REVISTA ÂMBITO JURÍDICO O poder das ag?ias ® A marca mais importante deixada pela administração do presidente Fernando Henrique Cardoso será a da reforma do Estado brasileiro. As mudanças ocorridas na estrutura estatal nacional são profundas e significativas, caracterizando um novo marco na política de desenvolvimento para o país. O Estado brasileiro deixou de atuar como executor e, aos poucos, em certas áreas, passou a assumir a condição de regulador. Dentro deste sistema surgiram importantes estruturas estatais para dar corpo a este novo modelo de Estado: as agências reguladoras. A reforma do Estado brasileiro ocorreu mais por necessidade do que por convicção. O Estado desenvolvimentista, que tem seu início na década de 30 com a chegada de Vargas ao poder, durou com pequenos sobressaltos até o final da década de 80. Neste modelo, o Estado financiava seu próprio desenvolvimento, principalmente através de suas empresas estatais. Este modelo atingiu seu ápice nas décadas de 30 e 70, com o crescimento brutal do aparato estatal. Entretanto, como resultado desta política, vimos o país sofrer com a falta de recursos que gerassem crescimento na década de 80, pois a capacidade de o próprio Estado financiar seu desenvolvimento havia se esgotado. Era necessária a adoção de um novo modelo de Estado para o país. Desta forma, aos poucos, o Brasil vem abandonando um modelo excessivamente interventor, dirigindo-se para um modelo regulador. O novo modelo de Estado implantado no Brasil desenhou dois tipos de agências: as reguladoras e executoras. Apesar do âmbito de cada ente ser normalmente confundido, faz-se muito importante lembrar a maior diferença entre ambas. Enquanto as agências de regulação são entes estatais, perenes em relação aos governos, devendo obediência ao Estado, as agências executoras são entes governamentais suscetíveis a mudanças orientadas pelo executivo. Assim, as agências reguladoras contam com diretores que possuem um mandato fixo que pode transcender a um governo. Estes diretores fazem parte de um órgão colegiado e seus membros devem ser aprovados pelo Senado Federal após a indicação do Presidente da República. Assim, os diretores das agências de regulação possuem mecanismos para se tornar inumes a pressões políticas, caracterizados principalmente pela independência funcional. Este novo modelo regulador ainda possui problemas como a desarticulação entre as agências, a efetividade do controle de suas ações, além da adoção de marcos e regimes regulatórios definidos que possam fornecer clareza para os investidores. Logo, algumas nuancias deste modelo vem angariando inúmeras críticas, contudo, devemos ter cuidado para identificar claramente eventuais defeitos ou desvios de rota de cada um destes órgãos reguladores, no intuito de que as mudanças necessárias para seu bom funcionamento sejam implantadas de forma clara e dentro das regras legais. Neste momento de adaptação a um novo sistema, o Brasil deve respeitar os mecanismos legais que asseguram a estabilidade jurídica necessária para a captação de investimentos de qualidade. O questionamento em relação à criação de mecanismos que tenham por objetivo a possível demissão de um diretor de uma agência de Estado por um governo, retirando sua independência, são temerárias. Da mesma forma, no episódio da crise energética, seria muito mais prudente deixar a gerência dos problemas com o órgão regulador competente, a Aneel, do que criar um novo órgão gestor, a Câmara de Gestão da Crise de Energia (CGCE). Atitudes como esta somente semeiam a desconfiança de potenciais investidores no Brasil. As agências de regulação e sua estabilidade jurídica são fundamentais em um momento que o país passa por transformações profundas em suas estruturas. Alterar regras de maneira abrupta, somente gerará desconfiança naqueles que desejam implantar investimentos de qualidade no Brasil. As agências reguladoras devem manter sua independência, meios e mecanismos que assegurem a manutenção do sistema, com ampla publicidade para suas ações, guiadas por marcos regulatórios definidos e políticas setoriais claras. Desta forma, será viabilizado um modelo estável e perene que guiará o país para um desenvolvimento apoiado em bases sólidas.