1 Apelação Criminal nº 29.630-8 /213 (200601955522) wa/mfb Comarca de Planaltina Apelante : Marcos José Ferreira da Silva Apelado : Ministério Público Relator : Desembargador Geraldo Salvador de Moura EMENTA : Apelação criminal. Roubo. Tentativa. Razões extemporâneas. Intempestividade. O atraso na apresentação das razões recursais traduz-se em mera irregularidade procedimental, não se revelando óbice ao conhecimento do recurso interposto, atempadamente, através de cota nos autos, no instante em que intimado o acusado da sentença. 2 - Inquérito policial. Confissão. Retratação em juízo. Outros elementos de prova. Suficiência. Condenação mantida. Não merece acolhida a retratação da confissão extrajudicial se não evidenciadas provas de que obtida a confissão mediante constrangimento ilegal e se os elementos probatórios atestam, com propriedade, a efetiva atuação do acusado na conduta criminosa. 3 - Roubo qualificado. Tentativa. Redução em grau intermediário. O percentual redutor da tentativa é incidível na proporção da proximidade da consumação, considerando-se os atos aptos e idôneos realizados pelo 2 agente na composição do núcleo da conduta típica, de forma que razoável a redução em 1/2 (meio) se frustrada a empreitada criminosa ainda no momento do anúncio do crime. Apelação conhecida e improvida e, de ofício, reduzida a pena aplicada, mantidos os demais termos da sentença, à unanimidade de votos. ACÓRDÃO Vistos, oralmente relatados e discutidos os presentes autos de Apelação Criminal nº 29.630-8 /213 (200601955522), da Comarca de Planaltina, figurando como apelante Marcos José Ferreira da Silva e como apelado Ministério Público. ACORDAM os integrantes da Quarta Turma Julgadora da Primeira Câmara Criminal do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, por votação uniforme, acolhendo o parecer Ministerial, em conhecer da apelação mas improvê-la e, de ofício, reduzir a pena aplicada ao acusado Marcos José Ferreira da Silva para 02 (dois) anos e 08 (oito) meses de reclusão, mantendo a sentença quanto ao mais, nos termos do voto do Relator, exarado na assentada do julgamento que a este se incorpora. Custas de lei. Votaram com o Relator a eminente Desembargadora Juraci 3 Costa e o MM. Juiz Doutor Alvarino Egídio da Silva Primo (substituto do Desembargador Elcy Santos de Melo), que completou a Turma Julgadora, ante a ausência justificada do Desembargador Arivaldo da Silva Chaves. Presidiu a sessão o digno Desembargador Huygens Bandeira de Melo. Esteve presente à sessão o Doutor Leônidas Bueno Brito, ilustre Procurador de Justiça. Goiânia, 21 de novembro de 2006. ______________________________________, Presidente Desembargador Huygens Bandeira de Melo ______________________________________,Relator Desembargador Geraldo Salvador de Moura 4 Apelação Criminal nº 29.630-8 /213 (200601955522) wa/mfb Comarca de Planaltina Apelante : Marcos José Ferreira da Silva Apelado : Ministério Público Relator : Desembargador Geraldo Salvador de Moura RELATÓRIO O Representante do Ministério Público, com atribuições na Comarca de Planaltina, ofereceu denúncia contra Marcos José Ferreira da Silva, qualificado nos autos, menor de 21 anos, dando-o como incurso nas sanções do artigo 157 § 2º incisos I e II c/c o artigo 14 inciso II, todos do Código Penal, por fato ocorrido em 15 de junho de 2001. Conforme a denúncia, o acusado Marcos José e um terceiro não identificado, armados de um revólver calibre 38, deram voz de assalto às vítimas Sheila Aparecida Marques Santana e Leidjane Rodrigues da Silva, fato não consumado porque surpreendidos por policiais militares que realizavam procedimento de rotina nas imediações. Ao serem abordados, o co-réu que portava a arma de fogo, empreendeu fuga, restando preso em flagrante apenas o acusado Marcos José. Recebida a denúncia em 28.06.2001 (fl. 29), foi o acusado citado (fls. 32 e verso), qualificado e interrogado na presença de seu defensor 5 constituído (fls. 36/37) que apresentou, posteriormente, defesa prévia com rol testemunhal (fl. 38). Inexistentes antecedentes criminais (fl. 34). Foram inquiridas duas vítimas (fls. 43/44), uma testemunha arrolada pela acusação (fl.54) e três pela defesa, nenhuma delas presenciais (fls. 59/61 e 65/66). Fase de diligências sem requerimentos (fl.66). Oferecidas as derradeiras alegações (fls. 67/73 e 74/79), a magistrada, em sentença, deu o acusado como incurso nas sanções do artigo 157 § 2º incisos I e II c/c o artigo 14 inciso II, todos do Código Penal, à pena de 03 (três) anos e 07 (sete) meses de reclusão, em regime aberto, e ao pagamento de 50 (cinqüenta) dias-multa, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente, impossibilitada a substituição da pena privativa da liberdade por inexistentes os requisitos legais (fls. 80/87). Regularmente intimado da sentença (fls. 90 e verso), por inconformado, o acusado interpôs recurso apelatório objetivando a sua absolvição (fls. 90-v e 96/103). Sustenta o apelante que a confissão obtida na fase administrativa deve ser desprezada porque angariada sob vício insanável; nega a autoria do fato e pede a sua absolvição face à inexistência de provas concretas e suficientes da sua participação no evento delitivo a calçar o decreto condenatório (fls. 96/103). Em contra-razões, o Ministério Público de origem pugna pelo não conhecimento do recurso a despeito de que, apesar de interposto atempadamente, 6 suas razões foram apresentadas após o prazo regulamentar. No mérito, pede a manutenção da sentença (fls.105/107). A Procuradoria Geral de Justiça, em parecer da lavra da Dra. Maria da Conceição Rodrigues dos Santos, opinou pelo conhecimento e improvimento do recurso (fls. 115/118). É o relatório que submeto à douta Revisão. Goiânia, 25 de outubro de 2006. Desembargador Geraldo Salvador de Moura Relator 7 Apelação Criminal nº 29.630-8 /213 (200601955522) wa/mfb Comarca de Planaltina Apelante : Marcos José Ferreira da Silva Apelado : Ministério Público Relator : Desembargador Geraldo Salvador de Moura VOTO DO RELATOR O acusado Marcos José Ferreira da Silva, qualificado nos autos, insurge-se contra sentença que o condenou à pena de 03 (três) anos e 07 (sete) meses de reclusão, em regime aberto, e ao pagamento de 50 (cinqüenta) diasmulta, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo, por infração ao artigo 157 § 2º incisos I e II c/c o artigo 14 inciso II, todos do Código Penal (fls. 80/87). Em suas razões, o acusado/apelante aduz imprestável a confissão realizada durante o inquérito policial porque obtida por meios ilícitos; sustenta a tese da não-participação, atribui a autoria exclusiva do fato ao co-autor não encontrado e requer a sua absolvição face à inexistência de provas jurisdicionalizadas (fls. 96/103). 8 Em contra-razões, o Ministério Público de primeiro grau arguiu a intempestividade do recurso porque apresentadas as suas razões fora do prazo legal. No mérito, pediu a manutenção do decreto condenatório em sua inteireza (fls.105/107). A Procuradoria Geral de Justiça, em parecer da lavra da Dra. Maria da Conceição Rodrigues dos Santos, opinou pelo conhecimento e improvimento do recurso (fls. 115/118). É o suscinto relatório. O atraso na apresentação das razões recursais traduz-se em mera irregularidade procedimental, não se revelando óbice ao conhecimento do recurso vez que o acusado, ao ser intimado da sentença condenatória, de forma clara e em tempo hábil, demonstrou seu inconformismo através de cota nos autos (fl.89-v). Portanto, não merece prosperar a preliminar suscitada pelo Ministério Público de primeiro grau. Nesse sentido a jurisprudência: “ Apelação Criminal. Preliminar de não conhecimento do apelo. Apresentação das razões fora do prazo. Mera irregularidade.(...) A apresentação tardia das razões de apelação constitui mera irregularidade processual, insuficiente para ensejar o não conhecimento do recurso, quando consta requerimento da parte dentro do quinqüídio legal.” ( AC nº 27.423-1/213 DJ nº 14669, de 03.01.06, acórdão da lavra do Des. Floriano Gomes) Desse modo, rejeito a preliminar de não conhecimento da 9 apelação. Assim, satisfeitos os pressupostos de admissibilidade do recurso, dele conheço. 2. Passando ao mérito, vejo que razão não assiste ao apelante em pretender sua absolvição pois, diverso do que alega, as provas não frágeis senão vejamos: O acusado, em suas primeiras declarações, na fase policial, confessou em detalhes a empreitada criminosa, como se vê a seguir: “ (...) o conduzido disse que estava vindo juntamente com um indivíduo chamado Paulo Sérgio Carvalho so sacolão do Xepa; QUE então o conduzido e PAULO subiram uma rua, momento em que avistaram as duas meninas; QUE PAULO disse para o conduzido “vamos ali naquelas duas meninas”; QUE quando chegaram perto das meninas, PAULO abordou uma das vítimas com um revólver calibre 38, de cor preta; QUE PAULO pediu para que o conduzido segurasse na mão de uma das meninas; QUE PAULO pediu para que todos fingissem que fossem namorados; QUE passados alguns instantes um veículo chegou no local, sendo que os indivíduos que estavam dentro deste disse “polícia, mão na cabeça”; QUE então Paulo e o conduzido saíram correndo; QUE o conduzido desistiu de correr logo em seguida, colocando a mão na cabeça e se entregando para a polícia” (fl. 08) Em juízo o acusado modificou a versão anterior e negou a sua participação na tentativa de roubo, atribuindo-a exclusivamente ao outro co-réu (fls. 36/37). 10 Em consonância com a confissão extrajudicial do acusado, as vítimas narraram o fato, em juízo, com a mesma precisão de detalhes. Sheila Aparecida Marques Santana disse, verbis: “ (...) estava com sua amiga caminhando, na rua (...) os dois acusados abordaram a depoente e sua amiga por trás e o autor não identificado colocou a arma na altura da barriga de Leidjane anunciando voz de assalto; que mandaram que as duas seguisse e posteriormente que entrasse em um terreno baldio, oportunidade em que avistaram o carro da polícia e falaram para a depoente e sua amiga que eram para ficarem com as mãos entrelaçadas ao dos autores como se fossem namorados; que o acusado estava com as mãos dadas com a depoente e quem estava armado era o outro; que falaram para as jovens não olharem para o rosto dele, caso contrário as mataria; que a polícia abordou os quatro.” (fl. 43). A outra vítima, Leidjane Rodrigues da Silva, narrou também em juízo: “ (...) os dois acusados abordaram a depoente e sua amiga por trás e o autor não identificado colocou a arma na altura da barriga da depoente anunciando voz de assalto, que mandaram que as duas seguisse e posteriormente que entrasse em um terreno baldio, oportunidade em que avistaram o carro da polícia; que o acusado segurou Sheila; que falaram para as jovens não olharem para o rosto dele, caso contrário as mataria; que a polícia abordou os quatro (...) que pegaram o acusado, mas o outro conseguiu fugir” ( fl. 44). A conjugação da confissão extrajudicial do acusado com a coerente prova angariada sob o crivo do contraditório e da ampla defesa atesta, com propriedade, a efetiva atuação do acusado na prática do crime de roubo 11 qualificado pelo concurso de pessoas e a utilização de arma de fogo, em sua forma tentada. A alegação de que o apelante foi torturado para confessar a autoria do roubo não encontra apoio nos autos; em momento algum o apelante indicou prova de que houvesse sido vítima de qualquer constrangimento durante o procedimento inquisitorial. Em que pese a retratação do acusado em juízo, o seu interrogatório na fase administrativa e os demais elementos probatórios interagem-se harmonicamente e embasam o acerto da sentença condenatória. Os depoimentos das vítimas possuem elevado valor probante e demonstram coincidências com a confissão extrajudicial do acusado em diversos aspectos essenciais. Ambos, vítimas e acusado, de modo uníssono, relataram que aquelas foram abordadas por trás, que o co-autor evadido portava uma arma e abordou Leidjane, sendo que o acusado segurou Sheila. As vítimas foram advertidas para não olharem para os acusados, sob pena de morte, e instruídas a falsear uma relação de namoro com eles para esquivarem-se da polícia, tendo o acusado permanecido com as mãos entrelaçadas às de Sheila. Sobre o assunto, jurisprudência deste Tribunal: “Apelação. Roubo com resultado morte. Confissão extrajudicial. Retratação. Outros elementos de prova. (...) A confissão extrajudicial, inobstante posterior retratação em juízo, se harmônica e coerente com os demais elementos de prova dos autos, constitui indicativo de culpabilidade do agente, ensejando a formação do convencimento para suportar a condenação” (AC 28985-1/213, DJ nº 14808, de 31.07.2006, acórdão da lavra do 12 Des. Huygens Bandeira de Melo) Dessa forma, demonstrado que a irresignação do apelante não encontra suporte no arcabouço probatório, restando por demais evidenciadas a autoria e a materialidade do delito, julgo descabidas as razões do apelo. 3. No tocante à dosimetria da pena, verifico que a dirigente procedimental incorreu em equívoco ao promover o cálculo aritmético da pena ao finalizá-la em 03 (três) anos e 07 (sete) meses de reclusão, posto que, diminuída a pena-base, fixada em 04 (quatro) anos e 06 (seis) meses de reclusão, em 06 (seis) meses, face à menoridade do acusado, e, aplicada a causa especial de aumento de pena do artigo 157 § 2º I e II do Código Penal, à razão de 1/3 (um terço), e a redução em igual patamar pela tentativa, resta a pena de 03 (três) anos, 06 (seis) meses e 20 (vinte) dias. Ao aplicar a minorante da tentativa a magistrada fê-lo em grau mínimo, 1/3 (um terço). No caso posto, a opção mais rigorosa ocorreu; fez-se a aplicação aleatória da redutora da tentativa em grau mínimo, sem que levada à linha de conta o envolvimento do acusado em direção à execução do ato criminoso. Sobre o assunto, o Supremo Tribunal Federal já se posicionou: “A fixação da percentagem relativa à diminuição da pena em face do envolvimento de prática delituosa tentada faz-se a partir do percurso inplementado (iter criminis)” (STF – RT 760/545). O percentual redutor da tentativa é incidível na proporção da 13 proximidade da consumação, considerando-se os atos aptos e idôneos realizados pelo agente na composição do núcleo da conduta típica. O acusado, juntamente com um terceiro não identificado, armado de um revólver calibre 38, deu voz de assalto às vítimas e, nesse momento, teve sua empreitada frustrada sem que efetivada a retirada de qualquer bem ou valor das vítimas; a surpresa impeditiva da consumação ocorreu ainda no momento em que se evidenciava a grave ameaça, no instante do anúncio do crime, motivo pelo qual redimensiono a pena imposta ao acusado, ao entendimento de que razoável a redutora da tentativa no percentual de 1/2 (meio). Partindo da pena-base fixada pela sentenciante em 04 (quatro) anos e 06 (seis meses) de reclusão, mantida a diminuição de 06 (seis) meses em face da menoridade do acusado e a causa especial de aumento de pena do artigo 157 § 2º incisos I e II do Código Penal, à razão de 1/3 (um terço), remanesce o quantum de 05 (cinco) anos e 04 (quatro) meses que reduzo em 1/2 (meio) pela tentativa, ou seja, 02 (dois) anos e 08 (oito) meses, finalizada a pena em 02 (dois) anos e 08 (oito) meses de reclusão , em regime aberto, impossibilitada a substituição da pena, nos moldes do artigo 44 do Código Penal, por ausentes seus requisitos autorizadores. Ex positis, acolhendo o parecer da Procuradoria Geral de Justiça, da lavra da Dra. Maria da Conceição Rodrigues dos Santos, conheço o recurso mas lhe nego provimento e, de ofício, reduzo a pena aplicada ao acusado Marcos José Ferreira da Silva para 02 (dois) anos e 08 (oito) meses de reclusão, mantidos os demais termos da sentença. Custas de lei. 14 É o meu voto. Goiânia, 21 de novembro de 2006. Desembargador Geraldo Salvador de Moura Relator