CENTRO HISTÓRICO EMBRAER
Entrevista: José Eduardo Teixeira Barbosa
São José dos Campos – SP
Abril de 2011
Apresentação e Formação Acadêmica
Meu nome é José Eduardo Teixeira Barbosa, sessenta e três anos, nasci em
Ubá, Minas Gerais, fica perto de Juiz de Fora, uns cem quilômetros de Juiz
de Fora. Sou casado, duas filhas, moro em São José (São José dos Campos)
desde 69, no início das atividades da Embraer. Sou engenheiro, fiz
engenharia civil. Eu vim para São José em 69, na verdade eu vim aqui
visitar uma irmã, que tinha nascido uma sobrinha, e lá pelas tantas me
convidaram “Vamos conhecer o PAR (Divisão de Aeronaves)”, na época era
o CTA (Centro Técnico Aeroespacial) – eu vim aqui..., em Juiz de Fora eu
era desenhista, eu gostava muito de desenho, de caricaturas, geometria
descritiva,
perspectiva
etc.
e
aí
eu
encontrei
o
Guido
(Guido
Pessotti)...”Então, você vem trabalhar aqui conosco...”, e eu nunca imaginei
que eu viria... “Mas como assim?”, “Nós estamos precisando de desenhista
aqui, estamos precisando muito...” – isso em 69 – “Então, você vem para
cá...”, “Então quando é que eu começo?”, “Semana que vem você já pode
começar...”, eu falei “Ai meu Deus do céu!”. Aí chegar em Juiz de Fora –
morava nessa época em Juiz de Fora – e contar para a namorada que eu
teria que mudar em uma semana.
Trajetória na Embraer
Claro que para você passar quarenta e dois anos numa empresa você não
pode ficar numa área só, mesmo porque o que você ganha com isso na
verdade você tem aí três anos de experiência e depois a coisa começa a
repetir, então se você não muda de área você não acrescenta nada na sua
experiência. Então, quando se fala em quarenta e dois anos na Embraer, se
você considerar que cada área, as atividades, empresas – como se fossem
empresas diferentes – isso não é um tempo muito longo não, a Embraer
tem ainda muito mais áreas para caminhar, para aprender, não é?
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Mas como eu disse, eu comecei na parte de desenho de projeto e tal... E
projeto e normas, normatização técnica é muito próxima, então a gente
sentia, naquela época, uma falta muito grande de padronizar o projeto
mesmo, então naquela época a norma era muito, muito importante, nós
fazíamos um trabalho de “ok” como é..., o que é que precisávamos
padronizar no desenho, no projeto mesmo, e aí fazia toda aquela pesquisa,
manuais, normas mil, etc, e nós criamos aquelas normas Embraer, NE que
chamava... Então, até o procedimento de desenho como é que corta, como
é que faz uma apresentação do desenho, como é que você corta bloco de
título, então tudo isso aí tinha que ser padronizado, nós começamos a
Embraer de nada, do zero. Então, você pegava um desenho, você tinha
uma folha... “Está bom, o que eu ponho aqui, como é que eu corto...”, não
podia
cada
um
fazer
da
sua
maneira.
Então,
o
início
nosso
de
normalização..., esse foi um trabalho que eu entrei de cabeça, fiz um pouco
de carreira dentro da Embraer nessa parte de normatização técnica e ela foi
muito importante naquela época.
Em seguida, uma vez que eu estava trabalhando em norma, escrevendo
norma etc., naturalmente, pela maneira de escrever, pela organização de
normas etc. eu fui levado, fui convidado também quando a Embraer falou
“Ok, agora nós já sabemos fazer..., estamos bem na parte de normatização
técnica, agora nós precisamos organizar a Embraer, do ponto de vista de
organização, de processo...”, então aí eu fui convidado para ir para
Organização e Método. Na verdade, nós criamos uma área de informática,
que era o Cássio Toledo, na época foi o primeiro gerente de informática, aí
veio o pessoal todo trabalhar comigo o Emílio (Emílio Matsuo), o Cid
(Ladislau Cid) todo aquele pessoal lá que nós montamos, uma equipe que
estamos até hoje, tenho uns amigos desde aquela época. Aí montamos uma
área de Organização e Método e como nós tínhamos consultores externos, o
Sérgio Binder, não sei se... da época, mas a metodologia, como é que nós
deveríamos abordar, como deveríamos definir o organograma na empresa,
então isso tudo para gente..., e quais eram os sistemas de suporte de
informática que deveriam suportar essa organização. Então, isso aí tudo nós
começamos do zero, a Embraer não tinha nada e outra, não era só a
Embraer, era o Brasil que estava totalmente deficiente.
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Muito bem, aí começamos a desenvolver os sistemas de produção, como é
que a produção tem que fazer o planejamento da produção, o controle da
produção, a emissão das ordens de fabricação, o apontamento de mão de
obra, os custos, então isso tudo nós já puxamos, montamos todos os
sistemas para suportar a Embraer nessa atividade, só que aconteceu um
problema complicado: nessa época nós estávamos trabalhando na nossa
igrejinha, pensando em quando o terminal chegar – o terminal ainda não
tinha chegado - e aí agora vamos implantar essa encrenca... quando nós
chegamos na produção para implantar o sistema de computador, ele não
teve uma boa aceitação, por quê? É natural, a Embraer já tinha aquela
cultura das áreas supervisoras “Opa, espera aí, aqui quem conhece essa
área aqui sou eu, aqui não...”, e quem sabe qual é a ordem de fabricação
que deve ser feita... essa, depois dessa e os sistemas eram pessoas
dedicadas, pessoas que tinham valor, mas a cultura..., nós queríamos
alguma coisa mais dinâmica, mais moderna, etc, e esse pessoal não
deixava avançar. Para se ter uma ideia, por exemplo, para se achar uma
ordem de fabricação na fábrica se dizia se existia a famosa roleta, era uma
roleta mesmo na sala e você ia colocando cartão e ia andando e tal e para
conseguir achar uma ordem de fabricação na fábrica você tinha que ir à sala
do supervisor, talvez preencher um formulário, ia lá e identificava, era um
negócio horroroso. Bom, e aí implantamos o sistema, botamos o terminal
na fábrica e o terminal vivia desligado por que..., aí quando o chefe “Tem
que usar o terminal...” e o terminal passava a concorrer com o sistema
manual, então..., é claro, se você tem um sistema mecanizado e um
manual e você só usa o manual, a hora em que você vai consultar alguma
coisa, você está completamente fora, desatualizado porque o que vale é
esse aqui, e o negócio não andava e tal. E nessa época tinha um gerente
de... – nessa época a Embraer, a estrutura dela você tinha diretoria, a
gerência e o chefe de seção, só isso -, mas o Juarez Wanderley – era muito
amigo, gostava muito do Wanderley, Juarez – ele era o gerente da
produção e ele falou “Bom, como é que eu vou fazer entrar o computador
aqui?”, não tinha jeito, eram reuniões, os supervisores não aceitavam e
aquela..., “Bom, só tem uma maneira, você que trabalhou no sistema lá,
para a produção vai implantar esse negócio na fábrica...”, aí eu falei “Ai
meu Deus, vou cair no...”, porque uma coisa é você atuar de fora, tentar
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fazer palestra, outra coisa é ser o chefe do cara, dar ordem para ele e
pronto. Bom, e foi assim que eu passei de Informática, de Organização e
Método – na época eu era chefe de seção de Organização e Método – eu caí
na fabricação, eu fui ser o chefe de seção de Planejamento e Controle de
Produção que era em todos os aviões, em toda a...
E foi complicado porque para você impor... eu tinha uma confiança no
sistema, mas existia um risco também do sistema estar errado – em tudo
tem risco -, você chega lá implanta o negócio e o negócio não funciona, aí
você tranca a fábrica... Eu me lembro, as críticas eram um negócio absurdo
e aí eu levei, inclusive, uma fama de um cara meio duro na produção
porque você tinha supervisores que estavam lá vinte anos e mandavam na
área, só eles conheciam, só eles... e você tinha que chegar e falar “Não,
agora vamos fazer um pouco diferente...”, era um horror. Tem uma coisa
muito engraçada..., nós tínhamos o planejamento de ordem de fabricação,
era feito através de fichários, então tinha uma área enorme, uma sala
enorme, muito grande no F30 (hangar F30) que só tinha aquele cardex, a
quantidade de funcionários que tinha lançando..., porque programava uma
ordem de fabricação e tinha que lançar no cardex a quantidade, lançava e aí
tal, tinham as fichas, tudo manual e ali, depois os custos da empresa era
tudo..., aí terminava a ordem ele ia lá lançava quanto gastou, tudo manual
e nós tínhamos um sistema – você chegou a trabalhar nele também – que
computava aquele sistema de mão de obra, que coletava as horas que o
pessoal apontava e ia direto para o computador e tal, mas aquilo não
funcionava porque tinha o danado do cardex. Então, os custos nossos de
produção, ordem de fabricação, de peça, não tinha nada a ver com nada...
Muito bem, aí eu já era o chefe do negócio lá e não tinha jeito de fazer o
pessoal usar o terminal. Bom, o que eu fiz..., eu vim aqui no final de
semana, juntei uma quantidade de gente aqui, limpei a fábrica, sumi com
todos os cardex, não tinha mais nada, quando o pessoal chegou na
segunda-feira que eles olharam aquele negócio “Pô, você está maluco, você
destruiu o histórico da empresa, nada vai funcionar mais...”, foi uma revolta
quase que eu fui crucificado. Aí começamos..., vamos usar o computador,
vamos usar o computador, aí o apoio..., esse é um aspecto muito
interessante dentro da Embraer, o time as pessoas aqui são muito
envolvidas no trabalho.
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Então, foi muito interessante porque nós fizemos uma equipe de trabalho
usando o pessoal que estava no computador, o pessoal que estava... eu lá
na produção, como se fosse um time realmente e conseguimos implantar
toda essa base de computadores, de apropriação de horas, o sistema de
controle de ordem de fabricação crítica ou a parte do estoque do GPA –
antigamente o estoque intermediário de peças não existia, não era
controlado – então, eu me lembro que nós fizemos um trabalho assim
que..., só realmente trabalho de..., eu acho que em três ou quatro dias, nós
colocamos estoque em tudo, era trabalho realmente de... Bom, resultado: a
produção entrou no esquema e hoje em dia não existe a Embraer se não
tiver sistema mecanizado, mas coisas não acontecem assim porque para
você quebrar paradigma, quebrar essa cultura e as pessoas mais antigas, é
um problema por que... é a mesma coisa, hoje eu vejo minha filha mexer
em computador e ela tem muito mais facilidade do que eu, e naquela época
você imagina que o computador chegando e o pessoal que estava lá há
trinta anos fazendo um trabalho manual, esse choque de cultura foi muito
importante. Mas esse trabalho a Embraer administra bem, essa parte aí.
Engenharia Embraer
Antigamente o projeto projetava e aí mandava para a produção, a produção
fazia o processo de engenharia, ia para fabricação, a fabricação fabricava,
está certo? Às vezes tinha uma modificação, a coisa andava até chegar aqui
outra vez, era um pouco complicado. Como é que nós trabalhamos hoje? As
coisas são muito mais integradas, quer dizer, você tem..., coloca todo
mundo numa área com colocalização
que a gente chama e as pessoas
trabalham integradas: a engenharia de produção, a engenharia de projetos,
a qualidade, todo time já debruçado em cima... Então, quando você define
um processo de montagem, como é que vai ser, se vai ser em painéis e a
engenharia já está participando ali, já vê as dificuldades, “Olha, se fizer
assim vai ficar mais pesado porque aqui tem que ter uma emenda, então
vamos aumentar aqui...”, isso já é feito com compromisso através de
inúmeros trade-off que a gente faz “Olha, qual essa solução, opa essa aqui
está boa...”, então aí que a gente parte... e esse processo a gente chama
de Desenvolvimento Integrado do Produto que é o famoso DIP.
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Embraer e Futuro
A Embraer, primeiro existe um lado dentro da Embraer, de trabalhar na
Embraer, que você está em contato com o que existe de mais moderno do
mundo, isso tem um valor..., às vezes, a gente..., lá em 75, lá atrás, eu
tinha um colega meu, um cara muito bom e ele saiu, ele era muito bom
aqui na Embraer, ele saiu e foi trabalhar numas empresas. Aí um dia eu
encontrei com ele “E aí?”, “Cara, você não sabe o quanto a gente sabe por
ter trabalhado na Embraer, você não tem ideia dos problemas que o pessoal
trás aí fora, são coisinhas pequenas daquilo que nós vivemos...”. Então, a
gente não tem, às vezes, essa dimensão, do poder, da capacidade que a
gente tem de venda, de agressividade, de trabalhar em equipe, entende?
Então, o jovem, o que está entrando, ele tem que cultivar esse lado, vamos
dizer assim, esse conhecimento que a Embraer dá para ele. Se um dia, a
pior coisa que pode acontecer é nada, porque se ele sair da Embraer ele vai
levar esse conhecimento, isso aí vai virar spin off em qualquer lugar, em
qualquer indústria que ele for, independe do tempo, ele tem que aproveitar
aqui dentro essa participação, esse conhecimento, porque é muito rico. Nós
temos..., a tecnologia está ao lado da nossa mesa ali, e muitas vezes falta
isso aí, as vezes a gente acha que não, mas só respirar esse envirement,
essa magnetismo que tem da indústria de ponta dos conhecimentos, das
reuniões, isso já é um conhecimento muito grande. Então, eu acho que o
pessoal que está entrando, ele tem que olhar isso aí, não olhar a Embraer,
vamos dizer assim, como um lugar onde ele ganha dinheiro para sustentar
família – está certo, é um lugar onde ganha dinheiro, uma empresa
excelente, te dá apoio, planos excelentes, não tem dúvida -, mas é mais do
que isso, ela é uma escola, e a Embraer tem que ser vista como uma
escola, se você passa aqui cinco anos você não consegue adquirir esse
conhecimento em lugar nenhum. Então, entenda isso, se dedique a isso aí
porque essa é a parte mais importante dos jovens que estão entrando aqui.
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