TRANSPORTES MARÍTIMOS:
ABORDAGEM ESTRATÉGICA
As disposições comunitárias relativas aos transportes marítimos visam sobretudo a aplicação
do princípio da livre prestação de serviços e a correta aplicação das regras da concorrência,
assegurando simultaneamente um nível elevado de segurança, boas condições de trabalho e
normas ambientais.
BASE JURÍDICA
Artigo 100.º, n.º 2, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, complementado pelas
disposições gerais do Tratado relativas à concorrência e à liberdade de prestação de serviços
(ver ficha 3.1.4.).
OBJETIVOS
O objetivo prioritário é o da aplicação do princípio da livre prestação de serviços aos transportes
marítimos da União, inscrito no Tratado, e a garantia do respeito das regras da concorrência.
Esta política tem por base o interesse da UE em defender-se da concorrência desleal das frotas
de certos países terceiros e trabalhar no sentido de condições de concorrência leais e estáveis
para os setores marítimos a nível mundial.
O transporte marítimo contribui consideravelmente, direta e indiretamente, para a criação
de postos de trabalho na UE. Por este motivo, temas como a melhoria das condições de
trabalho, a resolução do problema da falta de mão-de-obra especializada ou medidas de
qualificação profissional têm uma elevada relevância na política de transportes marítimos. Uma
política coerente relativa a transportes marítimos é, portanto, de considerável relevância para o
desenvolvimento económico da UE.
Além disso, o transporte marítimo é um elemento fundamental da Política Marítima Integrada
(PMI, ver ficha 5.3.8.). A política de segurança marítima da UE é abordada num capítulo
separado (ver ficha 5.6.11.).
REALIZAÇÕES
A.
Orientação geral
Em 1985, o transporte marítimo foi objeto de um memorando da Comissão intitulado «Para uma
política dos transportes — transportes marítimos», a que se seguiu, em 1996, a Comunicação
intitulada «Para uma nova estratégia marítima». O Livro Verde da Comissão relativo aos portos
e infraestruturas marítimas (COM(1997)0678) apresenta uma análise do setor com especial
incidência nos problemas das tarifas e da organização do mercado, incluindo a integração dos
portos nas redes transeuropeias de transporte.
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B.
Acesso ao mercado
O Regulamento (CEE) n.º 4055/86, de 22 de dezembro de 1986, que aplica o princípio da livre
prestação de serviços aos transportes marítimos entre Estados-Membros e entre EstadosMembros e países terceiros, aboliu as restrições aos armadores comunitários após um período
de transição. O Regulamento (CEE) n.º 4058/86, de 22 de dezembro de 1986, relativo a uma
ação coordenada com vista a salvaguardar o livre acesso ao tráfego transoceânico, permite
à Comunidade tomar medidas contra restrições ao livre acesso aos serviços de carga.
Em junho de 1992, o Conselho adotou um pacote de medidas relativas à liberalização
progressiva da cabotagem, ou seja, o acesso dos transportadores não residentes num
determinado Estado-Membro ao mercado dos transportes marítimos entre os portos desse
Estado-Membro. O Regulamento (CEE) n.º 3577/92 do Conselho, de 7 de dezembro de 1992,
consagrou definitivamente o princípio da liberalização da cabotagem marítima a partir de 1 de
janeiro de 1993 para os armadores comunitários que explorem navios registados num EstadoMembro, processo concluído em 1999.
C.
Regras de concorrência
Em 22 de dezembro de 1986, o Conselho adotou os regulamentos (CEE) n.º 4056/86
e n.º 4057/86, integrados num pacote marítimo. O primeiro desses regulamentos fixava
as modalidades de aplicação das regras de concorrência aos transportes marítimos
internacionais provenientes de ou com destino a um ou vários portos da Comunidade e
visava impedir distorções da concorrência em consequência de acordos abusivos. Em 13 de
outubro de 2004, a Comissão adotou um Livro Branco sobre a revisão do Regulamento (CEE)
n.º 4056/86 relativo à aplicação das regras comunitárias em matéria de concorrência aos
transportes marítimos (COM(2004)0675).
Em 2004, a Comissão apresentou também uma revisão das orientações sobre auxílios estatais
aos transportes marítimos (C(2004) 43). Estas especificam as ajudas compatíveis com o
direito comunitário, em especial as que visam promover a inscrição de navios nos registos dos
Estados-Membros ou o seu reingresso num registo sob pavilhão de um deles.
Em fevereiro de 2001, a Comissão apresentou um conjunto de medidas relativas ao
estabelecimento de regras claras e de um procedimento aberto e transparente no acesso ao
mercado dos serviços portuários — o «pacote portuário» (COM(2001)0035), com o intuito
de abrir os serviços portuários à concorrência, tanto no interior de cada porto marítimo como
entre os diferentes portos. Depois de, em 20 de novembro de 2003, e em terceira leitura, o PE
ter rejeitado esta proposta, a Comissão fez nova tentativa para resolver o assunto e, em 13 de
outubro de 2004, apresentou uma nova proposta (COM(2004)0654), também rejeitada pelo PE,
desta vez em primeira leitura, em 18 de janeiro de 2006.
Mais recentemente, e no quadro das Orientações da RTE-T (Orientações da RTE, ver ficha
5.8.1.), a Comissão adotou, em 23 de maio de 2013, uma nova iniciativa destinada a melhorar
as operações portuárias e as ligações à rede de transportes em 329 portos marítimos chave
em toda a UE — «Portos: um motor para o crescimento» (COM(2013)0295). Esta iniciativa
propõe uma estratégia integrada que combina medidas não legislativas e legislativas. Uma
das medidas legislativas é a nova proposta de Regulamento (UE) que estabelece um quadro
normativo para o acesso ao mercado dos serviços portuários e a transparência financeira dos
portos (COM(2013)0296), sobre a qual o Parlamento formulará a sua posição na próxima e
oitava legislatura.
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D.
Condições de trabalho
A Diretiva 1999/63/CE, de 21 de junho de 1999, tem por base um acordo celebrado entre a
Associação de Armadores da Comunidade Europeia (ECSA) e a Federação dos Sindicatos dos
Transportes da União Europeia (FST) na UE e regula a organização do tempo de trabalho dos
marítimos a bordo dos navios que arvoram pavilhão de um Estado-Membro da UE, enquanto
a Diretiva 1999/95/CE, de 13 de dezembro de 1999, a torna aplicável aos navios que arvoram
pavilhão de um país terceiro e escalam portos comunitários.
Em 23 de fevereiro de 2006, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) adotou a
Convenção sobre o Trabalho Marítimo, criando assim um instrumento único e coerente que
incorpora todas as normas atualizadas aplicáveis ao trabalho marítimo: o direito dos marítimos
a locais de trabalho seguros e protegidos nos quais se cumpram as normas de segurança,
a condições dignas de trabalho e vida, bem como à proteção da saúde, assistência médica
e proteção social. A Diretiva 2009/13/CE aplica um acordo da ECSA e da ETF sobre esta
Convenção.
A Diretiva 2012/35/UE, de 21 de novembro de 2012, que altera a Diretiva 2008/106/CE relativa
ao nível mínimo de formação dos marítimos, estipula que a formação e a certificação dos
marítimos são reguladas pela Convenção da Organização Marítima Internacional (OMI) sobre
normas de formação, de certificação e de serviço de quartos para os marítimos («Convenção
STCW»), que entrou em vigor em 1984 e foi significativamente alterada em 1995.
A Diretiva 2013/38/UE, de 12 de agosto de 2013, que altera a Diretiva 2009/16/CE relativa à
inspeção pelo Estado do porto, harmoniza mais o texto com a Convenção sobre o Trabalho
Marítimo de 2006 acima referida. A diretiva alterada faz igualmente referência ao seguinte:
(i) Convenção Internacional relativa ao Controlo dos Sistemas Antivegetativos Nocivos nos
Navios (AFS, 2001); e (ii) Convenção Internacional sobre a Responsabilidade Civil por Danos
resultantes da Poluição causada por Combustível de Bancas, de 2001 (Convenção «Bancas»,
2001).
Por fim, a mais recente Diretiva 2013/54/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de
novembro de 2013, relativa a certas responsabilidades do Estado de bandeira no cumprimento
e aplicação da Convenção do Trabalho Marítimo, traduz o acordo obtido entre a ECSA e a ETF
sobre essa convenção de 2006.
E.
Normas ambientais aplicáveis ao transporte marítimo
Nos últimos anos, foram adotadas várias medidas sobre a proteção do meio marinho. Estes
incluem:
—
Diretiva 2000/59/CE, de 27 de novembro de 2000, relativa aos meios portuários de
receção de resíduos gerados em navios e de resíduos da carga, que estabelece e controla
a eliminação obrigatória dos óleos usados, de misturas contendo óleo e dos resíduos dos
navios e da carga nos portos da UE;
—
Regulamento (CE) n.º 782/2003, de 14 de abril de 2003, relativo à proibição dos compostos
organoestânicos nos navios; estes compostos eram utilizados principalmente como
produtos anti-incrustantes nos cascos dos navios, mas causam sérios danos ambientais;
—
Diretiva 2005/35/CE, de 7 de setembro de 2005, relativa à poluição por navios e à
introdução de sanções em caso de infrações; contém definições precisas das infrações e
prevê sanções eficazes, dissuasivas e proporcionadas — penais ou administrativas — por
violação das regras. Em maio de 2009, o Parlamento e o Conselho chegaram a acordo
quanto à diretiva revista, segundo a qual emissões de poluentes de navios são consideradas
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infrações, mesmo em casos menos graves, caso resultem de premeditação, leviandade ou
negligência grave;
—
F.
Várias diretivas sobre a redução do teor de enxofre nos combustíveis navais, culminando
na Diretiva 2012/33/UE, de 21 de novembro de 2012.
A política relativa a transportes marítimos da UE até 2018
Em janeiro de 2009, a Comissão apresentou uma comunicação sobre os objetivos estratégicos
principais que deverão nortear o setor comunitário do transporte marítimo até 2018
(COM(2009)0008). Nesta comunicação, determinava as principais opções estratégicas para o
sistema de transporte marítimo da UE no período até 2018. Nesta comunicação são também
determinadas as áreas mais importantes para a tomada de medidas, bem como uma vasta paleta
de desafios futuros:
—
O transporte marítimo da UE no contexto de mercados globalizados e maior pressão de
concorrência;
—
Recursos humanos, prática marítima e conhecimento especializado marítimo: as possíveis
medidas dizem sobretudo respeito ao aumento da atratividade de profissões do transporte
marítimo, à melhoria das perspetivas profissionais de marítimos, ao estímulo de perspetivas
de carreira vitalícias nos grupos marítimos, bem como à melhoria da imagem da navegação
marítima. Está ainda prevista a implementação da Convenção sobre o Trabalho Marítimo,
bem como a melhoria do ensino e formação das tripulações;
—
Medidas para alcançar o objetivo a longo prazo de um transporte marítimo sem resíduos
nem emissões, bem como medidas para o aumento da segurança do transporte marítimo e
para a prevenção de terrorismo e pirataria;
—
A exploração do potencial do transporte marítimo de curta distância, por exemplo através
da criação de um espaço europeu de transporte marítimo sem barreiras, da implementação
completa dos projetos para implantação de autoestradas marítimas ou para a ligação à zona
interior nos arredores do porto;
—
Investigação e inovação marítimas: a Comissão recomenda o estímulo da inovação e
investigação e desenvolvimento tecnológicos no transporte marítimo para otimizar a
eficiência energética dos navios, reduzir a pegada ecológica e melhorar a qualidade de vida
no mar. Também apoia a criação de um quadro de referência para a prestação de serviços
"e-Maritime" a nível europeu e mundial.
O PAPEL DO PARLAMENTO EUROPEU
Na sua resolução de 24 de abril de 1997, o Parlamento acolhe com satisfação a comunicação da
Comissão «Para uma nova estratégia no setor marítimo» e sublinha a necessidade de condições
de concorrência equitativas, considerando também importante a proteção social dos marítimos
num nível consentâneo com as convenções internacionais, nível esse que deve ser igualmente
assegurado aos navios que arvorem pavilhão de conveniência.
O Parlamento conclui no seu parecer de 1999 que as propostas de diretivas em matéria
de acesso ao mercado nos portos apresentadas na sequência do Livro Verde relativo aos
portos marítimos publicado pela Comissão não são adequadas à regulação das condições de
concorrência entre os portos e no interior dos mesmos. O Parlamento rejeitou essas propostas,
frustrando assim os correspondentes processos legislativos.
Na sua resolução de 12 de abril de 2005 relativa ao transporte marítimo de curta distância,
o PE solicita uma promoção reforçada do mesmo, a maior redução possível dos processos
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administrativos, o desenvolvimento de corredores de qualidade entre os Estados-Membros e a
atribuição de prioridade ao investimento nas infraestruturas com vista a melhorar o acesso aos
portos.
Na sua resolução de 5 de maio de 2010 relativa à definição de objetivos estratégicos e
recomendações para a política comunitária de transporte marítimo no horizonte de 2018, o
PE apoia, em princípio, a política da Comissão, e apresenta uma longa lista de medidas concretas
(novas medidas contra a utilização indevida de pavilhões de conveniência, auxílios estatais para
manter a competitividade do transporte marítimo da EU, a mais forte integração dos interesses
do transporte marítimo nas RTE-T, bem como a melhoria da sustentabilidade do transporte
marítimo, através da redução das emissões de navios, da internalização dos custos externos e da
introdução de normas ambientais internacionais aplicáveis no âmbito da OMI).
Em 15 de dezembro de 2011, o PE adotou um relatório de iniciativa sobre um Roteiro do espaço
único europeu dos transportes, em resposta ao Livro Branco da Comissão, de 2011. No que
diz respeito ao transporte marítimo, o Parlamento solicitava: (i) a apresentação, até 2013, de
uma proposta sobre a "cintura azul"; (ii) a introdução de uma política europeia para o transporte
marítimo de curta e média distância; e (iii) a atribuição de pelo menos 15 % do financiamento da
RTE-T a projetos de melhoria das ligações sustentáveis e multimodais entre portos marítimos,
portos de navegação interior e plataformas multimodais.
Em 2 de julho de 2013, o Parlamento deu-lhe seguimento com um relatório de iniciativa
sobre Crescimento Azul, apresentando o seu roteiro para a promoção e revitalização da PMI.
Este relatório acentua que as autoridades locais, regionais, nacionais e europeias devem criar
as condições necessárias para o crescimento sustentável, da seguinte forma: (a) estabelecendo
sistemas de ordenamento do espaço marítimo; (b) melhorando as infraestruturas; (c) facultando
o acesso a competências profissionais; e (d) assegurando financiamento adequado (como novas
regras para o capital de risco). Convém destacar que o Parlamento Europeu reiterou ainda a
enorme importância dos seguintes temas: (i) competências e emprego no setor marítimo; (ii)
investigação e inovação; (iii) a quota da UE de transporte marítimo e construção naval, bem
como a necessidade de a Comissão apresentar em breve as propostas legislativas necessárias
para a criação da "cintura azul", incluindo a revisão necessária do Código Aduaneiro da UE.
Christina Ratcliff
11/2015
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