REFLEXÕES SOBRE A FORMAÇÃO E A PRÁTICA DOCENTE NA
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
BARBOSA*, Viviane R. – UFPR
[email protected]
OLIVEIRA**, Josiane M. A. M. – UFPR
[email protected]
Resumo
O presente artigo busca evidenciar algumas reflexões sobre a formação e prática docente na
Educação de Jovens e Adultos (EJA), tendo como objetivo ampliar as discussões a respeito do
tema através da análise dos discursos das práticas dos sujeitos participantes. Para atender a
meta proposta utilizou-se como instrumento de coleta de dados um roteiro de entrevista semiestruturada, contemplando questões referentes à formação e a prática docente. Foram
entrevistados pelos pesquisadores vinte (20) professores atuantes na Educação de Jovens e
Adultos, no município de Curitiba. Após a análise dos dados coletados, verificou-se que ainda
existem deficiências na formação inicial dos professores que atuam na EJA e que estes
dependem, hoje, da oferta de cursos de formação continuada direcionada por sua chefia
imediata para buscar novos recursos teóricos e práticos, de modo a favorecer uma prática de
qualidade. A partir dos dados pode-se dizer que os professores participantes da pesquisa
seguem, em boa parte, a perspectiva diretiva, ou seja, uma pedagogia centrada no professor,
onde o empirismo está enraizado; seguem-se apostilas, conteúdos pré-determinados e pouco
se favorece à participação coletiva na construção de conhecimentos. Na maioria dos
entrevistados quanto à opção pelo EJA, apenas vinte por cento (20%) disseram ser por falta de
opção e a grande maioria refere que hoje prefere a Educação de Jovens e Adultos à de
crianças. Para fundamentar teoricamente este estudo buscaram-se periódicos e obras de
autores que discutem a problemática da Educação de Jovens e Adultos, bem como questões
referentes à formação docente no contexto brasileiro.
Palavras-chave: Educação de Jovens e Adultos; Formação de Professores; Prática Docente
na Educação de Jovens e Adultos.
Introdução
Na tentativa de iniciar e aprofundar possíveis discussões em torno do tema que, já vem
sido explorado por outros pesquisadores Libâneo & Pimenta (1999) e Ribeiro (1999) (dentre
outros) buscou-se analisar a partir de entrevistas semi-estruturadas cedidas por vinte
professores, como vem sendo dinamizada a prática educativa na Educação de Jovens e
*
Mestranda do Programa de Pós-graduação em Educação da UFPR.
Mestranda do Programa de Pós-graduação em Educação da UFPR.
**
1453
Adultos (EJA) em Curitiba e como a formação docente (inicial e continuada) favorece para
que o aprendizado se efetive com qualidade.
Estudos realizados em uma disciplina sobre Educação de Jovens e Adultos, no curso
de Mestrado em Educação, aguçaram ainda mais nossas inquietações sobre a proposta de
pesquisa aqui demonstrada.
O objetivo principal deste artigo é favorecer novas reflexões, bem como dar
continuidade a outras que já vem sendo dinamizadas em cursos de formação de professores,
pesquisas na área de educação e outros, sobre quais as possíveis lacunas que ainda existem na
formação docente, dando ênfase na atuação com jovens e adultos, tendo como suporte de
análise a própria prática educativa de professores já formados e que contam apenas com a
educação continuada como subsídio teórico-prático.
Formação e prática de professores atuantes na EJA em Curitiba
Segundo Ribeiro (1999, p. 184):
Nas últimas décadas, a pesquisa educacional brasileira vem abordando um amplo
conjunto de problemas relacionados à formação e ao desempenho dos educadores
que atuam no Ensino Fundamental; quando a área de estudos é a educação de jovens
e adultos, a esses problemas se agrega mais um, que no mais das vezes acaba sendo
postulado como uma tradução sintética dos demais: a falta de formação específica
dos educadores que atuam nessa modalidade de ensino, resultando numa
transposição inadequada do modelo de escola consagrado no ensino fundamental de
crianças e adolescentes.
Como esse problema é um fato que muito se discute, porém poucas soluções são
apresentadas nas grades curriculares de formação de professores, mais uma vez coloca-se um
estudo investigativo como possível foco de retomada crítica a respeito do que fazer. Este foi
desenvolvido através de entrevistas realizadas individualmente com os sujeitos participantes,
escolhidos aleatoriamente, tendo como referência apenas um dado em comum: todos são
atuantes na Rede Municipal de Ensino de Curitiba.
As entrevistas realizadas nas escolas, com os sujeitos participantes, deram-se em
momentos de planejamento, através do diálogo com os pesquisadores (nos dividimos em três
escolas) pautaram-se em algumas questões pontuais fechadas e em pontos de discussão mais
amplos. Na primeira questão buscou-se verificar qual seria a formação específica de cada
sujeito. Encontramos profissionais de várias formações na graduação, sendo que a maioria
(65%) são pedagogos. Dos entrevistados 70% dos profissionais têm especializações em várias
áreas.
Na questão seguinte solicitou-se que fossem relatadas as quantidades de alunos
atendidos por turma. A grande maioria (90%) dos entrevistados afirmou atender entre 10 e 25
1454
alunos, sendo que somente um professor que atua em várias escolas citou o número de 160 e a
coordenadora do Estado em duas escolas disse ser responsável por 150 alunos.
Para caracterizar melhor quem seriam esses alunos atendidos pelos profissionais
participantes desse estudo, pediu-se que assinalassem as faixas etárias dos alunos das turmas
de atuação de cada um. Das vinte entrevistas, aparecem faixas etárias distintas em idade e
percentual.
Os alunos que participam da EJA, estão distribuídos dos 16 aos 80 anos, sendo que a
participação percentual vai aumentando com a idade. Dos alunos atendidos pelos professores
entrevistados 19% estão entre 16 e 21 anos, 24% de 21 a 30 anos, 27% de 30 a 40 anos e 30%
estão entre 40 a 80 anos. Como a última fase compreende uma faixa maior de anos, isso pode
explicar a maior participação percentual. Vemos que os alunos procuram mais o retorno à
escola quando estão mais velhos, provavelmente por maior consciência da necessidade dos
anos de estudo formal para melhoria de emprego e condições de vida.
Dando continuidade na caracterização da prática dos sujeitos entrevistados, perguntouse sobre sua atuação em outras turmas do Ensino Fundamental e como poderiam ser descritos
os alunos da EJA, bem como a forma de atendimento em sala de aula.
Dos 20 professores entrevistados, 19 trabalham durante o dia com ensino regular e
apenas uma professora é aposentada do ensino regular e trabalha apenas na EJA. Na rede
municipal, apenas duas professoras são concursadas para o trabalho noturno, ou seja, possuem
dois vínculos com a Prefeitura, e os outros trabalham em regime de horas extras.
Quando foi perguntado como são suas aulas, 35% dos professores disseram tentar
inovar nas aulas, usando outros recursos, inclusive não sendo muito fiel às apostilas. Já 45%
dos professores disseram seguir as apostilas e se necessário complementá-las com outros
recursos e o restante disse seguir as apostilas, sendo que uma professora referiu que as
apostilas são relacionadas ao dia a dia dos alunos e que têm objetivos práticos. Quando o
professor analisa o desvio entre o que se faz e o que deseja fazer, desenvolve sua dinâmica
pedagógica com o objetivo de melhorar o desempenho ou modificar uma relação infeliz ou
desajustada com o mundo e com os outros.
Quanto ao atendimento dos alunos, 60% dos professores preferem fazer atendimentos
individuais, conforme as necessidades dos alunos. Do restante 20% diz fazer o atendimento
grupal e se muito necessário, passa ao individual e 20% diz que não é possível o atendimento
individual e faz apenas o atendimento grupal. A Educação de Jovens e Adultos (EJA), não
trata apenas da alfabetização, nesse sentido, o papel do educador tem um horizonte maior na
construção do conhecimento, implicando na necessidade da formação continuada do professor
1455
e estabelecendo relações próximas às soluções dos conflitos vivenciados no cotidiano
pedagógico.
O estudante que freqüenta a Educação de Jovens e Adultos é, geralmente, aquele que,
por falta de tempo, oportunidades ou outros motivos pessoais, não pôde freqüentar o ensino
regular em sua idade adequada. Desta forma, este estudante traz consigo certa ansiedade em
recuperar “o tempo perdido” e, ainda, certa insegurança em relação ao erro, pois, seus anseios
em relação ao sucesso imediato são evidentes. Neste sentido, “pessoas com uma trajetória de
não-acesso à escola, ou histórico de fracasso escolar, ou ainda aversão aos rituais escolares
necessitam de espaços e tempos alternativos que atendam a seus anseios” (CURITIBA, 2006,
p. 50).
Além disso, “a necessidade de apropriação, pelos que vivem do trabalho, de
conhecimentos científicos, tecnológicos e sócio-históricos, com particular destaque para as
formas de comunicação e de organização e gestão dos processos, sociais e produtivos, para
além das demandas da acumulação capitalista” (KUENZER, 1999 In: CURITIBA, 2006, p.
56) é constante e deve ser atendida conforme as necessidades individuais as quais o professor
se depara em sala de aula.
O trabalho pedagógico na Educação de Jovens e Adultos deve considerar certas
características individuais (idade, gênero, competências acadêmicas, experiências de vida,
motivação, interesse, bagagem cultural e expectativas, projetos de vida de modo a favorecer o
avanço dos estudantes sem que estes sintam-se desmotivados ou menosprezados em relação
as suas defasagens idade/série.
O professor deve caracterizar-se enquanto humanizador (FREIRE, 1987), valorizando
observações, experiências e relatos dos estudantes, bem como exercitando a reflexão
dinamizando uma prática pedagógica dialógica (FREIRE, 1987).
Algo que deve ser crucial no trabalho do professor da Educação de Jovens e Adultos é
seu compromisso efetivo “com a totalidade e pluralidade dos estudantes, compreendendo as
ocorrências da prática educativa, assim como as participações e inter-relações nela existentes”
(CURITIBA, 2006, p. 62).
Para os professores da EJA, 30 dos alunos são trabalhadores e, na opinião deles,
excluídos de várias formas, como egressos de classes especiais, vindos do interior e que não
tiveram condições de estudar por problemas financeiros para 35%. Para 10% dos professores,
os alunos são mais ansiosos que os de ensino regular. 35% dos professores citam
características de afetividade, amizade e referem que são alunos especiais. Uma professora
falou do fato de não haver indisciplina e uma professora de estarem sempre cansados e para
1456
15% dos professores o principal interesse está em aprender a ler e escrever, não havendo
interesse nas outras disciplinas.
O homem, como ser racional, possui capacidade de ir além daquilo que é imposto por
outra pessoa ou pela sociedade. Este é o aluno da EJA, um indivíduo capaz de estabelecer
relações com os seus semelhantes na sociedade em que vive e possuidor de um meio social
que o diferencia, diversifica e o transforma em concordância com a diversidade social a que
está submetido. Tal transformação exige do sujeito, aluno desta modalidade de ensino,
mudanças de
identidade,
informações,
representações, saberes, atitudes, energias,
concentração, qualidade, eficiência e permanência (FERRAZ, 2004).
De acordo com Pinto (1994), o homem, em toda sua existência, vive a fase mais
importante da sua vida quando adulto, nesse sentido, é considerado como o ser humano que
melhor se verifica no seu caráter como trabalhador. “O trabalho o define, o dignifica em todas
as fases da sua vida, desde a infância até a velhice. Porém, é no período adulto, que se
caracteriza a compreensão do seu mundo, como fator que constitui a natureza humana” (p.
79).
O homem, sendo produto do seu trabalho e se este trabalho faz parte integrante do
trabalho social geral, então, tudo que o homem faz configura parte da sociedade. Como esse
trabalho é aplicado à sociedade pelo executor do mesmo de forma condicionada (salários,
valores), conclui-se que o homem está subordinado as idéias dominantes. O adulto sendo um
trabalhador que executa seu trabalho nas condições oferecidas pelo meio em que vive,
determina as possibilidades econômicas e culturais do seu trabalho. Isso faz com que, com a
participação das massas, incluindo os analfabetos, nos processos sociais, cresça a consciência
do trabalhador. Tem-se aí então, a oportunidade maior do reconhecimento nos processos
políticos e sociais. Nesse sentido, a situação do analfabeto não representa uma barreira à
consciência de seu dever social.
Nos casos onde a falta de educação formalizada, não é percebida pelo trabalhador
adulto, como deficiência em relação à outra educação proporcionada pela sociedade, tem-se a
participação do adulto não escolarizado na realidade social mediante seu trabalho. Isto
proporciona os fundamentos para a participação política, ou seja, a atuação do indivíduo em
seu meio.
Prova disso, são indivíduos que exercem papel importante como líderes ou
representantes de movimento sociais. Por isso, na medida em que a sociedade se desenvolve,
a necessidade da educação de adultos torna-se inevitável. Na verdade, como participante ativo
1457
da sociedade, o adulto já atua como educado. Apenas não de forma alfabetizada ou
escolarizada.
Porém, essas necessidades, estão subjacentes as exigências materiais e circunstanciais
familiares determinadas pelas condições impostas pela sociedade.
A Educação de Adultos, não pode ter a visão de condená-lo definitivamente ao
analfabetismo, mas sim de favorecer a este um trabalho de conscientização e ampliação de
conhecimentos previamente sistematizados socialmente. É um erro social supor, que o adulto
é o culpado da sua própria ignorância. O adulto é voluntariamente analfabeto e não se faz
analfabeto senão pela sociedade. Nas condições da sua existência.
O educador de adultos deve admitir, que os indivíduos com os quais trabalha, são
seres normais e agentes ativos na sociedade considerando-os não como seres marginalizados,
e sim, como um produto normal da sociedade em que vive. O ser humano, por ser racional,
possui características essenciais, desta forma não vai longe fora do meio social (DELVAL,
2001). Diante desta premissa, pode-se dizer que o estado de não domínio de determinados
conteúdos acadêmicos no qual o adulto se encontra, é um fator social. O qual mostra as
condições externas da existência humana e seus efeitos sobre o ser homem. Não significa que
se trate de indivíduos desprovidos de inteligências, preguiçosos, rebeldes e atrasados.
O que ocorre na verdade, é que na presença do educador, o analfabeto se sente
inferiorizado, e seu comportamento, se torna retraído. Porém, se o educador possui uma
consciência crítica que não pretenda se sobrepor ao indivíduo adulto, se identificando com o
mesmo, utilizando um método adequado, seu aluno revelará uma capacidade de apreensão
equiparável com as dos indivíduos de sua idade.
O educando adulto é um membro atuante da sociedade, não somente pelo fato de ser
um trabalhador, mas sim, pelo conjunto de ações que exerce no meio em que vive. O adulto
analfabeto é um individuo que possui grande influência na comunidade, desta forma, é que se
torna importante instruí-lo.
O que compete ao educador é praticar um método de educação compatível com as
características dos educandos e que dê a estes, as oportunidades de alcançarem a consciência
de si mesmo e de seu mundo, assim, o próprio aluno adulto descobrirá as causas de seu atraso
cultural.
Conduzindo o ensino como se fosse dono do saber, adotando uma conduta do tipo
imitação, o professor estaria violando os direitos de liberdade e de pensamento do ser
humano, e mais ainda, praticando um ato inútil, pois estaria criando uma “cópia” de si
mesmo. Não se pode dinamizar uma “didática marcada pelo mero ensino e pela mera
1458
aprendizagem. De um lado, aparece um pretenso sujeito, chamado professor, que apenas
ensina, no sentido surrado de copiador de cópias, já que definido como ministrador de aulas,
sem qualquer compromisso construtivo”. (DEMO, 2002, p. 13-14). Deve-se sim, ter o saber
enquanto processo que “se constrói e se expande, quando partilhado e, a aprendizagem, em
colaboração e por descoberta, decorrem da premissa de que o conhecimento é construído
socialmente” (MIZUKAMI, 1996, p. 67).
Cabe aqui a seguinte questão: será que o educador considera o educando como um ser
portador de idéias dotado de capacidades intelectuais que se revela espontaneamente em sua
conversação, em sua critica aos fatos, em sua literatura, como pré–requisitos para conduzir o
ensino e aprendizagem em sala de aula? O conhecimento abrange um universo de
complexidade maior que a questão apontada. Ou seja, “A falta de uma visão teórica
competente tende a reduzir a limites estreitos a compreensão do processo de conhecimento e,
por conseqüência, a fazer o mesmo com a aprendizagem e o ensino” (BECKER, 1993, p. 95).
Delval (2001), pesquisador que tem dedicado seus estudos nas pesquisas sociais, cita
que: “Um indivíduo transmite intencionalmente a outro uma conduta ou um conhecimento.
Para isso, precisa ter uma teoria da mente do outro. Deve considerar os estados mentais
daquele que aprende suas dificuldades a sua capacidade de compreensão para modificá-los”
(p. 19).
Quando se questionou quanto a sentir-se preparado ou não para atuar na EJA, apenas
uma professora acha não estar preparada para o trabalho com EJA e refere estar sempre
buscando. Os outros professores se consideram preparados sendo que o principal motivo
citado foi o tempo de experiência com educação e em segundo lugar foram as capacitações na
área.
Concomitante a esta questão, foi solicitado aos sujeitos que descrevessem se sua
chefia oferece algum tipo de capacitação e de que forma isso ocorre. Nos entrevistados temos
4 professores do EJA ensino fundamental fase II1, de competência do Estado. Os outros 16
professores que são da fase I, são funcionários do Município de Curitiba e este oferece
capacitação de 80 horas anuais, sendo distribuídas semanalmente nas sextas-feiras. Já os do
Estado, têm capacitações por área em Faxinal do Céu e possuem mais dificuldades para
participar.
Para dinamizar uma prática que leve em conta todos esses aspectos explicitados
anteriormente, outra questão deve ser discutida – sua formação. A formação inicial do
1
EJA fase I equivale aos quatro primeiros anos do ensino fundamental (1ª a 4ª série) e fase II aos quatro anos
seguintes (5ª a 8ª série).
1459
professor das séries iniciais baseia-se fundamentalmente no trabalho com crianças. As grades
curriculares dos cursos de formação docente disponibilizam uma carga horária mínima para o
trabalho com a Educação de Jovens e Adultos, tendo a prática de estágio, em alguns cursos
noturnos, como um dos únicos momentos dedicados a esta modalidade.
Além dessa formação inicial, deve-se considerar também a formação continuada, onde
o professor busca novos conhecimentos através de capacitações, ou seja, “a formação inicial
estaria estreitamente vinculada aos contextos de trabalho, possibilitando pensar as disciplinas
com base no que pede a prática; cai por terra aquela idéia de que o estágio é aplicação da
teoria” (LIBÂNEO & PIMENTA, 1999, p. 268).
Segundo Libâneo & Pimenta (1999, p. 260):
O desenvolvimento profissional envolve formação inicial e contínua articuladas a
um processo de valorização identitária e profissional dos professores. Identidade que
é epistemológica, ou seja, que reconhece a docência como um campo de
conhecimentos específicos configurados em quatro grandes conjuntos, a saber:
conteúdos das diversas áreas do saber e do ensino, ou seja, das ciências humanas e
naturais, da cultura e das artes; conteúdos didático-pedagógicos (diretamente
relacionados ao campo da prática profissional); conteúdos relacionados a saberes
pedagógicos mais amplos (do campo teórico da prática educacional) e conteúdos
ligados à explicitação do sentido da existência humana (individual, sensibilidade
pessoal e social). E identidade que é profissional. Ou seja, a docência constituiu um
campo específico de intervenção profissional na prática social – não é qualquer um
que pode ser professor.
No processo de formação continuada pode ser desenvolvido na escola a partir dos
saberes e experiências dos professores adquiridos na situação de trabalho, articulando-se com
a formação inicial, indo os professores à universidade para uma reflexão mais apurada sobre a
prática.
Assim, o professor deve buscar sempre novas possibilidades sem que a acomodação
tome conta de sua vida. “As transformações das práticas docentes só se efetivam na medida
em que o professor amplia sua consciência sobre a própria prática, a da sala de aula e a da
escola como um todo, o que pressupõe conhecimentos teóricos e críticos sobre a realidade”
(LIBÂNEO & PIMENTA, 1999, p. 261).
Existe outra questão que merece destaque quando se falam do papel do professor, sua
função, etc. Diz respeito às condições que são disponibilizadas para a efetivação das
transformações necessárias em prol de uma dinâmica pedagógica de qualidade. Delval (2006,
p. 151) comenta que “muitas vezes os professores desejam mudar sua prática, mas não
dispõem de instrumentos, de conhecimentos ou dos meios necessários para promover essa
1460
mudança”. Quando se tratam de meios, cabe também reportarmo-nos até mesmo ao salário
deste profissional que não é reconhecido como merece.
Para tentar evidenciar melhor a prática que os sujeitos realmente efetivam
proporcionou-se um momento de conversa, onde falou-se sobre conteúdo, avaliação,
currículo, diversidades em sala de aula e condições de trabalho.
Quanto ao conteúdo todos referem seguir os conteúdos propostos pelo nível central e
considerara que os conteúdos devem ser enriquecidos. Dos professores entrevistados 20 % (4)
acham que os conteúdos devem ser revistos e estão aquém das necessidades dos alunos.
Já a avaliação de 1 a 4 ª série é feita por observação diária e anotações em ficha
própria, porém, mesmo não tendo convencionalmente a prova, 50 % dos professores dessa
fase fazem provas por sua conta, mantendo critérios de avaliação, para que possam passar
para uma nova série escolar. Da 5ª série ao 2º grau, tem provas oficiais do Estado para
“passar” para o próximo ano, que é elaborada pelo nível central e sofre críticas de uma
professora por considerar facilitada.
Por ser a avaliação um processo natural das relações sociais, sabemos que a todo
momento de nossa vida somos avaliados. Tal avaliação não é um processo neutro, não é algo
que tem um valor em si, é um meio para que algo chegue ao seu fim; é pré-condição para que
uma atividade mais constituída se dê e pode servir para melhorar ou piorar um processo.
Através da avaliação é possível a verificação da ação executada, se esta atingiu ou não seus
objetivos, se tal ação necessita de aprimoramentos ou se a mesma foi executada com todas as
suas perfeições.
Alguns autores que destinaram seus estudos a fim de poderem compreender a
avaliação e seus desdobramentos na sociedade acabaram fazendo suas próprias definições
sobre o que vem a ser avaliação. Segundo Luckesi (1991, p.9): “A avaliação é um juízo de
qualidade sobre dados relevantes para uma tomada de decisão”. Já Sousa (1995, p.25) afirma
que:
A avaliação se constitui em processo de busca de compreensão da realidade escolar,
com o fim de subsidiar a tomada de decisões quanto ao direcionamento das
intervenções, visando o aprimoramento do trabalho escolar. [...] Como tal, a
avaliação compreende a descrição, interpretação e o julgamento das ações
desenvolvidas resultando na definição de prioridades a serem implementadas e
rumos a serem seguidos, tendo como referência princípios e finalidades
estabelecidas no Projeto Escola, ao tempo em que subsidia a sua própria redefinição.
Hoffmann (2000, p.19) também faz apontamentos sobre o que entende por avaliação:
1461
Avaliação [...] reflexão permanente do educador sobre sua realidade, e
acompanhamento, passo a passo, do educando, na sua trajetória de construção do
conhecimento. Um processo interativo do qual educandos e educadores aprendem
sobre si mesmos e sobre a realidade escolar no ato próprio da avaliação.
Não apenas autores, mas também os órgãos oficiais que direcionam os sistemas
educacionais definem o que entendem por avaliação. Tem-se, dessa maneira, a definição
apresentada pelos PCN’s (1997, p.81): “A avaliação deve ser compreendida como um
conjunto de atuações que tem a função de orientar a intervenção pedagógica. Acontece
continuamente por meio de interpretação qualitativa do conhecimento construído pelo aluno”.
O conceito de avaliação definido pelos autores e pelos Parâmetros Curriculares,
apresenta um ponto em comum: a mudança. Utiliza-se a avaliação para se poder verificar uma
determinada situação a fim de poder modificá-la, torná-la diferente. E, a avaliação dentro da
escola deveria assim ser encaminhada, faz-se a avaliação para verificar os avanços e percalços
dos alunos a fim de se poder planejar atitudes que possam modificar a situação apresentada.
Com relação ao currículo, apenas 3 professores, fazem críticas e apontam necessidades
de mudança. Os outros 17 professores referem ser bem elaborados /ou estarem bem
relacionados com a prática.
No município de Curitiba, o currículo base são as diretrizes municipais, onde é
garantido uma parte do volume 4 especificamente para esta modalidade de ensino. Porém,
conforme a realidade em que se atua, deve-se favorecer a dinâmica de currículo oculto, aonde
se vá além do documento formal de modo a atender as necessidades individuais dos
educandos e especificamente da comunidade escolar num todo. Isso só se efetiva com um
trabalho árduo do professor em diagnosticar sua comunidade, adaptar os conteúdos conforme
as necessidades e propor um processo avaliativo que proporcione avanços a todos que
aprender (neste caso o professor também aprende).
Quanto as condições de trabalho os professores foram unânimes em dizer que a
condição é boa, com bons recursos materiais e disponíveis. Os professores do Estado fazem
referência as escolas municipais, como as melhores para se trabalhar.
Em relação à diversidade em sala de aula, todos colocam que conseguem lidar bem
com ela. Dos 20 professores, 30% dizem que a diversidade criou dificuldades. Aparecem
como diversidade: as faixas etárias, dificuldade de aprendizado, choque de gerações e os
alunos especiais. Os que referem nunca terem se importado com ela, referem o uso de
materiais didáticos diversos e o fato da diversidade estar presente também no ensino regular.
Atender as diversidades é um desafio que os profissionais da educação, independente
da série ou etapa de atuação deparam-se freqüentemente. A importância de se respeitar o
1462
tempo de aprendizagem de cada estudante, suas habilidades e competências, seu modo de
aprender, leva o professor a repensar sua prática constantemente, revendo suas estratégias
pedagógicas, avaliação e, de modo geral sua postura frente à sua turma.
Por fim, questionou-se a respeito da opção em atuar na EJA. O motivo de inicio de
trabalho com educação de jovens e adultos é citado em igual proporção a escolha própria e a
situação financeira, com 40 % dos entrevistados para cada um. Apenas 20% citaram ser por
falta de opção. Na maioria das entrevistas, sendo 19 entrevistados dos 20, disseram que depois
do início passaram a gostar do trabalho e que hoje não trocariam o trabalho com adultos por
trabalho com crianças.
Conclusão
A partir da análise dos dados pode-se dizer que os professores participantes da
pesquisa seguem, em boa parte, a perspectiva diretiva, ou seja, uma pedagogia centrada no
professor, onde o empirismo está enraizado; seguem-se apostilas, conteúdos pré-determinados
e pouco se favorece à participação coletiva na construção de conhecimentos. Por outro lado,
há interesses isolados na tentativa de atentar-se para uma pedagogia sócio-interacionista que é
o fio-condutor das práticas pedagógicas do município em questão e que busca resgatar os
conhecimentos que compõem a história de vida dos sujeitos envolvidos de forma crítica e
participativa.
A escola enquanto “local de confronto de culturas” e “encontro de singularidades”
(OLIVEIRA, 1999, p. 72) deve proporcionar aos jovens e adultos o exercício da participação
enquanto direito e dever. Para que isso se efetive, faz-se necessária uma formação docente
mais pontual aos que estarão atuando nesta modalidade de ensino.
É fundamental que o professor da EJA busque além de sua formação inicial, novos
confrontos teóricos em momentos de educação continuada. Esta forma de capacitação deve
iniciar-se na escola, através de discussões coletivas, estudos e, estender-se para cursos
específicos da temática que envolve o trabalho pedagógico com jovens e adultos.
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