MODIFICAÇÃO DO AMIDO ATRAVÉS DA INSERÇÃO DE GRUPOS FOTOPOLIMERIZÁVEIS Izabela S. Salgado1*, Patrícia Patrício2, Rodrigo L. Oréfice2 1 Departamento de Engenharia Metalúrgica da Universidade Federal de Minas Gerais, Rua Custódio Carreira, 86/203 Prado CEP 30480-060 – [email protected]; 2Depto. de Engenharia Metalúrgica e de Materiais da UFMG, Rua Espírito Santo, 35 sala 306, 30160-030 Belo Horizonte/MG - [email protected] Modification of starch through the graftization of photopolymerizable groups In this work, polymerizable groups were inserted into starch to yield modified macromolecules that were further converted to hydrogels through photopolymerization. Cassava starch was esterificated using methacrylic anhydride in different proportions, and ethylenediamine as catalyst. The obtained modified macromolecule was photopolymerized by using 2-hydroxi-2-methyl-propiophenone as an initiator and UV as light source. Gelation of the modified starch was observed during photopolymerization that proved the ability of the modified starch to yield crosslinked networks. FTIR results showed that the incorporation of C=C bonds were successfully achieved by the chemical procedure used and that photopolymerization led to conversion of the C=C grafted groups in aliphatic chains. Starch containing polymerizable groups can be interesting since they can be used in the fabrication of biodegradable hydrogels. Introdução Materiais biodegradáveis são de grande interesse para a proteção ambiental e para o desenvolvimento sustentável, já que podem restringir o acúmulo de materiais em aterros. [1] Assim, o uso de polímeros biodegradáveis seria bastante satisfatório, não fosse o alto custo de produção e o baixo desempenho, que limitam o uso de alguns desses polímeros biodegradáveis. [2] Modificações das propriedades físicas e químicas desses materiais, através de reações ou misturas com outros polímeros biodegradáveis ou não, são muitas vezes necessárias para alcançar o desempenho desejado. [3-5] Como um biopolímero de fontes naturais, o amido vem sendo considerado um material alternativo no desenvolvimento de plásticos degradáveis devido à sua biodegradabilidade, disponibilidade e baixo custo. [6-9] O amido, segunda maior biomassa produzida na Terra, vem sendo amplamente usado em misturas com polímeros biodegradáveis ou não, tanto para reduzir o custo total como para aumentar a biodegradabilidade do material. [10-12] Neste trabalho pretende-se inserir grupos polimerizáveis em amido de mandioca. Tais grupos podem ser úteis em processos de misturas reativas com outros polímeros, onde reações de graftização (enxertia) podem ser viabilizadas através da presença das ligações insaturadas. Além disso, dispositivos como hidrogéis biodegradáveis de grande valor tecnológico para aplicações biomédicas, por exemplo, podem ser gerados através da polimerização do amido contendo ligações duplas. Experimental Materiais (utilizados como fornecidos) Materiais: Amido de mandioca (Amidos Navaí); anidrido metacrílico 94% (Aldrich); dimetilsulfóxido (DMSO) (Synth) como solvente e etilenodiamina (ETDA) (Vetec) como catalisador. Fotopolimerização: 2-hidroxi-2-metil-propiofenona (Aldrich) como iniciador e persulfato de amônia (Synth) como catalisador. Esterificação do amido A 4 gramas de amido de mandioca colocadas num balão com saída lateral foram adicionados 30mL de DMSO. O balão foi equipado com condensador e uma rolha na saída lateral. A solução foi submetida à agitação constante com o auxílio de um agitador magnético até a dissolução total do amido (cerca de 20 minutos), evidenciada pela formação de uma solução clara. O sistema foi imerso em um banho de gelo para diminuir a temperatura dentro do balão, evitando uma volatilização do ETDA e do anidrido metacrílico. Feito isso, 1g (~1,11mL) de ETDA foi introduzido no balão. Após completa homogeneização, anidrido metacrílico foi adicionado. A reação de esterificação do amido proposta para cada hidroxila é a seguinte (Figura 1): Figura 1 – Reação de esterificação. De acordo com a reação proposta acima, pode-se estimar a razão ente a massa de anidrido e a de amido necessária para substituir cada hidroxila. Tem-se, então: Massa molar do amido por hidroxila: 162g / 3 = 54g Massa de metacrílico para cada hidroxila: 85g Razão (em massa) metacrílico / amido: 85g / 54g = 1,57 Assim, para uma reação em que 100% das hidroxilas sejam substituídas, a massa de anidrido metacrílico utilizada deve ser 1,57 vezes maior do que a massa de amido. Tendo como base essa suposição, as amostras foram preparadas nas seguintes proporções, como mostra a Tabela 1. Anais do 9o Congresso Brasileiro de Polímeros Tabela 1 – Proporção de anidrido metacrílico nas amostras (%amostra = percentagem (massa/ massa); Nº hidroxilas = suposição do número de hidroxilas substituídas em cada unidade do amido). AMOSTRA Amido 1 2 3 4 5 6 4g 4g 4g 4g 4g 4g Anidrido metacrílico 2,10g 3,15g 3,69g 4,15g 4,89g 6,28g Razão 0,524 0,787 0,922 1,04 1,22 1,57 % Nº amostra hidroxilas 34,4 1 44,0 2 48,0 >2 50,9 >2 55,0 >2 61,1 3 Como o anidrido metacrílico pode reagir diferentemente com cada unidade, foram testadas amostras com percentagem de anidrido entre 44% (reação com somente duas hidroxilas de cada unidade) e 61,1% (reação com as três hidroxilas de cada unidade). A reação foi conduzida durante 48 horas à temperatura ambiente. A solução inicialmente esbranquiçada tornou-se amarela. A solução com o amido modificado foi precipitada em metanol, filtrada e lavada em água deionizada, obtendo um filtrado branco. Preparação do hidrogel (polimerização do amido modificado) O filtrado foi dissolvido em água deionizada, com intuito de formar uma solução 30% em massa. Após a dissolução completa, a solução foi aquecida até 76ºC e esta temperatura foi mantida por 10 minutos. Após o resfriamento em temperatura ambiente da solução, foi adicionado persulfato de amônio (10% em massa da solução) e iniciador 2-hidroxi-2-metil-propiofenona (1,8% em massa da solução). Após completa dissolução de todos os reagentes, a mistura final foi condicionada em pequenos recipientes cilíndricos transparentes e submetida à radiação UV. Vários tempos de exposição foram testados. A produção do gel foi verificada pelo aumento de viscosidade do sistema até o ponto onde não ocorria mais escoamento do material no frasco. Resultados e Discussão As amostras 1 e 2 não geraram géis após a fotopolimerização. Assim, pode-se considerar que para a formação de uma rede polimérica integrada e completa, o anidrido metacrílico deve reagir teoricamente com mais de duas hidroxilas de cada unidade estrutural do amido. As amostras 3, 4, 5 e 6 necessitaram tempos diferentes para polimerização (formação do gel). Nota-se que, quanto maior é a percentagem de anidrido metacrílico na amostra, menor é o tempo gasto para formação do gel, como mostra a Tabela 2. Anais do 9o Congresso Brasileiro de Polímeros Tabela 2 – Tempo de exposição à luz UV gasto pelas amostras para formação do gel. AMOSTRA TEMPO (min) 3 4 5 6 15 12 10 8 Espectroscopia na região do Infravermelho As análises de espectroscopia na região do infravermelho (espectroscopia IV) foram realizadas em um aparelho espectrofotômetro FTIR-GX Perkim Elmer com ATR horizontal, na faixa de 4000 a 700cm-1 utilizando cristais de seleneto de zinco. As amostras, na forma de filme, foram colocadas diretamente sobre o cristal. Os espectros de IV na região entre 3500 e 1000 cm-1 do amido modificado e após a fotopolimerização (polímero pronto) das amostras 4, 5 e 6 são mostrados na Figura 2. Na Figura 2, os espectros de IV das várias amostras de amido modificado (amostras 4, 5 e 6) e dos respectivos polímeros formados são analisados na região de número de onda entre 1000cm-1 e 2500cm-1. Em tal região, se observa a freqüência de absorção característica de ligações duplas C=C (1600cm-1). A presença desta banda de absorção nas três amostras de amido modificado mostra que houve incorporação dos grupos polimerizáveis no amido. A comparação entre os espectros antes e a após a fotopolimerização permite constatar que há uma sensível redução na intensidade desta banda como indicação da conversão das ligações duplas em simples durante a fotopolimerização do amido modificado. Observando-se, também na Figura 2, a faixa de número de onda de aproximadamente 2900cm-1, que é característica da vibração de estiramento de hidrocarbonetos, nota-se uma alteração no formato desta banda antes e após a fotopolimerização em todas as amostras. Isso é atribuído à modificação do ambiente químico ao qual estão confinados os grupos CH3 e CH2 presentes no amido modificado devido à fotopolimerização. A polimerização do amido contendo ligações duplas gera uma reestruturação na conformação e disposição das moléculas do sistema, o que altera as interações entre os grupos químicos presentes e, consequentemente, as vibrações das moléculas. Anais do 9o Congresso Brasileiro de Polímeros Figura 2 – Espectros (A) Amostra 4, (B) Amostra 5, (C) Amostra 6 antes e após a fotopolimerização do amido contendo grupos polimerizáveis. Anais do 9o Congresso Brasileiro de Polímeros Conclusões Este trabalho mostrou a possibilidade de inserção de grupos fotopolimerizáveis com duplas ligações (C=C) em moléculas de amido de mandioca através de reação de esterificação com anidrido metacrílico. A efetivação da reação de fotopolimerização pôde ser comprovada com a mudança na textura e na viscosidade das amostras, e também pela espectroscopia IV, que deixou claro haver uma diminuição das ligações duplas (C=C) inseridas no amido com a esterificação e um aumento das ligações simples. Os géis obtidos podem ser interessantes para aplicações biomédicas, pois incluem possíveis características como biodegradabilidade e biocompatibilidade atribuídas normalmente ao amido. Além disso, a presença de ligações duplas no amido pode favorecer interação com outros polímeros durante processos de mistura reativa. Agradecimentos Os autores gostariam de agradecer o apoio financeiro fornecido pelo CNPq e FAPEMIG. Referências Bibliográficas 1. X. 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