EXERCÍCIO DE SENTENÇA EXCLUSIVAMENTE PRODUZIDO PARA O CURSO DE SENTENÇA CCT: Na data de 30/10/13, foi protocolada a seguinte petição inicial, distribuída para a Vara K de Curitiba: Maicon Jéquisson propôs ação trabalhista em face de Taxis do Marcão, qualificação desconhecida, a ser citado no endereço Rua X, cidade de Curitiba. Afirma que: − trabalhou como motorista de taxi na cidade de Curitiba, entre 10/05/2008 e 15/08/2013, mas não teve CTPS assinada; − já trabalhara anteriormente por mais de 6 anos em oficina mecânica, da qual foi dispensado; − dirigia o taxi no turno da noite, normalmente das 18h às 6h, todos os dias da semana; − recebia 30% do valor bruto auferido por corrida, realizando o acerto de contas ao final de cada período de trabalho. Em média, obtinha R$ 1.000,00 mensais; − em uma oportunidade foi chamado de “capivara sem vergonha” por um passageiro que se irritou sem razão, quando percebeu que o autor usava bandeira 4 em uma corrida noturna para o aeroporto. Como o empregador é responsável pelo meio ambiente de trabalho, deverá ser responsabilizado pelos danos morais. − foi dispensado sem nada receber, logo após sofrer acidente de trabalho. Restaram devidos saldo salarial, aviso-prévio, gratificação natalina e férias proporcionais, e multa do FGTS; − o acidente consistiu em atropelamento de um cavalo, que resultou na morte do animal. O autor quebrou um dente incisivo superior; − embora não tenha perdido aptidão para o trabalho de motorista, não mais pode trabalhar em shows de descascar cocos com a boca, o que fazia diariamente na praça Osório e lhe rendia R$ 200,00 semanais; − sua capacidade de mordida também lhe rendia gorjetas extras no taxi, pois abria garrafas e entortava pregos para entreter os passageiros, em uma média de R$ 50,00 por dia; − quando da dispensa foi chamado de “ex-dentuço barbeiro” pelo Sr. Marcos, que fora atender o acidente. Na oportunidade, teve sua CNH retida pelo empregador, ao argumento de que devolveria quando fosse ressarcido das despesas causadas pelo autor. A ação do empregador vem lhe causando danos materiais, pois não consegue trabalhar. Pugna pela antecipação dos efeitos da tutela para a devolução do documento; − nunca gozou férias; − não recebia gratificação natalina no final do ano. Reclama: 1. Declaração de vínculo de emprego, com a consequente anotação do trabalho em sua CTPS, observando-se a projeção do aviso-prévio. Se não reconhecido, pleiteia a remuneração da noite de trabalho anterior ao acidente na condição de autônomo; 2. Integração das gorjetas na remuneração mensal do autor e sua utilização como base de cálculo das parcelas salariais abaixo postuladas. 3. Saldo salarial do dia do acidente. 4. Aviso-prévio indenizado proporcional ao tempo de serviço. 5. Férias com terço e 13º salário proporcionais, observada a projeção do aviso-prévio. 6. Férias integrais em dobro, com o terço e gratificações natalinas. 7. Horas extras excedentes da 8ª diária e 44ª semanal, com adicional de 50% e 100% aos domingos, reflexos em repouso semanal remunerado e feriados. Essas horas, com os reflexos em RSR, devem gerar reflexos em férias com terço, 13º salário (de todo o período) e aviso-prévio. Sobre tudo, deve incidir FGTS. CCT – Curso Presencial de Sentença Trabalhista - Prof. Daniel Lisboa www.carreirastrabalhistas.com.br Exercício de Sentença produzido exclusivamente para o curso CCT Reprodução desautorizada 8. Adicional noturno, com repercussões nas verbas apontadas no item acima, inclusive em horas extras, devendo ainda ser observada a hora reduzida. 9. Uma hora intervalar por dia trabalhado, com os mesmos adicionais e reflexos acima. 10. FGTS devido do período contratual e sobre todas as verbas salariais postuladas com sua indenização compensatória de 40% e expedição de guias para levantamento, sob pena de multa a ser estipulada pelo Juízo sem prejuízo do pagamento direto dos valores. 11. Indenização pelo não gozo do seguro-desemprego. 12. Indenização pelo não percebimento do abono anual do PIS nos anos em que laborou, ante a não comunicação da existência do contrato aos órgãos competentes. 13. Multas dos arts. 467 e 477 da CLT. 14. Dobra dos DSR e feriados. 15. Pagamento dos DSR e feriados não gozados. 16. Compensação por danos morais em face de não anotação de sua CTPS e das ofensas sofridas. 17. Declaração de que sofreu acidente de trabalho, com pagamento de indenização por danos morais e materiais decorrentes. 18. Indenização adicional de 20% a fim de cobrir os honorários contratuais devidos pelo autor ao seu causídico, observando-se o para tanto o princípio da restituição integral e a evidente necessidade de contratação de um advogado ante a complexidade da demanda. 19. Expedição de ofícios à PFN, SRTE, MPF e CEF por conta do vínculo de emprego sem o devido reconhecimento. 20. Juros moratórios e compensatórios, desde a origem dos créditos na forma do Código Civil, aqueles devidos pelo atraso e esses decorrentes da impossibilidade de o autor contar desde logo com seus haveres e lucrar com isso. 21. Correção monetária pela taxa SELIC ou, alternativamente, IGPM, considerando-se a manifestação do STF sobre a inconstitucionalidade da TR como taxa de reconstituição patrimonial. Requer juntada de notas fiscais e recibos emitidos no taxi no período, sob pena de confissão. Requer a condenação dos réus em honorários advocatícios e custas do processo, que o IR seja calculado pelo regime de competência, a produção de todas as provas admissíveis em direito. Deu à causa o valor de R$ 100.000,00 para fins de alçada. Juntou vídeo de reportagem da TV local em que aparece fazendo seu show, fotos de sua arcada dentária atual, em que falta o dente mencionado na inicial e contrato de honorários advocatícios no valor de 20% sobre o valor líquido devido, com expressa cláusula de que não seriam devidos em caso de deferimento de honorários de sucumbência. Citado o sr. Marcos Bandeira no endereço informado na inicial. Em audiência inicial compareceu o sr. Marcos Bandeira, desacompanhado. Ante a exaltação dos ânimos das partes, na medida em que o autor contestava em altos brados qualquer manifestação do réu, que lhe respondia a altura, compreendeu o Juiz deferir prazo de 05 dias para apresentação da defesa, com protestos do procurador do autor, que pugnou pela aplicação dos efeitos da confissão ficta. O juiz determinou, outrossim, que o réu devolvesse a CNH do autor, no prazo de 48h, sob pena de multa diária de R$ 100,00, até o limite de R$ 3.000,00. Apresentada contestação em Secretaria, esta alega: − desconhece a empresa “Taxis do Marcão”. Compareceu para defender-se apenas porque é proprietário de um único taxi e já teve relação comercial com o autor. É, pois, parte ilegítima, pois não há requerimentos contra si, pessoa física; CCT – Curso Presencial de Sentença Trabalhista - Prof. Daniel Lisboa www.carreirastrabalhistas.com.br Exercício de Sentença produzido exclusivamente para o curso CCT Reprodução desautorizada − incompetência material para o pedido de pagamento de verbas decorrentes de contrato de trabalho autônomo do autor; − o autor era motorista autônomo, com contrato regido pela lei 6.094/74, por isso os pedidos são juridicamente impossíveis; − há prescrição a ser declarada; − o autor era responsável por dirigir o taxi do contestante, no turno da noite. Pegava o carro na casa do réu, das mãos de Jarbas, outro motorista autônomo que é responsável pelo taxi no período diurno. Na ocasião, diariamente, havia o acerto de contas, com pagamento de 30% do valor bruto das corridas, no valor médio de R$ 900,00; − nunca foi informado pelo autor de que esse se faria substituir ou que não laboraria em algum dia, mas se o fizesse, não haveria qualquer problema; − o autor laborava em média das 20h às 7h, todos os dias, externamente e sem qualquer controle; − o réu era responsável pelas despesas do veículo; − por esses motivos, não faz jus aos pleitos decorrentes da legislação trabalhistas, ante a contratação autônoma na forma regida pela citada norma; − não houve acidente de trabalho pois não há relação de emprego. O autor atropelou um cavalo quando descascava um coco com a boca enquanto dirigia o veículo na Av. das Torres. Como o autor não se machucara na ocasião, apenas quebrando um dente, não houve atendimento médico. Apenas afirmou o réu que não devia mais comparecer na empresa pois havia desrespeitado regras de trânsito que deveria conhecer como motorista profissional, sem ofendêlo. Esse fato, se eventualmente for reconhecido o vínculo de emprego, é evidente justa causa do empregado; − já havia alertado o autor algumas vezes que seu costume de entreter os passageiros com suas habilidades era indevido e contra a lei de trânsito. Mas já havia muito tempo que não tinha notícia de que tais fatos ocorriam em seu taxi; − não faz jus o autor a décimo terceiro salário, mesmo que reconhecida a relação de emprego, que aduz para argumentar, porque no mês de dezembro o taxi roda em bandeira 2 direto, o que dobrava o rendimento e, assim, as comissões; − em relação ao pleito alternativo, opta pelo IGPM, mas aponta que deve prevalecer a TR por disposição legal, caso condenado a alguma verba, o que aponta apenas por argumento; − requer aplicação de multa por litigância de má-fé em relação ao acidente de trabalho, de que deu causa o autor, e indenização pelo mesmo fato, no valor de R$ 1000,00, seus gastos com honorários contratuais advocatícios. Apresentada reconvenção em Secretaria, esta alega: − sofreu prejuízos de R$ 15.000,00 decorrentes do acidente, para conserto do veículo e lucros cessantes pelos 10 dias em que ficou o veículo parado. Requer indenização dos valores; − foi obrigado a pagar R$ 5.000,00 para o dono do cavalo, a título de indenização. Requer indenização do valor; − como protetor de animais, Marcos pagou despesas para funeral e cremação do cavalo atropelado, no importe de R$ 1.000,00. Requer indenização do valor. − requer honorários advocatícios; Deu à causa o valor de R$ 15.000,00 Juntou: − contrato de prestação de trabalho autônomo, com cláusula que consta como hipótese para rescisão, entre outros, o desrespeito a legislação de trânsito, bem como obrigação de ressarcimento por danos decorrentes de culpa ou dolo; CCT – Curso Presencial de Sentença Trabalhista - Prof. Daniel Lisboa www.carreirastrabalhistas.com.br Exercício de Sentença produzido exclusivamente para o curso CCT Reprodução desautorizada − nota fiscal de oficina que consta despesas de R$14.000,00 para conserto de lataria de veículo e 10 dias entre a entrada e saída; − nota fiscal de pet shop no importe de R$ 1.000,00 pelas despesas de “funeral para cavalo luxo” e cremação; − contrato de honorários advocatícios no valor de R$ 1.000,00 para defesa na presente demanda. Em audiência em prosseguimento, 15 dias depois da anterior, o procurador do autor requereu prazo para manifestar-se sobre a defesa. Apontou que não fora intimado para tanto. O juiz deferiu o requerimento, sob protestos do procurador do réu, que disse tratar-se de manobra porque as testemunhas da parte adversa não se faziam presentes e não havia prova de convite. Em impugnação à contestação, reportou-se à inicial e requereu declaração incidental de nulidade do contrato de trabalho autônomo juntado pelo réu, porque ilícito. Quanto à reconvenção aduziu ausência de nexo causal entre todas as despesas narradas e o fato, porquanto realizadas por iniciativa do empregador. Passados mais 30 dias, nova audiência em prosseguimento, em que foram colhidas provas orais: Depoimento do autor: sempre foi muito orgulhoso da fama de sua mordida, mas agora encontra-se deprimido, pois não conta mais com suas habilidades desde o acidente; trabalhava das 18h20min até as 06h30min, todos os dias; nunca faltou ou pediu para se fazer substituir, razão pela qual não sabe afirmar se poderia mandar outro no lugar ou faltar; não tinha ponto definido; não tinha meta; fazia apenas um lanche, por 20min, durante a madrugada; em uma ocasião conheceu uma moça no início do expediente e passou a noite conversando; na oportunidade não fez corridas e não recebeu nada; não sofreu punição pelo fato, a não ser o que deixou de ganhar; não estava abrindo garrafas com a boca para impressionar o passageiro na hora do acidente; seus shows na praça lhe rendiam fama e dinheiro, em uma média de R$ 200,00 por semana; também recebia gorjetas de passageiros que pediam para demonstrar suas habilidades; só fazia demonstrações no taxi se pedissem; deixava ligado um DVD com gravação de seu show durante as corridas, pois, além de vendê-los, sonhava em ser “descoberto” e ir no Faustão; ganhava dobrado em dezembro. Depoimento de Marcos: não tem empresa; tem a concessão de um taxi; há adesivo no taxi com o nome Taxis do Marcão, mas o plural é para impressionar; não dirige o taxi, apenas administra; o acerto com o autor é praxe com qualquer pracista, é o mesmo de Jarbas, o outro motorista do taxi, e consiste em 30% da renda do carro, acertado diariamente ao final do período; o horário do autor é acertado diretamente com Jarbas, mas normalmente vai das 20h às 7h; depois de uma reclamação de um cliente, disse para o autor parar de gracinhas no taxi, e não mais soube de o autor realizar performances enquanto dirigia; pagou o valor do cavalo e do funeral para não dar problema na Justiça; não chamou o autor de nada quando do acidente; disse “ex-dentuço barbeiro” ao telefone, quando contava o caso à sua mulher, longe do autor; se esse escutou é porque estava bisbilhotando seu telefonema; o autor podia acertar diretamente com Jarbas ou outro motorista se não pudesse trabalhar, mas nunca ocorreu; não emitem nota, mas sim um recibo carbonado para cada corrida. Testemunha Jarbas, convidada pelo autor: é condutor autônomo de taxi; tem muitos amigos que laboram nas mesmas condições; o horário do dia é das 6h às 18h, sendo esse o horário em que pega e devolve o veículo; sabe que o autor ganhava muitas gorjetas por ser extrovertido e fazer demonstrações de habilidades, mas não pode precisar o valor nem a qual habilidade se refere. Testemunha Jorge, convidada pelo réu: é PM e atendeu a ocorrência; havia cascas de coco por todo o CCT – Curso Presencial de Sentença Trabalhista - Prof. Daniel Lisboa www.carreirastrabalhistas.com.br Exercício de Sentença produzido exclusivamente para o curso CCT Reprodução desautorizada carro; o autor estava com um coco semi-descascado nas mãos quando chegou; também tinha um dente quebrado; a direção do veículo tinha profunda marca no local em que o autor bateu a boca; o passageiro do veículo estava indignado porque o motorista ficava fazendo show e oferecendo DVD enquanto dirigia, mesmo após ter pedido que parasse, pois causaria um acidente, como ocorreu; não multou o autor porque não presenciou o fato, mas descascar cocos com a boca seria conduta passível de autuação; por um lapso, a CNH do autor ficou com o depoente, e atualmente encontra-se nos achados e perdidos do batalhão. Razões finais remissivas com renovação de protestos por ambas as partes. O procurador do autor requereu, ainda, a execução das astreintes ante o descumprimento da determinação havida em antecipação de tutela. Conciliação recusada. O procurador do réu pede a palavra e afirma que o processo é nulo porque não realizada tentativa conciliatória inicial. Audiência adiada sine die. RELATÓRIO DISPENSADO. CCT – Curso Presencial de Sentença Trabalhista - Prof. Daniel Lisboa www.carreirastrabalhistas.com.br Exercício de Sentença produzido exclusivamente para o curso CCT Reprodução desautorizada