A Manifestação da Histeria e a Estética do Corpo Feminino na Atualidade: um Estudo Psicanalítico RESUMO O objetivo deste é identificar e analisar o Pathos na mulher atual em sua relação com a imagem corporal e a busca compulsiva por escolhas de torná-las perfeitas. Freud (1930) afirmava “que a valorização da estética em relação à vida oferece pouca proteção contra o sofrimento psíquico, como a histeria feminina”. É preciso entender por que a histeria está ativa nos debates da saúde e causando reações adversas no contexto sociocultural. Vivemos na cultura do imediatismo, da tecnologia a serviço dos desejos, buscando respostas rápidas no campo da beleza. O presente estudo foi realizado por meio de uma pesquisa bibliográfica, de base psicanalítica, especificamente nos textos freudianos e de seus comentadores e com a contribuição da Psicopatologia Fundamental. Conclui-se que o culto à beleza excessiva oferecido pela sociedade ocidental é causador de sintomas, postulando uma desordem do Eu em forma de conversão histérica levando a compulsão e repetição, dispondo assim, de uma incompletude inerente a todo ser vivente. Autora: Irajara Lacerda Santana *1 Psicóloga Graduada pela Universidade da Amazônia- UNAMA. CRP nº: 03944. Pós-Graduanda Lato Sensu em Psicologia Jurídica- UNAMA. [email protected] Autora: Marlene da Costa Frota *2 Psicóloga Graduada pela Universidade da Amazônia- UNAMA. CRP nº: 03976. Pós-Graduanda Lato Sensu em Psicologia Clínica de Base Psicanalítica- EPA/INSTITUTO INVESTY. [email protected] Co-autora: Elizabeth Samuel Levy *3 Psicanalista, Mestre em Psicologia (UFPA), Professora Adjunta VI da Universidade da Amazônia- UNAMA, Pesquisadora do Laboratório de Psicanálise e Psicopatologia Fundamental da UFPA, Pesquisadora do CNPQ nº 402524/2010-1 Membro do Núcleo de Estudos Freudianos ligado ao Círculo Psicanalítico de Minas Gerais. [email protected] Palavras Chave: Histeria feminina, Pathos, Sintoma. 1. INTRODUÇÃO SOBRE A HISTERIA FEMININA 6. DESAMPARO E SUBJETIVAÇÃO FEMININA O ser humano está sempre se deparando com suas faltas, com a incompletude que o constitui e com as restrições impostas pela civilização. Está sempre vivendo a ilusão de satisfação plena de seus desejos, deste modo, o sujeito tenta escapar e buscando saídas, sendo que o sofrimento psíquico comparece nas mais diversas manifestações psicopatológicas da subjetividade. Freud (1927) faz uma reflexão em seu texto “O Futuro de uma Ilusão” sobre o destino da civilização. Freud ao versar no texto (1930, p. 102) “O Mal-Estar na Civilização”, destaca que a valorização da “estética em relação ao objetivo da vida oferece pouca proteção contra a ameaça do sofrimento psíquico”. Freud (1895) pontua que é pela vivência de satisfação primitiva que confere ao bebê a dependência ao Outro, logo somente pela falta que virá o desejo. Portanto, o “organismo humano é, a princípio, incapaz de promover ações específicas, sendo que estas serão realizadas por uma pessoa experiente, que através da comunicação, transparece o desamparo como fonte de fatores morais” (p. 336). O Desamparo é de suma importância para o processo de organização psíquica, uma vez que, embasa toda a estruturação subjetiva. Assim, quando o sujeito está na condição de Desamparo o Outro garante suas necessidades vitais de ser amado, que acompanhará o sujeito durante o percurso de sua vida. (LEVY, 2008). 2.A SEXUALIDADE FEMININA EM FREUD Freud (1931) em seu texto “A Sexualidade Feminina”, ressalta a intensa ligação pré-edipiana entre a menina e sua mãe, perpassando pela fase que corresponde ao Complexo de Édipo, uma vez que, a criança está ligada ao genitor do sexo oposto, logo sua ligação com o do mesmo sexo é baseada em uma relação de hostilidade, a mãe é a primeira relação objetal que permeia a criança nos seus primeiros anos de vida. A Psicanálise nos ensina a lidar com uma libido única, a qual, é verdade, possui objetivos ativos e passivos. Deste modo, a sedução torna-se familiar, da mesma maneira que as crianças descobrem as diferenças entre os sexos, ou seja, tudo isso pode impulsionar o desenvolvimento sexual da criança e direcioná-la para o processo de maturidade. (FREUD, 1931, p. 276 e p. 278). 7. O QUE TORNA DETERMINANTE PARA O PROCESSO DE ADOECIMENTO DAS HISTÉRICAS O quadro clínico da Histeria é construído mediante a passagem da criança pelo Complexo de Édipo, desta forma o bebê será caracterizado por uma estrutura psíquica que o determinará enquanto sujeito. A Histeria é uma estrutura neurótica que tem como defesa um trauma preso no Inconsciente, que se converte em um sofrimento somático, ou seja, tudo por que um excesso de energia psíquica passa para o somático, se fixando em uma zona do corpo. Na neurose de conversão o sujeito não ultrapassa a fase fálica, permanecendo em uma completa insatisfação. (NASIO, 1991). A neurose histérica é provocada pela inabilidade com que o eu pretende neutralizar a representação sexual intolerável, enquanto essa representação dolorosa é mantida à distância, ou seja, recalcada, o Eu conserva em si um trauma psíquico interno e latente, assim, o que adoece o histérico não é tanto o vestígio psíquico do trauma, mas o fato de esse vestígio, sob pressão do recalcamento, ser sobrecarregado de um excedente de afeto que em vão pretende se escoar. (NASIO, 1991, p. 28). 3. O PATHOS NO DISCURSO FEMININO NA CONTEMPORANEIDADE A insatisfação é uma característica que gera sofrimento psíquico no sujeito histérico, no entanto, antes de falarmos de sofrimento psíquico, é necessário enfatizar o lugar da Psicopatologia para revelar o sentido de tal sofrimento. A Psicopatologia Fundamental vem significar “um discurso, um saber (Logos), sobre uma paixão (Pathos), da alma (Psiquê), ou seja, um discurso sobre o sofrimento psíquico”. (CECCARELLI, 2005). Trata-se do sujeito acometido pela paixão, isto é, padecendo de algo cuja origem o mesmo desconhece. 4. O SOFRIMENTO PSÍQUICO E TRANSTORNOS ALIMENTARES: ANOREXIA E BULIMIA O sintoma é tudo que nos trás desconforto, que causa desprazer no sujeito, ou seja, gerador de sofrimento psíquico. Assim, o “sintoma é um fenômeno subjetivo advindo de um conflito inconsciente, possui um motivo e um propósito, ambos desconhecidos pela pessoa acometida, isto é, são determinados segundo a história de vida do sujeito”. (FREUD, 1916-17 apud OCARIZ, 2000, p. 37). A Anorexia e a Bulimia são Transtornos Alimentares, cujos sintomas perpassam pela oralidade, usualmente relacionados com a Histeria. Neste sentido, “a relação com a alimentação é uma luta ativa contra um desejo de se apropriar daquilo que lhes falta, um desejo de se preencher sem restrição, lutando pela conduta oposta de privação”. (URRIBARRI, 2008, p. 37). O quadro de anorexia pode ser classificado de três formas, a Anorexia restritiva, a Anorexia nervosa e a Anorexia purgativa. A Bulimia é caracterizada por uma compulsão alimentar, acompanhada por comportamentos compensatórios inadequados, tais como o vômito auto-induzido, mal uso de laxantes e diuréticos, jejuns ou exercícios físicos excessivos, sem que se evidencie uma perda de peso tão significante como ocorre na Anorexia. (SEVERIANO; RÊGO; MONTEFUSCO, 2010). 8. A CONTRIBUIÇÃO DA PSICOPATOLOGIA FUNDAMENTAL NA REESTRUTURAÇÃO DO EU A Psicopatologia é de fundamental importância para compreender e elaborar o sofrimento psíquico dos sujeitos, pois a Psicanálise buscará junto aos pacientes elementos que desvele a patologia que ora surge pelo discurso do Inconsciente. Com a Psicopatologia escutar o Pathos tornou-se uma alternativa de ressignificara angústia, o Desamparo perante o sofrimento psíquico. Portanto, é necessário “transformar o Pathos em experiência, não apenas como um estado transitório, mas, sobretudo, como algo que enriquece o pensamento”. (BERLINCK, 1998 apud CECCARELLI, 2005, p. 374). 9. A PSICANÁLISE E SUA CONTRIBUIÇÃO As tecnologias ofertadas em nossa sociedade atual avançam a cada dia e com ela o sujeito também é afetado. As mulheres no contexto atual estão buscando novas alternativas para expor o que mais lhe causa desconforto, o corpo. Portanto, o corpo é sempre visto como algo idealizado, que sempre requer reparos, mas o que está deixando muitas mulheres escravas do corpo é o fato da cultura privilegiar um modelo padrão, ou seja, belo, assim, a insatisfação carrega consigo a angústia por não ter o gozo da perfeição, logo, estas mulheres estão adoecendo psiquicamente. É neste cenário que a Psicanálise pode contribuir, pois muitas mulheres não se dão de conta que o sofrimento da falta está instalado e é inerente ao sujeito. Então, para atenuar os sintomas no corpo, a Psicanálise se oferece para escutar o sofrimento psíquico do sujeito, para que este possa simbolizar suas dores, transformando a posição de desconforto em experiência subjetiva. A escuta do Pathos, propicia mediante o processo analítico, um mergulho na sua singularidade fundamental, para que o paciente se dê conta de seus sintomas, convertendo dor em palavras. (FREUD, 1930). CONSIDERAÇÕES FINAIS 5. O MAL-ESTAR EM FREUD, NA CULTURA DO IMEDIATISMO. O mal-estar causado pela familiarização patológica em grande escala, sobre a barreira “entre o Eu e o mundo externo é um fator incerto”. Observamos que as fronteiras do Eu não são eternas e “até mesmo o sentimento referente o nosso Eu está sujeito a conflitos”. (FREUD, 1930, p.75). BIBLIOGRAFIA CECCARELLI, Paulo Roberto. O Sofrimento Psíquico na Perspectiva da Psicopatologia. Psicologia em Estudo. Maringá, v. 10, nº. 3, 2005. FREUD, Sigmund. (1927). O Futuro de uma Ilusão. Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas, v.21. Rio de Janeiro: Imago, 1974. ______________. (1930). O Mal-estar na Civilização. Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas, v. 21. Rio de Janeiro: Imago, 1974. _______________. (1888). Histeria. Sobre o mecanismo Psíquico Histérico: uma conferência. Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas, v. 1. Rio de Janeiro: Imago. ______________. (1931). A Sexualidade Feminina. . Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas, v.21. Rio de Janeiro: Imago, 1974. ______________. (1895). Projeto para uma Psicologia Científica. Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas,v.23. Rio de Janeiro: Imago, 1974. LEVY, Elizabeth Samuel. “Desamparo, Transferência e Hospitalização em Centros de terapia Intensiva”. Belém, 2008. 108 f. Dissertação (Mestrado em Psicologia) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas – Programa de Pós – Graduação, Universidade Federal do Pará. NASIO, Juan-David. A Histeria: teoria e clínica psicanalítica. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed, 1991. OCARIZ, Maria Cristina. A Clínica conta História: o sintoma para além da significação. São Paulo: Escuta, 2000. SEVERIANO, Maria de Fátima Vieira. RÊGO, Mariana Oliveira do. MONTEFUSCO, Érica Vila Real. O corpo idealizado de consumo: paradoxos da hipermodernidade. Ver. Mal-Estar Subj. Vol. 10, nº 1, Fortaleza, Mar. 2010. URRIBARRI, Rodolfo. Anorexia e Bulimia. São Paulo: Escuta, 2008. Na compreensão deste estudo, sobre as mais diversas manifestações dos sintomas da insatisfação na Histeria feminina, pontuado pelos conceitos primordiais de Freud, fica aqui estabelecido que, na cultura do imediatismo os padrões que vislumbram o corpo ficam distorcidos mediante o desconforto subjetivo do ser humano, retratado pela Angústia e Desamparo. De acordo com o mal-estar vivenciado pelas mulheres no século XXI, os padrões de beleza trazem complicações psicopatológicas que no contexto da Psicanálise são postulados como traços marcantes de uma desordem na oralidade, como a Anorexia, Bulimia e a Obesidade.