MINISTÉRIO PÚBLICO
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
CENTRO DE APOIO OPERACIONAL DE DEFESA DO CONSUMIDOR
Para: Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania
Objeto: PL nº 240/2011 – altera artigo 6º, inc. VIII, do CDC - Código de Defesa
do Consumidor
Porto Alegre, 21 de junho de 2013.
Comentários acerca da redação proposta para a alteração
do artigo 6º, inciso VIII, do CDC1 - Capítulo III – Dos Direitos Básicos do
Consumidor:
a) Em fevereiro do ano de 2011, foi apresentado pelo Deputado Sandes Júnior
(PP-GO) o Projeto de Lei nº 240/2011, com a seguinte proposta de alteração
do inciso VIII do artigo 6º do CDC:
“(...)
Art. 6º
(...)
VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da
prova, a seu favor, no processo civil, quando a pedido do consumidor este se sentir
em condição de desvantagem por não ter recebido orçamento, pedido, contrato,
manual de instrução em língua portuguesa e rotulagem, certificado de garantia, recibo,
nota fiscal ou documento equivalente de fornecimento de produtos ou prestação de
serviços;
(...).”
1
“Redação atual – “Artigo 6º. São direitos básicos do consumidor:
(...)
VIII – a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu
favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímel a alegação ou quando ele for
hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiência;
(...).”
1
MINISTÉRIO PÚBLICO
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
CENTRO DE APOIO OPERACIONAL DE DEFESA DO CONSUMIDOR
JUSTIFICATIVA:
O art. 6º do Código de Defesa do Consumidor trata dos direitos básicos do consumidor
e, entre eles, encontra-se a possibilidade de o consumidor ter a defesa de seus
direitos facilitada pela inversão do ônus da prova no processo civil. Isto é o que
determina a primeira parte do inciso VIII do dispositivo sob comento.
No entanto, a redação final da norma em análise, condiciona o direito do consumidor à
discricionariedade do juiz que deverá aferir a verossimilhança da alegação e a
hipossuficiência do consumidor.
Nossa proposta é de ser incondicional o direito de inversão do ônus da prova no
processo civil, especialmente nos casos do consumidor por não ter recebido, como
ocorre muitas vezes, orçamento, contrato ou recibo dos produtos e serviços que lhe
são ofertados e vendidos. A inversão do ônus da prova é, ao nosso ver, um direito
básico e incondicional, não devendo ficar brechas na lei para que se torne apenas
uma expectativa e não um direito consagrado pelo Código de Proteção e Defesa do
Consumidor.
Ante o exposto, pedimos o apoio dos nobres pares para aprovação desta proposta que
visa a consolidação de importante direito para o consumidor brasileiro.
b) Embora salutar a incorporação de novos conceitos à luz dos princípios
insculpidos no CDC, importante ponderar a intenção do legislador, na edição
da lei 8.078/1990, ao estabelecer a facilitação da defesa dos direitos do
consumidor, mediante a possibilidade da inversão do ônus da prova a seu favor
quando, a critério do Juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele
hipossuficiente, segundo regras ordinárias de experiência.
A inversão do ônus fica a critério do julgador, de sua convicção sobre a
verossimilhança das alegações ou hipossuficiência do consumidor, diante da
falta de condições de realizar a dilação probatória, não decorrendo de
imposição ditada pela própria lei.
2
MINISTÉRIO PÚBLICO
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
CENTRO DE APOIO OPERACIONAL DE DEFESA DO CONSUMIDOR
A aplicabilidade do instituto da inversão do ônus da prova, na forma
estabelecida pelo art. 6°, inc. VIII, do CDC, dá-se como uma maneira de tornar
mais igualitária a relação de consumo havida, notadamente para concretizar-se
o princípio constitucional da efetiva defesa do consumidor (art. 5°, inc. XXXII,
da CF).
Sob outro aspecto, e sem pretender esgotar a análise da matéria, releva
destacar a disposição constante no artigo 38 do CDC, o qual refere-se ao
princípio da inversão do ônus da prova que informa a matéria publicitária.
De fato, as hipóteses de inversão do ônus previstas nos artigos 6°, inc. VIII, e
38 do CDC, são inconfundíveis. A primeira depende de determinação judicial,
ao passo que a segunda, contida em capítulo distinto, decorre da própria lei e
não pode ser modificada, por se tratar de regra cogente, determinando que o
ônus da prova da veracidade e correção da informação ou comunicação
publicitária cabe a quem patrocinou, ou seja ao fornecedor.
A inversão ope legis em sede de matéria publicitária se justifica diante da
dificuldade que teria o consumidor de provar tecnicamente se a publicidade é
enganosa ou abusiva, considerando ficar em poder do fornecedor os dados
fáticos, técnicos e científicos que dão sustentação à mensagem.
c) A sugestão apresentada por meio do Projeto de Lei nº 240/2011, na tentativa
de tornar “incondicional o direito de inversão do ônus da prova no Processo
Civil”, acaba por limitar o mais importante instrumento para facilitação da
defesa dos direitos do consumidor em juízo, consagrado no CDC.
Ou seja, num mercado de consumo extremamente veloz, exigindo dos
operadores do direito o acompanhamento diário do surgimento de novas e
mais aprimoradas tecnologias, a proposta lista, à exaustão, os requisitos para
3
MINISTÉRIO PÚBLICO
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
CENTRO DE APOIO OPERACIONAL DE DEFESA DO CONSUMIDOR
que o consumidor se sinta na “condição de desvantagem” indicada como
requisito para a facilitação da defesa dos seus direitos: “por não ter recebido o
orçamento, pedido, contrato, manual de instrução em língua portuguesa e
rotulagem, certificado de garantia, recibo, nota fiscal ou documento equivalente
de fornecimento de produtos ou prestação de serviços.”
Embora condicionada à verificação do preenchimento das condições pelo juiz
da causa, a atual redação do inciso VIII do artigo 6° do CDC possibilita a
inversão do ônus da prova em favor do consumidor em qualquer caso, não
estabelecendo limitações a sua aplicabilidade.
d) Sob outro ângulo, vislumbra-se, a toda evidência, a situação de
vulnerabilidade a que ficarão expostos os consumidores diante da necessidade
de justificar a denominada “sensação de desvantagem” para fazer jus à
facilitação da defesa de seus direitos.
e) Nessa perspectiva, a alteração do CDC, na forma pretendida, enfraquece
um dos poderosos instrumentos de efetividade das normas e princípios do
CDC, desequilibrando as relações entre o fornecedor e consumidor. Destacase, por último, que a jurisprudência dos nossos Tribunais, especialmente do
Superior Tribunal de Justiça, vem reconhecendo, de maneira ampla, a
aplicação desse direito básico de facilitação da defesa do consumidor em juízo,
o que demonstra que a atual redação do art. 6º, VIII, do CDC não necessita
alterações.
Cordialmente,
Alexandre Lipp João,
Procurador de Justiça - Coordenador.
4
Download

ANEXO I - AMP/RS