Um convite ao pensamento sobre vários ramos do Direito Contemporâneo
Por Juliana Silva
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SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO........................................................................................................3
PARTE I – Reflexões sobre Direito e Ciência..............................................................4
PARTE II – Direito, Corrupção e Sociedade .............................................................34
PARTE III – O Direito e os Problemas do Sistema Penal..........................................42
PARTE IV – Observações sobre temas de Direito Civil – Constitucional .................49
PARTE V – Direito, Meio Ambiente e Sociedade.......................................................55
PARTE VI – Breves Considerações finais: Direito e Sociedade................................64
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..........................................................................66
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APRESENTAÇÃO DA AUTORA E INTRODUÇÃO A ESTE TRABALHO
Graduada em Direito pela Universidade de Brasília (UnB), Juliana Silva
trabalha na área de Direito Civil e do Consumidor, e escreve sobre diferentes temas
contemporâneos. Nascida no Distrito Federal, em 12/06/1984, tem participado de
diferentes concursos literários, adquirindo seus primeiros êxitos em 1999, quando
obteve a 1ª colocação no XXI Concurso Literário Juvenil da Biblioteca Demonstrativa
de Brasília.
Neste trabalho, especificamente, a autora expõe uma coletânea de artigos
sobre diferentes ramos jurídicos, com o intuito de propiciar reflexões sobre temas
atuais envolvendo Direito e sociedade. Em tal perspectiva, este livro é dividido em
seis partes para fins de organização do pensamento. Na primeira, são expostos
artigos que tratam da relação entre Direito e Ciência. Em seguida, são delineadas
reflexões sobre Direito, Corrupção e Sociedade. Já na terceira parte deste trabalho,
são enfatizados alguns problemas do sistema penal brasileiro da atualidade, com
uma série de observações críticas.
Na quarta parte, por sua vez, são expostas breves reflexões sobre temas de
Direito Civil – Constitucional. Em seguida, são delineados artigos sobre Direito e
Meio Ambiente no contexto do século XXI. A sexta parte, enfim, traz considerações
gerais sobre a insegurança jurídica que tem sido vista no Brasil, suas consequências
sócio-econômicas e desafios correlatos.
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PARTE I – Reflexões sobre Direito e Ciência
A RELAÇÃO ENTRE DIREITO, CIÊNCIA E OUTRAS FORMAS DE
CONHECIMENTO
Analisar a relação entre ciência, direito e outras formas de conhecimento
significa, antes de tudo, perquirir os diversos debates históricos e atuais que têm
sido realizados acerca dos vínculos entre tais ramos de estudo. É perceptível que,
durante séculos, a ciência tem procurado se afirmar como saber preponderante, em
detrimento de outras formas de explicação sobre o mundo. A fim de se demonstrar
uma série de equívocos que permeiam tal ideia de “superioridade científica”,
inclusive com repercussões no conceito que constantemente se impõe sobre a
“ciência do direito”, far-se-á neste artigo uma breve abordagem dividida em quatro
tópicos fundamentais.
Preliminarmente,
será
ressaltado
o
problema
da
concepção
do
conhecimento científico como saber por excelência, nos moldes da teoria sustentada
por diversos autores do positivismo clássico, entre os quais Auguste Comte. No
âmbito desse primeiro tópico, é importante discutir uma série de fundamentos
metodológicos com os quais muitos doutrinadores almejaram separar o que era
ciência de especulações ditas pseudo-científicas.
No segundo tópico, por sua vez, caberá esclarecer o conjunto de
objetivos norteadores do positivismo jurídico, especialmente aquele ligado aos
argumentos kelsenianos, no sentido de se erigir uma “ciência do direito”,
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pretensamente racional e incólume a apreciações valorativas. Em prosseguimento a
esse estudo, o terceiro tópico traz em seu bojo uma apreciação dos termos “direito”
e “ciência” como variáveis axiológicas, destituídas de um significado neutro, exato e
cosmopolita, a despeito das aspirações racionalistas e universalizantes de vários
pensadores.
O quarto tópico, por fim, refere-se à teoria anarquista do conhecimento de
Feyerabend e à possibilidade de convivência não-hierárquica entre as diversas
formas de saber. Em tal abordagem, impende aferir quais são as reais
características de complementaridade entre as ciências, como um todo, e se, dessa
forma, seria efetivamente infactível a tese segundo a qual existem conhecimentos
incólumes a valores, crenças e constatações subjetivas. Assim, o presente artigo
tem como escopo avaliar uma série de conceitos inerentes às ciências, em geral, e à
dita “ciência do direito”, em particular, a fim de perquirir a consistência e a
plausibilidade de tais conceitos.
1. O problema da conceituação do conhecimento científico como saber por
excelência.
Freqüentes associações entre ciência e razão, ciência e método ou entre
ciência e técnica vêm constantemente imbricadas com uma certa pseudosuperioridade do conhecimento científico sobre os demais âmbitos do saber. De
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fato, como salienta o autor Paul Feyerabend1, a convicção reiterada de que as áreas
científicas do saber estariam acima das outras é repleta de equívocos, falhas e
preconceitos. No contexto jurídico, mais especificamente, fala-se muito em “ciência
do direito”, apesar de existirem ainda muitos questionamentos e críticas a respeito
da real cientificidade dos sistemas normativos. A fim de se analisar sucintamente a
relação verificada entre ciência, direito e outras formas de conhecimento, far-se-á
uma breve abordagem acerca dos principais aspectos filosóficos que norteiam a
separação entre os diversos modos de se entender o mundo.
Preliminarmente, é fundamental perquirir quais são os elementos da
ciência que a distinguem de outros ramos do saber. Nesse sentido, cumpre indagar:
o que ontologicamente caracteriza a atividade científica ? Qual é a essência do
saber científico a partir de uma perquirição filosófica ? Onde se encontra a linha
demarcatória entre ciência e não-ciência ? Em relação a tais perguntas, o autor Imre
Lakatos ressalta:
O problema da demarcação das fronteiras entre ciência e
pseudociência
tem
sérias
implicações...
para
a
institucionalização da crítica. A teoria de Copérnico foi proibida
pela Igreja Católica em 1616 por ser considerada pseudocientífica. Em 1820, foi retirada do Index, porque àquela altura
a Igreja acreditou que os fatos a haviam comprovado e,
1 - FEYERABEND, Paul. Against Method: Outline of an Anarchistic Theory of Knowledge. Londres: New Left
Books, 1975.
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portanto, ela se tornara científica. O Comitê Central do Partido
Comunista Soviético, em 1949, declarou pseudo-científica a
genética mendeliana e matou os que a defendiam em campos
de concentração (..). Contudo, manteve-se o direito de o
partido decidir o que é científico e publicável e o que é pseudocientífico e passível de punição (...). Todos esses julgamentos
inevitavelmente baseavam-se em alguma espécie de critério de
demarcação. Esta é a razão por que o problema dos limites
entre a ciência e a pseudo-ciência não é um pseudo-problema
de filósofos de poltrona: ele tem sérias implicações éticas e
políticas. 2
Nessa mesma linha argumentativa de Lakatos, Alan Chalmers assevera:
Paul Feyerabend é um dos filósofos mais lidos que (...) zomba
dessas venerações de ciência. Segundo algumas de suas
formulações mais radicais, as atitudes atuais em relação à
ciência equivalem a nada menos do que uma ideologia
representando um papel afim ao que desempenhou o
cristianismo na sociedade ocidental (...). Feyerabend (1975) diz
2 – LAKATOS, I.mre. “Science and pseudo-science”. In : WORRAL, CURRIE, 1978, p. 6-7.
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que a ciência moderna não tem características que a tornem
superior e distinta do vodu ou da astrologia. 3
Pelo que se infere dos textos supracitados, a demarcação efetiva entre o
que é e não é ciência está inequivocamente impregnada de questões políticas,
éticas e ideológicas. Apesar da plausibilidade dessa constatação, diversos
pensadores propuseram critérios para uma demarcação estanque da linha fronteiriça
entre os modos de conhecimento. Nesse sentido, o positivismo científico forneceu
bases para se identificar o que é ciência e para diferenciá-la de outros ramos do
saber. Além disso, os positivistas concederam ao conhecimento científico um
questionável status de “saber por excelência” , intrínseco ao estágio superior do
progresso humano. Tal concepção se torna nítida por meio das seguintes idéias de
Auguste Comte:
Estudando (...) o desenvolvimento total da inteligência humana
em suas diversas esferas de atividade, desde seu primeiro vôo
mais simples até nossos dias, creio ter descoberto uma grande
lei fundamental (...). Essa lei consiste em que (...) cada ramo
de nossos conhecimentos, passa sucessivamente por três
estágios históricos diferentes: estado teológico ou fictício,
estado metafísico ou abstrato, estado científico ou positivo (...).
No estado teológico, o espírito humano (...) apresenta os
3 – CHALMERS, Alan. A fabricação da ciência. Trad. de Beatriz Sidou. São Paulo: Fundação Editora da
UNESP, 1994, p.13 - 37 .
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fenômenos como produzidos pela ação direta e contínua de
agentes sobrenaturais (...). No estado metafísico, os agentes
sobrenaturais são substituídos por forças abstratas (...). Enfim,
no estado positivo, o espírito humano (...) renuncia a procurar o
destino do universo, para preocupar-se unicamente em
descobrir, graças ao uso combinado do raciocínio e da
observação, suas leis efetivas.4
Conforme a explanação anterior de Comte, vê-se claramente uma
tentativa de hierarquização entre conhecimentos, de modo que o científico venha a
preponderar sobre os demais. A referida lei dos três estágios explicita bem a idéia
arraigada a muitos pensadores modernos, no sentido de que a ciência possui os
métodos universais para se alcançar o verdadeiro saber. Segundo Comte e diversos
outros positivistas, o conhecimento religioso ou mítico estaria muito aquém das
possibilidades científicas de explicação do universo. No cerne dessa concepção
positivista, não só está presente uma idéia de hierarquia entre as formas de
conhecimento, como também uma abordagem a respeito de graus hierárquicos
entre as próprias ciências. Nesse sentido, Auguste Comte elucida:
A filosofia positiva se encontra, pois, naturalmente dividida em
cinco ciências fundamentais, cuja sucessão é determinada pela
subordinação necessária e invariável, fundada (...) na simples
4 – COMTE, Auguste. Curso de filosofia positiva. São Paulo: Ed. Abril Cultural. Col. Os pensadores, p. 9-11.
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comparação aprofundada dos fenômenos correspondentes: a
astronomia, a física, a química, a fisiologia e, enfim, a física
social.5
Ressalte-se que a física social, segundo Comte, nada mais era do que a
sociologia. Dessa forma, percebe-se uma nítida influência das ciências ditas naturais
sobre as humanas. Essas últimas, por serem relativamente recentes, ainda são
alvos de algumas objeções quanto ao seu real status científico. Há muita discussão
acadêmica em torno da cientificidade de estudos como os da História, da Filosofia
ou do Direito, por exemplo. Muitos salientam que tais ramos de conhecimento não
são científicos, em virtude de critérios metodológicos ou em decorrência de seu
próprio conteúdo.
2. O advento da “ciência jurídica”: cientifização da norma e normatização da
ciência .
O debate acerca da cientificidade ou não do direito certamente envolve
muitos aspectos históricos e culturais. De fato, o saber jurídico tem passado por um
certo processo de institucionalização , perceptível em diversas circunstâncias
históricas, nas mais diferentes regiões do mundo. Vislumbrar o modo pelo qual as
variáveis tempo e lugar influenciaram essa construção do saber jurídico é
imprescindível ao entendimento dos recursos com os quais esse saber foi,
paulatinamente,
instituído.
Entre
tais recursos,
destaca-se a
tentativa
de
5 – COMTE, Auguste. Curso de filosofia positiva, p. 39.
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