenas o ato de morar junto com ânimo de constituir família (união estável). Ocorre que por anos esta família teve sua formação reconhecida pela sociedade na forma, e apenas nesta, do casamento celebrado em cartório. Fugindo deste pensamento arcaico, a família deve ter como palavra norteadora à liberdade, neste sentido Oliveira (2002, p. 144), “liberdade para escolher o parceiro; liberdade para expandir suas aptidões pessoais; liberdade de diálogo; liberdade contra o falso moralismo que ainda está impregnado nos discursos de alguns grupos sociais; liberdade para ser feliz!” Assim, buscando esta liberdade para ser feliz, surgiram novas espécies de família, baseando-se apenas no afeto, carinho e na vontade de estar junto, surgindo à união estável que consiste em união entre duas pessoas de sexo diferente sem as formalidades do casamento, a família monoparental formada por apenas um dos genitores e a união homoafetiva, formada por pessoas do mesmo sexo, sendo as duas primeiras reconhecidas pela Constituição Federal, cabe agora tecer considerações sobre a família, objeto deste estudo. 2.1 O reconhecimento da união estável como entidade familiar pela constituição federal de 1988 A saga para o reconhecimento jurídico da união estável no Brasil como instituição familiar passou por diversas etapas. Segundo Gagliano e Pamplona Filho (2011, p. 407), tais etapas dividem-se em: [...] ampla rejeição, com absoluta ausência de tutela jurídica, atravessando o silencioso constrangimento da simples tolerância, passando pela aceitação 25 natural como fato social, até o reconhecimento e valorização constitucional como forma idônea de família. Assim, a ampla rejeição trazida por Gagliano e Pamplona Filho (2011) tratava-se de uma relação ilícita, relacionada ao adultério e rejeitada pela religião, sofrendo certa aversão pela sociedade. Além disso, completa Dias (2009) que até 1977 não havia a possibilidade de dissolução do casamento, negando-se assim a liberdade de decisão dos indivíduos, podendo este apenas desquitar-se, desmanchando a sociedade conjugal, mas ainda assim, impedido de contrair novo matrimônio. Quanto à impossibilidade de contrair novas núpcias completam Gagliano e Pamplona Filho (2011, p. 529), “[...] somente gerava “famílias clandestinas”, destinatárias do preconceito e da rejeição social.” Apenas com o surgimento da Lei n. 6.515/77, “Lei do Divórcio”, segundo Gagliano e Pamplona Filho (2011) mudou-se os paradigmas até então trazidos pela Constituição Federal. Esta lei não apenas regulou o divórcio, mas também, proibiu a utilização da palavra “desquite”, até então utilizado pelo ordenamento brasileiro, substituindo-a por “separação judicial”. Ficou estabelecido que as partes teriam que aguardar o decurso do lapso temporal, para então, extinguir o casamento, este tempo teria como finalidade uma possível reconciliação. Mesmo assim, essa rejeição aos fatos sociais referentes às uniões livres continuava ocorrendo e aclamando ao judiciário, o qual por sua vez, vendo-se diante destes teve que tomar providências, sendo estas, o reconhecimento da existência da sociedade de fato, que buscava a repartição dos bens adquiridos em sociedade, evitando-se assim o enriquecimento ilícito de uma das partes. Acentua-se ainda, que a união estável era conhecida como concubinato antes de seu reconhecimento pela constituição, nomenclatura esta que adiante será analisada na oportunidade da questão terminológica adotada pelo legislador e doutrinadores, continua-se assim na análise da saga da família constituída pela união estável. 26 A etapa da tolerância, verificada por Gagliano e Pamplona Filho (2011) e abordada também por Dias (2009), é a primeira tutela que impulsionou providência judicial, reconhecendo direitos aos companheiros, as quais foram de natureza previdenciária, que por meio do Decreto nº 2.681 de 1912, assegurou direitos indenizatórios a concubina que tivesse seu companheiro morto em estrada de ferro, bem como, surgiram demandas de indenização por morte do companheiro em acidentes de trabalho e de trânsito. Porém, ainda que reconhecidos estes direitos, a doutrina continuava posicionando-se desfavoravelmente a estas uniões livres. A aceitação como fato social, terceira etapa da união estável para Gagliano e Pamplona Filho (2011), foi conquistada pela jurisprudência, a justiça teve que se pronunciar diante de tantos fatos advindos desta união livre. Deste modo, frente às dissoluções do companheirismo o legislador passou a reconhecer o direito à indenização por serviços domésticos prestados, evoluindo então para o reconhecimento de uma sociedade de fato entre estes. Assim, o Supremo Tribunal Federal não pode mais abster-se dos fatos, vendo sua única saída na edição da súmula 380 com o seguinte conteúdo: “Comprovado a existência de sociedade de fato entre os concubinos, é cabível a sua dissolução judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum.” Percebível ser este um grande marco na história da união estável, cabendo à concubina, visando à garantia de seus direitos, provar o esforço comum, não bastando apenas morar com o companheiro, mas também contribuir financeiramente. Desta maneira, passou a ter reconhecimento como uma sociedade de fato. Sobre a presente sumula, registram Gagliano e Pamplona Filho (2011, p. 414): Assim, tal sociedade formada pelo vínculo matrimonial, a conjunção de esforços de ambos os concubinos (expressão que ainda persistia naquele momento histórico) formava, no campo dos fatos, uma sociedade, o que autorizaria, na sua eventual dissolução, a partilha dos bens. Em 1988 é que vem o reconhecimento, quarta fase, de acordo com Gagliano e Pamplona Filho (2011), que se apresenta pela valorização desta forma de família, momento proporcionado pela Constituição Federal que a reconheceu como instituição familiar equiparando-se ao casamento. 27 De acordo com Oliveira (2002, p. 146): Anteriormente, o que se observou é que o legislador – não podendo negar a existência destas uniões – regulamentava efeitos jurídicos que dela decorriam, tais como previdenciários, tributários, efeitos do contrato de locação, entre outros, mas nunca enfrentando diretamente a questão. O que havia era tratamento oblíquo e fracionado do problema. Disciplinava-se – por absurdo que possa parecer – um efeito sem dispensar igual tratamento à sua causa. Quanto à equiparação da união estável ao casamento há certa convergência pelo legislado, verifica-se que apesar da Constituição Federal reconhecer aquela como entidade familiar comparada a essa, facilitou sua conversão em casamento. No entender de Venosa (2003), se ambas são reconhecidas e equiparadas não logra razão o legislador em convertê-la. Outrossim, ocorre também divergências na sucessão do companheiro e cônjuge, conforme será exposto em capítulo posterior. Visto a saga enfrentada pela união livre até seu reconhecimento como instituição familiar dotadas de direitos e deveres, passa-se a terminologia escolhida pelo legislador, o qual tratou os sujeitos dessa união como companheiros ao invés de concubinos. Nomenclatura utilizada até então para reconhecer as uniões fora do casamento, pois esta carregava grande carga repressora pela sociedade. O concubinato dividia-se em puro e impuro, suas definições são trazidas por Maria Helena Diniz (1997, p. 274, grifo da autora): Será puro se se apresentar como união duradoura, sem casamento civil, entre homem e mulher livres e desimpedidos, isto é, não comprometidos por deveres matrimoniais ou por outra ligação concubinária. Assim, vivem em concubinato puro: solteiros, viúvos, separados judicialmente e divorciados (RT 409:352). Ter-se-á o concubinato impuro se um dos amantes ou ambos estão comprometidos ou impedidos legalmente de se casar. Apresentam-se como: a) adulterino (RTJ 38:201; RT 458:224), se se fundar no estado de cônjuge de um ou ambos os concubinos, p. ex., se o homem casado mantem, ao lado da família legitima, outra legitima, e b) incestuoso, se houver parentesco próximo entre os amantes. Deste modo, alguns doutrinadores entendiam logo que se reconheceu a união estável que a nomenclatura correta para designar os sujeitos desta união seria compatível o 28 concubinato puro, que como visto expõem adequadamente o estado civil dos sujeitos e a relação entre eles. Ocorre que após o legislador infraconstitucional trazer no Código Civil de 2002, a definição de concubinato e de companheiro, não houve mais lugar para reconhecimento do concubino como sujeito de união estável, sendo distintas tais nomenclaturas, existindo hoje apenas o concubinato impuro. Neste sentido Carlos Roberto Gonçalves (2011, p. 606), ressalta que “A expressão ‘concubinato’ é hoje utilizada para designar o relacionamento amoroso envolvendo pessoas casadas, que infringem o dever de fidelidade, também conhecido como adulterino.” Assim, conceitua o concubinato impuro o artigo 1.727 do Código Civil de 2002, que diz: “As relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar constituem concubinato.” Feito a análise histórica do reconhecimento da união estável e distinguindo-a de concubinato impuro, passa-se a família formada pela união estável. 2.2 A família estabelecida pela união estável Visto o percurso jurídico atravessado até então, passa-se a análise do que é a união estável, sua natureza e características. Deste modo, quanto à união estável aponta Dias (2009, p. 161, grifos da autora): Nasce a união estável da convivência, simples fato jurídico que evoluiu para a constituição de ato jurídico, em face dos direitos que brotam dessa relação. O que se exige é a efetiva convivência more uxório, com características de uma união familiar, por um prazo que denote estabilidade e objetivo de manter a vida em comum entre o homem e a mulher assim compromissados. Por mais que a união estável seja o espaço do não instituído, à medida que é regulamentada vai ganhando contornos de casamento. Tudo que é disposto sobre as uniões extramatrimoniais tem como referencia a união matrimonializada. Com isso, aos poucos, vai deixando de ser união livre para ser união amarrada às regras impostas pelo Estado. Esse é um paradoxo com o qual é preciso aprender a conviver, pois, ao mesmo tempo que não se quer a intervenção do estado nas relações mais intimas, busca-se a sua interferência para lhes dar legitimidade e proteger a parte economicamente mais fraca. Ao se criar um instituto da união estável e disciplinar as relações dai decorrentes, não se abandonou a estrutura formal da relação jurídica [...] 29 A união estável para Flávio Tartuce e José Fernando Simão (2007) veio ser a representação dessa liberdade, tendo em vista ser uma união livre. Essa união entre pessoas teve que ser regulada pelo direito, sendo reconhecido por este como fato jurídico, principalmente por ser esta forma preferida da sociedade brasileira, especialmente nos últimos tempos. Reconhecida a União Estável pela Constituição Federal de 1988, o legislador ordinário editou a primeira lei acerca da matéria, ou seja, a Lei 8971/94, buscou segundo Dias (2009, p. 160, grifos da autora): [...] A Lei 8.971/1994 assegurou direito a alimentos e a sucessão do companheiro. No entanto, conservava ainda certo ranço preconceituoso, ao reconhecer como união estável a relação entre pessoas solteiras, judicialmente separadas, divorciadas ou viúvas, deixando fora, injustificadamente, os separados de fato. Também a lei fixou condições outras, só reconhecendo como estáveis as relações existentes há mais de cinco anos ou das quais houvesse nascido prole, como se tais requisitos purificassem a relação. Assegurou ao companheiro sobrevivente o usufruto sobre parte dos bens deixados pelo de cujus. No caso de inexistirem descendentes ou ascendentes, o companheiro (tal como o cônjuge sobrevivente) foi incluído na ordem de vocação hereditária como herdeiro legítimo. Deste feita, a referida lei mostrou grande avanço nos direitos dos companheiros, principalmente no que refere à sucessão, colocando estes em paridade com os cônjuges. Posteriormente foi editada a Lei 9278/96, que buscou a regulamentação do disposto no art. 226, §3° da CF/88, deixando claro desde o início que esta lei não veio revogar a anterior. Para Tartuce e Simão (2007), a referida lei trouxe: a) o conceito de união estável; b) os direitos e deveres dos conviventes; c) não estipulou prazo para o reconhecimento da união; d) não exigiu os companheiros viessem a habitar no mesmo teto; e) não exigiu a comprovação do esforço comum na aquisição de bens, salvo estipulação contrária em contrato escrito; f) também o direito real de habitação pelo usufruto do imóvel da família enquanto não sobreviesse ter novo companheiro ou cônjuge; g) os alimentos devidos observariam a regra da necessidade e possibilidade; h) possibilitou a qualquer tempo à conversão em casamento; e, i) estipulou a competência para julgar as matérias relativas à união estável para vara de família. 30 São estas as primeiras normas que vieram a regular os direitos dos companheiros, trazendo grandes inovações para sua época, causando repulsa a alguns legisladores mais conservadores e satisfação para outros, bem como aos companheiros que saíram do limbo jurídico e passaram a ter seus direitos garantidos. O Código Civil em vigor no ordenamento brasileiro, conceituou a união estável em seu artigo 1.723, caput: “É reconhecida, como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.” Como já visto na história primordial, o termo utilizado para a união livre de pessoas era concubinato, mas o legislador optou por utilizar o termo união estável, tendo em vista o grau de repúdio que acompanhava a palavra. Assim explica Gagliano e Pamplona Filho (2011, p. 420, grifo dos autores): Essa palavra, conforte carga pejorativa, derivada da expressão latina concubere, significava “dividir o leito”, “dormir com”, ou, conforme jargão popular, caracterizaria a situação da mulher “teúda e manteúda”: “tida e mantida” por um homem (sua amante, amásia, amigada). Quanto à natureza jurídica da união estável, menciona Venosa (2003) que ela nasce de um fato do homem, sendo então fatos sociais e fatos jurídicos diferentes do casamento, o qual tem sua natureza de fato social e negocio jurídico. Tecido informações sobre essa forma de família, passa-se as características da união estável. Gagliano e Pamplona Filho (2011) tomando por base o artigo 1.723 do Código Civil de 2002 resumem os elementos caracterizadores em quatro: a) publicidade – que traz o reconhecimento pela sociedade de que realmente nesta união há um núcleo familiar, convivência pública das partes, diferenciando de um relacionamento às escondidas, ou “clandestino” como para a doutrina, o qual se caracteriza por ser um caso de interesse das partes, apenas sexual; b) continuidade – mesmo que o namoro se perdure por anos sem a vontade de constituir família não há caracterização, deve haver a continuidade com objetivo de formar a família, reconhecendo-se como tal; c) estabilidade – deve haver uma convivência 31 duradoura, fazendo-se uma nítida diferença do namoro no qual há términos e recomeços, o famoso “dar um tempo”; e d) objetivo de constituição de família – juntam-se como se casados fossem. É o liame nuclear para a distinção de um namoro para a união estável. Quanto à publicidade, Dias (2009) assinala que a característica imposta pelo legislador não pode ser lida apenas em seu significado, para ela é a notoriedade que abrange todo o significado que a lei passa. Nas palavras de Dias (2009, p. 164), “há uma diferença de grau uma vez que tudo que é publico é notório, mas nem tudo que é notório é público.” Além disso, Gagliano e Pamplona Filho (2011) trazem os elementos acidentais, que por mais que não sejam necessários para a caracterização, ajudam na identificação, são eles: tempo de convivência, prole e coabitação. É através desses que se acentuam o reconhecimento da união. Do mesmo modo, Guilherme Calmon Nogueira da Gama (2002) apresenta as características em consonância com os já citados além da informalidade da união, na qual não há regras para formalizá-la, como ocorre no casamento. Já os requisitos, o autor os divide em requisitos objetivos, os quais são a disparidade de sexos, inexistência de impedimentos matrimoniais, vida conjunta e a existência de certo tempo de convivência more uxório e animus de construir família. Por fim, o Código Civil de 2002 traz as hipóteses de impedimentos em seu artigo 1.521, as quais passa-se a expor: Art. 1.521. Não podem casar: I - os ascendentes com os descendentes, seja o parentesco natural ou civil; II - os afins em linha reta; III - o adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem o foi do adotante; IV - os irmãos, unilaterais ou bilaterais, e demais colaterais, até o terceiro grau inclusive; V - o adotado com o filho do adotante; VI - as pessoas casadas; VII - o cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou tentativa de homicídio contra o seu consorte Percebe-se neste artigo a clara intervenção do Estado, ao proibir algumas uniões como acontece no casamento, ocorre que quanto ao inciso VI do mencionado artigo deve-se fazer 32 uma objeção, é o caso em que um dos companheiros encontrasse ainda casado, porém separados de fato ou judicialmente, o que não proibirá o reconhecimento da união estável. Após caracterizar a união estável, bem como sua natureza e impedimentos para sua formação, passa-se a análise do regime de bens imposto pelo legislador do Código Civil de 2002. 2.3 O regime de bens da união estável A união estável gera efeitos de ordem pessoal e patrimonial para os companheiros, sendo estes regulados pelo Código Civil de 2002. Tais efeitos pessoais estão tratados no artigo 1.724 do referido código: “As relações pessoais entre os companheiros obedecerão aos deveres de lealdade, respeito e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos.” Observa-se diferença dos deveres impostos ao casamento, inexistindo na união estável o dever de convivência na mesma moradia, estando este disposto na súmula 382 do Supremo Tribunal Federal: “A vida em comum sobre o mesmo teto, more uxório, não é indispensável à caracterização do concubinato.” Já quanto aos efeitos patrimoniais, passa-se a analisar o regime de bens impostos pelo legislador aos companheiros, os quais nem sempre foram protegidos pela lei. De acordo com Gagliano e Pamplona Filho (2011, p. 442): [...] nos primórdios da evolução do instituto, não havia espaço para se falar em disciplina patrimonial de bens, pelo simples fato de que a união estável – então denominada de concubinato – vagava no limbo da invisibilidade jurídica, ofuscado pela primazia absoluta do casamento. A partir do reconhecimento da união estável pela sociedade, enfim começou-se a ter alguns direitos patrimoniais reconhecidos. Por tratar-se de fato jurídico, os tribunais passaram a lhe reconhecer, evitando-se assim, o enriquecimento ilícito de uma das partes como já mencionado anteriormente. 33 Antes disso, os companheiros buscavam no judiciário através de ação actio de in rem verso, indenização por serviços domésticos, conforme Gagliano e Pamplona Filho (2011) são necessários requisitos simultâneos, estes dividem-se em cinco: enriquecimento do réu, empobrecimento do autor, relação de causalidade, inexistência de causa jurídica para o enriquecimento e inexistência de ação específica. Desde o reconhecimento constitucional, não se pode falar mais em indenização por serviços prestados, salienta Dias (2009) que passou a lei a garantir a mútua assistência e alimentos ao companheiro, do mesmo modo que no casamento. O regime de bens adotado pelo legislador foi o de comunhão parcial. De acordo com Tartuce e Simão (2007, p. 260), “[...] salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se a união estável, no que couber o regime de comunhão parcial de bens [...]” Dias (2009) destaca a diferença entre o casamento e a união estável quanto à escolha do regime de bens, sendo que ao casamento é por meio do pacto antenupcial, e para os companheiros é na forma de contrato de convivência, sendo ambos facultativos, não celebrando estes o regime de bens será de comunhão parcial. Gonçalves (2011) contextualiza o regime de comunhão parcial, pelo regime onde os bens adquiridos onerosamente na constância do relacionamento, são dos dois companheiros, devendo haver a partilha destes em caso de dissolução. No mesmo entendimento Dias (2009, p. 170, grifos da autora): No regime da comunhão parcial, todos os bens amealhados durante o relacionamento são considerados fruto do trabalho comum, adquiridos por colaboração mútua, passando a pertencer a ambos em parte iguais. Instala-se um estado de condomínio entre o par. Tudo há que ser dividido. A presunção de propriedade do titular aparente no registro não é mais absoluta, e o companheiro é patrimonialmente equiparado ao cônjuge. Adquirido o bem por um, transforma-se em propriedade comum, devendo se partilhado por metade na hipótese de dissolução do vínculo. Portanto, quem vive em união estável e adquire algum bem, ainda que em nome próprio, não é o seu titular exclusivo. O fato de o patrimônio figurar como de propriedade de um não afasta a co-titularidade do outro. Trata-se de presunção juris et de jure, isto é, não admite prova em contrário, ressalvadas as exceções legais de incomunicabilidade (CC 1.659 e 1.661). 34 Outrossim, como visto os companheiros podem optar por outro regime de bens que não seja a comunhão parcial conforme disposto no artigo 1.725 do Código Civil de 2002. Basta para isso, que os companheiros celebrem em cartório contrato de convivência, assim segue o referido artigo: “Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens.” Os demais regimes regulados pela lei, além do já citado comunhão parcial de bens, segundo Gonçalves (2011) são: a) comunhão universal; é o regime em que todos os bens dos companheiros comunicam-se, podendo ser eles atuais ou futuros, mesmo que adquiridos em nome de um só companheiro, salvo os incomunicáveis expressos por lei, artigo 1.668 do CC, e pela vontade expressa dos companheiros em contrato escrito, os bens incomunicáveis que a lei dispõe são: Art. 1.668. São excluídos da comunhão: I - os bens doados ou herdados com a cláusula de incomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar; II - os bens gravados de fideicomisso e o direito do herdeiro fideicomissário, antes de realizada a condição suspensiva; III - as dívidas anteriores ao casamento, salvo se provierem de despesas com seus aprestos, ou reverterem em proveito comum; IV - as doações antenupciais feitas por um dos cônjuges ao outro com a cláusula de incomunicabilidade; b) participação final nos aquestos; é o regime em que cada companheiro possui seus bens, ou seja, estes não se comunicam na constância do casamento. Mas, com a extinção desse é repartido entre o casal a metade dos bens adquiridos, a título oneroso na constância da união, ou seja, em quanto estiverem em união estável vigora o regime total de bens, com a extinção da união passa-se ao regime de comunhão parcial de bens. c) separação convencional ou absoluta; não há a comunicabilidade de bens, cada companheiro pode livremente alienar ou agravar de ônus real, ou seja, a administração dos bens fica a cargo do companheiro que tem lhe a posse e a propriedade dos bens, também terá incomunicabilidade dos bens presentes e futuros, frutos e rendimentos. Neste sentindo, Gonçalves (2011, p. 491), “[...] Embora sejam marido e mulher, cada qual continua dono do que lhe pertencia e se tornará proprietário exclusivo dos bens que vier a adquirir, recebendo sozinho as rendas produzidas por uns e outros desses bens [...]” 35 Assim, percebe-se que apesar do legislador tratar na união estável apenas do regime de separação parcial de bens, os companheiros podem convencionar por meio de contrato escrito outro regime que lhe for mais favorável. Esclarecido os regimes, passa-se a análise de como se dá a sucessão do patrimônio dos companheiros, tema do próximo capítulo. 36 3 DA SUCESSÃO DO COMPANHEIRO A palavra sucessão da à ideia da troca de lugar de um sujeito ou objeto. Conceitua Gonçalves (2012, p. 19), “A palavra ‘sucessão’, em sentido amplo, significa o ato pelo qual uma pessoa assume o lugar da outra, substituindo-a na titularidade de determinados bens.” Completa este entendimento Venosa (2011, p. 1), “[...] Na sucessão, existe uma substituição do titular de um direito [...]” A sucessão do companheiro apresenta-se de maneira controversa no ordenamento, pois mesmo sendo reconhecida como forma de família igualada ao casamento tais direitos não são homogêneos, ocorrendo inúmeras diferenças desfavorecendo o companheiro no momento de suceder. Ressalta-se que seu reconhecimento pelo Direito Civil veio apenas ocorrer no ano de 2002, ou seja, sua presença no Direito das Sucessões é nova, mas a existência desta forma de família é tão antiga quanto à sociedade. Desta feita trataremos sobre a sucessão do companheiro e suas diferenças com a do cônjuge, para em fim, tecer considerações sobre a inconstitucionalidade deste tratamento pela lei infraconstitucional, mas antes cabe uma breve análise de como se dá a sucessão no Direito Brasileiro. 3.1 Do direito sucessório Ao longo do Direito Civil é possível verificar vários tipos de sucessões, como exemplo citado por Tartuce e Simão (2010), no desempenho de atividades, cargo ou função, na atuação empresarial ou política, transmissão de propriedade de bens pela troca de titular, como também quando os pais no direito de família passam a guarda dos filhos para um tutor. Assim sendo, a sucessão pode acontecer inter vivos, ou causa mortis. A primeira com origem em um ato entre vivos, como exemplo um contrato de compra e venda, onde uma pessoa sucede a outra nos direitos de propriedade sobre um bem. Já a segunda, objeto desde estudo, dá-se com a morte do sujeito, transferindo-se assim, direitos e obrigações a um ou mais pessoas vivas, seus herdeiros e legatários. Sobre a sucessão causa mortis, preceitua Christianne Garcez (2009, p. 02): 37 Sob o prisma legal, o Direito das Sucessões, como parte do Direito Civil, procura regular as relações patrimoniais e extrapatrimoniais decorrentes da morte, que acarreta a cessação da personalidade civil. Antes de iniciar o estudo de como se da esta sucessão, cabe tecer a origem deste instituto. Sobre a origem explica Garcez (2009, p. 01): Ao longo de sua existência, desde os primórdios, o ser humano busca amealhar um patrimônio, despendendo seu labor, sua criatividade, sua inteligência, para usufrui-lo e também para dar uma vida digna aos seus. Essa busca incessante faz parte da natureza humana. Mas é também parte da essência humana o nascer, o viver e o morrer. Com a morte de uma pessoa, nada mais logico do que assegurar aos que lhe sucederam o patrimônio de quem passou toda a vida trabalhando, construindo e economizando, para que aqueles também sigam idêntico trajeto. O Direito Romano é quem traz as primeiras ideias de sucessão, conforme Venosa (2011) na Roma antiga a figura do herdeiro era ligado à religião, o pater, como já visto no primeiro capítulo, era a figura do chefe de família, sendo este o sacerdote com o dever de cultivar seus antepassados, bem como passar aos seus filhos esses ensinamentos. Segundo Gonçalves (2012), quando o pater falecia transmitia seu “cargo” ao filho mais velho, apenas para a linha masculina, recebendo com isto a herança, ou seja, todos os bens da família. Ressalta-se que não cabia a irmã, pois esta ao contrair matrimônio passaria a integrar a família do esposo, levando consigo a herança que sairia da esfera da família de seu pai e agregando-se ao patrimônio da família de seu marido, cultivando, inclusive, os deuses da nova família, perdendo-se com isso não apenas os bens do seu pai, mas também o culto a sua memória. Assim, percebe-se como o direito de família, propriedade e sucessão estão ligados, conforme Venosa (2011), com o nascimento da família, se tem também a aquisição de propriedade, gerando futuramente o direito sucessório para dar continuidade a esta. Levando-se em consideração a natureza do homem em adquirir patrimônio para passar a seus descendentes, coube a Constituição Federal de 1988, assegurar esse direito, assim previsto no Art. 5º, inciso XXX, in verbis: “É garantido o direito de herança.” 38 Em conformidade com o exposto, disserta Venosa (2011, p. 4): O direito das sucessões disciplina, portanto, a projeção das situações jurídicas existentes, no momento da morte, da desaparição física da pessoa, a seus sucessores. A primeira ideia, com raízes históricas, é de que a herança (o patrimônio hereditário) transfere-se dentro da família. Dai, então, a excelência da ordem de vocação hereditária inserida na lei: a chamada “sucessão legitima”. O legislador determina uma ordem de sucessores, a ser estabelecida, no caso de o falecido não ter deixado testamento, ou quando, mesmo perante a existência de ato de ultima vontade, este não puder ser cumprido. Nesse sentido, o homem busca durante toda sua existência acumular patrimônio para si e para seus entes queridos, desta forma, com a chegada de sua morte deseja que tais bens fiquem com familiares ou até mesmo terceiros. Buscando uma proteção a esse desejo, coube ao legislador regular à sucessão desses bens, ou seja, a passagem que tem como marco a morte, momento em que a pessoa já não está entre nós para expressar sua vontade. Assim, sucessão causa mortis, tem duas espécies prevista no Código Civil, podendo ser ela legítima (art. 1.829 do CC), que discrimina uma ordem a ser seguida para suceder, e também a testamentária, com efeitos deixados pela última vontade do falecido (art. 1.786 do CC). Quanto à sucessão testamentária e legítima, assinala Tartuce e Simão (2010, p. 132): Partindo-se dessa fundamental diferença, enquanto na sucessão testamentária serão sucessores a titulo singular (legatários) ou universal (herdeiros) as pessoas indicadas pelo próprio falecido, em se tratando de sucessão legitima cabe à lei indicar a ordem de vocação hereditária, ou seja, quem são as pessoas chamadas a suceder. Deste modo, a legítima contém o rol preferencial, denominado vocação hereditária, conforme dispõem Gonçalves (2012, p. 158), “[...] relação preferencial pela qual a lei chama determinadas pessoas a sucessão hereditária.” Ainda trata Gonçalves (2012) que no Código Civil de 1916, está sequência, obedecia a uma ordem preferencial, não havendo entre elas concorrência. No mesmo sentido seguiu o novo Código de 2002. 39 Preceitua o novo dispositivo do Código Civil de 2002, art. 1.829: Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte: I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares; II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge; III - ao cônjuge sobrevivente; IV - aos colaterais. Já o testamento é utilizado para alterar a vontade do legislador, podendo se ter assim, herdeiros sem qualquer ligação sanguínea ou familiar. Ocorre que o legislador, tratou de assegurar aos familiares seus direitos, sendo estes chamados de herdeiros necessários, não podendo ser afastados totalmente da sucessão, estando esses elencados no art. 1.845 do Código Civil de 2002 que dispõe: “São herdeiros necessários os descendentes, os ascendentes e o cônjuge.” Outra mudança significante é percebível neste artigo, uma vez que no Código Civil de 1916, não faziam parte deste rol o cônjuge, o que gerava um grande descontentamento social. Neste sentido Venosa (2012, p. 117, grifo do autor): [...] Havendo essas classes de herdeiros, fica-lhes assegurada, ao menos, metade dos bens da herança. É o que se denomina legitima dos herdeiros necessários. A outra metade fica livre para o testador dispor como lhe aprouver. Visto o conceito, a origem e as formas de suceder, como próximo ponto de pauta aborda-se a sucessão do companheiro e a disparidade de tratamento em relação ao cônjuge. 3.2 O direito do companheiro na sucessão e disparidade de direitos resguardados ao cônjuge Como já estudado nos capítulos anteriores a união estável passou por sérios preconceitos e discriminação, tanto na sociedade quanto na legislação. Mesmo sendo esta uma 40 das mais antigas formas de família, seu reconhecimento como tal, veio apenas na Constituição Federal de 1988. Após este marco importante, seu reconhecimento equiparado ao casamento, coube ao legislador editar normas para garantir seus direitos, assim foram editadas duas Leis, a 8.971/94 e posteriormente a esta a 9.278/96, tratando a situação sucessória do companheiro semelhante àquela vivida pelo cônjuge no Código Civil de 1916. Deste modo, o art. 2º da Lei 8.971/94 dispõe: Art. 2. As pessoas referidas no artigo anterior participarão da sucessão do(a) companheiro(a) nas seguintes condições: I - o(a) companheiro(a) sobrevivente terá direito enquanto não constituir nova união, ao usufruto de quarta parte dos bens do de cujos, se houver filhos ou comuns; II - o(a) companheiro(a) sobrevivente terá direito, enquanto não constituir nova união, ao usufruto da metade dos bens do de cujos, se não houver filhos, embora sobrevivam ascendentes; III - na falta de descendentes e de ascendentes, o(a) companheiro(a) sobrevivente terá direito à totalidade da herança. Somando a este, veio o art. 7º, § único da Lei 9.278/96: Art. 7. Dissolvida a união estável por rescisão, a assistência material prevista nesta Lei será prestada por um dos conviventes ao que dela necessitar, a título de alimentos. Parágrafo único. Dissolvida a união estável por morte de um dos conviventes, o sobrevivente terá direito real de habitação, enquanto viver ou não constituir nova união ou casamento, relativamente ao imóvel destinado à residência da família. Desta feita, o companheiro segundo Tartuce e Simão (2010, p. 219, grifos dos autores), possuíam os seguintes direitos: Usufruto dos bens do falecido nas hipóteses de concorrência com descendentes ou ascendentes do de cujus. Em concorrência com os descendentes do falecido, o companheiro tinha direito de usufruto sobre ¼ dos bens do morto. Se o morto não deixasse descendentes, mas apenas ascendentes, o usufruto do companheiro se dava com relação a metade dos bens. Direito real de habitação enquanto vivesse ou não constituísse uma nova união ou casamento, haveria o direito real relativamente ao imóvel destinado à residência da família. 41 Cabe ressaltar que o cônjuge no Código Civil de 1916 não concorria com os descendentes e ascendentes, apenas sendo chamado a suceder quando estes não fossem, bem como também não fazia parte dos herdeiros necessários, sendo assim não se teria direito a legítima. Direitos estes, observados e garantidos pelo legislador infraconstitucional, quando do novo Código Civil de 2002. Assim, equiparando se os direitos do companheiro e do cônjuge, Gonçalves (2012, p. 189, grifo do autor): A promulgação da Lei n. 9.278/96 e a manutenção de dispositivos da Lei n. 8.971/94 que não conflitassem com aquela acabaram por conferir mais direitos à companheira do que à esposa. Esta poderia ter o usufruto vidual ou o direito real de habitação, dependendo do regime de bens adotado no casamento, enquanto aquela poderia desfrutar de ambos os benefícios. Mas, esta situação perdurou por pouco tempo, em 2002 nasce o novo Código Civil que ao invés de fazer adaptações, mantendo o que já dispunha no Código Civil de 1916, o mesmo inverteu as posições, garantindo mais direitos ao cônjuge do que ao companheiro, o que era para igualar, desigualou mais ainda, ou seja, a situação do companheiro é extremamente inferior. Tartuce e Simão (2010) trazem a baila não apenas os diferentes tratamentos, mas chama atenção para o local escolhido pelo legislador para colocar o único dispositivo que regula a sucessão do companheiro, sendo este, na parte geral, em total desacordo, uma vez que deveria estar transcrito no Titulo II (Sucessão legitima). O referido autor expressa este comportamento do legislador como má vontade. Neste sentido Zeno Veloso (2006, p. 1484) argumenta: Mal não, o dispositivo está pessimamente localizado! Vale dizer, alias, que o atual art. 1.790 do CC/2002, que trata do tema, sequer constava do Projeto 634/1975, tendo sido introduzido pelo então Senador Nelson Carneiro, no ano de 1997. Salienta Rolf Madaleno (2004) que novamente a família constituída pela união estável resta discriminada no ordenamento jurídico, mesmo após já ter conquistados relevantes 42 direitos na Carta Magna, vem o legislador civilista, com traços de forte discriminação, e pouco modifica a legislação, restando à jurisprudência a tarefa de resguardar os direitos sucessórios desta forma de família. Já Paulo Daniel Sena Almeida Peixoto (2010, p. 32, grifo do autor) sobre o art. 1.790 aduz: O artigo, em debate, é alvo de inúmeras críticas, tanto de ordem formal quanto material. No primeiro caso, porque se encontra localizado no Capítulo das “Disposições Gerais”, quando deveria ter sido inserido no capítulo que trata da ordem de vocação hereditária. No aspecto material, a crítica que se impõe é em relação à previsão do caput, que limita a sucessão dos companheiros apenas aos bens adquiridos, onerosamente, durante a união estável, o que os coloca numa posição de flagrante inferioridade em relação às pessoas casadas. Feitas estas primeiras considerações sobre a sucessão do companheiro, passa-se a análise do dispositivo que a regula a partir do novo Código Civil de 2002, o art. 1.790: Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes: I - se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho; II - se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles; III - se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança; IV - não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança. Diante desde artigo, é possível entender que caso os companheiros no período em que estiveram juntos não tenham adquirido patrimônio oneroso (moveis e imóveis) na constância da união, falecendo um destes, nada cabe de seu patrimônio anterior ao relacionamento, ou seja, seu patrimônio particular. Neste sentido explica Tartuce e Simão (2010, p. 226, grifo dos autores): Curiosamente, fica a conclusão de que com relação à sucessão do companheiro a regra será a seguinte: quanto aos bens em que há meação, o companheiro também será herdeiro. Sobre os bens em que não há meação, o companheiro também não terá direitos sucessórios. Como se vê, as regras 43 diferem completamente das previstas para a sucessão do cônjuge, razão pela qual [...] há julgados entendendo pela inconstitucionalidade do dispositivo relativo à união estável (cf. item 2.5.2.9). Cabe aqui relembrar o que foi tratado no item 2.3, no qual, versou-se sobre o regime de bens na união estável, e apontou-se a diferença da escolha do cônjuge e do companheiro. Sendo que para aquele é feito por meio do pacto antenupcial, e para esse é na forma de contrato de convivência, sendo ambos facultativos, não celebrando estes, o regime de bens será de comunhão parcial. Porém, no momento da separação os direitos reservados na constância do regime de comunhão parcial, tanto do companheiro como do cônjuge são os mesmos, contudo na hora de suceder isso não é observado. Salienta-se, ainda, que mesmo celebrando contrato escrito em cartório onde os companheiros divergem do regime de separação de bens adotado pelo código, esta alteração nada influi no momento da sucessão. Nas palavras de Tartuce e Simão (2010, p. 227), “[...] o fato de o contrato entre os companheiros ter alterado a relação patrimonial existente entre eles não altera a regra sucessória prevista no art. 1.790 do Código Civil.” Assim, se os companheiros após sua união adquirem uma casa, e posteriormente um deles vem a falecer deixando dois filhos comuns, conforme o art. 1.790 caput e inciso I do Código Civil de 2002, cabe ao companheiro a meação (que não é herança) do bem adquirido após a união e concorrendo com os filhos aos 50% restantes do imóvel deixado de herança pelo falecido. Já quanto aos bens particulares anteriores à união, estes herdarão apenas os filhos. Em igual situação o cônjuge, conforme o art. 1.829, inciso I, do Código Civil, além da meação e herança dos bens adquiridos após o casamento, com regime de bens de separação parcial, o cônjuge concorrerá também com os herdeiros aos bens particulares, o que não ocorre na sucessão do companheiro. Aprofunda-se esta concorrência entre o companheiro e os descendentes, utilizando-se do disposto no art. 1.790, inciso I e II do Código Civil de 2002: 44 Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes: I - se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho; II - se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles; [...] Da análise preliminar destes artigos é possível definir que havendo filhos comuns entre o falecido e o companheiro todos herdarão a mesma quota. Por outro lado, se haver filhos apenas do falecido, herdará o companheiro a metade do que couber aqueles. Segundo Gonçalves (2012), é percebível no inciso I um erro do legislador, visto que o mesmo refere-se a filhos ao invés de descendentes, o que já foi observado no inciso II, onde a palavra foi corretamente empregada. Deste modo, deve ser utilizada a palavra “descendente” de forma extensiva ao inciso I. Concerne de tal entendimento Peixoto (2010, p. 33): Atendemos para a má técnica legislativa do inciso I. Esse dispositivo se refere a “filho”, enquanto o inciso II menciona “descendentes”. Para se evitar injustiças no caso de não haver filhos comuns, mas netos em comum, por exemplo, o inciso I deverá ser interpretado, ampliativamente, para abranger qualquer descendente. A questão contravertida na sucessão do companheiro e que também é alvo de grande discussão pela doutrina na sucessão do cônjuge, é a filiação híbrida, ou seja, quando há concorrência com filhos comuns e exclusivos. Ocorre que se tratando de concorrência do cônjuge e companheiro, aquele teve resguardado para si a quarta parte da herança. Mas no tocante aos filhos híbridos disserta Gonçalves (2012, p. 196, grifo do autor): O inciso em apreço repete a inoportuna distinção entre descendentes exclusivos, só do autor da herança, e descendentes comuns, havidos da união entre o autor da herança e o companheiro, tal qual previsto para o cônjuge no art. 1.832 do Código Civil. 45 Sobre o assunto é percebível na doutrina três diferentes posicionamentos segundo Peixoto (2010), o primeiro em que tantos filhos comuns como exclusivos deveriam ser considerados como aqueles, atribuindo-se ao companheiro quota idêntica a dos descendentes. O segundo que todos fossem considerados filhos exclusivos, cabendo ao companheiro metade do que couber aos descendentes. O terceiro posicionamento é de que caberia uma quota e meia ao companheiro, deixando este em situação mais favorável diante aos descendentes. Para Gonçalves (2012, p. 197, grifos do autor): Por conseguinte, o inciso II do art. 1.790 do Código Civil só garante aos descendentes quinhão correspondente ao dobro do que for atribuído à companheira quando forem todos descendentes exclusivos do de cujus. Havendo descendentes comuns e unilaterais, aplica-se a regra do inciso I, assegurando à companheira quinhão igual ao daqueles. Feitas as considerações pertinentes à sucessão dos descendentes concorrendo com o companheiro, passa-se a análise da sucessão deste com outros parentes do de cujus, tratado no inciso III do art. 1.790 do Código Civil de 2002, a seguir exposto: Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes: [...] III - se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança; [...] Referido dispositivo trata dos direitos sucessórios dos pais do falecido (ascendentes) e dos parentes até quarto grau (colaterais). Restando apenas um dos ascendentes vivos, a quota será dividida em dois terços para este e continuará o companheiro com seu um terço dos bens onerosos. Sendo idêntica a situação do cônjuge concorrente com os ascendentes. Seguindo a sequência do art. 1.790 do Código Civil em seu inciso IV, não havendo parentes sucessíveis o companheiro herdará a totalidade da herança. Ocorre, que deste inciso gera grande questionamento pela doutrina, como colocado por Peixoto (2010), que para alguns herdaria o companheiro somente em conformidade com o caput do art. 1.790, a totalidade dos bens onerosos, sobrevindo bens particulares, estes ficam 46 para o poder público. Já para outra parte da doutrina, intendem que a herança deveria ser interpretada como a totalidade dos bens, ficando assim esta integral para o companheiro. No entendimento de Tartuce e Simão (2010), este inciso teria que ser interpretado desconsiderando o preceituado no caput do artigo, uma vez que o art. 1.844 do Código Civil é claro ao dizer que não existindo cônjuge, companheiro nem outros parentes sucessíveis, é que o poder público receberá estes bens, considerados como herança jacente. É claro em seu posicionamento Gonçalves (2012, p. 203, grifo do auto): O Poder Público não é herdeiro, não lhe sendo, por isso, reconhecido o direito de saisine. Apenas recolhe a herança na falta de herdeiros. Não adquire o domínio e a posse da herança no momento da abertura da sucessão, pois, na falta de herdeiros, a herança torna-se jacente, transformase posteriormente em vacante, e só então os bens passam ao domínio público (CC, art. 1.822; arts. 1.142 e s.). Desta feita, segundo o referido autor, para o cônjuge não importa o regime de bens, pois sempre herdará a totalidade da herança. Ainda, deve-se adentrar a um tema, o direito sucessório simultâneo do cônjuge e do companheiro. Desta forma cabe o exame do art. 1.830 do Código Civil de 2002: Art. 1.830. Somente é reconhecido direito sucessório ao cônjuge sobrevivente se, ao tempo da morte do outro, não estavam separados judicialmente, nem separados de fato há mais de dois anos, salvo prova, neste caso, de que essa convivência se tornara impossível sem culpa do sobrevivente. Segundo Gonçalves (2012) cabe ao companheiro os bens adquiridos durante a união estável e para o cônjuge os bens que pertenciam ao de cujus, anteriores ao marco inicial da união estável. Por último, mas não menos importante, cabe tecer considerações sobre a habitação do companheiro sobrevivo. 47 Conforme visto no início do presente capítulo, a Lei 9.278/96 em seu art. 7º tratava do direito de habitação, ocorre, que o novo Código Civil de 2002 manteve-se silente quanto a este direito do companheiro. Já o cônjuge teve seu direito discriminado no art. 1.831 do Código Civil, que refere que o imóvel em uso exclusivo da família ficara para o mesmo, desinteressando o regime de bens e inexistindo outro de mesma natureza a ser inventariado. Diante desta lacuna deixada pelo legislador, Peixoto (2010, p. 46, grifo do autor) discorre seu entendimento sobre o assunto: Estamos convictos do direito real de habitação dos companheiros com fulcro no direito de moradia previsto no artigo 6º, caput, da Constituição da República, no principio mestre da dignidade humana, bem como, no princípio da igualdade entre cônjuges e companheiros, devendo, portando, ser a eles estendido o direito previsto no art. 1.831 do Código Civil. Demonstrado todos os direitos do companheiro, analisando suas diferenças com o tratamento dado para o cônjuge, cabe em fim à análise da inconstitucionalidade do art. 1.790 do Código Civil de 2002, diante da pesquisa feita até então. 3.3 Da inconstitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil: uma análise jurisprudencial Chegado ao ponto central do estudo, qual seja a inconstitucionalidade do art. 1.790, frente à existência ou não de tratamento desigual no momento da sucessão do companheiro e do cônjuge pelo legislador infraconstitucional. Como visto do tópico anterior, ocorrem grandes contradições e equívocos por parte do legislador, os quais resumidamente são: a) restringe-se ao companheiro herdar apenas os bens adquiridos onerosamente na constância da união; b) faz distinção entre filhos comuns e exclusivos do de cujus, distinguindo também sua concorrência entre eles; c) a concorrência com os demais herdeiros se dará na quota de um terço; d) inexistindo ascendente, descendentes e colaterais, ficará o companheiro sobrevivente com a totalidade da herança que concernem os bens adquiridos na constância da união estável, sendo deste modo uma interpretação literal do dispositivo, subsistindo patrimônio particular restaria este para o Estado. 48 Salutar para o presente estudo é transcrever o artigo, 226, §3° da Constituição Federal: Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. [...] § 3º - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. [...] Sendo a família célula básica da sociedade, primeiramente, existia apenas uniões livres, deste modo, o casamento veio após a união estável, sendo aquele criado para unir um homem e uma mulher perante Deus de cunho exclusivamente religioso, vindo também a regulamentar o regime patrimonial desta união. Diante disso, tendo a união estável uma bagagem histórica mais antiga, não cabe à lei nem ao judiciário renegar direitos a esta espécie de família, com o argumento de ser ela inferior quando lado a lado com o casamento, até porque a realidade social em que estamos evolui em maior velocidade que a lei, existindo hoje uma quantidade maior de uniões livres. Desta maneira alerta Dias (2011, p. 11), “É necessário adequar a justiça à vida e não engessar a vida dentro de normas jurídicas muitas vezes editadas olhando o passado na tentativa de reprimir o livre exercício da liberdade.” Quanto ao entendimento ultrapassado onde a união estável e o casamento não podem ser tratados com isonomia, reflete Tartuce e Simão (2010, p. 255): O fato de a lei dever facilitar a união estável em casamento significa, para alguns, que o casamento é instituto hierarquicamente superior a união estável e, portanto, qualquer vantagem que a lei ordinária atribua á união estável, que superem as vantagens do casamento, seria considerada inconstitucional. Para outros, a determinação constitucional apenas impede que a lei infraconstitucional dificulte a conversão da união estável em casamento. Seria uma norma proibitiva da imposição de qualquer dificuldade, mas não geradora de hierarquia entre as duas formas de constituição de família. Não se pode intender que a família é apenas a que se origina com a celebração contratual, entendimento ultrapassado, uma vez que como visto no primeiro capítulo do presente estudo a família hoje é formada pelo afeto, e conceituando-se assim família, os companheiros deveriam ter total proteção do Estado, não importando como se deu sua constituição. 49 Diante disso, coloca-se que a constituição é a norma vértice do sistema jurídico brasileiro, e como tal, deve se ter como premissa para elaborar qualquer outra lei. Sendo assim, a validade das demais ficou dependente de sua compatibilidade com as normas constitucionais, as quais não sendo observadas, devem ser declaradas inconstitucionais. Esta afirmação advém do princípio da supremacia da constituição, que segundo Pedro Lenza (2011), surtirá efeitos para todos os ordenamentos. Constitucionalidade e inconstitucionalidade têm conceitos que se relacionam, segundo o doutrinador Jorge Miranda (2001, p. 273), citado por Gilmar Ferreira Mendes e Paulo Gustavo Gunet Branco (2012, p. 1093) é: A relação que se estabelece entre uma coisa – a Constituição – e outra – um comportamento – que lhe está ou não conforme, que com ela é ou não compatível, que cabe ou não no seu sentido. Essa inconformidade da norma deve ser declarada pelo órgão competente, no Brasil o controle de constitucionalidade segundo Peixoto (2010) se dá de forma repressiva, sendo o próprio poder judiciário quem fará a fiscalização da lei ou do ato normativo, devendo retirar aqueles que não estiverem de acordo. Este controle exercido pode se dar de duas formas reservadas, concentrado ou por via de ação, e ainda, pela forma difusa, aberto ou por via de exceção ou defesa, assim, este controle se dá de forma mista. Sendo este último, o meio que se deve utilizar para buscar o reconhecimento da inconstitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil, tendo em vista que qualquer juiz ou tribunal pode analisar o juízo de constitucionalidade da norma concreta de oficio ou quando proposta pelo legitimado. Segundo Peixoto (2010), são legitimados para exercer o controle difuso as partes do processo, terceiros eventuais admitidos como intervenientes e também o representante do Ministério Público, que conforme o referido autor atue como custos legis. Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino (2007, p. 728), dissertam sobre este controle de inconstitucionalidade feito de oficio pelos juízes e tribunais: 50 O juiz ou tribunal, de oficio, independentemente de provocação, poderá declarar a inconstitucionalidade da lei, afastando a sua aplicação ao caso concreto, já que esses tem por poder-dever a defesa da Constituição. Note-se que a declaração da inconstitucionalidade no caso concreto não está dependente do requerimento das partes ou do representante do Ministério Publico. Ainda que esses não suscitem o incidente de inconstitucionalidade, o magistrado poderá, de oficio, afastar a aplicação da lei ao processo, por entendê-la inconstitucional. Assim, diante de tantas controversas coube aos tribunais posicionar-se sobre o tema, buscando-se garantir os direitos do companheiro, tendo em vista que a lei atribuída com essa finalidade não vem resguardando. O Tribunal do Rio Grande do Sul que sempre se mostrou inovador adquiriu uma postura mais conservadora diante do tema, considerando que o legislador não conferiu tratamentos iguais entre cônjuge e companheiro: SUCESSÕES. INVENTÁRIO. SUCESSÃO DO COMPANHEIRO. DIFERENÇA DE TRATO LEGISLATIVO ENTRE UNIÃO ESTÁVEL E CASAMENTO. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO A PRECEITOS OU PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS. 1. A capacidade sucessória é estabelecida pela lei vigente no momento da abertura da sucessão. Inteligência do art. 1.787 do Código Civil. 2. O art. 226 da Constituição Federal não equiparou a união estável ao casamento civil, apenas admitiu-lhe a dignidade de constituir entidade familiar, para o fim de merecer especial proteção do Estado, mas com a expressa recomendação de que seja facilitada a sua conversão em casamento. 3. Tratando-se de institutos jurídicos distintos, é juridicamente cabível que a união estável tenha disciplina sucessória distinta do casamento e, aliás, é isso o que ocorre, também, com o próprio casamento, considerando-se que as diversas possibilidades de escolha do regime matrimonial de bens também ensejam seqüelas jurídicas distintas. 4. O legislador civil tratou de acatar a liberdade de escolha das pessoas, cada qual podendo escolher o rumo da sua própria vida, isto é, podendo ficar solteira ou constituir família, e, pretendendo constituir uma família, a pessoa pode manter uma união estável ou casar, e, casando ou mantendo união estável, a pessoa pode escolher o regime de bens que melhor lhe aprouver. Mas cada escolha evidentemente gera suas próprias seqüelas jurídicas, produzindo efeitos, também, no plano sucessório, pois pode se submeter à sucessão legal ou optar por fazer uma deixa testamentária. 5. É possível questionar que a regulamentação do direito sucessório no Código Civil vigente talvez não seja a melhor, ou que a regulamentação posta na Lei nº 9.278/96 talvez fosse a mais adequada, mas são discussões relevantes apenas no plano acadêmico ou doutrinário, pois existe uma lei regulando a matéria, e essa lei não padece de qualquer vício, tendo sido submetida a regular processo legislativo, sendo devidamente aprovada, e, como existe lei regulando a questão, ela deve ser cumprida, já que se vive num Estado democrático de direito. Recurso provido, por maioria, vencido o Relator. (RIO GRANDE DO SUL, 2008). 51 Porém, é possível encontrar julgados mais antigos onde era reconhecida a inconstitucionalidade, é o caso da jurisprudência a seguir exposta: AGRAVO DE INSTRUMENTO. INVENTÁRIO. SUCESSÃO DA COMPANHEIRA. ABERTURA DA SUCESSÃO OCORRIDA SOB A ÉGIDE DO NOVO CÓDIGO CIVIL. APLICABILIDADE DA NOVA LEI, NOS TERMOS DO ARTIGO 1.787. HABILITAÇÃO EM AUTOS DE IRMÃO DA FALECIDA. CASO CONCRETO, EM QUE MERECE AFASTADA A SUCESSÃO DO IRMÃO, NÃO INCIDINDO A REGRA PREVISTA NO 1.790, III, DO CCB, QUE CONFERE TRATAMENTO DIFERENCIADO ENTRE COMPANHEIRO E CÔNJUGE. OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA EQUIDADE. Não se pode negar que tanto à família de direito, ou formalmente constituída, como também àquela que se constituiu por simples fato, há que se outorgar a mesma proteção legal, em observância ao princípio da eqüidade, assegurando-se igualdade de tratamento entre cônjuge e companheiro, inclusive no plano sucessório. Ademais, a própria Constituição Federal não confere tratamento iníquo aos cônjuges e companheiros, tampouco o faziam as Leis que regulamentavam a união estável antes do advento do novo Código Civil, não podendo, assim, prevalecer a interpretação literal do artigo em questão, sob pena de se incorrer na odiosa diferenciação, deixando ao desamparo a família constituída pela união estável, e conferindo proteção legal privilegiada à família constituída de acordo com as formalidades da lei. Preliminar não conhecida e recurso provido. (RIO GRANDE DO SUL, 2007). Mesmo entendimento mais conservador é encontrado no Tribunal de Justiça do Distrito Federal, in verbis: CONSTITUCIONAL E CIVIL. ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGO 1.790, INCISO III, DO CÓDIGO CIVIL. DIREITO SUCESSÓRIO DO COMPANHEIRO DIFERENCIADO EM RELAÇÃO AO CÔNJUGE SUPÉRSTITE. UNIÃO ESTÁVEL NÃO EQUIPARADA AO CASAMENTO PELA CONSTITUIÇÃO. ARTIGO 226, §3º, DA CF. ARGUIÇÃO REJEITADA. EMBORA O LEGISLADOR CONSTITUINTE TENHA RECONHECIDO A UNIÃO ESTÁVEL ENTRE O HOMEM E A MULHER COMO ENTIDADE FAMILIAR, NÃO A EQUIPAROU AO CASAMENTO DE MODO A ATRAIR A UNIFICAÇÃO DO REGIME LEGAL ACERCA DO DIREITO SUCESSÓRIO, HAJA VISTA A OBSERVAÇÃO FINAL NO TEXTO CONSTITUCIONAL DA NECESSIDADE DE LEI PARA A FACILITAÇÃO DE SUA CONVERSÃO EM CASAMENTO - ARTIGO 226, §3º, DA CF.NÃO INCIDE EM INCONSTITUCIONALIDADE O TRATAMENTO DIFERENCIADO CONFERIDO PELO ARTIGO 1790, INCISO III, DO CÓDIGO CIVIL, ACERCA DO DIREITO SUCESSÓRIO DO COMPANHEIRO SOBREVIVENTE EM RELAÇÃO AO CÔNJUGE SUPÉRSTITE QUANTO À CONCORRÊNCIA DAQUELE COM OUTROS PARENTES SUCESSÍVEIS DO DE CUJUS. ARGUIÇÃO REJEITADA. UNÂNIME. (DISTRITO FEDERAL, 2010). 52 Assim, também, o Superior Tribunal de Justiça: RECURSO ESPECIAL - UNIÃO ESTÁVEL - APLICAÇÃO DO REGIME DA SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA DE BENS, EM RAZÃO DA SENILIDADE DE UM DOS CONSORTES, CONSTANTE DO ARTIGO 1641, II, DO CÓDIGO CIVIL, À UNIÃO ESTÁVEL NECESSIDADE - COMPANHEIRO SUPÉRSTITE - PARTICIPAÇÃO NA SUCESSÃO DO COMPANHEIRO FALECIDO QUANTO AOS BENS ADQUIRIDOS NA CONSTÂNCIA DA UNIÃO ESTÁVEL OBSERVÂNCIA - INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 1790, CC - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I - O artigo 1725 do Código Civil preconiza que, na união estável, o regime de bens vigente é o da comunhão parcial. Contudo, referido preceito legal não encerra um comando absoluto, já que, além de conter inequívoca cláusula restritiva ("no que couber"), permite aos companheiros contratarem, por escrito, de forma diversa; II - A não extensão do regime da separação obrigatória de bens, em razão da senilidade do de cujus, constante do artigo 1641, II, do Código Civil, à união estável equivaleria, em tais situações, ao desestímulo ao casamento, o que, certamente, discrepa da finalidade arraigada no ordenamento jurídico nacional, o qual se propõe a facilitar a convolação da união estável em casamento, e não o contrário; IV - Ressalte-se, contudo, que a aplicação de tal regime deve inequivocamente sofrer a contemporização do Enunciado n. 377/STF, pois os bens adquiridos na constância, no caso, da união estável, devem comunicar-se, independente da prova de que tais bens são provenientes do esforço comum, já que a solidariedade, inerente à vida comum do casal, por si só, é fator contributivo para a aquisição dos frutos na constância de tal convivência; V - Excluída a meação, nos termos postos na presente decisão, a companheira supérstite participará da sucessão do companheiro falecido em relação aos bens adquiridos onerosamente na constância da convivência (período que não se inicia com a declaração judicial que reconhece a união estável, mas, sim, com a efetiva convivência), em concorrência com os outros parentes sucessíveis (inciso III, do artigo 1790, CC). VI - Recurso parcialmente provido. (BRASIL, 2010). É importante esclarecer que mesmo os tribunais decidindo pela constitucionalidade do artigo 1.790, do Código Civil, eles apontam a injustiça cometida quanto à sucessão do companheiro. No entanto, os Tribunais do Estado do Paraná, Rio de Janeiro e Sergipe estão reconhecendo a inconstitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil, assim é a jurisprudência do Estado do Paraná: INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE. SUCESSÃO DA COMPANHEIRA. ARTIGO 1.790, III, DO CÓDIGO CIVIL. INQUINADA AFRONTA AO ARTIGO 226, § 3º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, QUE CONFERE TRATAMENTO PARITÁRIO AO INSTITUTO DA 53 UNIÃO ESTÁVEL EM RELAÇÃO AO CASAMENTO. NECESSIDADE DE MANIFESTAÇÃO DO COLENDO ÓRGÃO ESPECIAL. IMPOSSIBILIDADE DE LEI INFRACONSTITUCIONAL DISCIPLINAR DE FORMA DIVERSA O DIREITO SUCESSÓRIO DO CÔNJUGE E DO COMPANHEIRO. OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA IGUALDADE. ELEVAÇÃO DA UNIÃO ESTÁVEL AO" STATUS "DE ENTIDADE FAMILIAR. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA. CONHECIMENTO DO INCIDENTE, DECLARADO PROCEDENTE. 1. Inconstitucionalidade do artigo 1.790, III, do Código Civil por afronta ao princípio da igualdade, já que o artigo 226, § 3º, da Constituição Federal conferiu tratamento similar aos institutos da união estável e do casamento, ambos abrangidos pelo conceito de entidade familiar e ensejadores de proteção estatal. 2. A distinção relativa aos direitos sucessórios dos companheiros viola frontalmente o princípio da igualdade material, uma vez que confere tratamento desigual àqueles que, casados ou não, mantiveram relação de afeto e companheirismo durante certo período de tempo, tendo contribuído diretamente para o desenvolvimento econômico da entidade familiar. (PARANÁ, 2009). Ainda, tem tribunais que andam nas duas mãos, ou seja, uma hora decidem como constitucional e outra como inconstitucional. É o caso do Tribunal do Estado de São Paulo que em pesquisa feita às jurisprudências mais recentes deste Tribunal, foi possível analisar julgados de ambos posicionamentos, são eles: Agravo de instrumento Arrolamento União estável Sucessão do companheiro Impugnação apresentada por colaterais da de cujus, que, entre outras coisas, requereram o reconhecimento de seus direitos sucessórios nos termos do art. 1.790 do CC Decisão que rejeitou a impugnação sob o fundamento da inconstitucionalidade do dispositivo Alegação de que o dispositivo é constitucional Cabimento Constitucionalidade da norma declarada pelo Órgão Especial desta Corte Vinculação do órgão fracionário ao entendimento exarado Inteligência do art. 97 da CF e da Súmula Vinculante n.º 10 do STF Juízo que deverá analisar novamente a impugnação à luz do art. 1.790 do CC, já que a rejeição se deu com base exclusiva na inconstitucionalidade do dispositivo em questão, não podendo as demais questões serem apreciadas por esta Corte sob pena de indevida supressão de Instância Decisão mantida AGRAVO PROVIDO EM PARTE. (SÃO PAULO, 2013). Inventários Sucessão da companheira Inconstitucionalidade do art. 1790 do Código Civil Regime sucessório do cônjuge sobrevivente - Não havendo descendentes e ascendentes, a companheira recolhe toda a herança Recurso provido. (SÃO PAULO, 2013). Alguns tribunais como o do Rio Grande do Sul, se mostram a favor do tratamento diferenciado, enquanto outros tribunais defendem a inconstitucionalidade. 54 Após toda a análise das diferenças de tratamento entre o cônjuge e o companheiro, cabe o exame dos princípios violados pelo presente artigo, sendo estes fundamentos utilizados pelos tribunais para o reconhecimento da inconstitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil, são eles o principio da igualdade/isonomia e da dignidade da pessoa humana. O principio da igualdade ou isonomia, encontra-se no artigo 5º, caput da Constituição Federal em vigor, que diz: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza [...]” Sobre o princípio trata Lenza (2011), buscando a realização efetiva da justiça, a lei procura dar tratamento igual aos desiguais. Porém, deste modo, é necessário dar tratamento desigual aos desiguais na exata medida de suas desigualdades, estes tratamentos tem a finalidade de alcançar não apenas a igualdade formal (encontrada na lei), mas principalmente a igualdade material (a realidade). Não se pode admitir desta forma um tratamento desigual ao cônjuge e companheiro, seria proteger mais o primeiro tipo de família do que o segundo, apenas por ter escolhido celebrar sua união através do casamento. Assim, disserta Ana Luiza Maia Nevares (apud PEIXOTO, 2010, p. 53, grifo do autor): Esta situação, sem duvida é uma contrariedade do ordenamento constitucional, violando o principio da igualdade, na medida em que estabelece privilégios a alguns indivíduos em prejuízos de outros, de forma injustificada. [...] Dessa forma, apesar do casamento e união estável encerrarem situações diversas, este fato não é suficiente para que a tutela na sucessão hereditária seja discrepante, conferindo-se mais direitos sucessórios a uma ou outra entidade familiar, pois ambas constituem família, base da sociedade, com especial proteção do Estado (CF/88, art. 226, caput) e é a família o organismo social legitimador do chamamento de determinada pessoa à sucessão, em virtude do dever de solidariedade que informa as relações familiares. Outro princípio violado é o da dignidade da pessoa humana encontrado em nossa Constituição Federal no artigo 1º, inciso III, o qual é tratado como direito fundamental, sendo que para um ser humano ter dignidade é necessário garantir a este requisitos mínimos de uma vida digna. 55 Desta feita, segundo Peixoto (2010), dar ao casamento tratamento privilegiado diante da união estável é ofender o princípio da dignidade da pessoa humana, tendo que ser garantido a esses um “patrimônio mínimo”. Sendo assim, nas palavras de Peixoto (2010, p. 59), “[...] imprescindível se fazer uma interpretação hermenêutica que privilegie os princípios e normas constitucionais em face da normativa civilista.” Diante disso e do fato que o STF ainda não se manifestou acerca da matéria, o tratamento desigual deva ser considerado inconstitucional, haja vista os princípios defendidos por nossa constituição de igualdade e da dignidade da pessoa humana. A exemplo disso, é o ter do preâmbulo da Constituição Federal da República de 1988 (grifo nosso), prega in verbis: Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bemestar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Conforme Pedro Lenza (2005), o preâmbulo serve como rumo a ser tomado pelo legislado na compreensão das normas constitucionais, não havendo relevância jurídica nem mesmo força obrigatória. Está claro segundo Peixoto (2010) que não houve por parte do legislado a intenção de criar classes de família, onde destas a união estável seria de classe inferior ao do casamento. Falar nisso seria dizer que a constituição elege o casamento como modelo mais adequado de família. Tomada essas premissas, é notório que não há hierarquia entre entidades familiares, sendo inconstitucional tratamentos desiguais como o regulado pelo artigo 1.790 do Código Civil. Deste modo, devemos impedir injustiças, e resguardar os direitos daqueles que os conquistaram, preconiza Dias ([S.d.], p. 05): No entanto, há sério risco de a jurisprudência deixar de reconhecer a permanência de ditos direitos na união estável bem como afastar todo e 56 qualquer tratamento desiguaritário ente casamento e união estável. Seria uma severa limitação às relações extramatrimoniais, além uma injustificável afronta aos princípios constitucionais. Devem as diferenciações ser afastadas do sistema jurídico. Mas, até que seja corrigido tal equívoco, pela reformulação da lei, cabe ao juiz simplesmente deixar de aplicar as normas discriminatórias, reconhecendo a inconstitucionalidade das mesmas. Esta é a única forma de evitar que o equívoco legal traga prejuízos enormes às uniões que merecem a proteção do Estado. Deste modo, fica claro não haver entendimento uno sobre a matéria pelos tribunais, tanto entre Estados diferentes como no mesmo tribunal. Mas possível perceber que há por todos o reconhecimento de tratamento desigual, inclusive inferior, ao companheiro frente ao do cônjuge. Após este estudo desde a instituição familiar, passando pela União Estável, e em fim sua sucessão, não há como deixar de comentar como esta espécie de família vem conseguindo direitos a passos lentos na sociedade brasileira, tendo em vista todo preconceito social que por anos, e ainda hoje passam. Em tempos de igualdade de sexo, raça e religião, para que promover a desigualdade em uniões familiares, ainda mais as que se unem por única e exclusiva vontade de afeto, amor e carinho. Os tempos são outros e os valores também, deste modo frente a esse descaso legislativo cabe aos tribunais promoverem justiça! 57 CONCLUSÃO O presente estudo abordou a temática do instituto familiar, buscando sua origem, e salientando as mudanças ocorridas para a atual família contemporânea. Em seguida passou ao estudo da família constituída pela união estável, abordando sua história, sua formação e regime de bens. A família surgiu junto com a sociedade, a primeira denominação referente a essa foi chamada de gens. Na sua forma mais primitiva não havia restrições de relações sexuais, aos poucos com a evolução do próprio homem, passou-se a ter restrições nas uniões, como entre pais, após entre irmãos e por último entre primos. Com essas referidas censuras vieram também à evolução da sociedade, e foi na Roma antiga que surgiu a palavra família, primeiro referindo aos escravos, depois se passou a referir a união entre homem e mulher, com o advento do cristianismo surgiu o matrimônio, que consistia na união de um homem e uma mulher perante Deus, sendo esta, por vários anos a única forma de família conhecida. Constata-se que o casamento não é a única forma de família existente, ou seja, com a possibilidade do divórcio/separação surgiu também à família monoparental, formada por um dos pais e filhos. Também tem-se a família homoafetiva, entre pessoas do mesmo sexo, e ainda a família constituída pela união estável, entre homem e mulher, sem impedimentos matrimoniais. A união estável por muitos anos foi uma união discriminada, pois antes de seu reconhecimento era conhecida como concubinato, que se dividia em duas formas, puro e impuro. Esse tratava da união de homem e mulher, onde um ou ambos encontravam-se casados, e assim impedidos de constituir nova família, sendo uma união marcada pela bigamia. Já aquela é a união formada entre homem e mulher livres e desimpedidos. 58 Assim sendo, a religião condenava estas formas de família, no entanto isso não impediu que estas deixassem de surgir, deste modo os companheiros continuaram lutando por seus direitos bem como reconhecimento frente esta sociedade preconceituosa. Desta forma, diante da união de fato surgiram efeitos jurídicos, os quais tiveram repercussão no judiciário fazendo com que o mesmo se pronunciasse sobre esses direitos. Deste modo, foi que a união estável conseguiu a passos lentos ver seus direitos garantidos, muitas injustiças foram cometidas para que então esta forma de família livre tivesse reconhecimento constitucional. Contudo, mesmo com seus direitos resguardados pela Constituição e pelo Código Civil, a sucessão do companheiro se mostra de certa forma revoltosa. Isto porque, após o seu reconhecimento duas leis vieram buscando proteger esta forma de família, são elas a Lei 8.971/94 e 9.278/96. A primeira trazendo os requisitos para o reconhecimento da relação entre os companheiros, seus direitos e deveres, bem como usufruto na habitação no momento da sucessão, e a segunda falando exclusivamente sobre a sucessão do companheiro. Assim, equiparou-se os diretos ao do cônjuge e em alguns casos, até mesmo, pode se ver um favorecimento ao companheiro em igual situação com o cônjuge. Desta maneira, em 2002 com advento do novo Código Civil, onde todos imaginavam que o legislador infraconstitucional respeitando o preceituado na Carta Magna nacional regularia os direitos do companheiro equiparados aos do cônjuge. O mesmo com muita má vontade retrocedeu tais direitos que já se havia conferido, e de maneira bastante diversa coloca em posição inferior no momento de suceder em comparação ao cônjuge. Diante desta explanação buscou-se o entendimento dos tribunais, pois a lei mais confundiu do que esclareceu nestes pontos. Pela análise jurisprudencial foi possível perceber que não há um único entendimento, sendo que mesmo quando declarado a constitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil, que cuida exclusivamente da sucessão do companheiro, os desembargadores reconhecem a injustiça proporcionada pelo presente artigo. Até mesmo o STJ posicionou-se nesta linha, defendendo a ideia de que a Constituição Federal não deu tratamento igual diante de sua possibilidade de conversão em casamento. Atenta-se que até o presente momento não há posicionamento do STF. Teoria defasada, pois faz crer que a instituição do casamento seria uma família de classe mais elevada que a união estável. 59 Ainda, muitos tribunais além de apontarem tais diferenças de tratamento, defendem a inconstitucionalidade, aplicando aos casos as leis referentes à sucessão do cônjuge que se mostram de maneira mais justa. Em suma, é imperioso o reconhecimento desta inconstitucionalidade, que gera desigualdades em um país que condena tais atitudes, é desumano e viola os princípios constitucionais máximos da isonomia e dignidade da pessoa humana. Destarte, é gritante o descaso do legislador da norma infraconstitucional pela inobservância de tais princípios, sobrevindo, assim a inconstitucionalidade de tal dispositivo. Não se pode inquietar frente a essa falta de desconsideração do legislador infraconstitucional quanto aos princípios constitucionais, sendo que a dignidade da pessoa humana não só apenas é princípio, mas também, é fundamental neste estado de direito democrático em que se vive. Ainda, é de se ter com relevância a ignorância quanto ao princípio da isonomia, pois falar em tratamento desigual para desiguais seria reconhecer o casamento como constituição de família mais digna de status superior a união estável, o que de maneira alguma é possível concordar, tendo em vista que ambas são formas de família, sendo reconhecidas como tais pela própria constituição, a qual tem o dever de proteger este instituto. Nestes termos, conclui-se pela inconstitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil de 2002, diante de todas as desigualdades impostas pelo legislador, o direito veio para primeiramente proteger os indivíduos, não podendo se possibilitar regimes de bens com efeitos diferentes para o cônjuge e companheiro no momento de suceder. Destinando-se ao companheiro apenas os bens adquiridos onerosamente na constância da união, distinguindo direitos aos filhos comuns dos exclusivos, sendo que só sucederá o companheiro a totalidade inexistindo descendentes, ascendentes e colaterais. Cabendo ainda, questão revoltosa, apenas ao companheiro suceder os bens onerosos, tendo em vista que os bens particulares que restarem ficam para o governo. Diante de todas essas atrocidades legislativas, é imperiosa a declaração de inconstitucionalidade pelos juízes e tribunais no exercício de suas atribuições por terem estes o dever e poder de garantir a soberania das normas constitucionais. 60 REFERÊNCIAS BRASIL. 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