Projeto Escritores da Própria História: um relato da prática da comunicação comunitária para o desenvolvimento humano no âmbito do programa Terra Mais Igual Autora Mirella Bravo de Souza Bonella1 RESUMO Este artigo trata da experiência de um projeto de comunicação comunitária, que ocorreu em Vitória, no Espírito Santo, por iniciativa da Prefeitura Municipal de Vitória, chamado Escritores da Própria História. Nele, crianças e adolescentes participaram de oficinas de comunicação para compreender a função da mídia e sua linguagem e fazer um resgate das histórias dos últimos 10 anos do lugar onde vivem, período em que ocorreram as intervenções sócio-ambientais e urbanísticas do programa Terra Mais Igual. Como objetivo final, as narrativas serão registradas em um livro. A idéia fundamental é que, se os personagens só existem no tempo quando são narrados e determinados lugares e atores não obtém da mídia massiva a atenção narrativa esperada, é preciso criar novos mecanismos de intervenção e visibilidade. Afinal, mais do que contar fatos, por meio do discurso construímos memórias e identidades. Deixar-se narrar é delegar que outros digam o que será lembrado e o que será esquecido da história do grupo de referência. Chega-se ao ponto em que os próprios personagens das histórias passam a crer nessa perspectiva externa. O jornal, e outras mídias informativas, passam a ser senhores da memória2 daquela comunidade. É preciso mudar esse processo e dar novas opções de manifestação discursiva. PALAVRAS-CHAVE Jornalismo, Comunicação Comunitária, Narrativa, Memória Coletiva 1 Graduada em Comunicação Social, habilitação Jornalismo, pela FAESA/ES; pós-graduada em Estratégias de Comunicação Organizacional, pela Faculdade Cândido Mendes de Vitória/ES; MBA Liderança e Gestão de Pessoas, pelo Centro Universitário de Vila Velha - UVV/ES; mestre em Comunicação pela Universidade Federal Fluminense -UFF/RJ; professora de Comunicação Social da Faculdade Estácio de Sá Vitória/ES; analista de Comunicação Social do Núcleo Gestor do programa Terra Mais Igual, vinculado à Secretaria de Gestão Estratégica da Prefeitura Municipal de Vitória. Contato: [email protected] 2 O conceito é da professora da Universidade Federal Fluminense Marialva Carlos Barbosa e será detalhado adiante. 1 INTRODUÇÃO É fato que os meios de comunicação desempenham papel central na vida em sociedade. Com o passar do tempo e as mudanças nas relações sociais, a praça pública foi deslocada para os aparelhos de TV e as páginas dos jornais. Conforme afirma Thompson (1995) 3, o conhecimento que temos dos fatos que acontecem além do nosso meio social imediato é derivado de nossa recepção das formas simbólicas mediadas pela mídia. Pensando sobretudo na esfera de atuação do Jornalismo, várias reflexões levam a crer que em um mundo cada vez mais contraditório, buscam-se parâmetros para entender porque, apesar de ambíguas, as coisas são assim. Vale ressaltar a intervenção das narrativas jornalísticas nesse processo de mediação simbólica4. Na contemporaneidade, a narrativa jornalística se torna o lugar de explicação e apresentação de diferentes experiências passíveis de serem vividas cada dia mais de forma mais segura, dentro de casa, sentados no sofá, lendo jornal ou assistindo TV. Mas o que queremos dizer quando falamos de narrativa? Ricoeur (1994) entende que é na intriga – ou seja, na narrativa - que está o meio privilegiado pelo qual configuramos nossa experiência temporal. É inerente ao ser humano a capacidade de intercambiar experiências e é na narrativa que a vida configura sua existência. Fatos e personagens existem no tempo a partir do momento em que são contados. Por isso, não se pode ignorar que existe uma correlação entre a atividade de narrar uma história e o caráter temporal da experiência humana, que não é puramente acidental. O tempo torna-se tempo humano na medida em que é articulado de modo narrativo, e a narrativa atinge seu pleno significado quando se torna uma condição da existência temporal. Ao falar de narrativa, queremos falar de discurso como prática social, que significa pensar qualquer texto como integrante do contexto sócio-histórico e não algo de caráter apenas puramente instrumental, externa às pressões sociais. O discurso apresenta papel fundamental na reprodução, manutenção e transformação das representações que as pessoas fazem e das relações e identidades com que se definem numa sociedade5. Propomos um projeto de comunicação comunitária, que em sua maioria surgem da percepção pelos grupos e entidades da sociedade civil da necessidade de conquistar visibilidade no espaço público midiático. Se os personagens só existem no tempo quando são narrados e 3 THOMPSON, John. Ideologia e cultura moderna:teoria social crítica na esfera dos meios de comunicação de massa. Tradução sobre o grupo de ideologia, comunicação e representações sociais da pós-graduação do Instituto de Psicologia da PUCRS. Petrópolis: Vozes, 1995. 4 RICOEUR, Paul. Tempo e Narrativa (tomo I). Campinas, São Paulo: Papirus, 1994. 5 PINTO, Milton José. Comunicação e Discurso. São Paulo: Hacker Editores, 2002. determinados lugares e atores não obtêm da mídia massiva a atenção narrativa esperada, é preciso criar novos mecanismos de intervenção. Afinal, mais do que simplesmente contar fatos do cotidiano, estamos tratando de uma questão de construção de memórias e identidades. O conceito de memória coletiva6 é uma ferramenta que nos permite interrogar sobre condições sociais de produção de lembranças e de esquecimentos, que tenta dar pistas das interações sempre dinâmicas entre passado e presente, e que nos faz pensar as relações entre indivíduos e grupos. É através da memória que se delineia, simboliza e classifica o mundo. O meio social exerce influência decisiva sobre a memória do indivíduo. Se todo indivíduo está em processo de interação e troca com o grupo do qual faz parte, com o meio social e com toda sociedade, a memória é sempre coletiva, ou seja, é uma construção de natureza social. A memória individual sempre está enraizada dentro de vários quadros que o instante ou a necessidade reaproxima em determinados momentos. Conforme Duvignaud7, a rememoração pessoal situa-se na encruzilhada das múltiplas malhas de solidariedade dentro das quais estamos engajados. Se a produção do discurso não ocorre a partir das comunidades, mas pelo contrário essa produção é efetuada por outros atores, conseqüentemente, os membros do grupo narrado perdem o domínio de suas lembranças. Deixar-se narrar é delegar que outros digam o que será lembrado e o que será esquecido da história do grupo de referência. Chega-se ao um ponto em que os próprios personagens das histórias passam a crer nessa perspectiva externa. O jornal, e outras mídias informativas, passam a ser senhores da memória daquela comunidade. Segundo Barbosa (1996), o impresso funciona como uma espécie de memória escrita de uma época, uma seleção e retenção de determinados fatos em detrimento de outros. É preciso pensar que o jornalista, ao escolher fatos, relegar outros ao esquecimento, escolher como narrar e ao definir o lugar da página a ser ocupado pelo texto, mantém com o seu trabalho a dialética fundamental da memória: a lembrança e o esquecimento. “Aos relatos que devem ser perenizados, imortalizados pela prisão da palavra escrita, contrapõem-se outros que devem ser relegados ao esquecimento”.8 Seguindo essas pistas, a autora explica que a escrita deve ser vista como elemento básico da construção seletiva de memória que, sobretudo, engendra a questão do poder. Percebendo-a como uma seleção e uma construção, é necessário ver os agentes, ou os senhores dessa 6 HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. São Paulo: Vértice, 1990. DUVIGNAUD, Jean. “Prefácio”. In: Memória Coletiva. São Paulo: Vértice, 1990. 8 BARBOSA, BARBOSA, Marialva. Imprensa, poder e público: os diários do Rio de Janeiro – 18807 1920. 1996. Tese (Doutorado em História) - Programa de Pós-graduação em História da Universidade Federal Fluminense, Niterói, 1996, p. 156. operação, como detentores de poder. Tornar-se senhores de lugar, das agências da memória, é ditar a lembrança e o esquecimento. Citando George Duby – um dos autores que evidenciou o papel da escrita como forma de controle, cerceamento e domesticação da memória –, a autora conclui que, ao selecionarem o que deve ser lembrado e o que deve ser esquecido, o que deve ficar nas zonas de sombras e de silêncio, os jornais torna-se-iam também senhores de memória. Senhores do conteúdo e da forma em que devem ser narradas as histórias. Faz-se urgente efetuar um trabalho que permita reconfigurar o uso das narrativas para além de uma relação convencional com os meios massivos de comunicação. Uma relação atualmente distante, passiva e pouco democrática, na qual se limita a reconfirmar insistentemente um senso comum repleto de elementos estereotipados, imposições normativas de formas de pensar o mundo e o estabelecimento de lembranças e esquecimentos. A proposta é a efetivação da garantia do direito à livre expressão, prevista na Constituição Brasileira. Para isso, é imprescindível convidar, dar subsídios e, desta forma, encorajar novos atores sociais a entrarem nessa “ordem arriscada do discurso”9, como enfatiza filósofo Michel Foucault (2000) ao afirmar que, em toda sociedade, a produção do discurso é ao mesmo tempo controlada, selecionada, organizada e redistribuída por certo número de procedimentos que têm por função conjurar seus poderes e perigos, dominar seu acontecimento aleatório, esquivar sua pesada e temível materialidade. O autor destaca que se considerarmos a linguagem como uma série de fatos tendo um determinado estatuto de materialidade, essa linguagem é um abuso de poder pelo fato de podermos usá-la de determinada maneira, tão obscura, que vem impor-se à pessoa a quem é dirigida, do exterior, criando problemas sem solução, tanto de compreensão como de reutilização, de respostas, de críticas etc. Uma colocação que faz pensar mais uma vez na necessidade de multiplicar as manifestações discursivas nas comunidades, assim como os registros de memória. 2 PONTO DE PARTIDA: O PROGRAMA TERRA MAIS IGUAL Buscando resgatar a enorme dívida que o país acumulou com a população de baixa renda, em função do modelo econômico adotado nas últimas quatro décadas, a Prefeitura de Vitória prioriza, desde 1990, investimentos de recursos nas políticas sociais, mais especificamente nas áreas de saúde, educação e urbanização de favelas10. 9 FOUCAULT, Michel. A ordem do discurso. São Paulo: Loyola, 2000. Parte das informações colocadas aqui foram retiradas de documentos de circulação interna do Núcleo Gestor do Terra Mais Igual disponíveis para consulta pela autora ou formulados pela mesma. 10 A primeira experiência foi com o Projeto São Pedro. De acordo com Martinuzzo (2002)11, na década de 80, registraram-se os primeiros movimentos para enfrentar a incompatibilidade entre pobreza e qualidade de vida na cidade de Vitória. A região da Grande São Pedro, um extenso maguezal a noroeste da ilha, começou a ser ocupada na década de 70. Formaram-se 11 bairros, com população hoje superior a 50 mil habitantes, muitos dos quais viviam em palafitas. Foram gastos mais de R$ 25 milhões em obras de infra-estrutura, desenvolvimento social e econômico e preservação ambiental na região. Foi a partir da experiência acumulada com o Projeto São Pedro e seguindo a definição da Agenda 21 Local – Plano Estratégico Vitória do Futuro, elaborada em 1996, que surge o Programa Integrado de Desenvolvimento Social, Urbano e de Preservação Ambiental em Áreas Ocupadas por População de Baixa Renda do Município de Vitória, primeiramente conhecido como Projeto Terra e atualmente chamado Terra Mais Igual. O programa tem como público-alvo direto mais de 85 mil habitantes e a área total atingida é de 6,2 quilômetros quadrados, divididos em 15 territórios denominados poligonais, que abrangem 30 bairros e 13 comunidades do município. Essas áreas foram definidas tendo como critérios o grau de carência em equipamentos e serviços urbanos, grau de risco e os baixos índices sociais da comunidade em relação às demais áreas da cidade. Em cada uma dessas poligonais é desenvolvido um diagnóstico da região que é compartilhado com a comunidade, promovendo a participação popular em todo o processo de desenvolvimento do plano sócio-ambiental e urbanístico para o local. A partir do compartilhamento das informações entre técnicos e moradores, é construído o Plano de Desenvolvimento Local Integrado (PDLI), que abrange dois eixos: o Desenvolvimento Humano e o Desenvolvimento Urbano12. O PDLI é o instrumento que orienta as prioridades nas obras e ações sócio-ambientais. No eixo do Desenvolvimento Urbano, o trabalho consiste na complementação da rede de equipamentos e serviços urbanos, liberação e destinação de uso adequado para as áreas de interesse ambiental, melhoria física das habitações precárias, eliminação das áreas de risco, melhoria da acessibilidade e mobilidade e das ações de apoio à implantação das obras físicas de inclusão territorial e ao uso e sustentabilidade das mesmas, chamadas gerenciamento social das obras. 11 MARTINUZZO, José Antônio. Projeto Terra – Vitória para todos. Vitória: Prefeitura Municipal de Vitória, 2002. 12 As explicações sobre os eixos foram retiradas da metodologia do programa Terra Mais Igual, requalificada em 2005 para que o trabalho priorize as ações no ser humano, com foco na melhoria da qualidade de vida e o desenvolvimento sustentável dos moradores, ficando a qualificação do espaço físico apenas como uma parte das ações necessárias para o cumprimento dos objetivos do programa. No eixo de Desenvolvimento Humano, o objetivo é o apoio necessário à população beneficiária do programa, buscando ampliar e agregar capacidades e habilidades, proporcionando oportunidades que reduzem a exclusão social, através da formulação e implantação de ações emergenciais e estruturantes. Tendo como principal objetivo promover melhorias para a população excluída, que se encontra em locais privados de condições mínimas de habitabilidade, o programa é uma iniciativa de política pública de inclusão social, cujo modelo de gestão pressupõe uma ação integrada das diferentes secretarias por causa das múltiplas facetas do processo de exclusão. A participação social, a integração institucional e a gestão compartilhada são buscadas em todas as fases de implementação do programa, que compreende: pré-urbanização, urbanização e pós-urbanização. 3 O PROJETO ESCRITORES DA PRÓPRIA HISTÓRIA 3.1 METODOLOGIA A metodologia adotada no projeto Escritores da Própria História contempla as diretrizes do Terra Mais Igual e se encaixa no eixo prioritário de Desenvolvimento Humano explicado acima. Entende-se que capacitar as pessoas beneficiárias do programa para ao entendimento do processo de construção de mensagens midiáticas é o primeiro passo no início de ações que dêem condições de desenvolvimento de práticas de visibilidade no espaço público. Na perspectiva de mobilização, os mais diversos grupos podem se apropriar do universo da mídia e criar oportunidades que ampliem a produção de discursos. Nas experiências de comunicação comunitária, três elementos parecem fundamentais: a possibilidade de experimentar a mídia, a centralidade do processo de criação, e a recepção em que produtor e receptor se confundem13. Em diálogo com a perspectiva do planejamento e ações integradas com outras secretarias da Administração Municipal, esse projeto foi desenvolvido de forma articulada com a Secretaria de Educação do município. Como os participantes eram de escolas da região, a proposta base foi discutida com representantes dos colégios - diretores, pedagogos, professores e 13 LIMA, Rafaela. Visibilidade no espaço público e metodologias participativas: os princípios da comunicação comunitária. [on line] Disponível na internet via http://www.aic.org.br/metodologia/principios_da_comunicacao_comunitaria.pdf. Última atualização em 2 de maio e 2007. supervisores escolares – sendo aprimorada e adequada de acordo com as questões levantadas pelo grupo de trabalho. Foi desses encontros que nasceu a parceria com a direção da Escola de Ensino Fundamental Marieta Escobar, que foi sede do projeto e que colaborou de forma decisiva para o sucesso dele. 3.2 OBJETIVOS 3.2.1 Geral Ampliar os canais de comunicação das e nas comunidades, capacitando determinados atores sociais para serem multiplicadores da idéia de criação de novas formas de intervenção e visibilidade no espaço público. A proposta é que eles apresentem um novo posicionamento, agora ativo, não mais apenas como receptores, mas produtores efetivos de mensagens e memória sobre o seu território e suas vidas. 3.2.2 Específicos • Capacitar a comunidade sobre questões gerais da construção narrativa dos meios de comunicação, sobretudo das mídias impressas. z Criar um mecanismo de mobilização e articulação social, que favoreça a democracia participativa. z Reconhecer e valorizar os atores sociais dos bairros por meio das narrativas feitas por moradores do próprio lugar. z Obter como resultado final uma série de textos as mudanças nos bairros a partir das intervenções do Terra, que serão organizadas em um livro visto como instrumento de memória coletiva local. 3.3 A PRÁTICA O projeto envolveu, entre janeiro e abril deste ano, crianças e adolescentes de escolas que atendem aos moradores da poligonal 11 do programa Terra Mais Igual, constituída pelos bairros de Joana D’Arc, Santa Marta, Andorinhas e pela comunidade de Mangue Seco, em um processo de produção de comunicações – artigos, entrevistas, reportagens, poesias, crônicas, paródias, acrósticos e outros. Especificamente, foi trabalhado um projeto de produção narrativa, seguindo as indicações técnicas de produção jornalística de discurso, que teve como tema a história das intervenções do Terra Mais Igual naquela região. Como essa poligonal iniciou o processo de pós-urbanização em setembro de 2007, existia a necessidade de fazer um resgate histórico com os moradores do lugar de todas as ações que o programa promoveu de qualificação na região. Porém, foi definida que a intenção não era de se realizar uma construção narrativa institucional, mas de memória coletiva local, que valorizasse quem viveu e participou dessa história, por quem também estava lá enquanto ela acontecida. Os 25 participantes inscritos foram envolvidos num processo de reconhecimento dos atores sociais que foram importantes para a qualificação dos bairros, ao mesmo tempo que se tornam, no fim do trabalho, parte da história, também como protagonistas. A iniciativa visou mobilizar pessoas e grupos por meio da capacitação para a efetiva construção de narrativas. A idéia era gerar uma animação social e cultural que utiliza os artífices dos meios massivos de comunicação, por meio do uso das técnicas de construção textual do jornalismo. O método escolhido colocou as pessoas em contato com a possibilidade de criação discursiva, ajudando-as a descobrir, a exprimir, a discutir e a resolver problemas dessa produção que chega até eles hoje, principalmente, por intermédio dos grandes meios massivos. 3.4 CAPACITAÇÃO Desde o início, a preocupação era com a capacitação dos alunos. Para isso, a primeira etapa foi desenvolver um plano de cursos, divido em módulos, que envolvesse o entendimento sobre o que são os meios de comunicação, suas potencialidades e como essas podem ser usadas na comunicação comunitária. Esses cursos deveriam contemplar também a capacitação nas técnicas de redação jornalística, formulação de pautas, recolhimentos das informações e escrita das narrativas. Os cursos foram divididos em duas etapas: uma prática e outra teórica. E essas etapas foram redivididas em módulos. Os conteúdos desses módulos, em média com 30 horas/aula cada, foram descritos para servirem de referência para a formulação da proposta do grupo que seria contratado para aplicar as oficinas de comunicação comunitária. O conteúdo a ser ministrado na etapa teórica foi dividido em três módulos. • ENTENDENDO A MÍDIA: Conceituar e esclarecer os diversos aspectos da comunicação na atualidade, processo no qual a mídia massiva assume posição privilegiada de mediares da realidade. Favorecer o entendimento do processo de construção de sentidos, memória e identidades via meios de comunicação e a importância de se tomar as rédeas dessa construção na própria comunidade. Estimular a leitura crítica das mensagens midiáticas e, por fim, provocar e instrumentalizar os atores sociais para a prática da comunicação comunitária, incentivando o protagonismo social. • JORNALISMO: NOTÍCIA, PAUTA E APURAÇÃO DE INFORMAÇÕES: O que é notícia, entendimento dos critérios de noticiabilidade e discussão de novos critérios para a mídia comunitária, conceito e importância de pauta para apuração de informações, passo-a-passo da construção da pauta, elementos essenciais e início do entendimento do processo de apuração. • ESTILO JORNALÍSTICO E FORMAS NARRATIVAS: O jornalismo e a construção das notícias, lead e pirâmide invertida, critérios de noticiabilidade, estilo jornalístico, tipos de narrativas, construção de sentidos por meio do uso das narrativas, o uso de personagens e casos, informação e criatividade. O conteúdo a ser ministrado na etapa prática foi dividido em dois módulos. • PRODUÇÃO DE PAUTAS: Retomada do conceito e da discussão em torno dos critérios de noticiabilidade para a prática da comunicação comunitária, estudos dos elementos da pauta e prática da produção de pautas sobre a comunidade em que estão inseridos, especificamente sobre a história das intervenções do programa Terra Mais Igual na região. • APURAÇÃO DAS INFORMAÇÕES E ESCRITA DOS TEXTOS: Retomada de informações sobre o estilo jornalístico, lead e pirâmide invertida, uso de personagens e casos, informação, criatividade, tipos de narrativas e prática da construção textual. Foco na parte prática da produção textual, com orientações e revisões dos textos. 3.5 ESCOLHA DOS TEXTOS PARA O LIVRO Dentro do estudo da proposta inicial, ainda era preciso pensar uma forma de escolher os textos que seriam incluídos no livro, produto final do projeto. A primeira idéia foi fazer um concurso para classificar a produção. Mas com o andamento do projeto e o entendimento mais profundo dos princípios da comunicação comunitária, ficou claro que seria possível, e deveria ocorrer, o máximo aproveitamento dos textos. Além disso, alguns participantes desistiram, a produção se reduziu um pouco e ocorreu muita repetição de assuntos tratados. Havia uma proposta inicial de envolver os professores das disciplinas de produção textual, que deveriam experimentar a capacitação antes dos alunos, apontando melhorias e adaptando os módulos para a realidade daquelas escolas. Eles seriam os responsáveis por utilizar o projeto como parte das suas disciplinas, colaborando com os estudantes na produção e motivando a participação efetiva na ação. Mas esse envolvimento foi pequeno, pois os professores já apresentavam uma agenda cheia e a participação no projeto seria um trabalho a mais, que foi logo deixado de lado. 3.6 O LIVRO: RESULTADO FINAL DAS OFICINAS Como já foi dito, todo o esforço terá como produto final um livro, com as narrativas feitas pelas crianças e adolescentes e deverá ser lançado nas comunidades em uma sessão de autógrafos com seus autores e se tornará um lugar de memória sobre as ações do Terra Mais Igual nos bairros e comunidade, marcando e propondo a existência de uma nova via de comunicação além da massiva. O livro é visto, nesse sentido, como uma atividade de qualificação e empoderamento dos autores dos textos como atores sociais multiplicadores e fomentadores de novas iniciativas na área de comunicação nos bairros da poligonal. Vale ressaltar que a proposta foi realizada pela primeira vez na poligonal 11 como piloto e deve ser replicada em outras áreas atendidas pelo programa. 3.7 GRAVAÇÃO DO AUDIO DA LEITURA DE TEXTOS O projeto incluiu, ainda, a gravação de alguns textos produzidos. Essa gravação foi feita no laboratório de rádio do curso de Comunicação Social da Faculdade Estácio de Sá de Vitória. A idéia é que o material gravado em estúdio seja editado e distribuído com o livro. O CD pode ser usado nas escolas, em programas de rádio comunitária e ainda serve como instrumento de inclusão social de deficientes visuais. Durante as oficinas, também foi produzido um programa de rádio a partir de uma entrevista coletiva feita pelos participantes a uma técnica do Terra Mais Igual. Essa gravação deve entrar no mesmo CD. Essas gravações foram importantes por terem proporcionado a experimentação da mídia. A experiência de falar e se ouvir foi um um misto de vergonha, orgulho, medo, receio e coragem. Se no início era difícil convencer os alunos a gravar, no fim o difícil foi fazê-los ouvir que o tempo estava esgotado. O mergulho na experimentação incentiva o desejo pela experiência das múltiplas possibilidades de construção discursiva. 5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BARBOSA, Marialva. Imprensa, poder e público: os diários do Rio de Janeiro – 1880-1920. 1996. Tese (Doutorado em História) - Programa de Pós-graduação em História da Universidade Federal Fluminense, Niterói, 1996. DUVIGNAUD, Jean. “Prefácio”. In: Memória Coletiva. São Paulo: Vértice, 1990. FOUCAULT, Michel. A ordem do discurso. São Paulo: Loyola, 2000. HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. São Paulo: Vértice, 1990. LIMA, Rafaela. Visibilidade no espaço público e metodologias participativas: os princípios da comunicação comunitária. [on line] Disponível na internet http://www.aic.org.br/metodologia/principios_da_comunicacao_comunitaria.pdf. via Última atualização em 2 de maio e 2007. MARTINUZZO, José Antônio. Projeto Terra – Vitória para todos. Vitória: Prefeitura Municipal de Vitória, 2002. PINTO, Milton José. Comunicação e Discurso. São Paulo: Hacker Editores, 2002. RIBEIRO, Ana Paula. A história de seu tempo: a imprensa e a produção de sentido histórico. Rio de Janeiro, dissertação de Mestrado em Comunicação defendida na ECO/UFRJ, 1996. RICOEUR, Paul. Tempo e Narrativa (tomo I). Campinas, São Paulo: Papirus, 1994. THOMPSON, John. Ideologia e cultura moderna:teoria social crítica na esfera dos meios de comunicação de massa. Tradução sobre o grupo de ideologia, comunicação e representações sociais da pós-graduação do Instituto de Psicologia da PUCRS. Petrópolis: Vozes, 1995.