Jornais
Brasil Econômico
25/06/2012
Sustentabilidade
Documento que prega consenso não agrada a todos
A falta de resultados práticos em alguns pontos, como a questão da preservação dos
oceanos e a discussão em torno de um novo modelo de comportamento de consumo,
dividiu opiniões
Erica Ribeiro
A Rio+20 terminou dividindo opiniões entre o efeito de consenso, por ter um documento
aprovado por 193 países e a falta de resultados práticos em alguns pontos, como a
questão da preservação dos oceanos e a discussão sobre um novo modelo de
comportamento de consumo.
A avaliação é de autoridades e especialistas ouvidos pelo Brasil Econômico.
A ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, defendeu o fato de tantos países
reunidos terem conseguido um documento que pudesse sinalizar novos caminhos.
"A Rio+20 foi extremamente importante no conjunto das conferências da ONU. É o
resultado da ambição coletiva, de reunir 193 países, discutir as suas prioridades e
traduzir isso em um documento que possa sinalizar um novo caminho em relação ao
consumosustentável, à mensuração de riqueza", disse a ministra.
Mas ela mesma aponta questões que poderiam ser melhor discutidas ou ficaram de fora.
Como o direito reprodutivo das mulheres, que, na avaliação da ministra, tem no Brasil
grandes avanços. E o texto dos oceanos, que poderia ter tido mais avanços.
Já a ex-ministra Marina Silva foi categórica ao dizer que o documento apresentado "é
ruim, pois não fala de investimentos e deixa de lado a governança".
Para ela, mais uma vez as decisões ficaram para os próximos 20 anos.
O embaixador, André Corrêa do Lago, negociador-chefe do Brasil na Rio+20, afirmou
que é preciso olhar o texto final como uma projeção para o futuro. "Quanto mais as
pessoas pararem para olhar, vão ver que é um texto que está projetando o futuro. Eu
acho que vai funcionar muito bem, porque também não adianta colocar coisas que não
vamos conseguir executar", disse, sem explicar com mais detalhes o que não poderia
ser executado.
O governador do Estado do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, por sua vez, avaliou que
enquanto países emergentes, sobretudo os que compõem o Brics (Brasil, Rússia, Índia,
China E África do Sul) seguem confirmando seu compromisso ambiental, nações
desenvolvidas precisam avançar nesta direção.
Paulo Skaf, presidente da Fiesp também destacou a dificuldade de se criar um
documento único em meio a diferentes pensamentos sobre diferentes temas. "Não é
fácil um entendimento com tantos países. A questão de quanto cada país vai emitir a
menos de gases de efeito estufa, por exemplo, vai continuar sendo discutido. Se tudo
fosse feito em dois ou três dias seria simples demais", destacou.
desenvolvimento sustentável
Para Dilma, cada país tomará a atitude necessária
"Documento é é um ponto de partida", declarou a presidente Dilma Rousseff sobre o
texto final da Rio+20. Segundo ela, a partir do que foi escrito, cada país deverá tomar
as atitudes necessárias para alcançar o desenvolvimento sustentável. "O que não
podemos conceber é que alguém fique aquém dessa posição", disse.
A presidente voltou a defender o multilateralismo e falou que a declaração final, por
este motivo, precisou considerar posições e o nível de comprometimento de todas as
nações envolvidas.
Dilma frisou que o documento não atende a todas as expectativas dos brasileiros e que
o país está a frente de outros no caminho do desenvolvimento sustentável,
entretanto, é muito importante, pois representa o acorde de 193 países.
Ela lamentou não haver compromissos concretos de financiamento para a promoção da
sustentabilidade e que o ponto foi excluído a pedido de países desenvolvidos.
Gabriela Murno
COMPROMISSOS E METAS
Cumprimento depende de responsabilidade
Em sua última missão como representante da Organização das Nações Unidas (ONU), o
chinês Sha Zukang, que ocupa o cargo de secretário-geral da conferência das Nações
Unidas sobre desenvolvimento sustentável, Rio+20, cobrou responsabilidade dos
empresários, sociedade civil e líderes dos 193 países que participaram do evento.
Ao lembrar da reunião de Copenhague, quando líderes se comprometeramcom medidas
de redução da emissão de gases de efeito estufa, Zukang criticou o não cumprimento
das metas e alertou que, sem responsabilidade, a Rio+20 pode correr o mesmo risco.
"Vocês
conhecem
os
compromissos
assumidos
em
Copenhague.
Quem os cumpriu? Ninguém foi obrigado a se comprometer com aquelas metas. Tudo
foi apresentado voluntariamente. Mas ninguém está cumprindo."
Ele acrescentou que "o que diferencia compromisso de uma simples intenção de vontade
é a responsabilidade".
ABr
COMPROMISSOS E METAS
O que vi foram todos os países em desenvolvimento assumindo compromissos em
relação à sustentabilidade e muitos países ricos não adicionando qualquer recurso para
esse processo
Izabella Teixeira
ministra do Meio Ambiente
Este é um momento difícil, mas graças à liderança brasileira conseguimos nos reunir em
torno de um documento final, que marca um grande avanço para o desenvolvimento
sustentável
Hillary Clinton
Secretária de Estado americana
Os princípios da erradicação da pobreza, o princípio contra a desigualdade, estão no
documento
Paulo Skaf
Presidente da Fiesp
Eles (chefes de Estado) ficaram aqui três dias e não gastaram nem uma hora
negociando entre si. Usaram essa oportunidade para anunciar projetos e iniciativas e
para tirar fotos
Sharan Burrow
Secretária-geral da International Trade Union Confederation
Jornais
25/06/2012
Sem ações, conferência delineou agenda
Por Francisco Goes, Daniela Chiaretti, Fernando Exman, Guilherme Serodio e Rodrigo
Polito | Do Rio
A expectativa de que a Rio+20 pudesse transformar conceitos adotados na Rio92 em
ações concretas para o desenvolvimento sustentável não se confirmou - a cúpula
este ano foi bem mais fluida que a de 20 anos atrás. Se a Rio92 pôs a questão
ambiental no mapa, fechando duas convenções e amarrando uma terceira, a Rio+20
sinaliza apenas com uma agenda. Essa é a grande diferença entre as duas
megaconferências: enquanto a anterior amarrou os países
obrigatórios, a Rio+20 é um exercício global voluntário.
em compromissos
A ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva faz esta análise e diz que a Rio+20
"sepultou um processo". Ela lembra que, há 20 anos, só os EUA não queriam que as
questões ambientais fossem resolvidas pelo multilateralismo. Mas agora, compromissos
voluntários foram a tônica do evento. Na Rio92 foram assinadas as convenções do Clima
e da Biodiversidade, dois marcos da dimensão ambiental contemporânea, e chegou-se
ao embrião da Convenção da Desertificação. A Rio+20 tem apenas o documento político
"O Futuro que Queremos", sem força legal.
O cenário atual é mais complexo e com mais atores participando do processo do que há
20 anos. O secretário-executivo da Rio92 era o canadense Maurice Strong, o da Rio+20
foi o diplomata chinês Sha Zukang, um indicador da mudança geopolítica no mundo. O
que persiste é o debate norte-sul de quem vai pagar a conta do desenvolvimento
sustentável e como irá se transferir tecnologia dos países desenvolvidos para os
demais.
"A aritmética da negociação não funciona mais da mesma forma. É um mundo muito
difícil. O que emerge da Rio+20 é um padrão diferente de liderança", disse Achim
Steiner, diretor-executivo do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente
(Pnuma). Steiner avaliou que o documento adotado mediante resolução pelos chefes de
Estado e de governo, e que agora será incorporado às legislações das Nações Unidas, é
um texto que tem muito a contribuir para o desenvolvimento sustentável: "O
documento é rico em ações, em iniciativas e em programas."
A Rio+20 também incorporou elementos novos, que não estavam presentes no debate
há 20 anos, como participação efetiva da sociedade civil organizada e da comunidade de
negócios. Também marcou a existência de um espírito voluntário nas ações de
governos, empresas e instituições em relação ao desenvolvimento sustentável.
Falou-se em mobilizar mais de US$ 513 bilhões durante a Rio+20 em compromissos
voluntários para o desenvolvimento sustentável, incluindo áreas como energia,
transporte, economia verde, redução de desastres, desertificação, água, florestas e
agricultura.
Um ganho incontestável da Rio+20 foi a participação da sociedade civil. Pelo Riocentro
passaram 45.381 pessoas. Na Rio92, haviam sido 17 mil, segundo Nikhil Chandavarkar,
diretor de comunicações da ONU para a Rio+20. Na era da comunicação digital e das
relações virtuais, a página em português da Rio+20 recebeu mais de um milhão de
acessos só na última semana. No twitter teve um bilhão de acessos.
No Riocentro, na zona oeste do Rio, que hospedou novamente o encontro das Nações
Unidas, os Estados Unidos tiveram participação tímida atuando forte nos bastidores para
travar algumas questões. Os emergentes pressionaram por resultados e pela posição
que proteja seu crescimento. O Brasil, na condição de anfitrião, buscou o acordo
possível.
O negociador-chefe do Brasil no encontro, embaixador André Correa do Lago, considera
que a Rio+20 foi uma conferência de ação porque criou processos. "Mas, mais do que
isso, estabeleceu os instrumentos para poder atuar de maneira decisiva nessa questão
da mudança dos padrões sustentáveis de produção e de consumo não só com um plano
de dez anos, mas com a criação dos Objetivos de desenvolvimento sustentável
[ODS], que vão orientar o mundo, as economias, de maneira objetiva", afirma.
"Creio que o documento da Rio+20 é muito marcante porque diz que a maior prioridade
do mundo é a erradicação da pobreza e, a segunda, é a mudança dos padrões de
produção e de consumo. Isso é uma mensagem fortíssima porque está dita em um
contexto de que a erradicação da pobreza é possível", disse.
Ele lembrou que em 1992 havia uma visão muito mais modesta do que poderiam fazer
os países em desenvolvimento. "Havia a percepção de que os países desenvolvidos
tinham encontrado uma fórmula certa e tínhamos que buscar uma maneira para que os
outros pudessem fazer da mesma forma." Hoje, segundo ele, a situação é
completamente diferente.
"A fórmula dos países desenvolvidos mostrou ser muito desafiada pelas circunstâncias
recentes e, por outro lado, os países em desenvolvimento mostraram soluções muito
impressionantes nas áreas de erradicação da pobreza, ambiental e econômica",
prosseguiu. "Acho que a Rio+20 é uma conferência contemporânea."
A partir de agora fica a expectativa de como vai ser a implementação de mais de uma
dezena de medidas que foram adotadas no documento pelos 193 países da ONU. A
reunião da Assembleia Geral das Nações Unidas, a partir de setembro, vai discutir esses
pontos. No tema financiamento do desenvolvimento sustentável, por exemplo, deve
se produzir um relatório sobre os fluxos de recursos disponíveis que deve ser concluído
até 2014.
Mary Robinson, ex-presidente da Irlanda e presidente honrária da Oxfam, disse que a
"Rio+20 se realizou em uma época mais crítica, os problemas são muito mais urgentes.
Ela registrou, porém, que a falta de liderança política é preocupante. "Mas o que me dá
esperança é que a sociedade civil, os sindicatos, grupos de mulheres e de jovens,
mesmo a comunidade de negócios, entendem a urgência do problema."
Outro ponto de implementação a ser discutido na Assembleia Geral a ONU são os
Objetivos de desenvolvimento sustentável. A partir de setembro, deve se definir
uma comissão com 30 representantes que terá um ano para entregar à assembleia
geral das Nações Unidas um informe com opções de ODS. "Os ODS tiveram um parto
muito difícil na Rio+20 e não sabemos se é um bebê querido, não sabemos se a
comunidade internacional de fato o irá acolher", comparou Antonio Hill, porta-voz da
Oxfam na conferência.
A Anistia Internacional considera a Rio+20 um passo atrás quanto aos direitos
humanos. "Perdemos todos e todas", avalia o diretor da Anistia no Brasil, Ítalo Roque.
"Em busca de conseguir um documento final, os direitos humanos e os direitos
reprodutivos das mulheres foram colocados na mesa como moeda de negociação", diz.
A postura pouco ousada do Brasil também é criticada. "O maior protagonismo do país
no cenário global também requer que ele esteja disposto a ir além do mínimo
denominador comum", diz Roque.
Mas para autoridades do Palácio do Planalto foi uma "vitória da diplomacia brasileira" o
acordo fechado antes do início da reunião de cúpula da conferência. O governo
acreditava que, se a costura final do texto ficasse para a última etapa da Rio+20, seria
grande o risco do impasse prevalecer. Para a presidente Dilma Rousseff, fracasso seria
não ter um texto aprovado por consenso pelos países.
Para o ministro do meio ambiente da Alemanha, Peter Altmaier, a Rio92 foi mais
objetiva e tinhas questões mais concretas do que a Rio+20. Na conferência de 2012,
ele admitiu avanços, mas se disse decepcionado e frustrado com algumas expectativas
que não se concretizaram, como a elevação do Pnuma para o patamar de agência da
ONU.
"Meu desapontamento mais importante é que a sociedade esperava um a ação concreta.
Em 1992, a principal questão foi a proteção das florestas. Em 2002, foi a questão
energética e o crescimento econômico. Em 2012, não temos uma questão concreta",
disse Altmaier.
"O Brasil acredita que problemas ambientais são resolvidos localmente. E questões
sociais e econômicas, globalmente", resume um negociador europeu que compara a
Rio+20 à Rio92. "Neste sentido, nada mudou. Em 1992, o Brasil fez forte oposição à
incluir as florestas nas convenções."
Jornais
25/06/2012
Para número 2 da ONU, Rio90 foi "espetacular", e Rio+20,
"mais séria"
Por Do Rio
Para Lalonde, um dos méritos do documento final é contemplar quase todos os temas
da agenda global do desenvolvimento sustentável
O francês Brice Lalonde, 66 anos, foi o segundo homem na hierarquia das Nações
Unidas para a Rio+20, fazendo o elo entre os governos e a sociedade civil. O
coordenador-executivo da conferência diz que um dos méritos do documento final, "O
Futuro que Queremos", é ter contemplado quase todos os temas importantes da agenda
global do desenvolvimento sustentável e ter deixado portas abertas, mas reconhece
que o conteúdo ficou no terreno das intenções. Na comparação com a Rio92, considera
que aquela foi espetacular e esta pode ser "mais séria". Emenda dizendo que não temos
o "Himalaia, mas são alguns degraus".
Ex-ministro do Meio Ambiente da França, Lalonde diz que a ideia da economia verde
ficou no texto "graças aos brasileiros", mas que a discussão foi ideológica e não avançou
como poderia. A seguir, trechos da entrevista Valor. (D.C.)
Valor: O que o senhor achou do resultado da Rio+20?
Brice Lalonde: Bem, nós temos um acordo.
Valor: Um acordo fraco.
Lalonde: Foi difícil. Temos que tirar o chapéu para os diplomatas que tiveram êxito e
fizeram aquilo em três dias. O Itamaraty diz que este é um compromisso e acho que foi
um grande sucesso para o time que organizou esta conferência. Agora, os resultados,
como todos dizem, não são tão fantásticos como todos teriam gostado, mas isso é
complicado mesmo.
Valor: Há boas coisas neste texto?
Lalonde: Na minha visão, sim. Quase tudo está ali, mesmo que bastante fraco.
Valor: Quais serão os próximos passos?
Lalonde: Há alguns mandatos no documento, algumas decisões. Pediram à Divisão de
Estatística das Nações Unidas que faça uma proposta que nos leve além do Produto
Interno Bruto (PIB), há a decisão de um Fórum de Alto Nível para o desenvolvimento
sustentável que tem que ser construído. Há o fortalecimento do Pnuma. E o processo
para criação dos Objetivos de desenvolvimento sustentável, o que, na minha visão,
é o ponto mais excitante.
Valor: Por quê?
Lalonde: Porque as Nações Unidas têm sido um palco do forte diálogo entre ricos e
pobres, desenvolvidos e em desenvolvimento, mas nos ODS, a coisa é universal. É
para todos os países e temos que descobrir como fazer isso. Como poderemos
transformar as nossas economias para que respeitem o planeta.
Valor: E a sociedade civil? Na plenária, o representante disse que queria que se
retirasse o nome sociedade civil do documento final...
Lalonde: Nunca tivemos tal participação da sociedade civil. O protesto é decorrência de
um processo que é novo. É como perguntar a um produtor de carvão se ele gosta de
energias renováveis. É bem difícil encontrar um modo em que dois ou três índios
representem todos os povos indígenas do mundo, ou que duas ou três empresas
representem todas as companhias do mundo. Integrando a Internet ao processo, como,
claro, não aconteceu em 1992, engajamos muito mais a opinião pública com mais
representação.
Valor: Quais os pontos de decepção, na sua opinião?
Lalonde: Na economia verde. Acho que graças aos brasileiros ela está no texto, mas
algumas pessoas dizem que se trata de um modelo entre outros. Na minha visão, é o
modelo inevitável, aquele que diz que temos que cuidar da natureza porque não há
modelo possível se a destruirmos. Então é bastante curioso que exista um compromisso
sobre isso. A polêmica não é sobre economia verde, mas sobre mercados e
regulamentação estatal. Mas esta é outra questão. A discussão de economia verde ficou
refém de uma discussão ideológica.
Valor: Teria dado para avançar?
Lalonde: Sim. Eu gostaria que a Rio+20 tivesse dito: em 2 anos vamos fechar algo
sobre energia, em 3 anos será sobre cidades, em 5 teremos decisões sobre agricultura.
E agora teríamos que trabalhar. Mas não há calendário, não há mapa do caminho. Então
ainda há muita hesitação. É absolutamente crucial que um grupo de 10 países comece a
liderar. Isso foi algo que faltou aqui, a liderança, o país que mostrasse o modelo.
Precisamos deste grupo, que mostre que é possível, lidere pelo exemplo e influencie os
outros.
Valor: Precisamos de liderança, então?
Lalonde: Sim, de um acordo melhor, com compromissos mais fortes. O Brasil pode ser
um destes países. Tenho certeza que alguns europeus, também. Há que escolher os
aliados.
Valor: O presidente francês François Hollande disse que não estava feliz com o status do
Pnuma e mencionou a taxa sobre operações financeiras como um meio de apoiar o
desenvolvimento sustentável.
Lalonde: Fiquei muito feliz. Ele avançou. A Rio92 foi muito espetacular, tivemos todos
aqueles acordos. Desta vez é menos espetacular, mas talvez seja mais séria.
Valor: Como assim?
Lalonde: Bom, não temos o Himalaia, mas pequenos degraus. A Rio+20 pode ser o
começo de um processo de trabalho melhor. Temos pontos de partida em energia, no
estudo do PIB, até em oceanos. É hora de fazer o que se prometeu. Os brasileiros
permitiram que todas as portas ficassem abertas. Este foi o maior esforço - deixar
aberto, não fechar. Quem quiser trabalhar nesta agenda agora, pode.
Jornais
25/06/2012
Empresas precisam tomar a iniciativa, diz Bird
Por Juliana Ennes | Do Rio
A vice-presidente de Sustentabilidade do Banco Mundial, Rachel Kyte
A lição final que fica da conferência de desenvolvimento sustentável realizada na
última semana para o setor privado é de que não é preciso esperar. Pouco importa o
texto final acordado entre os líderes. O que importa é o movimento na direção do
desenvolvimento sustentável. Pelo menos essa é a opinião da vice-presidente de
Sustentabilidade do Banco Mundial (Bird), Rachel Kyte, que liderou a delegação da
banco na Rio+20.
Uma das medidas práticas para as companhias que ficou de fora do documento, mas
que pode acabar nascendo da conferência é a instituição de um relatório integrado,
que inclua tanto os resultados financeiros como o relatório de sustentabilidade, hoje
ainda não divulgado por muitas companhias. O problema para se implementar essa
mudança, segundo a representante do Bird, é que atualmente os relatórios financeiros
são calculados com bases trimestrais.
"A sustentabilidade não é algo que possa ser medido em uma base trimestral. Gestores
de recursos muito inovadores agora medem o sucesso dos ativos em seus portfólios
olhando para uma linha média de três anos. Se conseguirmos fugir dos relatórios
trimestrais para uma linha média de três anos, acho que haveria tempo de se entender
o que as companhias estão fazendo pelo lado da sustentabilidade", disse Kyte ao Valor.
Embora não haja atualmente obrigatoriedade de publicação do relatório de
sustentabilidade, ela já enxerga uma consciência geral sobre sua importância, e este
seria apenas o primeiro passo. O próximo deverá ser a adoção de padrões voluntários
de relatórios integrados, para que então organizações contábeis e auditores possam
ajudar a desenhar um modelo para o relatório. Só depois disso é que os reguladores
deverão perceber este mercado como maduro para passar a exigir a publicação.
A vice-presidente do Banco Mundial defende a existência de uma correlação entre a
performance social e ambiental e a performance financeira. A importância do relatório
de sustentabilidade seria a transparência dada à quantidade de recursos utilizados no
processo de produção e à confiabilidade sobre a origem dos produtos utilizados pelas
empresas. "Isso é muito diferente de 20 anos atrás. Há 20 anos, o setor privado era
visto como parte do problema. Hoje, a energia, o entusiasmo e as ideias são muito mais
focadas no avanço do setor privado, à parte do RioCentro [onde aconteceu a Rio+20]",
acredita.
Para Kyte, uma das grandes mensagens que sai da Rio+20n é a necessidade de uma
trajetória de crescimento diferente para se ter um desenvolvimento sustentável. "E
essa trajetória de crescimento vai ser mais inclusiva, e mais verde", disse. Apesar de
admitir que será um desafio para a sociedade, é também uma "grande oportunidade"
para o setor privado. "O setor privado faz duas coisas melhor do que ninguém: ele inova
e pode se mover mais rápido", disse.
Outra proposta considerada importante é a de recompensar as empresas por "bom
comportamento". Mas, para isso, seria preciso realizar mudanças no quadro regulatório,
na legislação de investimentos climáticos. Mas isso permitiria uma maior concorrência
entre as empresas que investem no desenvolvimento sustentável.
Uma oportunidade para o setor privado dentro das metas do desenvolvimento
sustentável seria a construção das cidades, que deverão continuam crescendo pelos
próximos anos. Segundo a vice-presidente do Banco Mundial para Sustentabilidade,
trata-se de uma "grande oportunidade" para empresas dos setores de transporte,
infraestrutura e agropecuário.
Jornais
25/06/2012
Rio+20 cobra relatório ambiental na Bolsa
Documento da conferência ressalta
informações sobre sustentabilidade
importância
de
companhias
divulgarem
Intenção é encorajar publicação de dados; empresas brasileiras "fazem bom trabalho",
afirma organização
CAROLINA
MATOS
DE
SÃO
PAULO
Em um esforço para incentivar empresas a divulgar relatórios socioambientais, o
documento final da Rio+20, conferência das Nações Unidas sobre desenvolvimento
sustentável, destinou um trecho ao tema.
O parágrafo encoraja companhias, especialmente as listadas em Bolsa, a publicar dados
sobre sustentabilidade.
São informações como uso de água e energia, conservação de florestas e sobre o
relacionamento com a comunidade onde a empresa está localizada, que devem ser
integradas aos dados financeiros.
Para Ernst Ligteringen, presidente global da GRI (Global Reporting Initiative), que
estabelece o padrão internacional para divulgação de relatórios socioambientais, as
companhias estão mais cientes da importância das informações, inclusive no Brasil.
Leia trechos de entrevista do executivo à Folha:
Melhorar relações
As empresas têm percebido que relatórios socioambientais consistentes podem ajudálas a melhorar a relação com investidores, acionistas e sociedade em geral.
Tanto integrantes do mercado financeiro quanto os clientes esperam que as companhias
sejam cada vez mais claras na divulgação de dados sobre sustentabilidade.
No Brasil, a Bolsa passou a recomendar que as empresas listadas publiquem essas
informações.
Aqui, a qualidade dos relatórios socioambientais ainda é variável, mas isso não é
surpresa porque se trata de algo relativamente novo e muitas companhias estão
começando nisso. Leva algum tempo para que qualquer empresa aprenda como
preparar um bom documento.
Comunicação
Uma das dificuldades é as empresas entenderem que não se trata de marketing, mas de
comunicar de forma consistente e objetiva que impactos ambientais elas têm causado e
o que tem sido feito para superar os desafios.
Países como Reino Unido, Alemanha e outros na Europa, e também o Japão, estão mais
desenvolvidos nessa área. Mas, no Brasil, as maiores companhias também têm feito um
bom trabalho.
Investidores
Grande parte dos investidores confia em analistas e gestores de recursos para
direcionar as aplicações. E esses profissionais analisam a performance das empresas em
sustentabilidade.
Também existem índices para avaliar o desempenho das companhias nesse quesito, e
muitos investidores são guiados por isso. Assim, ainda que os aplicadores não sejam
consumidores diretos dos relatórios socioambientais, os documentos acabam
influenciando as decisões.
O maior objetivo das informações, no entanto, não é ser ferramenta para a compra ou a
venda de ações no curto prazo, mas sim melhorar a relação da empresa com
investidores e a sociedade no longo prazo.
Jornais
25/06/2012
Fórum criado na Rio+20 fiscalizará o cumprimento de
compromissos
Atendendo interesse do Brasil de reforçar multilateralismo, órgão político da ONU
cobrará a realização de metas de desenvolvimento sustentável
LOURIVAL SANTANNA , ENVIADO ESPECIAL / RIO - O Estado de S.Paulo
A declaração final da
palavra que define o
parágrafos começam
decisões se referem
sustentável.
Rio+20 contém 23.917 palavras. Apenas duas vezes aparece a
resultado palpável de uma negociação: "decidimos". Os outros
com "reafirmamos", "reconhecemos" e equivalentes. As duas
à criação do Fórum de Alto Nível para o desenvolvimento
Esse novo fórum é a expressão objetiva de um ganho intangível perseguido há décadas
pela política externa brasileira: o avanço do multilateralismo. Ele substituirá a inofensiva
Comissão do desenvolvimento sustentável, criada na Eco-92. Sua função será
fiscalizar o cumprimento de compromissos sobre desenvolvimento sustentável
assumidos na Agenda 21 (firmada na Eco-92), no Plano de Johannesburg (na Rio+10) e
noutras conferências subsequentes, culminando na Rio+20.
A declaração lança um "processo de negociação aberto, transparente e inclusivo sob a
Assembleia-Geral (da ONU) para definir o formato do fórum de alto nível e aspectos
organizacionais com o objetivo de reuni-lo no começo da 68ª sessão da AssembleiaGeral (em setembro de 2013)".
A criação de um órgão político da ONU com dentes voltado para o desenvolvimento
sustentável atende ao mesmo tempo a dois objetivos do Brasil: reforçar o
multilateralismo e criar condições para cobrar de todos os países, mas especialmente
dos ricos em geral e dos Estados Unidos em particular, que façam a sua parte.
"A criação do fórum gera esperança de que as Nações Unidas possam trabalhar com a
questão do desenvolvimento sustentável num outro patamar", disse a ministra do
Meio Ambiente, Izabella Teixeira. "Esperamos que o fórum de alto nível não só seja
responsável pela avaliação da implantação dos Objetivos de desenvolvimento
sustentável, mas que traga para a centralidade das questões da geopolítica
internacional e do multilateralismo a discussão do desenvolvimento sustentável."
O fato de uma ministra de Meio Ambiente enfatizar um aspecto geopolítico quando faz o
balanço da Rio+20 não é casual. A Rio+20 foi uma conferência sobre o meio
ambiente. Mas, como acontece todas as vezes em que dois ou mais países se reúnem,
os interesses de Estado se sobrepõem a todos os outros.
Prioridade. O fortalecimento do multilateralismo é prioridade da política externa
brasileira desde sempre. A razão é simples: o Brasil não é nem será, num horizonte
visível, uma superpotência militar ou econômica. Sua projeção global depende de sua
liderança política, baseada em sua capacidade de articular posições com outros países e
de apresentar credenciais que o elevem à condição de modelo - em esferas como meio
ambiente, inclusão social e direitos humanos. Isso só é possível num ambiente
multilateral.
O êxito do Brasil na Rio+20, ou o êxito da Rio+20 para o Brasil, é visto pelo governo
desse ponto de vista. "O grande ganho dessa conferência é o multilateralismo", disse
Izabella. "É difícil construir consensos. Essa é uma das coisas mais ricas das Nações
Unidas. É complicado, é complexo. Porque temos de falar e saber ouvir e, com base na
posição de todos, construir o consenso."
Em muitos momentos da Rio+20, os agradecimentos de representantes de outros
países e da ONU pela "liderança" exercida pelo Brasil foram além das declarações
protocolares que se fazem normalmente aos anfitriões. Muitas vezes vieram carregados
de menções das credenciais brasileiras.
"Os grandes esforços do Brasil demonstram, mais uma vez, que o Brasil continua um
país profundamente dedicado à causa das Nações Unidas e é uma ponte entre o Norte e
o Sul", declarou, por exemplo, Nassir Abdulaziz Al-Nasser, do Catar, o atual presidente
da Assembleia Geral da ONU, na abertura da cúpula, na quarta-feira. "Mais que isso,
demonstra que o Brasil está dedicado a fazer uma contribuição original à comunidade
internacional, demonstrando como um país em desenvolvimento pode ao mesmo
tempo perseguir com sucesso a prosperidade material, a justiça social e o bem-estar
ambiental."
No sistema internacional, o poder é um jogo de soma zero. Para um país ganhar
influência, é preciso que outro a perca. Na Rio+20, isso ficou evidente na participação
opaca da secretária de Estado americana, Hillary Clinton. Ela não disse uma palavra
sobre o tema-chave da conferência: a necessidade de mudança dos padrões de
consumo. Com 4% da população do mundo,os EUA emitem 18% do dióxido de carbono.
Hillary preferiu anunciar - unilateralmente - programas de ajuda aos países pobres. Mas
a premissa de que os países ricos fazem certo e os pobres devem imitá-los já não cola nem na economia nem no meio ambiente.
Jornais
25/06/2012
Rio teve 110 mil visitantes, 50% além do previsto
conferência movimentou R$ 274 milhões na economia; Paes diz que trânsito fluiu bem
e que cidade passou no teste
Diego Barreto
A conferência das Nações Unidas sobre desenvolvimento sustentável (Rio+20)
movimentou R$ 274 milhões na economia da cidade, que recebeu cerca de 110 mil
visitantes, número 50% superior ao previsto. A informação foi dada ontem pelo prefeito
Eduardo Paes ao fazer um balanço do evento.
A organização da Rio+20 foi avaliada por Paes como "extremamente positiva". A
colaboração dos moradores nas alterações feitas no trânsito, o sucesso dos eventos
paralelos e a coleta de 42 toneladas de lixo reciclável estão entre os destaques
apontados pelo prefeito:
- A Rio+20 não é um evento trivial, reuniu num mesmo lugar e durante vários dias
quase cem chefes de Estado e de governo. A colaboração da população foi fundamental.
O carioca mostrou que gosta e tem orgulho de receber esses eventos na cidade. A
conferência foi um sucesso em termos de organização e operação logística.
Uma das preocupações durante a organização da Rio+20, o deslocamento de comitivas
e delegações pela cidade foi considerado um dos pontos altos. A implantação de
medidas como a faixa exclusiva na Linha Vermelha e a reversível da Avenida Niemeyer
fez com que o tempo de deslocamento médio das comitivas ficasse 25% abaixo do
esperado, segundo a CET-Rio. Foram 262 comitivas e delegações oficiais, que
realizaram mais de 1.200 deslocamentos na cidade.
O esquema de trânsito - alterado às pressas, às vésperas da conferência - foi
considerado satisfatório pelo prefeito. Mesmo no dia 19, quando o tráfego se tornou
caótico devido à chegada antecipada das primeiras comitivas. Nos 18 principais
corredores de trânsito da cidade, a média de deslocamentos variou de 21 a 36 minutos,
abaixo dos 51 minutos em dias normais.
- Houve impacto no trânsito, mas foi rapidamente mitigado pela comunicação e pela
agilidade operacional - frisou o secretário de Conservação, Carlos Roberto Osório,
coordenador de operações e logística durante a Rio+20.
Outra medida que funcionou, na avaliação do prefeito, foi a fixação de ponto facultativo
para reduzir o número de veículos nas ruas. O fluxo médio foi, em geral, 21% menor
que em dias comuns, chegando a uma redução de 47% no corredor Lagoa-Barra, e de
28% no Túnel Rebouças.
Tom Jobim lotado com saída de visitantes
O serviço de limpeza também foi citado como destaque. Quase um terço do total das
144 toneladas de lixo produzidas durante o evento foi recolhido por meio de coleta
seletiva.
O sucesso dos eventos paralelos também foi ressaltado. O Humanidade 2012, com 210
mil visitantes, e a Cúpula dos Povos, com 300 mil participantes, foram os recordistas de
público.
Indagado sobre o custo da organização, Paes disse que a contabilidade não foi fechada
ainda, mas que os ganhos para a cidade compensam os ônus:
- Existe um custo, mas prefiro nem contabilizar. Todo o investimento feito é para a
cidade, que saiu ganhando.
Apesar de a conferência ter acabado oficialmente sexta-feira, ontem a cidade ainda
respirava Rio+20. O Aeroporto Internacional Tom Jobim estava lotado, com visitantes
que estenderam sua estada na cidade.
À tarde, cerca de 200 ciclistas percorreram 14 quilômetros entre o Museu de Arte
Moderna (MAM), no Aterro, e o Forte de Copacabana, durante bicicleata promovida pela
ONU-Habitat para alertar sobre os problemas de mobilidade urbana.
Cariocas que deixaram para visitar o Parque dos Atletas no último dia encontraram
muitas das tendas já fechadas ou em processo de desmontagem. No fim da tarde, os
poucos visitantes que percorriam o espaço foram brindados com o carnaval da
Orquestra Voadora. O lugar abrigou mais de 50 tendas de países, estados brasileiros,
instituições e empresas, que apresentaram experiências sustentáveis.
COLABORARAM Felipe Sil e Ludmilla de Lima
Jornais
24/06/2012
Resultado de conferência decepciona
Mobilização a favor do consumo sustentável deverá continuar
A carta assinada pelas entidades de defesa dos direitos do consumidor que participaram
da Rio+20, a conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente, destacou que "o
futuro que queremos tem mais compromisso e ação, não apenas promessas". A carta foi
divulgada pela Consumers International (CI).
De acordo com Luís Flores, que coordenou os trabalhos da equipe da entidade durante o
evento no Rio, o resultado da conferência foi uma decepção para muita gente, mas
houve alguns pontos positivos. —
Será necessário algum tempo para entender o impacto da Rio+20, mas o que já está
claro é que, para nós, a luta pelo consumo sustentável é muito importante para nos
darmos por vencidos — afirmou.
Flores acrescentou que as oportunidades abertas pelo evento no Rio devem ser
aproveitadas ao máximo. E afirmou que todos aqueles que apoiam um futuro mais
sustentável devem "redobrar seus esforços para fazer com que ele se torne uma
realidade".
Entre os aspectos positivos do encontro destacados pela Consumers Internacional está o
fato de o documento final da Rio+20 ter associado o consumo sustentável aos
Objetivos do desenvolvimento sustentável, que serão o foco de novos estudos da
ONU.
Jornais
24/06/2012
Especialistas totalizam as perdas e os ganhos
No balanço da conferência, destaque para os eventos paralelos e da sociedade civil
Cláudio Motta
A Rio+20 pode ser considerada a maior conferência realizada pela ONU, sobretudo
quando se leva em consideração os eventos paralelos, dizem especialistas. Mas o seu
resultado oficial, expresso num documento considerado pouco ambicioso, a apequenou,
na análise de ONGs e da sociedade civil. O texto reflete a unanimidade possível de ser
obtida entre os 193 países-membros. Mesmo assim, ainda há motivos para o resultado
não ser considerado um fracasso total, como avaliam representantes da prefeitura e do
governo federal.
- Em relação à parte oficial, houve aspectos positivos, sobretudo a eliminação de vetos
que estavam há algum tempo pendentes - disse o sociólogo, escritor e comentarista da
CBN Sérgio Abranches. - O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma)
teve a indicação de que será fortalecido, assim como deverão ser criados os Objetivos
do desenvolvimento sustentável realizando uma ampliação das Metas do Milênio.
Ficaram faltando determinar as metas e os compromissos, que não foram determinados
porque a regra da unanimidade impede a decisão por maioria.
Toda unanimidade
é diplomática
A conferência, para o economista Sérgio Besserman, presidente da Câmara Técnica de
desenvolvimento sustentável da prefeitura do Rio, não foi uma, mas muitas. A
riqueza do evento, de acordo com ele, esteve na mobilização da sociedade, seja na
Cúpula dos Povos, nas reuniões de empresários, em fóruns de cientistas, de ONGs, e
das redes de cidades (uma referência à C-40, uma reunião com 59 prefeituras que
estipularam metas voluntárias para evitar a emissão de 1 bilhão de toneladas de gasesestufa até 2030).
- A conferência da ONU produziu um documento frouxo, que não está à altura da
urgência que a crise ecológica tem hoje. Nossos embaixadores e a ministra Izabella
Teixeira fizeram um grande trabalho, mas não havia atores querendo avançar - avalia
Besserman. - Na minha opinião, o Brasil poderia ter adotado uma posição mais
audaciosa, mesmo que isso resultasse na ausência de acordo. Não seria um fracasso
maior do que um documento sem força.
Os representantes de ONGs, por outro lado, foram mais críticos. Matthew Gianni,
conselheiro político da Deep Sea Conservation Coalition (que reúne 71 instituições),
lembra que ambientalistas pediram a retirada do texto oficial o trecho no qual há
menção à participação da sociedade civil.
- Como muitas ONGs têm falado, o resultado foi débil, sobretudo em relação aos direitos
da mulher, fim dos subsídios a combustíveis fósseis e a falta de uma posição que leve à
proteção da biodiversidade em alto-mar - reclamou Gianni. - O aquecimento global é
um perigo sem precedentes, tanto para nós, que moramos na terra, como para a
biodiversidade do mar. E, nesse sentido, não podíamos ter esperado tanto dos
governos, levando em consideração eventos anteriores da ONU. Mas, diante da urgência
ambiental, os governos ainda precisam fazer muito mais para nos dar a chance de
evitar uma catástrofe global nas próximas décadas.
Centro Rio+ é apontado como conquista
Em relação a conteúdo, o governo brasileiro reconhece que o documento final da
Rio+20 poderia ter ido além. As limitações, de acordo com a ministra do Meio Ambiente,
Izabella Teixeira, foram impostas pela necessidade de obter unanimidade para aprovar
uma resolução. No discurso oficial, porém, o resultado da conferência é considerado
muito positivo.
Entre os legados citados pela ministra do Meio Ambiente, que levou em consideração
também os benefícios criados em eventos paralelos, destaca-se o para a criação do
Centro Mundial de desenvolvimento sustentável (Centro Rio+), com sede no Rio,
que servirá para reunir órgãos nacionais e internacionais na discussão sobre o meio
ambiente.
- O que é adotado (na Rio+20) é consenso. Não necessariamente nossas vontades
prevaleceram 100%. O Brasil era mais ambicioso em relação ao alto-mar, por exemplo,
mas tivemos que conciliar - explicou Izabella. - Acho que o texto sinaliza um caminho
para coordenar as várias ações, e dar a importância aos oceanos que talvez em 1992
demos às florestas.
Segundo a ONU, durante a Rio+20, foram criados 692 compromissos voluntários entre
governos, ONGs, empresas, universidades e outros, nos eventos oficiais e paralelos
realizados antes e durante a conferência.
Jornais
24/06/2012
Protecionismo não cria bons empregos, afirma chefe da
OMC
Para Pascal Lamy, dirigente da Organização Mundial do Comércio, Brasil precisa
diversificar pauta de exportações
Francês, que participou da Rio+20, afirma que a política de câmbio da China está se
movendo agora na direção correta
CLAUDIA
ANTUNES
DO
RIO
Há sete anos diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), o francês Pascal
Lamy, 65, diz que criar barreiras à importação não ajuda a criar bons empregos. Para
ele, o Brasil precisa tomar medidas para diversificar sua pauta de exportações.
Em entrevista à Folha durante a conferência Rio+20, Lamy também disse que a China
está corrigindo sua taxa de câmbio, acusada por EUA e outros países de ser
artificialmente desvalorizada.
Folha - O que a OMC tem a ver com a conferência sobre desenvolvimento
sustentável?
Pascal Lamy - Se você olhar para a declaração final da Rio+20, há muito sobre como o
comércio aberto pode trabalhar para uma economia sustentável. Em relação à Rio-92,
é uma das áreas nas quais há hoje mais compromissos com o comércio aberto, no
sentido de reduções de tarifas sobre bens e serviços ambientais e de disciplinar
subsídios à pesca.
Isso não é uma contradição com o fato de que muitos países, incluindo o Brasil, estão
adotando mais medidas de proteção?
Isso é correto. Temos um estudo feito para o G20 com as medidas tomadas por países
para restringir ou abrir o comércio que mostra que recentemente tivemos um saldo
negativo, com mais medidas protecionistas. Isso é um sinal preocupante.
Mas, até onde eu sei, nenhuma dessas medidas teve a ver com proteção ambiental,
mas com conteúdo local, antidumping, defesa comercial, aumento de tarifas.
Ainda há lugares neste planeta em que algumas pessoas acreditam que conter as
importações protege os empregos. Não é o que os números dizem. Existe a necessidade
de proteção em tempos de crise, para conter seus efeitos sociais, mas há muitas
maneiras de proteger empregos sem cair no protecionismo.
O senhor pode ser mais específico? A que estudo está se referindo?
Temos estudos nossos e da Organização Internacional do Trabalho. Por definição, você
importa onde sua economia não é competitiva e exporta onde é mais competitiva.
Quando uma parte cada vez maior de suas exportações é feita de importações que você
processa, proteger empregos no lado da importação pode preservar postos, mas leva à
perda de empregos no setor exportador. E os que você protege são de menor qualidade,
o que deteriora a competitividade de sua economia.
Isso, eu admito, depende do quanto o seu país está inserido nas cadeias globais de
produção. É verdade que países como o Brasil e a Argentina, no momento, estão
provavelmente menos inseridos nessas cadeias do que Chile, Peru ou Colômbia.
Mas, no final, o comércio brasileiro terá de se diversificar. As autoridades e as empresas
brasileiras estão cientes de que concentração demais do comércio em commodities e
matérias-primas é algo frágil, porque, no momento em que a economia chinesa
desacelerar, o impacto nas exportações será maior.
Mas o Brasil terá de fazer essa diversificação sem proteger a indústria, como fizeram a
Coreia do Sul e mesmo os europeus no passado?
Todo mundo cita esse exemplo da Coreia do Sul. A realidade é que essas economias se
abriram, e a questão de você atribuir o sucesso em competitividade ao fato de que elas
se protegeram ou ao fato de que se abriram é muito difícil de responder. Também
provavelmente é verdade que, dados os novos padrões de comércio, em que a produção
está localizada em diferentes países, as coisas não funcionam mais como funcionavam
há 50 anos.
Quem está certo na disputa entre EUA e a China sobre manipulação do câmbio?
O que importa é que a China caminhe para uma maior conversibilidade de sua moeda,
porque, no momento em que a moeda é conversível, a suspeita de manipulação do
câmbio deixa de existir.
No documento aprovado na cúpula do G20, há o reconhecimento de que a política de
câmbio da China está se movendo na direção correta.
Jornais
24/06/2012
Sono profundo e a vitória da diplomacia
Mesmo com suas críticas e fracassos, o evento brasileiro fez eco nos quatro cantos do
planeta e colocou a palavra sustentabilidade em forte evidência, com a cobertura de
mais de 2 mil jornalistas do mundo todo
Os discursos mais esperados da conferência Rio+20 – os derradeiros – foram tão
desmotivantes que nem os próprios debatedores tiveram ânimo para assisti-los.
Durante a reunião final entre os chefes de Estado, por volta das 20h de sexta-feira, um
representante asiático cochilou enquanto seu colega falava sobre o futuro comum. O
assunto estava tão bom que deu até sono.
Após o término da sonolenta conversa, com o documento em mãos, as discussões
travadas na Rio+20 saem do nível de quem decide para o nível de quem executa. E aí é
que se saberá se a conferência foi efetiva ou não.
De maneira geral, as expectativas são baixas. Não é o pessimismo que permite essa
afirmação, mas a recuperação histórica dos fatos. Há 20 anos, o término da Eco92 levou
a sociedade a criticar, da mesma maneira que hoje, as decisões tomadas por seus
líderes. Manchetes e coberturas jornalísticas da época permitem comparar isso.
A época era outra. Não estive lá, mas imagino que não havia telões em LCD, aplicativos
para celular com a programação da conferência, nem o acesso tecnológico que
permitisse a participação ativa da sociedade.
Falo aí de um aspecto em que o evento triunfou. Nestes quase dez dias em que ocorreu,
a Rio+20 fez eco nos quatro cantos do planeta. A presença de mais 2 mil jornalistas nas
inúmeras salas de imprensa do evento assegura que, pelo viés positivo ou negativo, as
pessoas ao redor do mundo falaram ou ouviram falar sobre a sustentabilidade. Já é um
avanço.
Sobre fracasso ou sucesso, depende muito de quem está vendo. Os interesses
envolvidos são inúmeros e passam pelo crivo de setores mais diversos – da educação à
agricultura, da arquitetura aos negócios, da mobilização social ao marketing verde.
Envolve poder de decisão, de ação. Mas também envolve sensibilidade e reflexão.
Dilma
frustrou
as
expectativas
É um assunto que toca a todos, e envolve diretamente a democracia, mas faltou pulso
firme e um pouco mais de imposição para que se chegasse a melhores conclusões.
Quando ao final já não se esperava mais nada, Dilma anunciou em tom solene que esse
foi um passo histórico para a humanidade. Dilma terminou o evento de bem com o
mundo, e de mal com a população que esperava dela muito mais objetividade.
Metas mais ousadas não foram vistas na Rio+20 porque nesta conferência viveu-se a
apoteose da diplomacia. O Brasil, como um país do Hemisfério Sul em plena
ascendência econômica, teve papel decisivo para que os blocos principais, desenvolvidos
e
nações
em
desenvolvimento,
chegassem
a
consensos
equilibrados.
Teve liderança para firmar a erradicação da pobreza como meta do desenvolvimento
sustentável, colocar o Brasil em quinto no novo índice de medição do
desenvolvimento, além de destinar US$ 6 milhões para o PNUMA e US$ 10 milhões
para as mudanças climáticas.
O Brasil não ajudou o mundo a despertar de um sono profundo. Mas, por estes dias da
conferência,
permitiu
que
muitos
colocassem
seus
sonhos
na
mesa.
Lara Ely
Jornais
24/06/2012
Documento da Rio+20 provoca saudades da Rio 92
Apesar de a primeira cúpula ser considerada mais robusta, ainda faltam resultados
concretos
Receber críticas não é exclusividade do documento aprovado pelos chefes de Estado na
Rio+20. A Rio 92 também desagradou a ambientalistas, que esperavam muito mais do
encontro promovido pela ONU. Especialistas afirmam, no entanto, que dificuldades
econômicas e políticas - e não ambientais - permitiram que os negociadores
conseguissem, há 20 anos, termos mais robustos e inovadores do que agora.
Na época em que o telefone celular era um tijolão usado por poucos, não havia crise
econômica assolando o planeta e a geopolítica mundial registrava fatos como a queda
do Muro de Berlim, em 1989. Além disso, a Constituição do Brasil, de 1988, foi uma das
primeiras a ter capítulos sobre meio ambiente. A Rio 92 comemorava os 20 anos da
conferência ambiental de Estocolmo e discutia os resultados do relatório da comissão
independente sobre meio ambiente e desenvolvimento, o Relatório Brundtland,
chamado de "Nosso futuro comum", publicado em 1987.
- A Declaração do Rio, de 1992, passou a ser a bíblia dos ambientalistas. Ela falava das
responsabilidades comuns, porém diferenciadas, isso leva em conta as diferentes
contribuições para a degradação ambiental que os países tinham provocado - explica
Haroldo Mattos de Lemos, coordenador dos cursos de pós-graduação em gestão
ambiental da Escola Politécnica da UFRJ. - Os estados têm direitos soberanos de
explorar seus recursos, mas têm a responsabilidade de assegurar que suas atividades
não causem danos ao meio ambiente de outros estados.
A Rio 92 produziu a Declaração sobre Florestas, que foi discutida durante a
conferência. As convenções sobre Mudanças Climáticas e Biodiversidade Biológica já
vieram com o texto pronto. Elas criavam mecanismos próprios: os países que as
ratificassem passavam a fazer parte das conferências das partes (COPs). O Protocolo
de Kyoto, com metas para reduzir os gases-estufa, também pode ser considerado um
legado, embora não tenha funcionado muito bem.
Houve, ainda, um compromisso para que os países aprovassem a convenção das Nações
Unidas para desertificação e a sugestão para a criação de uma comissão para o
desenvolvimento sustentável.
A Agenda 21 também foi um instrumento apresentado na Rio 92. Preparada pelo
secretariado da conferência, não resultou do debate entre os países. Esse documento
apenas era uma sugestão, que cada país poderia aceitar ou não, e que era voltado
principalmente para países em desenvolvimento.
A maioria esmagadora desses instrumentos criados em 1992, porém, não conseguiu
grandes avanços concretos, lamentam especialistas. Já o documento assinado na
Rio+20 nasce sendo chamado de aguado. Ele pode ser resumido como a reafirmação de
compromissos estabelecidos em 1992, mas também apresentou alguns avanços. Os
Objetivos do desenvolvimento do Milênio terão, em 2015, parâmetros de
sustentabilidade.
O fortalecimento do Programa de Meio Ambiente das Nações Unidas (Pnuma) é citado,
assim como o fim do subsídio que possa resultar em sobrepesca ou pesca ilegal, mas o
documento não define como nem quando. Para muitos, o melhor da conferência foi a
mobilização da sociedade civil e o compromisso de prefeitos de grandes cidades em
reduzir emissões.
- Ficou provada a fragilidade dos Estados, mas, ao mesmo tempo, surgem atores mais
fortes, como as cidades - disse Rosiska Darcy, presidente do Rio Como Vamos.
Jornais
24/06/2012
Rio +20: então tá combinado, depois a gente vê como é
que fica!
por maria paula
Parecia que era para decidir. Mas a decisão foi deixar pra depois. Gostaria de poder
dizer que não importa. Só o fato de lideranças de tantas nações terem tido a
oportunidade de se encontrar, debater e expressar opiniões já valeu! Sim, valeu. A
conferência das Nações Unidas para o desenvolvimento sustentável foi incrível, só
não cumpriu sua função.
Assistindo a uma mesa que discutia Belo Monte e suas repercussões tanto na economia
quanto no ecossistema, vibrei diante do confronto aberto entre o cientista da USP e o
representante do Ministério das Minas e Energia! Foi bom lembrar que os tempos da
ditadura militar já passaram, que podemos exigir o direito de querer saber como as
decisões estão sendo tomadas e o que está sendo feito com o nosso patrimônio coletivo.
No entanto, o desfecho mostrou que não há como evitar que os interesses privados de
algumas empresas multinacionais — que são mais poderosas do que qualquer governo
— prevaleçam. Neste contexto, concluímos que, no final, a democracia não existe. O
triste fato é que as campanhas políticas são financiadas por essas empresas, que, ao
chegar ao poder, não hesitam em legislar em causa própria...
E lá se vão as florestas, os rios, os oceanos, os povos indígenas, a biodiversidade,
enquanto seguimos aceitando o uso de energia suja. Enquanto os combustíveis fósseis
continuam sendo a principal fonte de energia mundial, lá se vão nossas esperanças.
Minha filha de 8 anos, carioca da gema, nem estranhou o nó no trânsito da cidade nos
últimos dias. O trajeto de casa à escola, que geralmente fazemos em 15 minutos, de
repente, passou a demorar quase uma hora para ser percorrido! E ela me surpreendeu,
afirmando que era um mal passageiro, que o mais importante era o encontro mundial
que estava acontecendo e que ela estava gostando da ideia de sua cidade ser o palco
central de um evento como esse, apesar da confusão nas ruas.
Fiquei admirada e orgulhosa, primeiro por ela estar tão bem informada e saber de
detalhes da Rio +20, mas principalmente por ver, nos olhinhos da minha pequena, um
brilho de esperança e o desejo de assumir as rédeas do destino do planeta. Revelou-se
pronta para decidir o que vale ou não a pena. Acha o trânsito chato, claro, mas chance
de opinar, não.
O jeito, agora, é fazer pressão para que não sejam necessários mais 20 anos para que
as velhas tecnologias sejam finalmente substituídas pelas novas.
Jornais
24/06/2012
Rio+20 reafirma o passado e adia decisões para o futuro
Conferência de nove dias enfatizou problemas e apontou caminhos para o
desenvolvimento sustentável, mas deixou a responsabilidade de resolvê-los para a
Assembleia-Geral das Nações Unidas
HERTON ESCOBAR, ENVIADO ESPECIAL / RIO - O Estado de S.Paulo
É difícil explicar qual foi o resultado prático da Rio+20. "Um ponto de partida", "uma
agenda para o século 21", "uma plataforma para o desenvolvimento sustentável",
foram alguns termos usados por políticos e diplomatas para descrever o legado da
conferência. O documento final, intitulado O Futuro que Queremos, tem 49 páginas,
com 283 parágrafos, organizados em seis capítulos: Nossa Visão Comum, Renovação
dos Compromissos Político, Economia Verde, Estrutura Institucional, Estrutura de Ação e
Meios de Implementação. Cada parágrafo traz algum tipo de afirmação, em que os
países reconhecem algum problema, se comprometem com algum ideal ou - em alguns
casos - com alguma ação específica.
Em sua maior parte, o documento "reafirma" compromissos de conferências
anteriores. Entre eles, os princípios da Eco-92. Um resultado comemorado pelo Brasil,
visto que havia pressão para rever alguns desses princípios - em especial, o das
"responsabilidades comuns, porém diferenciadas". Mas que deixa no ar uma certa
frustração. Reafirmar o que já foi acordado 20 anos atrás deveria ser o ponto de partida
da conferência, não uma de suas principais conquistas.
Jornais
24/06/2012
Rio+20 joga para o futuro ações para salvar o mundo
Documento fraco, que reflete esgotamento do modelo de cúpula da ONU que exige
consenso, empurra metas para 2015
A conferência das Nações Unidas sobre desenvolvimento sustentável, a Rio+20,
terminou na sexta-feira deixando um rastro de críticas das organizações não
governamentais - que consideraram o documento final pouco ambicioso - e um legado
que só deverá mostrar resultados a partir de 2015.
Em sua maior parte, o documento "reafirma" compromissos de conferências
anteriores. Entre eles, os princípios da Eco-92. Um resultado comemorado pelo Brasil,
visto que havia pressão para rever alguns desses princípios - em especial, o das
"responsabilidades comuns, porém diferenciadas", segundo o qual os países ricos se
comprometem a transferir recursos para os mais pobres investirem no
desenvolvimento sustentável.
Mas a declaração final, intitulada O Futuro que Queremos, deixou no ar uma certa
frustração. Reafirmar o que já foi acordado 20 anos atrás deveria ser o ponto de partida
da conferência, não uma de suas principais conquistas.
O resultado mais concreto da Rio+20 só vai começar a aparecer em 2015, depois do fim
do mandato da presidente Dilma Rousseff. Daqui a três anos, as Nações Unidas deverão
apresentar metas de desenvolvimento sustentável a serem perseguidas por todos os
países, assim como a origem do dinheiro para ajudar os países mais pobres a
cumprirem os chamados Objetivos do desenvolvimento sustentável.
A pergunta que fica é por que foi convocada uma conferência de alto nível para jogar
qualquer decisão para frente. Parte da resposta se deve ao modelo das conferências
de cúpula da ONU, cujo documento final exige sempre aprovação por consenso. Basta
um dos 193 países da ONU não aceitar um parágrafo para gerar o impasse. Por isso,
fechar o texto final exige negociações complexas e demoradas.
A estratégia brasileira, diante do possível impasse, foi costurar um texto-base que não
ameaçasse o resultado final da conferência. Isso implicaria evitar temas polêmicos e
metas numéricas. Embora a diplomacia brasileira, responsável pelo comando das
negociações, tenha sido elogiada, ONGs e até algumas delegações estrangeiras
criticaram a pressa do País em fechar o texto antes da reunião dos chefes de Estado e
de governo, nos últimos três dias da Rio+20. A avaliação é que as negociações
chegaram ao limite - e a opção foi por evitar qualquer risco.
Negociadores brasileiros reconheceram que se frustraram pela Rio+20 não ter
conseguido obter pelo menos a indicação dos temas a serem tratados pelas futuras
metas. Faltou consenso em relação a isso, sobretudo pela dificuldade em discutir
compromissos em relação à redução das emissões de gases de efeito estufa.
No jargão diplomático, a presidente Dilma Rousseff afirmou que a Rio+20 é uma
conferência de partida, ou seja, que lança processos para que alguns assuntos - como
os Objetivos do desenvolvimento sustentável - sejam tratados e definidos nos
próximos anos. Mas é sempre bom lembrar que a própria Eco-92 também foi em si uma
conferência de partida, ao criar convenções para discutir questões como mudanças
climáticas e biodiversidade. Dela praticamente nada se concretizou até hoje, e sobre
isso ninguém tem nem coragem de dizer nada em contrário.
Em meio ao clima de frustração, no último dia da conferência foi anunciado que a
Rio+20 rendeu cerca de 700 compromissos voluntários entre ONGs, empresas,
governos e universidades. Isso significa um investimento de US$ 513 bilhões para ações
de desenvolvimento sustentável nos próximos dez anos. Foi talvez, o melhor
resultado da conferência.
Jornais
24/06/2012
Entrevista :: Indiana Jones da causa ambiental
Philippe Cousteau, apresentador e ativista da causa ambiental
Bruno Deiro
Nascido seis meses depois do acidente aéreo que vitimou seu pai em 1979, Philippe
Cousteau Jr. só pôde conhecê-lo por meio dos populares documentários do avô, Jacques
Cousteau. Mais que o sobrenome famoso, porém, Philippe herdou a paixão pelos temas
ambientais e veio ao Brasil na semana passada para gravar dois programas para a CNN
International durante a Rio +20.
Desde o início do ano, ele comanda a série The Road to Rio, que passou por países
como Índia, China e México para apresentar exemplos de desenvolvimento
sustentável. No Parque dos Povos, o último episódio foi gravado em um painel que
será exibido no canal no dia 29. Ativista ambiental e fundador da EarthEcho
International, ONG criada ao lado de sua mãe, Jan, e da irmã, Alexandra, Philippe
admite que o documento final da conferência causou frustração.
Mas a aposta do ambientalista de 32 anos está mesmo nos programas que produz.
Empolgado, compara suas aventuras às de Indiana Jones e diz que ingressou na Bolsa
de Nova York motivado pelos exemplos que mostra em Going Green, outro programa do
canal que foi gravado no País.
• O que o público pode esperar deste último episódio da série The Road to Rio?
O programa é parte de uma série que apresentamos antes de grandes conferências
climáticas. Fizemos em Durban no ano passado e agora produzimos para o Rio, ainda
veremos qual será o próximo. No Brasil, falamos sobre o que mudou nos últimos 20
anos (desde a Eco-92) e o que esperar após a conferência. Então, teve um formato
um pouco diferente dos programas anteriores, no México e na China, em que
mostrávamos perfis de boas práticas em determinadas cidades.
• Como a frustração sobre os resultados da conferência no Rio influenciou a
discussão?
Não afetou tanto, mas com certeza foi tratado. As pessoas precisam assistir, pois não
posso falar pelos outros, mas foi parte do tópico. Há uma frustração geral com este
rascunho, porque é sem dentes, fraco, sem ações mensuráveis, sem fórmula para forçar
o comprometimento com ações.
• A falta de proteção aos oceanos foi bastante criticada no rascunho. Como vê
a questão?
O mar está exposto, é como o oeste selvagem. É, preciso impor leis, pois menos de 1%
do oceano está protegido e tudo fica cada vez pior com as tecnologias de pesca. Com
barcos maiores e radares modernos, se pode pegar até o último atum e incontáveis
toneladas de camarão e tubarões, por exemplo.
• Como tornar atrações voltadas para temas ambientais mais interessantes
para o grande público?
Com boa TV e boas histórias, a verdade pode ser mais excitante e interessante do que
qualquer história que criamos no papel. Em Avatar, muito do que James Cameron
colocou na ficção científica daquele mundo é baseado em criaturas do oceano. Se você
consegue trabalhar bem a história, as melhores virão de aventuras na natureza.
• Você vê um interesse crescente por este tipo de programa?
Em setembro, vai ao ar uma expedição que fizemos para a Indonésia cheia de insetos,
trilhas off road, situações em que pessoas quase morreram, ataques de tigres, algo
como Indiana Jones. São histórias maravilhosas, pois é um Indiana Jones da vida real,
algo que não é fácil de se fazer. E acho que é isso que explica a popularidade dos filmes
do meu avô, eram aventuras reais e se posicionavam em relação a algo. E hoje, em um
mundo cheio de problemas, disparidades, poluição, manchetes de jornais cheias de
desastres, acho que as pessoas buscam esperança. Elas querem boas histórias, querem
aventura, rir, chorar, e um pouco de esperança. É isso que temos tentado fazer na
televisão e faremos mais nos próximos anos: contar boas histórias e dar esperança.
• Quanto você assistiu do material produzido por seu avô?
Vi todos os filmes muitas vezes e li quase todos os livros.
• Como estes filmes influenciaram no seu trabalho?
Meu pai morreu seis meses antes de eu nascer, mas ele produziu, filmou e dirigiu 26
dos documentários de meu avô desde o fim da década de 60, até morrer em 1979.
Então, crescendo com os filmes do meu avô, os meus favoritos são da década de 70,
pois também é um jeito de ver e conhecer meu pai, e isso foi realmente a inspiração
para mim. Minha mãe participou de expedições por 13 anos e criou minha irmã e eu
como mãe solteira. Então, convivi com meu avô até os meus 17 anos, foi uma grande
inspiração, mas crescer com as histórias da minha mãe e ver meu pai pela televisão foi
realmente importante para mim.
• No Going Green, outro programa apresentado por você no canal, o foco está
na economia verde. Tem sido difícil achar bons exemplos pelo mundo?
A parte mais difícil do Going Green é que, com tantas boas histórias, é preciso escolher
quais contar. Não mostramos só o que se espera de um programa ambiental, como a
proteção de árvores e de água limpa. E sobre como o setor privado está mudando o
jeito de se fazer negócios. Trabalho com empresas de todo o mundo, vejo indústrias
farmacêuticas e automobilísticas que tiram até 35% de sua energia de fontes
renováveis, o que é melhor do que qualquer governo.
• Com tantas viagens pelo mundo, onde você passa as férias?
Vivo em Washington, passo boa parte do tempo em Los Angeles e tenho um fundo de
desenvolvimento sustentável que investe na Bolsa de Nova York, o que aliás me
deixa orgulhoso, pois consegui pôr em prática as coisas de que falo. Tenho muita sorte
de visitar, por causa do meu trabalho, lugares como selvas na Indonésia e no México.
Mas meu lugar favorito é minha casa, dormindo numa manhã de domingo. Minhas férias
são, como dizemos, "staycations" (gíria para descanso em casa), com meu cachorro e
minha namorada, fazendo uma panqueca para tomar o café da manha.
Jornais
24/06/2012
20+20 =zero
O número nas duas cimeiras, Rio+20 e G20, é coincidência. Já a falta de resultados não
é
Sérgio Augusto
Os líderes do planeta passaram a semana na praia. Em Los Gabos (México) discutiram a
crise econômico-financeiro-social global; no Rio de Janeiro, a crise socioambiental
global. Para aquele marciano da piada, teria sido mais negócio descer no primeiro
balneário. Se viesse direto para o segundo, não encontraria Barack Obama. Nem Angela
Merkel e David Cameron, que tampouco emendaram a reunião de cúpula do G20 com a
conferência das Nações Unidas sobre desenvolvimento sustentável. Os três
grandes ausentes da Rio+20 deixaram bem claro que o caos na economia os preocupa
bem mais que o caos ambiental. Como se não houvesse uma correlação entre os dois e
apenas um deles exigisse atenção máxima e decisões firmes e imediatas.
O número 20 é coincidência. O impasse nas duas cimeiras, não. Só em oftalmologia
20/20 é uma boa combinação.
O G20 ainda era G7 quando se reuniu pela primeira vez, por causa da crise do petróleo
e da recessão de 1974. Os sete grandes ficaram de repensar o capitalismo, mas, a
rigor, apenas relaxaram as regras e a vigilância que, ao menos teoricamente, poderiam
mantê-lo funcionando em benefício do maior número de pessoas. As consequências do
laxismo culminaram no apagão financeiro de 2008. Só o setor bancário e de câmbio
enfrentaram 332 crises, algumas sistêmicas, entre 1970 e 2008.
Criado em 2003, o G20 foi um canto de sereia para atrair o excedente asiático e, em
seguida, o surplus dos Brics, da Arábia Saudita e da Turquia. As promessas feitas pelos
próceres do G7 - uma infraestrutura regulatória mais robusta para as finanças e um
papel maior do G20 nas instituições financeiras internacionais - não saíram do ovo.
"Para injetar recursos, precisamos ter um certo controle", argumentou, com lógica
meridiana, Li Dakoui, do comitê de políticas econômicas do Banco Central da China.
"Não podemos emprestar dinheiro para que o gastem irresponsavelmente", prosseguiu
o representante de uma economia que escapou do veneno dos derivativos, do consumo
conspícuo subsidiado e dos empréstimos fáceis dos bancos de um certo Ocidente. "Não
é justo que vocês, ricos, continuem levando uma vida luxuosa, pegando empréstimo
com os pobres", arrematou Li. Na moleira.
Incentivos ao crescimento, garantia de estabilidade, apoio a uma união fiscal europeia
mais forte - tudo isso se falou em Los Cabos, e continuará sendo falado na próxima
semana, quando o G20 voltará a reunir-se, longe da praia, para reiterar promessas de
novos recursos para o FMI, ampliação do poder dos países emergentes no Fundo, e,
como gostava de dizer o rei do Sião, etc, etc, etc. Ações efetivas? A ver. Em dois anos
de crise do euro, a única solução posta na mesa foi a austeridade contraproducente,
proposta e defendida com pétrea caturrice por frau Merkel. Nem o aliado Obama
acredita em sua eficácia.
Há dias, Raymond Torres, diretor do Institute for International Labour Studies, pôs na
mesa um dado bem mais que curioso: países que optaram por medidas
macroeconômicas voltadas para o emprego tiveram melhores resultados econômicos e
sociais, muitos deles tornaram-se mais competitivos e contornaram a crise com mais
facilidade que os que seguiram o caminho da austeridade.
O marco histórico da Rio92 não teve continuidade em Johannesburgo, em 2002; nem
em Durban, seis meses atrás, com dados ainda mais alarmantes sobre o meio ambiente
à sua disposição, as autoridades ditas competentes esboçaram um planejamento
urgente para reverter a destruição do nosso ecossistema. Sobrou para a Rio+20.
Agradecemos a honra, a primazia, mas, apesar dos esforços da presidente Dilma e do
Itamaraty, a impressão que ficou é de que não avançamos nada, que perdemos mais
uma oportunidade de alterar o curso da história, de virar o jogo do desenvolvimento
sustentável (ou o ambientalismo dos pobres) contra o capitalismo verde (ou o
ambientalismo dos ricos).
Dos 90 objetivos importantes agendados para a Rio+20, apenas 4, se tanto,
emplacaram satisfatoriamente. O resto ficou na promessa. A preservação e a
capacidade de recuperação socioambiental do planeta continuaram Comprometidos.
Não há o que comemorar. A menos que se considere meritória - e ecologicamente
produtiva - a prensa que a anfitriã da Rio+20 deu em Ban Ki-moon após sua crítica à
falta de ambição do texto a duras penas coordenado pelo ministro Patriota, recolha-se o
champanhe. Nem depois que o representante máximo da ONU foi a Canossa e qualificou
o documento de "ambicioso, amplo e prático" o sentimento geral de frustração diminuiu.
Ao contrário, cresceu.
Como Washington Novaes aqui previu, semanas atrás, a declaração final da Rio+20
resultou genérica e sem compromissos obrigatórios, com prazos certos e cobráveis.
"Ganhou a burocracia, perdeu a Terra", resumiu à perfeição o correspondente do El País
no Brasil, JuanArias.
A exemplo do modelo de gestão da economia mundial, o modelo de discussões sobre o
meio ambiente, privilegiando acima de tudo a eliminação de pontos polêmicos, o
acochambramento prévio, já deu o que tinha que dar, esgotou-se.
Como buscar consenso entre partes aparentemente irreconciliáveis, com interesses
antagônicos? As grandes corporações veem a natureza como simples commodity e, com
honrosas exceções, não se interessam em aumentar o custo de sua produção para
implementar as reformas necessárias à superação da crise global de sustentabilidade,
preferindo investir milhões de dólares no boicote a políticas que, na sua visão estreita,
cerceiam a livre iniciativa e comprometem o progresso.
A pindaíba global em curso deu novo alento à desconversa. Que ninguém se surpreenda
se, na próxima cimeira climática, um ambientalista dos ricos invocar a palavra mágica
"austeridade", sugerindo que economizemos até o nosso consumo de água e oxigênio.
Jornais
24/06/2012
Suave apocalipse :: Roberto Simon
Slavoj Zizek é um pensador pessimista, com moderação. Lança críticas à ordem
geopolítica global e à política de causas miúdas "que servem apenas para você se sentir
bem", mas se engaja com entusiasmo no movimento Occupy Wall Street. Aponta a
desesperança de uma Europa em crise total, mas olha com simpatia para o Brasil dos
últimos anos. Reconhece a importância de encontros como a Rio+20, mas vaticina que
jamais poderão evitar o pior. No caso, um mais metafórico que literal apocalipse, "que
não quer dizer apenas desastre, mas hora da verdade".
Na entrevista a seguir, concedida com exclusividade para o Aliás, Zizek - que lança
Vivendo no Fim dos Tempos (Boitempo) no mês que vem no País - faz um balanço da
conferência verde do Rio de Janeiro em meio a um cenário de desolação global.
• Eventos como a Rio+20, reunindo centenas de líderes mundiais, ONGs,
empresas, etc, podem encontrar um denominador comum em relação ao
desenvolvimento sustentável?
Sou um pessimista moderado. Claro que devemos usar de todos os recursos à
disposição - estratégias de mercado, maior taxação sobre poluidores, regulação do
Estado, etc - para lidar com a questão. Mas será que estamos levando realmente a sério
a ameaça de uma crise ecológica global? Embora saibamos racionalmente que o perigo
está aqui, de certa forma não acreditamos, não levamos a sério. Então os líderes
sentam, conversam e aceitam compromissos insuficientes. Então, há o que chamo de
"medidas de superstição", que servem para fazer você se sentir bem. Somos
bombardeados com mensagens como "Recicle", "Não jogue fora seu jornal", "Não
desperdice garrafas de Coca-Cola". Está bem, mas isso não resolverá o problema.
• Grandes decisões em cúpulas internacionais não seriam capazes disso?
Elas nunca serão satisfatórias. Precisaríamos de uma coordenação internacional imensa,
de um novo eixo global, que não existe. Imaginemos que as atuais tendências
climáticas se mantenham: partes do mundo como a Somália, a África Subsaariana e o
norte da China se tomarão progressivamente inabitáveis, enquanto outras, como o
norte da Sibéria, passarão a ser perfeitamente habitáveis. Teremos de começar a"
pensar em mover grandes populações, milhões de pessoas, de um lugar da Terra para
outro. Alguns Estados já estão considerando o que chamam de "geoengenharia", com
imensas intervenções na natureza para moldá-la. Mas não há consenso político
internacional para tanto. Nem dá para colocar toda a culpa por essa ideologia nos
governos. Veja o caso do Brasil: você escutam essa história de aquecimento global e,
quando saem de casa, veem todo aquele verde, plantas crescendo, tudo vivo ao seu
redor. Você simplesmente não consegue aceitar a ideia da ameaça ecológica.
• Por que em seu livro o sr. chama a ecologia de um dos quatro cavaleiros do
apocalipse?
Espere um minuto: eu constantemente digo que há um lado exagerado nesse medo, das
profecias maias, de 2012, do "fim dos tempos". Não afirmo que ocorrerá uma catástrofe
em poucos meses, mas que estamos nos aproximando de uma espécie de ponto zero. O
que eu estou dizendo é que em quatro, cinco domínios humanos vivemos uma
perspectiva de "catástrofe". Assistimos ao boom da China com a consciência de que o
planeta não tem recursos suficientes para a continuidade dele. Sabemos que se o
aquecimento global não nos levar literalmente ao fim do mundo, vai alterar as condições
para o desenvolvimento em cada país. Ninguém sabe ao certo as consequências. Uma
imprevisibilidade que se mostra também a nível da ciência, com a biogenética, a
interação do computador com o cérebro humano, etc - tudo muito fascinante, mas
ninguém sabe onde vai dar. Tampouco sabemos como e se o capitalismo financeiro vai
se autorregular - e se haverá novos apartheids e exclusões sociais em massa. Vemos
que um mercado global cada vez mais abrangente não significa que seremos parte de
um todo, um grande mundo civilizado.
• O sr. dedicou parte de sua vida acadêmica ao estudo de Hegel, assim como
outro intelectual polêmico, Francis Fukuyama. Só que ele anunciou o "fim da
história", enquanto o sr. está falando de algo bem diferente disso...
Deixe-me lhe dizer algo que talvez o surpreenda. Fukuyama é obviamente um liberalconservador, quase o filósofo oficial do establishment americano. Ele foi ridicularizado
por sua tese sobre o fim da história, mas temos de reconhecer com honestidade que se
analisarmos todos esses grandes traços permanentes de que falei agora - a
internacionalização do capital financeiro, o drama da ecologia, as questões da
biogenética - a formulação de Fukuyama não pode ser simplesmente invalidada.
Peguemos o caso do Brasil. O que fizeram os governos Lula e Dilma senão aceitar como
fatos a democracia parlamentar e o capitalismo, para torná-los mais justos e
responsáveis socialmente, abandonando, porém, qualquer perspectiva de ruptura? Isso
é Fukuyama! Nós tomamos as molduras básicas do capitalismo liberal como imutáveis.
Com a ambição única de reformá-lo. Ninguém questiona mais o sistema em si. Claro
que sou um opositor das ideias de Fukuyama, mas ele não pode ser descartado tão
facilmente.
• E não há qualquer espaço para essa crítica estrutural de que está falando?
Veja, eu me coloco cético quanto ao pequeno reformismo político, as medidas paliativas
que se referem à ecologia, etc. Mas tomei parte do movimento Occupy Wall Street
porque julguei que ali não se tratava de um protesto em relação a uma questão
concreta - guerra, racismo -, mas uma crítica em relação aos fundamentos básicos do
sistema financeiro capitalista. Aí talvez se possa achar uma chave anti-Fukuyama.
• Por coincidência, gregos e egípcios foram às eleições no mesmo dia. O sr. vê
alguma relação entre a crise na Europa e a emergência da chamada Primavera
Árabe?
O que eu acho é que, ao contrário do que pensam alguns intelectuais ocidentais, a
Primavera Árabe está longe de se reduzir a uma demanda por democracia. É todo um
sistema econômico global que se revelou insustentável, com consequências políticas
ainda por se adivinhar. O que posso dizer é que o capitalismo global está à procura de
novos fóruns. Desde 2008 ficou claro que o equilíbrio global está rompido e nem as
economias mais avançadas do mundo conseguirão manter seus Estados de bem-estar
social construídos em décadas. É uma crise muito complexa e um momento muito
perigoso, em que tudo que havia até agora no mundo parece simplesmente não
funcionar mais. Talvez eu seja naif no que foi dizer agora, mas penso que países como o
Brasil ao menos têm pela frente uma perspectiva de manutenção dos avanços
construídos ou até uma ligeira melhoria. Nos EUA e na Europa a perspectiva que se tem
é de tudo piorar. Com o risco, como disse, de novas exclusões e fundamentalismos.
• Então, apesar da Primavera, o fundamentalismo continua vivo no mundo?
A verdadeira questão que deve ser levantada neste momento é: por que o capitalismo
atual produz fundamentalismos, em diferentes formas? Bem-vindo a tempos
interessantes. Você sabe o que isso significa? Na China, quando se detesta alguém, dizse: "Bem-vindo a tempos interessantes". É ruim quando coisas interessantes
acontecem. Quando se está feliz, nada interessante acontece, você vive em paz.
• Interessante, a despeito do cenário sombrio que o sr. descreve no mundo, é o
seu relativo otimismo em relação ao Brasil.
Estou consciente disso. Talvez porque os esquerdistas europeus sejam hipócritas. Eles
gostam de revoluções e coisas acontecendo, mas preferem ficar distantes, para que
possam simpatizar com os movimentos e não fazer nada. Como Venezuela, Vietnã,
Cuba, etc. E longe, então você pode ficar feliz, mas não precisa fazer nada. Quero dizer
com isso tudo que não tenho respostas, mas perguntas. Sou um ateu, mas gosto de me
referir à expressão "apocalipse" pois ela não significa apenas catástrofe. É também o
momento da verdade em que as coisas são revistas. Ou seja, meu apocalipse não quer
dizer desastre e fogo apenas. Significa sobretudo a hora da verdade.
Jornais
24/06/2012
Resultados da Rio+20 ficam para 2015
Esse é o prazo para ONU definir as metas de desenvolvimento sustentável dos
países
MARTA SALOMON, ENVIADA ESPECIAL / RIO - O Estado de S.Paulo
O resultado mais concreto da Rio+20 só vai começar a aparecer em 2015, depois do fim
do mandato da presidente Dilma Rousseff. Daqui a três anos, as Nações Unidas deverão
apresentar metas de desenvolvimento sustentável a serem perseguidas por todos os
países, assim como a origem do dinheiro para ajudar os países mais pobres a
cumprirem os chamados Objetivos do desenvolvimento sustentável.
"A estrada será longa e difícil", comentou o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon,
sobre o dever de casa estabelecido pela declaração final de chefes de Estado e de
governo. Encerrada a Rio+20, Ban tem agora a tarefa de formar grupo de trabalho para
discutir metas para o aumento do consumo de energia renováveis, reduzir a pobreza e
as emissões de carbono para uma nova rodada de negociações.
Consenso. Negociadores brasileiros reconheceram que se frustraram pela Rio+20 não
ter conseguido obter pelo menos a indicação dos temas a serem tratados pelas futuras
metas. Faltou consenso em relação a isso, sobretudo pela dificuldade em discutir
compromissos em relação à redução das emissões de gases de efeito estufa.
Os Objetivos do desenvolvimento sustentável (ODS), apontados como principal
resultado da Rio+20, partiu de uma proposta brasileira lançada no ano passado. Se
inspira nos Objetivos do Milênio, que países em desenvolvimento perseguem até 2015
na área social e de meio ambiente.
A expectativa dos negociadores brasileiros é que os ODS organizem a nova etapa da
agenda para reduzir a pobreza e o impacto do crescimento sobre o meio ambiente.
As Nações Unidas defendem o desenvolvimento sustentável desde o início dos anos
80. Mas pesquisa contratada pelo Ministério do Meio Ambiente mostra que mais da
metade da população brasileira (53%) não sabia do que se tratava às vésperas da
Rio+20. Muitos dos compromissos assumidos na agenda internacional continuavam no
papel.
O dever de casa definido durante a conferência prevê um "processo
intergovernamental transparente" para definir os Objetivos do desenvolvimento
sustentável. Mas a futura adesão será voluntária. Países que não cumprirem as metas
não serão punidos. Um dos parágrafos da declaração final da Rio+20 diz que o
cumprimento dos Objetivos levará em conta as realidades nacionais.
O primeiro passo é a criação de um grupo de trabalho até o final deste ano. Esse grupo
será formado por 30 integrantes nomeados pelos países membros da ONU. O resultado
do debate será submetido à Assembleia-Geral da ONU de 2013.
Um segundo comitê composto igualmente por 30 especialistas indicados pelos grupos
regionais ficará encarregado de discutir meios de ajudar os países mais pobres a
cumprirem as metas. O trabalho deverá ser concluído até 2014.
Jornais
24/06/2012
Os Estados e a sociedade civil internacional :: José Flávio
Sombra Saraiva
PhD pela Universidade de Birmingham, Inglaterra, é professor titular de relações
internacionais da UnB e pesquisador 1 do CNPq
A frustração da propalada sociedade civil internacional é compreensível ante as
resultantes da conferência Rio+20. As origens do desencanto não são novas nem
originais. Generalizou-se a ideia de que havia fonte inédita de poder, oriunda das
transformações sociais e políticas do mundo após a guerra fria. Novos atores sociais,
como as classes médias abastadas e organizadas, teriam capacidade de mover as forças
profundas da política mundial. Nascia a noção de sociedade civil internacional,
globalizada, transpondo o doméstico para o meio internacional. Alguns arrojaram o
conceito
ao
preferirem
o
termo
"cidadania
planetária".
Associou-se a elevação da sociedade civil internacional à ideia do fenecimento dos
Estados nas grandes decisões. O mundo seria a pátria de todos. A agenda internacional
de afegãos, chineses, ingleses, sírios, sudaneses, norte-americanos, gregos e bolivianos
deveria se concentrar em temas comuns como a salvação ambiental do planeta.
Essa ideia, tão inocente quando nociva, obliterou o acompanhar das razões pelas quais
nem sempre o problema de uns é o problema de todos, embora estejamos no mesmo
ecossistema. Os limites da conferência Rio+20 mostram o contexto no qual operam as
transformações nas relações internacionais contemporâneas. Subestimar a força dos
Estados no sistema de tomada de decisão por meio de consensos mínimos não parece
razoável.
As relações internacionais são mais complexas que o argumento de que o planeta está
no fim de suas possibilidades. Embora isso possa ser verdade, há outras verdades
concorrentes e eventualmente mais urgentes na agenda dos Estados. A decisão é
construída, no processo decisório internacional, no seio do sistema de relações entre os
Estados. Embora contenham regras assimétricas, além de poderes desproporcionais
entre gigantes e pequenos, o mundo é mais racional que a ausência de ordem.
Tampouco há governança global dirigida pelo nada, ou por todos ao mesmo tempo.
Dos sonhadores do "outro mundo possível" aos pragmáticos que buscavam privatizar o
debate do desenvolvimento sustentável fora da esfera pública dos Estados,
passando pelo pessoal sustentado por organizações internacionais cuja contabilidade
não é muito transparente, de tudo houve na Rio+20. Desfilavam especialistas, cientistas
e defensores da sociedade civil internacional (como se ela existisse como uma
entidade), no desejo de comandar, de forma grupal e privada, o destino das
negociações.
Essa autoconfiança nas próprias ideias foi mensagem da primeira onda da chamada
globalização liberal. Houve autor que definiu o mundo como plano, sem geografia ou
história. Afinal, era só estimular a liberdade individual e o credo do mercado que tudo se
resolvia. No mesmo compasso, cresce o poder difuso das demandas diversas da tal
sociedade civil internacional, ainda plasmada por matrizes nacionais, embora se
apresente como una, em torno de agendas globais como a do mundo mais limpo e
sustentável.
Ter o mundo sustentável é positivo, particularmente se não conduzido apenas pelas
percepções das classes médias das grandes cidades do mundo rico, de rendas média e
alta, educadas nas melhores escolas. Foi grande parte dessa gente que se sentiu traída
pelo consenso construído pelos negociadores do Brasil e de todos os Estados do sistema
internacional
nesses
dias.
Reconhece-se que há carência de projetos adequados para uma reforma do padrão do
capitalismo global. Mas o pessoal de baixo está gostando de consumir uma vez que
apenas agora começaram. Quem vai dizer aos africanos da emergente e nova classe
média (quase 300 milhões de pessoas) que irão ao sacrifício em favor da cidadania
planetária? Será melhor ficar na savana tradicional? Quem decide? O brasileiro do
sertão nordestino de hoje — povoado por motocicletas, barulho e consumo — vai ter
que
voltar
ao
mundo
da
bicicleta?
Já
conversou
com
ele?
A inocente ideia de que emergiria poder, com impacto decisivo nas decisões do sistema
internacional, recuou no Rio de Janeiro. Perdeu força a ideia de construir soluções para
o mundo dos outros. Afinal, os outros também pensam e possuem valores e interesses
próprios. Esses atores parecem mais bem representados junto aos seus representantes
governamentais. Isso não quer dizer que não possa haver, em futuro próximo, mais
sintonia entre as velhas e as novas classes médias em várias outras matérias
internacionais, até mesmo na agenda do desenvolvimento sustentável.
Jornais
24/06/2012
Visão comum de todos os países
"Nós, chefes de Estado, de governo e representantes de alto nível, tendo nos reunido no
Rio de Janeiro, Brasil, de 20 a 22 de junho de 2012, com plena participação da
sociedade civil, renovamos nosso compromisso com o desenvolvimento sustentável
e de assegurar a promoção de um futuro economicamente, socialmente e
ambientalmente sustentável para o nosso planeta e para as gerações presentes e
futuras."
Este parágrafo introdutório se tornou polêmico nos últimos dias da conferência.
Representantes de ONGs, indignados com a falta de ambição do documento, pediram
que a expressão "com plena participação da sociedade civil" fosse retirada do texto. Não
foi. Uma carta de repúdio, assinada por pensadores e ícones do movimento
socioambientalista, como Thomas Lovejoy, Ignacy Sachs, Yolanda Kakabadse e Marina
Silva, foi publicada no dia seguinte em protesto. Para eles, o documento da Rio+20 será
lembrado por ser "marcado por graves omissões".
Jornais
24/06/2012
‘A Rio+20 não tinha um texto prévio’
Para economista, a conferência foi tão desgastante que a ONU vai pensar dez vezes
antes de fazer outra igual
Entrevista: José Eli da Veiga
Daqui a três anos, a Assembleia Geral da ONU vai ter que adotar os Objetivos do
desenvolvimento sustentável (ODS). Mais do que isso: será formada, talvez já a
partir de agora, uma comissão de 30 pessoas que terá a função de estabelecer, dentro
desse prazo, quais os indicadores ou os critérios que podem ser usados para o
desenvolvimento sustentável. É uma decisão importante que está no texto da
Rio+20 e que, segundo o economista José Eli da Veiga, pode ser de grande avanço.
Professor da Universidade de São Paulo, antes de começar a conferência ele brincou
de imaginar o que aconteceria. Agora está comemorando: “Acertei quase tudo.”
Amelia Gonzalez
O GLOBO: O resultado da conferência o surpreendeu?
JOSÉ ELI DA VEIGA: Apesar da choradeira geral, tem coisas muito importantes que
podem servir como instrumento de pressão social. Na verdade, desde o primeiro
Rascunho Zero, logo no início, quando se começou a perceber que muitas coisas
estavam sendo postas entre colchetes etc., eu e outros que acompanhavam o processo
sabíamos que o resultado seria este. Os dois grandes temas, que são a Economia Verde
e transformar o Pnuma (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente) em
agência, sofreram grande resistência. Como nessas cúpulas as coisas têm que ser
tiradas por consenso, é de se prever que não seria assim tão fácil. Tanto é que tentei
fazer uma previsão do que iria acontecer, pouco antes de começar a Rio+20, e acertei
quase tudo.
O que, no documento final da conferência, não saiu de acordo com o que o senhor
imaginava?
JOSÉ ELI: Eu estava bem mais animado com a questão dos oceanos. A declaração que
está no documento final é muito importante, são 20 parágrafos, mas é uma questão
que, por incrível que pareça, foi esquecida. No início, em Estocolmo (1972, Primeira
Cúpula do Meio Ambiente), as evidências científicas não eram suficientes para que as
pessoas dessem importância aos oceanos. Depois, quando surgiram as evidências, as
dificuldades eram como fazer para se chegar a um acordo. Hoje se sabe que os oceanos
são até mais importantes do que as florestas para a regulação térmica do planeta. O
processo de preparação da Rio+20 refletiu isso mas, na última hora, eles tiraram uma
frase que era um intento de fazer um tratado sobre as águas internacionais. Os oceanos
ficam fora de qualquer soberania nacional. Na verdade, este é o primeiro documento
multilateral que dá tanta importância aos oceanos. Mas aquilo que seria importante de
fato eles tiraram na última hora.
Aconteceu isso também em relação a outros temas, não?
JOSÉ ELI: Foi parecido com o que aconteceu na questão das mulheres. O tema, a rigor,
conseguiu uma declaração razoável, mas pinçaram justamente o direito reprodutivo. A
mesma coisa aconteceu com a energia: tinha uma proposta do Ban Ki- Moon
(secretário-geral da ONU), de fornecer energia sustentável para todos. E eu achava
que essa proposta ia passar. A proposta passou, mas eles tiraram os números. O texto
inicial dizia que 1 bilhão e 400 mil pessoas não têm direito à energia e que elas têm de
ter esse direito. Isso ficou. Depois disso vinha outra parte dizendo que é preciso dobrar
a parte renovável da matriz energética e dobrar a velocidade em que se está
melhorando a eficiência energética. Foi mantido, mas tiraram o compromisso de dobrar
até 2030. Puseram que a eficiência energética tem de aumentar até 2030, ou seja,
evitaram qualquer compromisso com número.
Tinha uma proposta mais audaciosa, que era suprimir todos os subsídios fósseis. Não
entrou também...
JOSÉ ELI: O país que mais se mostrou contra essa ideia foi a Índia porque eles acham
que vão precisar dos fósseis para levar energia para os pobres do país. E, é claro, por
trás da Índia estava a OPEP (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) inteira.
Ou seja: no tópico energia acabou ficando muito menos do que eu imaginava. Curioso é
que, ao que parece, os Estados Unidos não resistiram, eles topariam.
Como o senhor já mencionou acima, havia uma expectativa grande também de que o
Pnuma virasse agência, e isso não aconteceu. Por quê?
JOSÉ ELI: Se você ler com atenção o parágrafo C do capítulo IV, chamado Pilar
Ambiental do desenvolvimento sustentável, que tem quatro subdivisões, vai
perceber que, se tudo aquilo for aplicado, o resultado é melhor do que se estivessem
escrito que o Pnuma ia virar agência, e pronto.
Mas, afinal, qual a maior diferença? Por que o Pnuma quer virar agência?
JOSÉ ELI: Um dos problemas de ser Programa das Nações Unidas é que ele é bancado
por 60 e poucos países, somente. Já como agência, todos os 193 países iriam bancá-la.
Mas isso não seria difícil resolver: bastava pôr um tópico dizendo que o Pnuma, mesmo
como Programa, seria bancado por todos os países, e pronto. Daria no mesmo.
O que, no texto, o surpreendeu positivamente?
JOSÉ ELI: De acordo com a versão final do texto, daqui a três anos a Assembleia Geral
da ONU vai ter que adotar os Objetivos do desenvolvimento sustentável. Mais do
que isso: os governantes já disseram também que tem de ser formada uma comissão
de 30 pessoas que serão indicadas pelas comissões regionais da ONU. Uma delas é a
Comissão Econômica para América Latina e Caribe (Cepal), que vai indicar seis
estudiosos, enquanto as outras comissões indicarão quatro pessoas cada uma. Essa
reunião de estudiosos do desenvolvimento sustentável vai ter que dizer, daqui a três
anos, quais os indicadores ou critérios que podem ser estabelecidos com prazo para o
desenvolvimento sustentável. Se isso acontecer e daqui a três anos a ONU
determinar esses indicadores, certamente vai ser um grande avanço.
Por que o Brasil está sendo tão criticado pelo texto final, se não dependeu só dele a
última versão?
JOSÉ ELI: Acontece que sempre, nas reuniões de cúpula, o país anfitrião desempenha o
papel do desbloqueio, ou seja, de tirar as travas do texto. A Dinamarca, por exemplo,
passou a ser criticada durante a realização da COP-15 (conferência das Partes que
aconteceu em Copenhague em 2009) porque não conseguiu isso. No México, em
Cancún, foi o contrário, o governo foi ovacionado porque justamente conseguiu
destravar. Suponho que em algum momento da negociação o Brasil tenha pedido uma
espécie de voto de confiança. Por isso conseguiu, com rapidez, aprovar um texto de que
ninguém gostava. Mas isso é só uma suposição.
O senhor acredita que o resultado desta conferência estimulará a realização de outra
daqui a vinte anos?
JOSÉ ELI: Olha, na verdade não sou uma pessoa de fazer previsões desse tipo, mas
acho que essa cúpula foi tão desgastante que a ONU vai pensar dez vezes antes de
fazer outra. A cúpula de Johanesburgo, em 2002, também não foi boa, mas ninguém
prestou muita atenção a ela porque o momento histórico era complicado, tinha acabado
de acontecer o ataque às Torres Gêmeas (nos Estados Unidos). A proposta inicial era
que a Rio+20 que acabou de acontecer fosse só em 2017, e o normal era que
acontecesse na Ásia, já que a primeira foi na Europa, a segunda na América do Sul (no
Brasil), a outra na África. Mas o ex-presidente Lula se empenhou bastante para que
fosse de novo no Rio.
Qual a maior diferença entre a Rio 92 e a Rio+20?
JOSÉ ELI: Nos vinte anos que sucederam a conferência de Estocolmo, o tratado que foi
discutido lá foi sendo amadurecido e quando começou a Rio 92 já havia o que assinar.
No caso da Rio+20 não tinha nada sendo preparado, não era culminância de nada. A
Rio+20 foi convocada sem que tivesse em preparação nenhum tratado ou convenção
nova. É o contrário da Rio 92.
O senhor acredita que uma declaração conseguida numa conferência como essa ajuda
a mudar muita coisa?
JOSÉ ELI: O ideal seria uma coisa mais enxuta com poucas palavras. Na verdade, uma
declaração como essa tem pouca aplicação mas dá argumentos para os países irem à
ONU cobrar.
Jornais
23/06/2012
Acabou...
conferência da ONU sobre desenvolvimento sustentável termina com acordo
criticado e deixa para o futuro definições cruciais para o futuro do planeta, como metas
comuns e financiamento para atingi-las
ROSTOS DE crianças sorrindo estampados nos guarda-chuvas usados por participantes
no último dia da conferência Rio+20, no Riocentro. Em meio a eles, circula Ghazael
Habibyar, da delegação do Afeganistão
Após dez dias de reunião, encerrados por um emocionado discurso da presidente Dilma
Rousseff, a conferência da ONU sobre desenvolvimento sustentável, mais
conhecida como Rio+20, terminou no início da noite de ontem deixando como legado
um documento final criticado por diferentes setores - de ambientalistas a alguns dos
chefes de Estado que participaram das discussões no Riocentro -, mas defendido pela
ONU e pelo governo brasileiro como uma espécie de roteiro a partir do qual os
diferentes países poderão conduzir suas ações de desenvolvimento sustentável.
As duas principais definições - quais exatamente são os Objetivos de desenvolvimento
sustentável e como financiá-los - ficaram adiadas respectivamente para 2013 e 2014.
Mas, mesmo para os críticos, a conferência não foi considerada tempo inteiramente
perdido, já que promoveu a união de diferentes setores da sociedade civil, catalisada
pelo caldeirão da Cúpula dos Povos e apresentou algumas iniciativas mais concretas, a
mais notável delas o compromisso de redução de emissões de carbono assumido pelos
prefeitos das maiores metrópoles do mundo.
Desde o dia 13, a Rio+20 também mudou a cara da cidade, com rostos e corpos vindos
de todas as partes do globo reunidos no Riocentro, no Aterro do Flamengo, e no Forte
de Copacabana, onde se encerrou ontem a exposição "Humanidade 2012", que,
destoando das negociações oficiais, foi um retumbante sucesso de público e crítica.
Resultados mais concretos não aconteceram por restrições de alguns países em assumir
compromissos de financiamento, com a desculpa da crise econômica global. Os EUA,
que deveriam ter papel de protagonismo, tiveram participação discreta, simbolizada
pela breve presença da secretária de Estado Hillary Clinton, que só veio para o último
dia da conferência.
Em visão otimista, o secretário-geral da Rio+20, Sha Zukang, disse que a insatisfação é
sinal de que algo de bom foi feito.
- Ninguém está feliz com o nosso trabalho, mas esse é o nosso trabalho. Muitos
governos assumiram compromissos em Copenhague (em cúpula sobre mudanças
climáticas, em 2009) e, até hoje, não cumpriram. Prometer é fácil, difícil é cumprir.
Jornais
23/06/2012
'É o melhor documento dadas as circunstâncias'
ENTREVISTA/Sha Zukang. Para secretário-geral da Rio+20, o acordo tem pontos
positivos, como o estabelecimento do processo para a criação de metas de
desenvolvimento sustentável
O secretário-geral da Rio+20, o chinês Sha Zukang, fez uma análise positiva do
documento final da conferência, tão criticado por não fixar metas nem meios de
financiamento. Segundo ele, é a primeira vez que se fala oficialmente em economia
verde e se estabelece um processo para os objetivos de desenvolvimento
sustentável: "É o melhor documento dadas as circunstâncias". Sua única reclamação
foi contra o trânsito do Rio: "Tivemos engarrafamentos gigantes".
Roberta
Jansen
[email protected]
O senhor acha que um documento final sem meios de financiamento e sem a definição
dos Objetivos de desenvolvimento sustentável é um bom resultado?
SHA ZUKANG: O objetivo da conferência, que era renovar o compromisso político com
o desenvolvimento sustentável, foi alcançado. Esse era o único objetivo da
conferência. Agora, de acordo com o resultado, todos os princípios passados, da Rio
92, da Agenda 21, incluindo o das responsabilidades comuns, mas diferenciadas, foram
reafirmados. Está lá, preto no branco. Pela primeira vez na história da ONU, seus
membros concordaram em estabelecer objetivos de desenvolvimento sustentável.
Pela primeira vez concordamos que a economia verde é a ferramenta para atingir o
desenvolvimento sustentável. Concordamos em fortalecer o Programa das Nações
Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma). E em estabelecer os meios de financiamento e
transferência de tecnologia. Por isso, eu discordo totalmente de quem diz que é um
documento fraco. Está tudo lá.
Qual será o legado da Rio+20?
ZUKANG: O legado da conferência é vasto. Tivemos um documento histórico. A
participação de quase 500 mil pessoas. Uma vasta participação da sociedade civil e
praticamente cem chefes de Estado. Se as pessoas mudarem suas maneiras de pensar e
passarem a agir de forma diferente como resultado da conferência, esse é um grande
legado. Porque estamos muito acostumados a um estilo de vida insustentável.
É difícil ter acordos mais ambiciosos sob esse modelo de negociação da ONU? O senhor
acha que o modelo deveria ser revisto?
ZUKANG: A ONU é a mais representativa e com mais autoridade organização
intergovernamental do mundo. O papel da sociedade civil nunca esteve tão forte e tão
presente. Vantagens da ONU: universalidade, representatividade, autoridade. A Rio+20
é uma conferência da ONU. Seu documento é político. Os políticos se comprometeram
com o que foi acertado aqui. Muita coisa se transforma em ações legais. Não há como
dizer que a ONU é fraca, não concordo. Mas temos muito países. Todos eles são
diferentes, cada um com suas prioridades. Chegar a um acordo é muito difícil. Mas nós
fomos bem-sucedidos desta vez, é uma vitória importante. É claro que depende de
como se olha para isso. Talvez não seja o melhor acordo, mas é o melhor dadas as
circunstâncias. Não é o melhor para cada um, mas é o melhor para todos. Meu critério
para melhor documento é aquele que faz todo mundo igualmente infeliz, o que significa
também dizer que todo mundo está igualmente feliz. Isso significa o melhor. Isso é
negociação. Queria agradecer ao Brasil, à cidade do Rio, ao povo do Rio, muito amável.
Claro que tivemos engarrafamentos gigantes, mas tiveram de construir uma grande
infraestrutura em pouco tempo, entendo isso, entendo os problemas, mas acredito que
vá melhorar no futuro. Os brasileiros têm 100% motivos de estarem orgulhosos com a
conferência.
Jornais
23/06/2012
Rio ganhará um centro de sustentabilidade
Novo
órgão
da Coppe-UFRJ
vai
funcionar
na
Ilha
do
Fundão,
em
prédio
Flávia Milhorance
Após uma série de críticas apontando para um resultado pouco ambicioso na Rio+20, a
ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, atacou os países desenvolvidos por não
mobilizarem recursos adicionais para a implementação de políticas sustentáveis. Ontem,
último dia da conferência, ao lado de Helen Clark, administradora do Programa das
Nações Unidas para o desenvolvimento (Pnud), Izabella Teixeira anunciou a criação
do Centro Mundial de desenvolvimento sustentável (Centro Rio+), com sede no Rio,
e que servirá para reunir órgãos nacionais e internacionais na discussão sobre o meio
ambiente.
A criação do Centro Rio+ é, segundo a ministra, um dos resultados concretos da
conferência. O Pnud investirá de US 3 milhões a US 5 milhões para dar início ao
projeto, que depois deverá captar recursos nos setores privado e público. Izabella
Teixeira afirmou ainda que o Ministério do Meio Ambiente deverá colaborar com cerca
de 10% a mais do que for investido pelo Pnud. Com sua sede inicialmente no prédio da
Coppe-UFRJ, na Ilha do Fundão, o centro tem o apoio de 25 instituições, tanto
brasileiras como internacionais, públicas e privadas, cujo objetivo é aproximar
pesquisadores, divulgar boas práticas sustentáveis no mundo e atrair financiadores. De
acordo com a ministra, o centro está previsto para ser criado desde 1992.
- Este é um legado concreto e tributo ao Rio de Janeiro. Na Rio 92, havia já um debate
que era exatamente o de criar a comissão de desenvolvimento sustentável na cidade
do Rio, mas que acabou não vingando. Vinte anos depois, criamos o centro com espírito
de Rio 92, mas com olhar de Rio+40 - afirmou Izabella, que contou que ele dará
continuidade ao evento Diálogos de desenvolvimento sustentável, que foi criado na
Rio+20.
Durante a Rio+20, os países do G77+China propuseram a criação de um fundo de US
30 bilhões para financiar ações voltadas para a sustentabilidade, mas ele não chegou a
entrar no documento final. De acordo com a ministra, os países mais pobres ou em
desenvolvimento se comprometeram mais que os desenvolvidos:
- É fácil falar que foi pouco ambicioso (o resultado da Rio+20), mas ninguém se sentou
à mesa para colocar dinheiro adicional. O que eu vi foram os países pobres e em
desenvolvimento todos assumindo compromissos em relação à sustentabilidade e
muitos países ricos não adicionando recursos para esse processo.
Jornais
23/06/2012
Diversidade que se iguala na luta por um planeta melhor
Ativistas de todas as partes do mundo são protagonistas na Rio+20
Renata
Gilberto Scofield Jr.
Malkes
Eles fizeram barulho dentro e fora do Riocentro. Pelos direitos reprodutivos da mulher,
pela salvação do Ártico, pelos direitos indígenas. Pelos mares, pelas florestas e por
fontes de energia limpa. Enquanto líderes mundiais falavam muito para escrever pouco
no texto final da Rio+20, foram as pessoas as vozes da sociedade civil - dos
ambientalistas aos cidadãos, dos prêmios Nobel aos caciques indígenas -, que deixaram
a maior mensagem na conferência das Nações Unidas sobre desenvolvimento
sustentável: o futuro do planeta está nas mãos de pessoas, e não de governos.
Sustentabilidade e sociedade não rimam por acaso.
No Riocentro, no Parque dos Atletas, na Cúpula dos Povos, no Aterro, e no evento
multicultural Humanidade 2012, no Forte de Copacabana, as melhores notícias vieram
não dos governos, mas das pessoas: dos prefeitos das 58 maiores cidades do mundo,
dispostos a cortar 1,3 bilhão de toneladas de emissões de carbono até 2030, aos líderes
indígenas que vieram ao Rio exigir um limite sustentável ao agronegócio, passando
pelas mais diferentes campanhas das organizações não governamentais por um mundo
melhor.
Se, na esfera política, crise, financiamentos e interesses individuais emperraram a
defesa do meio ambiente, a tarefa agora começa em casa. De volta ao Brasil após 20
anos, essa foi uma das primeiras constatações da canadense Severn Suzuki, que, aos
12 anos, virou um dos símbolos da Rio 92 ao discursar para os chefes de Estado.
- Esta conferência deixou evidente a pane da governança global - observou a agora
cientista, mãe de dois filhos, de volta à cidade para a Rio+20.
A herdeira de Severn concordou. A neozelandesa Brittany Trilford, de 17 anos, eleita em
um concurso da ONU a representante dos jovens, disse-se "simplesmente enojada" com
o documento final.
Os debates a portas fechadas das delegações estrangeiras foram marcados por
especulações, e as trocas de acusações entre países desenvolvidos e nações em
desenvolvimento renasceram com força. Em meio a tudo isso, os chamados diálogos
para o desenvolvimento sustentável quebraram, de certa forma, o protocolo das
Nações Unidas. Trouxeram o povo ao centro do debate, ainda que sob queixas e
protestos.
O Grupo de Articulação da Cúpula dos Povos é um exemplo disso. Ontem, entregou ao
secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, uma carta expressando o descontentamento
com o resultado oficial da Rio+20. As reclamações serviram para lavar a alma. E dar
espaço a uma série de novos projetos para engajar quem ainda não compreendeu a
necessidade de trabalhar pela manutenção dos recursos da Terra.
- Estamos esperando mudanças, e os governos não vão fazer mudanças. Não podemos
esperar por eles. Eu já não posso nadar nas praias onde meu pai e meu avô nadavam explicou Takaiya Blaney, de 11 anos, índia canadense que pede o afastamento dos
petroleiros das águas geladas do Canadá.
E que nos perdoem os autores de toda as propostas por um mundo melhor. O
ambientalista que mais se destacou no Riocentro se limitava apenas a observar tudo
com um sorriso maroto: o pequeno Erasmus, de apenas sete meses e meio de vida,
trazido à Rio+20 pela mãe, a professora sueca Sylvia Karlsson, de 41 anos. Na semana
passada, logo no início da conferência, O GLOBO o encontrou no gramado do
Riocentro. Indagou o que o bebê poderia esperar do futuro. Mas, terminada a
megacúpula da ONU, a pergunta mudou. Será que Erasmus conseguirá manter o
mesmo sorriso numa eventual Rio+40?
Jornais
24/06/2012
Consumidor é primeiro obstáculo para alterar padrão
Na declaração final da Rio+20, países encampam iniciativas para mudar padrões de
produção e consumo
MARTA SALOMON, ENVIADA ESPECIAL / RIO - O Estado de S.Paulo
"O primeiro obstáculo é o próprio consumidor", comentou um dos painelistas dos
Diálogos do desenvolvimento sustentável, na fase inicial da Rio+20, sobre uma das
respostas acordadas para lidar com o esgotamento dos recursos naturais do planeta, o
consumo sustentável.
Na declaração final da conferência, os chefes de Estado e de governo se
comprometeram a adotar planos locais para estímulos a padrões sustentáveis de
produção e consumo. É algo ainda impreciso, que vai depender de uma mudança de
comportamento, tem a ver com o dia a dia das pessoas e pouca gente sabe do que se
trata. Uma pesquisa contratada pelo Ministério do Meio Ambiente às vésperas da
Rio+20 mostrou que 53% da população brasileira nunca ouviu falar de
desenvolvimento sustentável.
Hélio Mattar, presidente da ONG Akatu, que trata do consumo sustentável, e painelista
de domingo passado no Riocentro, explica por que considera o consumidor o principal
obstáculo na tarefa de reduzir o desperdício e mudar os padrões de consumo do
planeta. "O consumidor precisa entender o que está acontecendo e precisa mudar o
estilo de vida", afirma Mattar.
"Não dá para demonizar o consumo, temos é que glamourizar o consumo consciente",
ponderou Samyra Crespo, secretária do Ministério do Meio Ambiente, responsável por
levar adiante o Plano de Ação lançado pelo governo em 2011. Parte da implementação
do plano, decreto presidencial do início do mês, tenta enquadrar um dos maiores
consumidores do País no princípio da sustentabilidade: o próprio governo. As compras
governamentais movimentam 17% do PIB, segundo dados oficiais.
"Vamos fazer uma coisa gradativa, é obvio que ainda é muito pouco", afirma Samyra
Crespo, sobre o prazo de 180 dias fixado para os ministérios passarem a dar preferência
a comprar móveis feitos com madeira certificada, eletroeletrônicos que consomem
menos energia e produtos de limpeza sem fosfato, além de reduzir as compras de
papel.
A pasta contabilizou como retrocesso a decisão do Ministério Público de São Paulo de
mandar os supermercados voltarem a distribuir sacolas plásticas. A decisão foi resposta
a um pedido do Instituto Sócio-Ambiental dos Plásticos (Plastivida). "O caso das sacolas
é um ícone, as pessoas precisam sair da zona de conforto", afirma Samyra.
Conflito. O caso das sacolas plásticas é emblemático por vários motivos. Entre eles,
porque deixou claro o conflito de interesse que envolve a mudança de padrões de
consumo. Presidente da Plastivida, Miguel Bahiense contabiliza faturamento de R$ 500
milhões por ano da indústria das sacolinhas. "Se o consumidor está sendo onerado, tem
direito à sacola", alega Bahiense, que comemorou a decisão em São Paulo, que
concentra mais de 40% do mercado nacional.
"Lamento que o governo prefira tratar do consumo sustentável com o banimento de
produtos. Por acaso vamos banir os carros do mercado porque eles são fontes de
poluição?", provoca.
O caso ilustra bem o que o painelista da Rio+20 Hélio Mattar apontou como o maior
obstáculo ao consumo sustentável (depois do primeiro obstáculo, o consumidor): os
segmentos da indústria prejudicados no processo. "Fabricantes de carros e de motos,
transportes de uso individual, também terão ocasião de reclamar", prevê.
Na Rio+20, a principal recomendação dos Diálogos para o desenvolvimento
Sustenteável foi em relação às compras governamentais. Na declaração final, chefes de
Estado e de governo reconhecem como "fundamental" para o desenvolvimento
sustentável a mudança nos padrões de produção e consumo. O tema ganhou 3
parágrafos nos quase 300 que compõem o documento final da conferência. Num deles,
os países endossam o compromisso com iniciativas regionais para mudar padrões de
consumo e produção, em debate há dez anos.
"Talvez seja esse o principal resultado da Rio+20, o fato de ter sido adotado esse
programa de dez anos para mudança nos padrões de consumo", disse a ministra do
Meio Ambiente, Izabella Teixeira. Mattar tem outra avaliação: "Foi pífio. Não esperava
que pudesse ser diferente, a insustentabilidade ainda fala mais alto".
Jornais
24/06/2012
No dia seguinte, discussão ainda continua
MARIANA DURÃO /RIO - O Estado de S.Paulo
O dia seguinte ao encerramento da Rio+20 foi o ponto de partida para a discussão de
novos rumos para a humanidade. Inspirados no aniversário de 300 anos do pensador
suíço Jean-Jacques Rousseau, que no século XVIII já debatia as relações entre homem,
natureza e economia na obra O Contrato Social, representantes da ONU, do governo
brasileiro e estudiosos do tema se encontraram para debater a criação de um novo
contrato social do século XXI.
A base do debate foi a ideia de que há um esgotamento do modelo que favorece a
dimensão econômica do desenvolvimento, em detrimento dos eixos social e
ambiental. E a necessidade de a sociedade civil se engajar na agenda do
desenvolvimento sustentável pós-Rio+20. O ecossocioeconomista Ignacy Sachs
defendeu cinco pilares para a construção de um futuro sustentável: novo contrato
social, planejamento, segurança alimentar, segurança energética e cooperação
internacional.
"Não acredito na mão invisível (do mercado). Nosso problema é o que fazer com esses
cinco dedos da mão visível", brincou. Ao detalhar esses pontos, ele citou a necessidade
de uma estratégia de abandono da energia fóssil e criação de um fundo de
desenvolvimento internacional baseado na taxação de operações financeiras e de
emissões de carbono.
Uma avaliação mais crítica dos resultados da conferência do Rio, entretando, partiu do
diretor-executivo do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma),
Achim Steiner. Ele comparou o documento final a um livro de culinária com muitos
ingredientes mas sem receitas completas.
Fim da festa. Após dez dias de intenso movimento e agitação, o Rio teve um sábado de
tranquilidade nos principais espaços onde aconteceram os eventos da Rio+20. No Aterro
do Flamengo, onde aconteceu os encontros dos movimentos sociais da Cúpula dos
Povos, as tendas foram esvaziadas e a estrutura do evento começou a ser desmontada.
Na manhã de ontem, o movimento maior era de cariocas caminhando pelo parque, mas
alguns ambulantes e grupos culturais ainda vendiam seus produtos e faziam atividades
aproveitando os últimos visitantes.
/ COLABOROU ANTONIO PITA
Jornais
24/06/2012
Mais ambição poderia não resultar em mais ações
Mesmo se o documento da Rio+20 fosse
necessariamente ele representaria mudanças
mais
forte,
como
desejado,
não
GIOVANA GIRARDI, ENVIADA ESPECIAL / RIO - O Estado de S.Paulo
Muito se esperneou nos últimos dias sobre a falta de ambição e de compromissos do
documento final da Rio+20. Pela posição oficial, o resultado - considerado o consenso
possível - foi comemorado por ao menos não retroceder em relação às conquistas da
Eco-92. Mas é honesto perguntar: faria mesmo alguma diferença se a conferência
tivesse terminado com um documento forte?
No jargão diplomático, a presidente Dilma Rousseff afirmou que a Rio+20 é uma
conferência de partida, ou seja, que lança processos para que alguns assuntos - como
os Objetivos do desenvolvimento sustentável - sejam tratados e definidos nos
próximos anos. Mas é sempre bom lembrar que a própria Eco-92 também foi em si uma
conferência de partida, ao criar convenções para discutir questões como mudanças
climáticas e biodiversidade. Dela praticamente nada se concretizou até hoje, e sobre
isso ninguém tem nem coragem de dizer nada em contrário.
Cinco anos depois, em Kyoto, Japão, nasceu o principal compromisso proveniente da
Eco-92, o protocolo de mesmo nome, que estabeleceu metas de redução das emissões
de gases de efeito estufa para países ricos. O protocolo foi parcialmente cumprido, mas
as metas eram modestas e o principal poluidor histórico, os Estados Unidos, nunca nem
sequer o ratificou, mantendo crescentes suas emissões. Em 2002, em Johannesburgo
(África do Sul), a proposta da Rio+10 era muito parecida com a de agora - ser uma
conferência de implementação. Mas apesar de ter trazido algumas decisões nesse
sentido, também elas não chegaram a ser cumpridas.
Na prática o mundo só viu suas emissões de gases de efeito estufa aumentarem em 20
anos, tornando mais críticas as mudanças climáticas, continuou promovendo perda de
biodiversidade e a exploração demasiada de recursos naturais. Ao mesmo tempo, o
conhecimento científico ganhou corpo e força para dizer que a necessidade de mudança
do modelo de desenvolvimento é urgente, o que poderia funcionar como fator decisivo
para que as ações se concretizassem.
Mas um outro ingrediente fundamental dessa complicada equação também mudou: a
geopolítica. A velha dicotomia Norte-Sul, ricos x pobres, ganhou outras dimensões, com
países em desenvolvimento como Brasil, China, Índia e África do Sul crescendo a
ponto de também serem cobrados por suas ações.
Boa parte da justificativa para a inação está no próprio processo das Nações Unidas.
conferências como essas sempre dependem de concordância de todos para vingar, de
modo que acaba nivelando os acordos por baixo. "Na ideia do mínimo denominador
comum, o país mais na retranca impõe a regra do jogo", explica o especialista em
Relações Internacionais Eduardo Viola, professor da Universidade de Brasília. "É um
modelo que está esgotado, mas cria a ilusão coletiva de que seria relevante. A verdade
é que é um fracasso e não tinha como ser diferente."
Mesmo se os países tivessem resolvido adotar objetivos concretos com metas e datas
para suas conclusões, ainda assim talvez daqui a 10 anos estaríamos novamente nos
lamentando. Por um motivo simples: o documento não é legalmente vinculante, ou seja,
não tem poder de lei, e não existe nenhuma sanção para quem não cumprir o
prometido.
O próprio Sha Zukang, secretário-geral da Rio+20, desabafou depois de tanto ouvir
críticas sobre o texto final. "Fazer promessas é fácil, cumpri-las requer esforços
continuados. O que diferencia um compromisso de boas intenções? Uma palavra:
accountability (prestação de contas)."
Hoje, no sistema ONU, somente tratados da Organização Mundial do Comércio têm esse
poder - por isso que muita gente queria que o Programa das Nações Unidas para o Meio
Ambiente (Pnuma) fosse alçado a esse patamar.
Na volta para casa, os líderes continuam agindo conforme as demandas do momento, a
crise, a expectativa de emprego ou de crescimento, as disputas no Legislativo. Um
exemplo simbólico é um acordo bilateral fechado na Rio+20 entre Brasil e China. Não só
não trouxe nenhuma proposta em torno do desenvolvimento sustentável, como
estabeleceu que os chineses poderão explorar petróleo e gás aqui.
Na tentativa de ver o copo meio cheio, há que se reconhecer que algumas coisas
mudaram. Principalmente no mundo empresarial e na sociedade civil. Mas os processos
públicos existem, e o não cumprimento de compromissos vai gerando pressão. "Vai
ficando menos confortável não fazer", resume Maria Cecília Wey de Brito, do WWF.
Jornais
24/06/2012
Rio+20 consolida mudança nas relações Norte-Sul
Brasil, China e Índia vinculam proteção ambiental e combate à pobreza e renovam
compromisso de ajuda dos ricos aos mais pobres
LOURIVAL SANTANNA, ENVIADO ESPECIAL / RIO - O Estado de S.Paulo
A declaração final da Rio+20 desapontou os que esperavam metas e prazos respaldadas por transferências de dinheiro e tecnologia - para a conversão da produção
e do consumo para padrões ambientalmente sustentáveis. Mas essa não era a ambição
do Brasil nem de seus principais parceiros: China e Índia. Daí a discrepância entre a
visão de sucesso de seus governos e a denúncia geral de fracasso por outros países e
pelas organizações não governamentais.
A estratégia do Brasil e de seus grandes parceiros emergentes é unir proteção
ambiental e combate à pobreza. Isso não é exatamente um segredo. No cenário de
todas as salas de reunião do Riocentro estava o dístico do governo Dilma Rousseff: "Um
país rico é um país sem pobreza." Desde 1970 os países ricos têm-se comprometido,
em sucessivas conferências da ONU, a destinar 0,7% de seus Produtos Nacionais
Brutos (todas as riquezas de um país menos a renda dos estrangeiros) à ajuda aos
pobres, chamada de Assistência Oficial ao desenvolvimento (ODA, em inglês). Se isso
fosse cumprido, geraria cerca de US$ 200 bilhões por ano. Mas apenas cinco países têm
atingido esse nível: Noruega, Suécia, Dinamarca, Luxemburgo e Holanda. A GrãBretanha está a caminho de tornar-se o sexto.
O documento final diz: "Reconhecemos que o cumprimento de todos os compromissos
de ODA é crucial, incluindo os compromissos de muitos países desenvolvidos de atingir
a meta de 0,7% do PNB em ODA para países em desenvolvimento até 2015, assim
como uma meta de 0,15% a 0,20% do PNB para ODA aos países menos desenvolvidos".
A declaração não obriga os países que recebem a ajuda a destiná-la a projetos de
desenvolvimento sustentável - além de tomar o cuidado de evitar medidas
protecionistas baseadas na questão ambiental. "Os países escolhem o seu futuro", disse
ao Estado o embaixador André Corrêa do Lago, diretor do Departamento de Meio
Ambiente do Itamaraty e negociador brasileiro.
É por isso que representantes da ONU salientaram a importância da participação da
chamada "sociedade civil". A aposta é que a opinião pública dos respectivos países exija
essa vinculação entre desenvolvimento, combate à pobreza e proteção ambiental.
Essa estratégia explica a resistência do Brasil à elevação do Programa das Nações
Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) à condição de agência - ao lado da economia
verde, o outro eixo da Rio+20, sob o tema da "governança". A ação do Brasil está
focada não no Pnuma, mas no Programa das Nações Unidas para o desenvolvimento
(PNUD).
Ao lado da administradora do PNUD, Helen Clark, a ministra do Meio Ambiente do Brasil,
Izabella Teixeira, anunciou, na sexta-feira, a criação de um Centro Mundial para o
desenvolvimento sustentável, que terá sede no Rio. A ministra disse que o Centro
será "o legado da Rio+20".
Tanto Izabella quanto Helen salientaram que a abordagem do centro integrará inclusão
social e proteção ambiental.
Balanço. A imagem gasta do copo meio cheio ou meio vazio, para avaliar o sucesso ou o
fracasso da Rio+20, foi usada nos debates de encerramento. O copo meio vazio é a falta
de compromissos com metas e prazos na conversão para uma "economia verde". O
copo meio cheio é o fato de um documento final ter sido aprovado, com compromissos,
ainda que vagos, com o desenvolvimento sustentável, dentre 193 países com
posições inconciliáveis, numa organização em que se decide por consenso.
Essa carta de princípios aprovada no Rio é o máximo denominador comum entre os
diversos blocos - Estados Unidos, União Europeia, Japão, G-77 e China. A crise
econômica na Europa e a eleição presidencial americana podem ter inibido
compromissos mais palpáveis. Mas o mais provável é que haja aqui uma questão
estrutural, e não apenas conjuntural: a Rio+20 pode ter cristalizado uma mudança de
paradigma nas chamadas relações Norte-Sul.
"Não pode ser mais "nós concordamos se vocês pagarem"", disse ao Estado o finlandês
Timo Makela, diretor de Assuntos Internacionais da Direção Geral para o Meio Ambiente
da Comissão Europeia. "Isso não funciona mais." André Correa do Lago concorda: "Não
há uma reiteração de que os países em desenvolvimento só vão se mexer se
receberem dinheiro." Segundo ele, "a Rio+20 é um marco na evolução da visão de
mundo" da comunidade internacional. "Os países que foram mais bem-sucedidos
ambientalmente, e sobretudo social e economicamente, nos últimos anos, não o foram
graças à cooperação internacional. Foram os que buscaram as próprias respostas",
observou o diplomata brasileiro, referindo-se à China, à Índia e ao Brasil.
"Os países desenvolvidos nunca poderiam, por meios internacionais, fazer o Brasil
diminuir o desmatamento no nível que o Brasil decidiu, de 80% até 2020, ou a China
investir monstruosamente em energia solar", avalia Corrêa do Lago. "O que esse
documento observa é que, deixando os países em desenvolvimento agir a partir de
sua decisão, a coisa sai muito mais certa."
O embaixador brasileiro reconhece que a realidade dos países pobres é diferente da
desses grandes emergentes. "Daí a importância da OAD", argumenta ele. O norueguês
Olav Kjorven, subsecretário-geral do PNUD, concorda. "O texto é muito forte em AOD",
disse Kjorven ao Estado. "Diz que não podemos retroceder, mesmo na difícil situação
econômica que estamos enfrentando."
A visão dos governos brasileiro, chinês e indiano de desenvolvimento sustentável é
bem diferente da dos ambientalistas. A Usina de Belo Monte, por exemplo, não passa
pelo crivo deles, porque embora gere uma fonte renovável de energia causa impacto um
ambiental considerado inaceitável.
Deslocamento. O que fica da Rio+20 é o deslocamento de parte da responsabilidade dos
governos para a sociedade civil - não só a opinião pública mas também o setor privado.
Cerca de 1.500 presidentes de empresas de 60 países participaram de eventos paralelos
à conferência, e assumiram mais de 200 compromissos - 45 deles se comprometeram
a investir no uso eficiente da água, e a pressionar seus respectivos governos a fazer o
mesmo.
Foram registrados no total 692 compromissos voluntários assumidos por governos,
empresas, grupos da sociedade civil e universidades, que mobilizarão US$ 513 bilhões.
Os oito maiores bancos regionais do mundo investirão US$ 175 bilhões nos próximos
cinco anos em projetos de transporte sustentável, como ônibus com energia eficiente e
infraestrutura para bicicletas e para pedestres.
Em resposta à crítica dos europeus à falta de metas e prazos no documento final, o
embaixador Luiz Alberto Figueiredo Machado, chefe da delegação brasileira, e a ministra
Izabella Teixeira disseram que não se pode cobrar compromissos sem colocar dinheiro
sobre a mesa. Talvez seja uma resposta velha a uma cobrança velha.
Jornais
24/06/2012
ONGs se dedicam a fechar negócios
Rio+20 se tornou fórum de fomento a projetos, acordos de cooperação e negócios
ANTONIO PITA, HELOISA ARUTH STURM / RIO - O Estado de S.Paulo
Longe das discussões políticas e da retórica anticapitalista de alguns, a Rio+20 pode ser
considerada um sucesso para ONGs e empresas que apostaram no evento como
oportunidade de concretizar parcerias e projetos.
No último dia da conferência, o secretário-geral da ONU para a Rio+20, Sha Zukang,
anunciou que durante os eventos oficiais foram firmados cerca de 700 compromissos
voluntários entre ONGs, empresas, governos e universidades. Isso significa um
investimento de US$ 513 bilhões para ações de desenvolvimento sustentável nos
próximos dez anos.
Mais que partilhar experiências e discutir práticas sustentáveis, para muitas instituições
a Rio+20 se transformou em fórum de fomento a projetos, acordos de cooperação e
negócios.
É o caso do Instituto Terra de Preservação Ambiental (ITPA), atuante no interior do Rio,
que aproveitou a Cúpula dos Povos para firmar parceria com a União Internacional para
a Conservação da Natureza (IUCN) e se tornar parte de um ambicioso projeto que
pretende restaurar 1,5 milhão de km² de florestas no mundo até 2020. Somente no
Brasil, pretende-se recuperar 10 mil km², quase o dobro do desmatamento registrado
na Amazônia em 2011. Ao ITPA ficará a responsabilidade de recuperar mil hectares de
Mata Atlântica - 0,1% da meta brasileira.
"Vamos fazer parte dessa aliança mundial e estamos levantando áreas e dimensionando
a equipe", diz o cofundador do Itpa, Maurício Ruiz, que dobrará seu quadro de
funcionários, atualmente de 130 pessoas. De acordo com a IUCN, essa meta mundial
possibilita injetar mais de US$ 80 bilhões nas economias nacionais e globais.
Na outra ponta, empreendedores também vislumbram o mercado verde, oferecendo
consultoria para empresas que buscam reduzir a ineficiência em seus processos.
"Mostramos que a redução dos custos passa pela redução do impacto ambiental", afirma
Krishnamurti Evaristo, da empresa de consultoria Vaporenge.
Novo perfil. A transformação dos eventos da Rio+20 em espaço de interação e negócios
também revela a mudança no perfil de atuação das ONGs nos últimos20 anos. Se em
1992 as instituições do terceiro setor se caracterizavam pela informalidade, forte apelo
ideológico e pouca estrutura, hoje muitas contam com organização profissional e
modelos empresariais de prestação de contas e financiamento.
A avaliação é de Reinaldo Bugarelli, coordenador do curso de gestão do terceiro setor da
FGV. Para ele, que participou da conferência em 1992, as parcerias e contatos feitos
na conferência são um efeito colateral positivo em função da tecnologia de gestão e
agendas entre ONGs mais estruturadas e as pequenas associações. Bugarelli indica que
a busca de financiamento nas empresas acabou por influenciar a estrutura das
instituições.
Gestão. "As organizações adotaram à imagem e semelhança o modelo de gestão dessas
empresas, para ser mais efetivas, demonstrar resultados. Isso acaba por tirar um pouco
da criatividade e da energia transformadora das instituições, da sua inovação no
pensamento da sociedade", avalia.
É com esse pragmatismo que pretende atuar o Grupo de Trabalho Novas Fronteiras para
Cooperação do Estado do Maranhão, que desde 2004 funciona como rede de articulação
entre ONGs de 84 municípios que desenvolvem atividades de agricultura familiar, gestão
de resíduos, preservação das matas ciliares e extrativismo - especialmente do babaçu,
uma das principais atividades econômicas de pequenas comunidades da região.
"Nosso foco é inserir o processo econômico dentro da preservação do meio ambiente",
afirma Edval Oliveira, diretor de articulação institucional do grupo. Oliveira veio à
Rio+20 com 13 conselheiros e aproveitou a visita para selar cinco parcerias com
pequenas empresas no espaço SebraeTec, no Aterro do Flamengo. Elas prestarão
consultoria à ONG, com apoio do Sebrae, em qualificação profissional, eficiência
energética, medição de carbono e tecnologias sustentáveis. O próximo passo, segundo
Oliveira, é difundir esse conhecimento nas cooperativas e associações de produtores,
fechar parcerias institucionais com governos e desenvolver estratégias de captação de
recursos para viabilizar todas essas medidas.
Apoio. E para que a falta de dinheiro não seja um obstáculo à concretização dessas
iniciativas, há entidades que atuam exclusivamente como apoio financeiro, como a
Sitawi - Finanças do Bem, uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público
(Oscip) que oferece empréstimos abaixo do mercado e gestão de fundos sociais, para
que ONGs não dependam apenas de doações.
No Brasil, as doações movimentam cerca de R$ 10 bilhões por ano. É pouco comparado
ao volume de empréstimo a pessoas jurídicas, que chega a R$ 1 trilhão por ano,
segundo Leonardo Letelier, presidente da Sitawi. "Isso não quer dizer que crédito
resolve todos os problemas nem que todas as organizações sociais deveriam fazer
empréstimo. Quer dizer que esse recurso deveria estar disponível para quando fizer
sentido", diz Letelier.
Jornais
24/06/2012
Resultados da Rio+20 ficam para 2015
Esse é o prazo para ONU definir as metas de desenvolvimento sustentável dos
países
MARTA SALOMON, ENVIADA ESPECIAL / RIO - O Estado de S.Paulo
O resultado mais concreto da Rio+20 só vai começar a aparecer em 2015, depois do fim
do mandato da presidente Dilma Rousseff. Daqui a três anos, as Nações Unidas deverão
apresentar metas de desenvolvimento sustentável a serem perseguidas por todos os
países, assim como a origem do dinheiro para ajudar os países mais pobres a
cumprirem os chamados Objetivos do desenvolvimento sustentável.
"A estrada será longa e difícil", comentou o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon,
sobre o dever de casa estabelecido pela declaração final de chefes de Estado e de
governo. Encerrada a Rio+20, Ban tem agora a tarefa de formar grupo de trabalho para
discutir metas para o aumento do consumo de energia renováveis, reduzir a pobreza e
as emissões de carbono para uma nova rodada de negociações.
Consenso. Negociadores brasileiros reconheceram que se frustraram pela Rio+20 não
ter conseguido obter pelo menos a indicação dos temas a serem tratados pelas futuras
metas. Faltou consenso em relação a isso, sobretudo pela dificuldade em discutir
compromissos em relação à redução das emissões de gases de efeito estufa.
Os Objetivos do desenvolvimento sustentável (ODS), apontados como principal
resultado da Rio+20, partiu de uma proposta brasileira lançada no ano passado. Se
inspira nos Objetivos do Milênio, que países em desenvolvimento perseguem até 2015
na área social e de meio ambiente.
A expectativa dos negociadores brasileiros é que os ODS organizem a nova etapa da
agenda para reduzir a pobreza e o impacto do crescimento sobre o meio ambiente.
As Nações Unidas defendem o desenvolvimento sustentável desde o início dos anos
80. Mas pesquisa contratada pelo Ministério do Meio Ambiente mostra que mais da
metade da população brasileira (53%) não sabia do que se tratava às vésperas da
Rio+20. Muitos dos compromissos assumidos na agenda internacional continuavam no
papel.
O dever de casa definido durante a conferência prevê um "processo
intergovernamental transparente" para definir os Objetivos do desenvolvimento
sustentável. Mas a futura adesão será voluntária. Países que não cumprirem as metas
não serão punidos. Um dos parágrafos da declaração final da Rio+20 diz que o
cumprimento dos Objetivos levará em conta as realidades nacionais.
O primeiro passo é a criação de um grupo de trabalho até o final deste ano. Esse grupo
será formado por 30 integrantes nomeados pelos países membros da ONU. O resultado
do debate será submetido à Assembleia-Geral da ONU de 2013.
Um segundo comitê composto igualmente por 30 especialistas indicados pelos grupos
regionais ficará encarregado de discutir meios de ajudar os países mais pobres a
cumprirem as metas. O trabalho deverá ser concluído até 2014.
Jornais
23/06/2012
Rio+20: Líderes adiam decisões e fim da cúpula tem tom
melancólico
A conferência da ONU sobre desenvolvimento sustentável terminou ontem, no Rio,
num to melancólico e sem surpresas. Os 114 líderes repetiram promessas feitas na Eco92 e adiaram ações tidas como urgentes.
Decisões sobre o financiamento do desenvolvimento sustentável e sobre um acordo
global para a proteção dos oceanos foram deixadas para depois.
Conferência repete promessas e adia ações para 2015
Saldo é um documento político de
sustentável são a maior inovação
53
páginas; metas do
desenvolvimento
Dilma diz que cúpula foi "ponto de partida, não de chegada"; ONU destaca parcerias e
acordos voluntários
DO
RIO
A conferência das Nações Unidas sobre desenvolvimento sustentável terminou
como começara: num tom melancólico e sem surpresas.
Num mundo vitimado pela crise econômica, os 114 líderes reunidos no Riocentro
contentaram-se em repetir as promessas feitas em 1992 e adiar de novo ações que a
ciência aponta como urgentes.
A presidente Dilma Rousseff, em seu discurso de encerramento, destacou como um dos
grandes resultados do encontro o "resgate do multilateralismo" -algo repetido em toda
reunião internacional que não acaba em um fracasso óbvio.
"O Futuro que Queremos", de 53 páginas, fixa 2015 como data mágica da
sustentabilidade global. É quando entrariam em vigor os Objetivos de
desenvolvimento sustentável, ideia que deve ganhar definições a partir de 2013.
Os objetivos são o principal processo internacional lançado pela Rio+20, que também
prometeu adotar um programa de dez anos para rever os padrões de produção e
consumo da humanidade.
Outras
decisões
esperadas,
como
um
mecanismo
de
financiamento
ao
desenvolvimento sustentável e um acordo global sobre a proteção do alto-mar,
foram adiadas.
"É como trocar as cadeiras de lugar no deque do Titanic", disse Kumi Naidoo, diretorexecutivo do Greenpeace, resumindo a reunião.
Para o ex-presidente da Costa Rica José Maria Figueres os diplomatas no Rio estão
desconectados da realidade. "Não são mais negociadores, são "no-goal-tiators"",
afirmou, num jogo de palavras em inglês ("no goal" significa sem objetivos).
Para Dilma, a Rio+20 é o "alicerce" do avanço. "Não é o limite, nem tampouco o teto do
nosso avanço."
"FESTA CÍVICA"
Dilma chamou de "festa cívica" os protestos que pipocaram pelo Rio durante a semana e
parabenizou os emergentes por se comprometerem com o desenvolvimento
sustentável "mesmo na ausência da necessária contrapartida de financiamento
prometida pelos países desenvolvidos."
Anunciou que o Brasil dará R$ 12 milhões ao Pnuma (programa ambiental da ONU) e
mais R$ 20 milhões para o combate à mudança climática em países pobres.
O secretário-geral da Rio+20, Sha Zukang, afirmou que parte do legado da Rio+20 são
os compromissos voluntários firmados entre setor privado, governos e sociedade civil.
Segundo ele, foram registrados 705 acordos, que irão direcionar R$ 1,6 trilhão ao
desenvolvimento sustentável nos próximos dez anos.
O caráter voluntário dos compromissos foi criticado. "Não precisávamos de pessoas
anunciando aqui o que poderiam ter anunciado em suas capitais", disse Naidoo.
Sha lançou uma nota de cautela, lembrando que os compromissos feitos em
Copenhague, em 2009, não foram cumpridos até hoje.
(CLAUDIO ANGELO, DENISE MENCHEN, FERNANDO RODRIGUES).
Jornais
23/06/2012
Conferência repete promessas e adia ações para 2015
Saldo é um documento político de
sustentável são a maior inovação
53
páginas; metas do
desenvolvimento
Dilma diz que cúpula foi "ponto de partida, não de chegada"; ONU destaca parcerias e
acordos voluntários
DO
RIO
A conferência das Nações Unidas sobre desenvolvimento sustentável terminou
como começara: num tom melancólico e sem surpresas.
Num mundo vitimado pela crise econômica, os 114 líderes reunidos no Riocentro
contentaram-se em repetir as promessas feitas em 1992 e adiar de novo ações que a
ciência aponta como urgentes.
A presidente Dilma Rousseff, em seu discurso de encerramento, destacou como um dos
grandes resultados do encontro o "resgate do multilateralismo" -algo repetido em toda
reunião internacional que não acaba em um fracasso óbvio.
"O Futuro que Queremos", de 53 páginas, fixa 2015 como data mágica da
sustentabilidade global. É quando entrariam em vigor os Objetivos de
desenvolvimento sustentável, ideia que deve ganhar definições a partir de 2013.
Os objetivos são o principal processo internacional lançado pela Rio+20, que também
prometeu adotar um programa de dez anos para rever os padrões de produção e
consumo da humanidade.
Outras
decisões
esperadas,
como
um
mecanismo
de
financiamento
ao
desenvolvimento sustentável e um acordo global sobre a proteção do alto-mar,
foram adiadas.
"É como trocar as cadeiras de lugar no deque do Titanic", disse Kumi Naidoo, diretorexecutivo do Greenpeace, resumindo a reunião.
Para o ex-presidente da Costa Rica José Maria Figueres os diplomatas no Rio estão
desconectados da realidade. "Não são mais negociadores, são "no-goal-tiators"",
afirmou, num jogo de palavras em inglês ("no goal" significa sem objetivos).
Para Dilma, a Rio+20 é o "alicerce" do avanço. "Não é o limite, nem tampouco o teto do
nosso avanço."
"FESTA CÍVICA"
Dilma chamou de "festa cívica" os protestos que pipocaram pelo Rio durante a semana e
parabenizou os emergentes por se comprometerem com o desenvolvimento
sustentável "mesmo na ausência da necessária contrapartida de financiamento
prometida pelos países desenvolvidos."
Anunciou que o Brasil dará R$ 12 milhões ao Pnuma (programa ambiental da ONU) e
mais R$ 20 milhões para o combate à mudança climática em países pobres.
O secretário-geral da Rio+20, Sha Zukang, afirmou que parte do legado da Rio+20 são
os compromissos voluntários firmados entre setor privado, governos e sociedade civil.
Segundo ele, foram registrados 705 acordos, que irão direcionar R$ 1,6 trilhão ao
desenvolvimento sustentável nos próximos dez anos.
O caráter voluntário dos compromissos foi criticado. "Não precisávamos de pessoas
anunciando aqui o que poderiam ter anunciado em suas capitais", disse Naidoo.
Sha lançou uma nota de cautela, lembrando que os compromissos feitos em
Copenhague, em 2009, não foram cumpridos até hoje.
(CLAUDIO ANGELO, DENISE MENCHEN, FERNANDO RODRIGUES).
Jornais
23/06/2012
Texto é 'rico em iniciativas', diz o diretor ambiental da ONU
Resultado é "boa notícia" em governança, afirma Steiner
DO
RIO
O diretor-geral do Pnuma (programa ambiental da ONU), Achim Steiner, em tese
derrotado pelo resultado da Rio+20, defendeu o documento da conferência e rebateu
críticas feitas por ONGs.
"O que emerge do Rio é uma boa notícia para a governança ambiental. O documento é
rico em iniciativas. As pessoas esperam que uma cúpula venha com resultados finais,
mas, como sempre na ONU, vamos em passos paulatinos", disse.
Cobrado sobre o fato de não terem sido criadas metas ambientais, Steiner respondeu
que a Rio+20 não foi sobre ambiente, mas sobre desenvolvimento sustentável.
"Quem tentar proteger o ambiente contra forças sociais e econômicas vai ficar parado."
Apesar de a Rio+20 não ter transformado o Pnuma em agência, o diretor se declarou
satisfeito com a decisão de elevar sua importância. Lembrou que todos os países terão
participação obrigatória no órgão (hoje são só 52) e que ele terá mais verbas da ONU
(hoje, 96% dos gastos do Pnuma dependem de doações).
Ao lado de Steiner, o diretor-geral da OIT (Organização Internacional do Trabalho), Juan
Somavia, disse que o mundo não atingirá o desenvolvimento sustentável se
mantiver o padrão atual da globalização.
"Há um sistema que não quer um modelo socialmente justo e que respeite o ambiente.
Temos um sistema financeiro muito forte e um reconhecimento fraco dos direitos dos
povos", disse o chileno Somavia.
Somavia foi cumprimentado ao final por um jovem que usava uma máscara do
Anonymous, símbolo dos movimentos de indignados na Europa e do Ocupe Wall Street
nos EUA.
(CLAUDIA ANTUNES)
Jornais
23/06/2012
Hillary encerra participação tímida dos EUA
Curta passagem da secretária de Estado pelo Rio é marcada por discurso em defesa de
direitos reprodutivos das mulheres e anúncio de modesta ajuda para projetos na África
Fernanda Godoy
Maria Lima
Poucas horas após sua chegada ao Rio, no início da madrugada, a secretária de Estado
Hillary Clinton fechou a discreta participação dos EUA na Rio+20 com um discurso no
qual o que mais chamou a atenção foi a defesa dos direitos reprodutivos da mulher,
reabrindo uma polêmica surgida com a substituição dessa expressão por "saúde
reprodutiva" da mulher, por pressão do Vaticano. Na área ambiental, a secretária
anunciou uma inexpressiva ajuda de US$20 milhões para projetos de energia limpa na
África, continente onde 600 milhões de pessoas vivem em casas sem luz elétrica.
- Para atingir nossas metas em desenvolvimento sustentável também temos que
garantir os direitos reprodutivos da mulher. As mulheres devem ter o poder de tomar
decisões sobre se e quando querem ter filhos - disse Hillary, no único trecho de sua fala
na plenária da Rio+20 interrompido por aplausos.
A secretária afirmou que os US$20 milhões doados pelo governo americano abrirão o
caminho para "várias centenas de milhões de dólares" em contribuições de empresas.
Ela destacou a mudança no perfil do fluxo de capitais para os países em
desenvolvimento, que dependia, nos anos 1960, em 70% de assistência dos países
ricos, percentual que caiu para 13%, embora os investimentos em desenvolvimento
tenham aumentado.
- Além de obter recursos do setor privado, deveríamos estar pensando diferente sobre
novos tipos de parceria para resolver problemas que de outra maneira pareceriam
insuperáveis - disse Hillary.
A secretária afirmou que a Opic (agência de desenvolvimento americana que mobiliza
investimentos privados) aumentou de US$130 milhões para US$1,1 bilhão os
investimentos em energia limpa. As cifras são muito inferiores ao que seria a fatia
americana em um fundo de US$30 bilhões anuais proposto pelos países em
desenvolvimento para financiar iniciativas sustentáveis, excluído do documento final
por oposição de países ricos, como os EUA.
Hillary chegou ao Rio na madrugada do último dia da conferência pelo
desenvolvimento sustentável, marcada pelo desapontamento com a ausência do
presidente Barack Obama, que acabou reduzindo o protagonismo americano. Nas
últimas horas da conferência, ela comandou a delegação americana de 69 pessoas,
incluindo a diretora da EPA (a agência ambiental americana), Lisa Jackson, e o enviado
especial para Mudanças Climáticas, Todd Stern, que liderou as negociações do
documento final pelo lado dos EUA a maior parte do tempo.
Hillary, que está acostumada a ser recebida pelos chefes de Estado ou de governo em
muitos países, pediu um encontro à presidente Dilma Rousseff, mas não foi atendida.
Ela teve reuniões bilaterais no Rio com o primeiro-ministro do Líbano, Najib Mikati, com
a primeira-ministra da Austrália, Julia Gillard, e com o presidente da Sérvia, Tomislav
Nikolic, antes de deixar o Rio pouco mais de doze horas após a sua chegada.
Ao anunciar a iniciativa para financiar projetos de energia limpa na África, Hillary
recebeu agradecimentos das delegações da África do Sul, do Quênia, de Gana e de
Ruanda. Todd Stern afirmou que o desenvolvimento sustentável é um dos três
pilares da política externa americana, junto com a diplomacia e a defesa.
Hillary elogiou a liderança do Brasil na produção de um documento que traz "um avanço
real para o desenvolvimento sustentável". Ela afirmou que o texto contém muitos
pontos importantes, mas destacou as novas formas de pensar que surgiram ao longo da
reunião. Ela disse que a hora é de pragmatismo, mas também de otimismo.
- Deve-se dizer do Rio, como dizia Steve Jobs, que as pessoas não apenas saíram
pensando grande, mas pensando diferente - afirmou.
Hillary fez menção às "vozes que têm se levantado exigindo uma expansão das
oportunidades e maior participação nas decisões".
- Temos o potencial de responder a essa demanda. Centenas de milhões de pessoas
foram retiradas da pobreza extrema na década passada. Estamos trabalhando para
acabar com a fome, uma área em que o Brasil tem mostrado uma liderança
particularmente forte - disse.
Jornais
23/06/2012
Sociedade civil promete assumir as rédeas de ações
ambientais
Insatisfeitas com resultados da conferência, organizações anunciam união em um
movimento global; ONU lista compromissos de US 513 bi como prova de êxito de
encontro
A Rio+20 terminou ontem como um diálogo de surdos, em que os governos de 193
países reunidos no Rio pareceram não ouvir os apelos de milhares de organizações não
governamentais, empresas, cientistas, academias e simples cidadãos do planeta.
Duas das mais importantes decisões foram adiadas: a definição dos Objetivos de
desenvolvimento sustentável, cuja conclusão foi agendada para 2013 com
implementação a partir de 2015; e a discussão em torno do financiamento de iniciativas
para atingir esses objetivos, delegada a um comitê intergovernamental cujos trabalhos
devem se encerrar em 2014. Ambas as negociações só devem ser oficialmente iniciadas
após a aprovação formal do documento da conferência pelos países membros das
Nações Unidas na 68ª Assembleia Geral da ONU, que começa em setembro, em Nova
York.
Diante de um documento final enfraquecido, líderes internacionais da sociedade civil
decidiram ocupar o vácuo de poder e de propostas deixado pela própria conferência
propondo um movimento global pela sustentabilidade. O apelo foi feito pelo ongueiro
Kumi Naidoo, do Greenpeace, pela sindicalista Sharan Burrow, da União Internacional
de Sindicatos, e pela representante da Cúpula dos Povos, a antropóloga Iara
Pietricovsky.
A ideia é criar uma rede global que aproxime os movimentos, identificando propostas e
críticas comuns. Em vez de defender só as bandeiras de cada grupo, o objetivo é criar
uma agenda comum, para fortalecer alternativas ao modelo econômico atual e
pressionar o poder público.
Ontem, o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, recebeu das mãos de cinco líderes da
Cúpula dos Povos um documento, de duas páginas e 16 parágrafos, com críticas e
propostas, que nasceram dos debates que ocorreram no Aterro do Flamengo.
- É hora de todos sentarmos à mesa e esquecermos as divergências. A sociedade civil
precisa se organizar, porque já sabemos que os governos não estão assumindo os
compromissos necessários - protestou Naidoo.
O canadense Maurice Strong, que ocupou a posição de secretário-geral da Rio 92, é voz
de peso que engrossa o coro:
- Parte do texto final da Rio+20 poderia ser impressa em papel higiênico. Há pontos
importantes, mas há trechos muito fracos. Já o movimento da sociedade civil criou uma
troca forte de experiências, que pode desembocar num movimento global mais
organizado.
O secretário-geral da Rio+20, Sha Zukang, também foi enfático na reação às críticas:
- Ninguém está feliz com o nosso trabalho, mas esse é o nosso trabalho. Quando todos
estão infelizes, todos estão felizes. Muitos governos assumiram compromissos em
Copenhague (em cúpula sobre mudanças climáticas, em 2009) e, até hoje, não
cumpriram. Prometer é fácil, difícil é cumprir.
Embora o documento final não inclua metas e compromissos específicos, a ONU
afirmou, em balanço final da conferência, que mais de US 513 bilhões foram
mobilizados em compromissos para o desenvolvimento sustentável. Além disso, 692
compromissos voluntários foram firmados por governos, empresas, grupos da sociedade
civil, universidades e outros.
Rechaçando as críticas, a presidente Dilma Rousseff disse ontem que o resultado foi
uma vitória da diplomacia brasileira e que se orgulha muito de o Brasil ter conseguido
organizar uma conferência com respeito ao multilateralismo. Para ela a Rio+20 foi um
ponto de partida, escrito, e nenhum país poderá esquecer ou deixar de cumprir o que foi
acordado aqui.
- O que nós temos que exigir é que a partir deste momento as nações avancem. O que
nós não podemos conceber é que alguém fique aquém dessa posição. Além dessa
posição, todos podem ir, todos devem ir. Muitos países não quiseram assinar o
financiamento. Agora temos que trabalhar para que isso seja colocado na pauta. Os
países desenvolvidos não querem colocar, nós queremos - disse.
Emocionada, ela fez o discurso que encerrou a Rio+20, no qual festejou a participação
da sociedade civil.
- Celebramos aqui a conferência mais participativa de nossa História - afirmou Dilma,
lembrando que ocorreram mais de mil eventos paralelos no Rio durante estes dias.
(Camila Nobrega, Liana Melo, Maria Lima e Renato Grandelle).
Jornais
23/06/2012
O futuro possível
Com a aprovação da ONU e dos representantes de mais de 190 países, mas reprovado
por Organizações Não Governamentais e entidades comprometidas com o meio
ambiente, foi divulgado ontem o documento final da conferência das Nações Unidas
sobre desenvolvimento sustentável, a Rio+20. O texto intitulado "O Futuro que
Queremos" contempla boas intenções em relação ao desenvolvimento sustentável,
mas não garante avanços práticos e fragiliza o ambicionado multilateralismo, pelo qual
os países mais ricos – que nem mandaram seus governantes ao evento –
compartilhariam com as nações menos desenvolvidas as grandes decisões sobre o
futuro do planeta. O que sobrou, depois de quase 10 dias de debates, foi o futuro
possível, representado por ações tímidas e na dependência de soluções para a atual
crise econômica, que preocupa muito mais as lideranças mundiais do que o
aquecimento global.
O propósito prioritário da Rio+20 era definir um plano de desenvolvimento comum
para a humanidade, capaz de conciliar crescimento econômico e administração dos
recursos naturais, de modo a garantir vida digna às próximas gerações. Decididamente,
este objetivo não foi alcançado. Sem a presença, a chancela e o comprometimento de
americanos, ingleses e alemães, era mesmo muito difícil chegar a algo parecido com o
consenso.
Ainda assim, é inadequado ver o resultado da conferência apenas sob a ótica do
catastrofismo. Quando a humanidade se reúne para discutir pacificamente os seus
problemas, alguma coisa fica. Além de um plano de boas intenções, a Rio+20 fortaleceu
um pouco mais a consciência dos povos sobre a necessidade de prestar atenção na
natureza, a começar pela natureza humana, que tem urgências inadiáveis. No mínimo,
ficaram as condições para que países ricos e pobres continuem debatendo, de forma
democrática e sob os auspícios da ONU, alternativas para erradicar a pobreza e
compatibilizar as ações humanas com as possibilidades do planeta.
Jornais
23/06/2012
Só um consenso possível
Dilma rebate as críticas de ONGs e dirigentes europeus
Gabriel
Mascarenhas
Enviados especiais
e
Denise
Rothenburg
Rio de Janeiro — A presidente Dilma Rousseff encerrou oficialmente a conferência das
Nações Unidas sobre desenvolvimento sustentável – Rio+20 –, ontem, da mesma
forma que deu início a ela: defendendo o documento elaborado durante a conferência,
alvo de críticas da sociedade civil e de parte dos chefes de Estado. Mais cedo, porém,
em entrevista coletiva, ela reafirmou o discurso adotado pela diplomacia brasileira de
que o texto final é resultado do "consenso possível", mas admitiu que as políticas de
desenvolvimento sustentável do Brasil estão mais avançadas do que as propostas no
documento.
"Obviamente, o texto não atende as nossas práticas. Aqui, nossa matriz energética é
45% renovável, enquanto em outras nações é de apenas 7%. Ainda assim, a minha
expectativa foi plenamente atendida", justificou. Embora tenha preferido não comentar
as manifestações de desagrado feitas por líderes de governo, Dilma deixou claro que
não aprovou o comportamento dos colegas. Repetindo a todo momento a importância
da multilateralidade, ela lembrou que o texto foi avalizado por representantes dos 193
países presentes na Rio+20. "Ninguém aqui pode ficar apontando o dedo para ninguém.
Acho que essa não é uma boa prática. Respeitar a posição do outro, seja ela qual for, é
fundamental".
No discurso que colocou ponto final na Rio+20, a presidente voltou a cutucar os países
desenvolvidos e, como já havia dito, considerou a conferência "um ponto de partida",
de onde as nações devem avançar daqui para frente. "Aplaudo em especial os países em
desenvolvimento, que assumiram compromissos concretos com o desenvolvimento
sustentável, mesmo na ausência do necessário financiamento prometido pelos países
desenvolvidos", alfinetou.
Insatisfação A principal fragilidade do acordo firmado no evento, principalmente na
avaliação dos representantes da sociedade civil, é a ausência de metas e prazos para
implementação de medidas que visem ao desenvolvimento sustentável. Integrantes
da Cúpula dos Povos, eventos paralelo a conferência, que reuniu integrantes das mais
variadas entidades, classes e raças, classificaram o documento como um fracasso. Um
dos pontos negativos da versão final, admitido inclusive pela diplomacia brasileira, foi a
supressão do termo "direitos reprodutivos", que diz respeito à autonomia das mulheres
de escolherem quantos filhos querem ter.
O tema em questão, retirado a pedido do Vaticano, foi abordado pela secretária de
Estado dos Estados Unidos, Hillary Clinton, que representou o presidente americano,
Barack Obama. "Temos que assegurar os direitos reprodutivos. As mulheres têm de ter
o direito de decidir se querem e quando querem ter filhos. Os Estados Unidos irão
trabalhar para assegurar que esses direitos sejam respeitados em acordos
internacionais", comprometeu-se Hillary. A secretária americana aproveitou para fazer
um afago na delegação brasileira, que ocupou a presidência da conferência e ficou
responsável por mediar os impasses entres as nações. "Apesar do momento difícil,
graças ao Brasil conseguimos finalizar um documento."
Jornais
23/06/2012
Elogios e críticas no dia de despedida
Secretária norte-americana chamou atenção no último dia do Rio+20 com discurso a
favor da independência reprodutiva das mulheres e elogiando ação brasileira no evento
Um grande avanço para o desenvolvimento sustentável. Essa foi a avaliação da
secretária de Estado norte-americana, Hillary Clinton, em pronunciamento no
encerramento da Rio +20. Hillary – considerada uma das mulheres mais poderosas do
mundo pela revista Forbes – elogiou a liderança brasileira, que, segundo ela, "permitiu
que os países se reunissem em torno de um documento final na conferência das
Nações Unidas sobre desenvolvimento sustentável".
– O Brasil prestou um grande serviço ao mundo ao nos hospedar e receber aqui. Esse é
um momento difícil, mas conseguimos nos reunir em torno de um documento final, que
marca um grande avanço para o desenvolvimento sustentável. É um dos momentos
mais difíceis de todos os tempos – avaliou Hillary.
Segundo ela, o documento assinado ontem no Rio de Janeiro não trata de questões de
longo prazo, mas de ações que precisam ser tomadas imediatamente. A chanceler
americana disse que é preciso haver um trabalho conjunto para combater a fome
crônica.
– Essa é uma área em que o Brasil apresenta uma liderança especial – falou.
Porém, o discurso de Hillary não foi só de elogios. Ela criticou o fato de ele não fazer
uma referência explícita aos direitos reprodutivos das mulheres.
– Ainda que eu esteja muito satisfeita com o fato de que o documento endossa a saúde
sexual e reprodutiva, e o acesso universal ao planejamento familiar, para alcançar
nossos objetivos de desenvolvimento sustentável precisamos garantir o direito
reprodutivo. Temos de fortalecer o direito das mulheres de decidir se querem ter filhos e
quando – afirmou.
O polêmico posicionamento de Hillary em relação a este tema provocou mal-estar na
quinta-feira na conferência, quando a presidente Dilma Rousseff recusou um pedido de
encontro bilateral com a secretária. Na área ambiental, a secretária anunciou uma
inexpressiva ajuda de US$ 20 milhões para projetos de energia limpa na África, já
aprovado pelo congresso americano.
Retrocesso em relação à Eco-92
Em 49 páginas e dividido em seis capítulos e 283 itens, o documento oficial da
conferência chamado "O Futuro que Queremos" não surpreendeu o público da
conferência, apenas apresentou caminhos sobre meios de financiamentos e
implementação do desenvolvimento sustentável.
Quem deu exemplo de que é pela ação individual se pode dar as mudanças esperadas
no coletivo foi o presidente da Costa Rica José Maria Figueiras, ao falar sobre metas de
redução das emissões.
– Pelo menos 50% das emissões globais de gás carbônico poderiam ser reduzidas sem
necessidade de acordo.
Membro do Pacto Global das Nações Unidas na China, Fu Chengyu mostrou números
sobre os resultados obtidos pelo setor empresarial. Porém, fez uma ressalva:
– O movimento do setor privado deve ser mantido nas próximas décadas para que se
tenha algum impacto.
O texto final da Rio+20 aprovado nas negociações prévias à reunião de cúpula recebeu
críticas de ambientalistas e de delegações internacionais, principalmente da Europa, que
apontaram falta de ambição.
A declaração final da Cúpula dos Povos também fez duras críticas ao documento
elaborado pelos governos na conferência mundial do meio ambiente. De acordo com
os manifestantes, o evento no Rio mostrou um retrocesso em relação à Eco-92, há
exatos 20 anos.
*A repórter viajou como bolsista do programa patrocinado pela Internews/OECO
[email protected]
LARA ELY*
Jornais
23/06/2012
Críticas e lista de promessas
conferência Após dez dias de discussões e protestos, encontro com representantes de
191 países deixa decisões para futuro e recebe ataques
RIO – A cúpula Rio+20 terminou ontem com uma longa lista de promessas para avançar
para uma “economia verde” que freie a degradação do meio ambiente e combata a
pobreza, sob o fogo das críticas por falta de metas vinculantes e financiamento.
A cúpula, a maior da história da ONU, reuniu durante 10 dias líderes e representantes
de 191 países, 20 anos depois da histórica Rio-92 no Rio, que tomou decisões para
combater as mudanças climáticas, a perda de biodiversidae e a desertificação.
O texto final foi elogiado pelo secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, segundo o qual se
tratou de um “bom documento, uma visão sobre a qual podemos construir nossos
sonhos”.
Mas a sociedade civil, irritada, denunciou o fracasso e a falta de ambição da Rio+20. “O
acordo final é abstrato e não corresponde à realidade”, afirmou Kumi Naidoo, do
Greenpeace Internacional, um dos 36 ativistas que se reuniram com Ban ontem para lhe
entregar um documento com críticas.
“O que vemos aqui não é o mundo que queremos, é um mundo no qual as corporações
poluidoras e aqueles que destróem o meio ambiente dominam”, completou.
O documento final que será adotado pelos líderes mundiais cita as principais ameaças
ao planeta: desertifica-ção, esgotamento dos recursos pesqueiros, contaminação,
desmatamento, extinção de milhares de espécies e aquecimento climático, catalogado
como “um dos principais desafios de nossos tempos”.
“Renovamos nossos compromissos com o desenvolvimento sustentável, para
garantir a promoção de um futuro economicamente, socialmente e ambientalmente
sustentável para nosso planeta e para gerações futuras e presentes”, diz o rascunho
do texto final.
“Para 2030, precisamos de 50% mais alimentos, 45% mais energia e 30% mais água
apenas para viver como vivemos hoje”, advertiu Ban durante a reunião. Para 2050,
estima-se que a população mundial será de 9,5 bilhões de pessoas.
O texto adota os Objetivos do desenvolvimento sustentável, com metas para
avanços sociais e ambientais dos países, e que substituirão as Metas do Milênio da ONU,
quando estas expirarem em 2015. A declaração impulsiona a transição para uma
economia verde, um conceito promovido pelos europeus, mas criticado por vários países
em desenvolvimento e ativistas que temem que represente a mercantilização da
natureza e promova o protecionismo em detrimento de nações pobres.
O Grupo dos 77 países em desenvolvimento (G77) mais a China pediu no início da
conferência um fundo de US$ 30 bilhões para conseguir cumprir as metas
socioambientais, mas em um contexto de crise econômica mundial, o texto final não
define cifras.
Quanto ao Programa da ONU para o Meio Ambiente (Pnuma), o qual os europeus
queriam tranformar em organização mundial, decidiu-se que por enquanto apenas será
fortalecido, como queriam Brasil e Estados Unidos.
RETROCESSO
A Rio+20 chega ao fim com um retrocesso quando se comparam seus resultados com os
avanços obtidos na conferência anterior, a Eco 92. A análise foi feita pelo Conselho
Permanente da conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), após dois dias de
debates.
Os bispos católicos questionaram principalmente o que classificaram de “desvio” dos
dirigentes mundiais no trato da educação como instrumento capaz de resultar em
relações novas e éticas com o meio ambiente. O secretário-geral da CNBB, dom
Leonardo Steiner, disse que a economia verde defendida pelas autoridades
governamentais foge do debate central de desenvolvimento de uma política ambiental
que promova o crescimento sustentável.
“A Rio+20 indica uma resposta a essas questões com a chamada economia verde. Se
esta, em alguma medida, significa a privatização e a mercantili-zação dos bens naturais,
como a água, os solos, o ar, as energias e a biodiversidade, então ela é eticamente
inaceitável”, diz o documento do conselho.
Jornais
23/06/2012
Os lixões e a Rio+20 :: Eunício Oliveira
Senador (PMDB-CE), é presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania
O mundo está, novamente, de olhos voltados para o Brasil e para os trabalhos da
conferência das Nações Unidas sobre desenvolvimento sustentável. Agora, como
foi há 20 anos, quando da realização da primeira conferência que passou para a
história como Rio-92, a finalidade é renovar o compromisso de governantes, lideranças
sociais e políticas e, na verdade, de todos os cidadãos do planeta, com a redução da
pobreza, com inclusão social, por meio do desenvolvimento sustentável, do fomento
à economia verde, da obtenção de energias limpas, da redução drástica do
desmatamento.
Em função da posição de vanguarda que adotou nos últimos anos, que levou algum
tempo para ser percebida por importantes nações desenvolvidas, o Brasil ocupa lugar de
destaque no mundo quando o assunto é meio ambiente. Lamenta-se, porém, que
alguns importantes países ainda não tenham adotado o desenvolvimento sustentável
com a firmeza necessária que o planeta, que hoje estamos deixando para filhos e netos,
exige.
Nunca é demais lembrar um preceito que considero universal quando pensamos em
desenvolvimento sustentável: a preservação do meio ambiente começa no quintal
de casa e estende-se por bairros, cidades e regiões onde vivemos, trabalhamos ou
produzimos. Se cada um de nós, se cada cidadão, empresário ou governante tiver essa
consciência, teremos um planeta menos hostil no futuro.
São inegáveis, e assim devem ser aproveitadas as oportunidades que conferências
como a Rio+20 proporcionam para que governos adotem novas propostas de
desenvolvimento, mesmo as que hoje contrariam interesses econômicos, como
demonstram as sempre delicadas negociações diplomáticas. Mas, tão importante quanto
os documentos assinados, é a mobilização social que esses encontros globais trazem
para a discussão e a disseminação de conceitos e de novas práticas de sustentabilidade.
É o que podemos chamar de poluição positiva do meio ambiente humano. Sete bilhões
de pessoas habitam o planeta. Se 10% delas ouvirem falar, nesses dias de
conferência, em preservação ambiental e desenvolvimento sustentável e
assumirem algum tipo de postura nova e colaborativa, já estaremos garantindo um
futuro um pouco mais saudável. Assim como podemos fazer em casa, o Congresso
Nacional deve levantar iniciativas. Foi com esse intuito que apresentei o projeto de lei
que cria o Fundo Nacional de Aterros Sanitários (FNAS).
A hora é esta. O artigo 10 da Lei 12.305, de 2010, que institui a Política Nacional de
Resíduos Sólidos, determina ao Distrito Federal e aos municípios a responsabilidade pela
gestão desses resíduos. Convém relembrar que quem dá a missão também deve propor
os meios. Ora, a mesma lei estabelece que cabe à União as funções de planejamento,
coordenação e fiscalização, enquanto aos municípios compete a execução da nova
política por meio de aterros sanitários, em substituição aos insalubres e degradantes
lixões. Entretanto, uma questão fundamental permanece: onde e como os municípios
que, em sua esmagadora maioria, enfrentam sérias dificuldades financeiras,
encontrarão recursos para investir em toda essa infraestrutura?
Por essa razão, a proposta que começa a tramitar e a receber sugestões é que o
Orçamento Geral da União separe, com destinação específica, o valor de R$ 800 milhões
por ano, por um período de 10 anos, para a formação do FNSA com a finalidade de
financiar a criação de aterros sanitários em todo o Brasil, com a exigência de
contrapartida das prefeituras que, sugiro, seja fixada em 30% do valor do projeto, no
mínimo.
A Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) deverá dispor sobre as demais condições para a
apresentação e a aprovação dos projetos e para os respectivos desembolsos, assim
como ao governo federal indicar os órgãos responsáveis pela execução. A Câmara dos
Deputados e o Senado Federal não podem deixar de participar, de colaborar, como têm
feito, para que o Brasil atinja, ao mesmo tempo, dois equilíbrios igualmente
fundamentais, o federativo e o ambiental.
Jornais
23/06/2012
Jornal inglês critica a organização de evento no Rio
Selma Schmidt
O jornal inglês "The Financial Times", na sua edição de ontem, fez duras críticas à
organização da Rio+20. Classificou como "ultrajantes" os preços dos hotéis, que
impediram que delegações participassem da conferência. Lembrou que o governo
brasileiro bloqueou quartos, que custaram até US$600 a diária. O jornal questionou a
capacidade de o Rio sediar eventos como as Olimpíadas de 2016.
Na véspera, "The Financial Times" optou por reproduzir propaganda da ONG Avaaz, que
fez uma paródia com a trilogia cinematográfica "O senhor dos anéis", para mostrar o
poder da presidente Dilma Rousseff na conferência. Dilma aparece segurando numa
das mãos o poder - o anel - para salvar o mundo. Ela é chamada de "Lady of the rings"
("Senhora dos anéis", em inglês).
A Avaaz destaca a batalha que Dilma ia - ou deveria - travar contra os poluidores
durante a Rio+20. O texto diz que ela pode ajudar a salvar o mundo, se conseguir
acabar com os subsídios a combustíveis fósseis até 2015. Na imagem, Dilma está
cercada de líderes de países como Venezuela, Arábia Saudita, México e Inglaterra.
As manifestações populares, os protestos quanto ao tom pouco ambicioso do documento
final da Rio+20, o discurso da secretária de Estado americana, Hillary Clinton, e o caso
de delegados do Japão que pararam, por engano, numa favela no Caju foram notícia
esta semana em jornais, agências e sites estrangeiros.
O site do argentino "Clarín" citou o apelo feito pela Organização das Nações Unidas
(ONU), aos governos e organizações financeiras internacionais, "para traçar planos a fim
de reduzir os riscos de catástrofes naturais resultantes das alterações climáticas". Do
discurso de Hillary, destacou a promessa dos Estados Unidos de lançar uma linha de
financiamento para projetos de energia renovável na África.
A agência Associated Press (AP) ressaltou pedido de Hillary para que sejam
implementadas medidas práticas, a fim de "resolver problemas ambientais globais e
promover o desenvolvimento sustentável". A rede de TV americana CNN exibia
ontem, no seu site, foto de Dilma cumprimentando o rei da Suécia, Carl Gustaf,
observados pelo secretário-geral da ONU, Ban Ki-Moon. A BBC optou por mostrar a foto
de uma manifestação de índios, com uma criança em primeiro plano.
Jornais
23/06/2012
'O Brasil podia ter sido muito mais ousado'
ENTREVISTA/Eduardo Viola. Especialista em negociações climáticas, o professor da
Universidade de Brasília acha que o modelo das conferências de cúpula da ONU está
esgotado
Professor titular do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília,
Eduardo Viola se tornou um dos maiores especialistas em negociações climáticas do
país. Ele acreditava que o documento traria alguns compromissos importantes, mas,
com o fim da conferência, passou a classificar o encontro como um fracasso. E aponta
o conservadorismo do governo nas negociações como ponto crucial para a situação.
Camila Nóbrega
O que o senhor achou do resultado da Rio+20?
EDUARDO VIOLA: A posição dos países foi extremamente conservadora, incluindo o
Brasil. A Rio+20 foi um verdadeiro fracasso do ponto de vista de acordos internacionais.
Os governos continuam tendo no centro de suas preocupações o crescimento econômico
de curto prazo e separam de fato a crise econômica da crise ambiental. O modelo de
negociação das conferências de cúpula das Nações Unidas, assim como das COPs de
mudança climática, está esgotado, porque sempre dará como produto um resultado pífio
baseado no consenso do mínimo denominador comum.
Quais foram os impasses?
VIOLA: O modo em que foi definida a negociação dos Objetivos do desenvolvimento
sustentável é fraco e difuso, não existem parâmetros consistentes para a negociação
futura, o que levará à repetição dos impasses do processo preparatório da Rio+20 nos
próximos três anos. O Fundo Verde de US$30 bilhões não foi criado, não apenas porque
os países desenvolvidos não quiseram contribuir, mas também porque os emergentes
de renda média (China, Brasil, México, Turquia, Argentina, Chile, Rússia) não quiseram.
Do ponto de vista da conferência intergovernamental, a lógica da maioria dos
governos é imediatista, são respostas de curto prazo. E, para piorar, vem uma crise
forte na Europa. A Rio+20 perdeu importância, as questões socioambientais ficaram de
lado.
Houve avanços?
VIOLA: O acordo firmado pelas maiores cidades do mundo sobre redução de emissões
me parece um avanço relevante que deveria inspirar os governos dos países. Mas ele
está longe de ser suficiente para mudar o processo de agravamento da concentração de
gases-estufa na atmosfera e o consequente aumento da temperatura além do limite de
dois graus.
À frente da presidência das negociações, o Brasil poderia ter tido um papel diferente?
VIOLA: Poderia ter sido muito mais ousado, ter apoiado de fato a proposta da União
Europeia para a criação de uma Organização Ambiental Mundial, ter pressionado para a
criação de um fundo para os países em desenvolvimento, e para o estabelecimento de
ao menos alguma meta forte.
Além do Brasil, outros países emergentes poderiam assumir o protagonismo das
negociações?
VIOLA: Sim. A Índia, por exemplo, defende a posição que o Brasil já abandonou, de que
tem crédito no planeta por ser um país pobre, com menos atividade industrial. O
planeta é um só,o modelo tem de mudar para todos. Mas é bom lembrar que, mesmo
para o Brasil, que se apresenta como vitrine em preservação ambiental, a mudança é
complicada já que a política industrial recente do país vai na contramão da
descarbonização. Podemos citar aí, por exemplo, o subsídio à industria automobilística.
Por que em 1992, quando o desenvolvimento sustentável não estava tanto na
agenda dos líderes mundiais, foi possível que os chefes de Estado firmassem
compromissos, lançando mecanismos como o Protocolo de Kyoto?
VIOLA: O assunto era novo. Qualquer coisa criada era um passo à frente. Nos primeiros
anos da década de 1990, a Guerra Fria havia acabado de chegar ao fim, o tema tinha
espaço, e não havia instrumento normativo algum. Vinte anos depois e, já sabendo que
os mecanismos criados na Rio 92 pouco avançaram, a confiança nos acordos globais
diminuiu.
Quatro anos atrás, quando estourou a crise econômica, o senhor afirmou que o cenário
estava dado para a mudança de paradigma econômico. Uma economia mais
sustentável parecia, naquele momento, uma resposta. Mas pouca coisa mudou...
VIOLA: Fui otimista demais. Os países buscaram soluções para a crise econômica dentro
do próprio paradigma, incentivando o mesmo modelo econômico, que objetiva a
maximização de lucros, sem levar em conta objetivos socioambientais. E por isso
estamos agora numa nova crise. Cedo ou tarde teremos de fazer mudanças, senão
haverá uma crise após a outra. O modelo atual do capital financeiro está falido.
É essa a razão para a provável ausência dos principais chefes de Estado na
conferência, como o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, e a chanceler
alemã Angela Merkel?
VIOLA: De uma forma geral, com certeza. Mas há razões específicas para que cada um
dos dois não tenha vindo. Merkel não vem porque acha que as negociações não
avançaram no período, e que a conferência não terá frutos. Já o que dificulta a
presença de Obama é a dinâmica política interna americana. Ele está amarrado a
conglomerados econômicos e tem dificuldades de aprovação de quaisquer leis
relacionadas às mudanças climáticas, ou ao desenvolvimento sustentável.
Há chance de mudanças?
VIOLA: Apenas quando mudar a correlação de forças atual, quando os interesses
econômicos mudarem. Em outras palavras, é preciso que haja a passagem de um
capitalismo hiperconsumista e intensivo em carbono para um capitalismo de baixo
carbono. Acredito que isso acontecerá no futuro, mas não a curto prazo. Em alguns
anos haverá forças poderosas no sistema internacional para criar novas instituições de
governança global representativas da população, de uma nova economia e do capital
tecnológico do mundo. A sustentabilidade se tornará mandatária na economia. Quando
se tornar urgente por falta de alternativa, o mundo se moverá.
Jornais
23/06/2012
Sérgio Abranches
ARTIGO. O agravamento do quadro ambiental e climático está aumentando os gastos
com saúde, reduzindo a produção da agricultura global, gerando insegurança alimentar
Balanço da Rio+20: É o ambiental?
"A Rio+20 terminou hoje (ontem) com um conjunto de resultados que, se realmente
levado adiante nos próximos meses e anos, oferece a oportunidade para catalisar
caminhos rumo a um século XXI mais sustentável." Assim Achim Steiner, diretorexecutivo do Pnuma, definiu a Rio+20. É uma promessa, não um resultado palpável.
"Vamos em passos incrementais", ele explicou. O problema desse passo a passo é que a
crise ambiental e climática corre solta.
O resultado oficial modesto contrastou com o escopo desse megaevento, que teve
numerosos eventos paralelos relevantes, promoveu impressionante mobilização de
recursos intelectuais, políticos, sociais, técnicos e logísticos. Decidiu-se por um processo
de negociações, sem garantias de que terá bons resultados. Ele tem prazo determinado
para chegar aos resultados indicados, mas o mandado aos negociadores é amplo
demais. Não garante que o produto final corresponderá às aspirações enunciadas nos
discursos.
Os diplomatas brasileiros dizem que a frustração é dos ambientalistas, porque a
conferência não é ambiental. É sobre desenvolvimento sustentável. Ênfase vocal
no desenvolvimento. O problema desse argumento é que, de 1992 para cá, o mundo
teve extraordinário progresso econômico. O último estágio desse avanço acontece agora
na África, onde vários países crescem a ritmo maior que a média dos países asiáticos
que sempre cresceram mais. Houve muito progresso social, no Brasil e em todo o
mundo. Ninguém cuidou do ambiental.
Entre 1992 e 2012, o quadro ambiental e climático piorou muito, em parte por causa do
desenvolvimento econômico e social global. Tivemos espantosa perda de
biodiversidade. A poluição atmosférica matou, e continua a matar, milhares de pessoas
anualmente em todo o mundo. Estamos no oitavo ano consecutivo em que eventos
climáticos extremos afetam a agricultura globalmente, mantendo os preços agrícolas em
patamares que condenam milhões à fome.
O agravamento do quadro ambiental e climático está aumentando os gastos com saúde,
reduzindo a produção da agricultura global, gerando insegurança alimentar, causando
bilhões de dólares de prejuízos econômicos para a indústria de seguros. A crise
ambiental causa pobreza e fome. Afeta a economia dos desenvolvidos e dos mais
pobres. A seca no Texas e seca e inundações na Austrália destruíram muito capital
econômico e natural. Eventos climáticos extremos estão produzindo uma devastação
social. No Leste da África (Etiópia, Somália, Djibouti e Quênia) e em Bangladesh, por
exemplo, secas e inundações afetaram uma população que ultrapassa 12 milhões de
pessoas, mais do que toda a população do Estado do Rio de Janeiro.
É o pilar ambiental que está ruindo e ele levará ao desmoronamento econômico e social.
Por isso precisávamos sair da Rio+20 com uma organização mundial para o meio
ambiente e metas de desenvolvimento sustentável. Munida de metas ambientais
quantitativas para equilibrar os pilares econômico, social e ambiental e integrá-los,
buscando a sustentabilidade. Para colocar a questão ambiental no topo do
multilateralismo, como disse François Hollande.
Na Rio+20 não se conseguiu consenso sobre o mínimo necessário para começarmos
essa caminhada rumo à sustentabilidade. Chegou-se ao compromisso possível. Mas não
é assim que funciona com o clima e o ambiente. A natureza do desafio mudou. No
século XX, o compromisso era possível, porque as questões eram políticas e de
segurança militar. No século XXI, as forças que nos ameaçam não admitem
compromissos, nem atraso.
Sérgio Abranches é sociólogo e cientista político
Jornais
23/06/2012
Brasil foi 'desesperado', diz Greenpeace
Segundo ONG, "fracasso" não se deve exclusivamente à posição do País ou da ONU
Herton Escobar, enviado especial
RIO - O "fracasso" da Rio+20 não pode ser atribuído exclusivamente ao Brasil nem à
ONU. Mas a posição "desesperada" do Brasil de "fechar um documento a qualquer
custo" colocou a conferência no rumo do "menor denominador comum", na opinião do
sul-africano Kumi Naidoo, diretor executivo do Greenpeace Internacional.
Ele foi um dos 36 representantes da Cúpula dos Povos – evento paralelo à Rio+20 que
ocorreu no Aterro do Flamengo – que se encontrou com o secretário-geral das Nações
Unidas, Ban Ki-moon, nesta sexta-feira, 22.
A ONU vetou a entrada de jornalistas no encontro e fez um cordão de isolamento na
frente da sala, para evitar que Ban fosse abordado na saída. O sul-coreano saiu do local
sem falar com a imprensa.
Segundo relatos de Naidoo e outras pessoas que estiveram na reunião com o secretáriogeral da ONU, Ban ouviu as preocupações com o "fracasso" da conferência, mas
manteve o discurso de que os resultados da Rio+20 são significativos e ambiciosos.
Na quarta-feira, o sul-coreano havia afirmado em uma entrevista coletiva que
concordava com a percepção geral de que o documento final da conferência poderia
ser mais "ambicioso". Na quinta, porém, voltou atrás e mudou o discurso, após ser
pressionado pelo Brasil.
Sharan Burrow, secretária-geral da International Trade Union Confederation, se mostrou
indignada com a "falta de coragem" dos chefes de Estado de negociar um documento
mais ambicioso, aceitando o texto "sem conteúdo" produzido pelos "burocratas". "Sintome profundamente irritada e frustrada", disse.
Desde a quarta-feira, chefes de Estado ou representantes de alto nível dos 193 paísesmembros da ONU se revezaram num pódio do Riocentro, um após o outro, para
discursar sobre o que o seu país pensa do desenvolvimento sustentável.
Na maioria dos casos, eles falaram para uma plateia quase que vazia, discursando
apenas para a televisão e para os registros dos arquivos da ONU. Como o documento
final da Rio+20 já está fechado desde a terça-feira, a conferência ficou quase que sem
nada para resolver nos últimos três dias.
"Os líderes chegam aqui para uma cúpula de três dias, com um texto sobre a mesa que
não tem ambição nenhuma, e não passam nem uma hora que seja discutindo o
documento", criticou Naidoo, lembrando que as viagens das comitivas são pagas com
dinheiro público.
A conferência terminou com uma sessão plenária na qual foram aprovados os
documentos negociados nos últimos dias. O principal deles, chamado O Futuro que
Queremos, criticado pelas ONGs, foi costurado pela diplomacia brasileira.
Naidoo qualificou a Rio+20 como uma "oportunidade história perdida" e criticou
especificamente os Estados Unidos, o Canadá, a Rússia e a Venezuela por terem
impedido avanços nas negociações sobre a proteção aos oceanos. "Quando há
interesses petrolíferos, os países acabam acertando suas diferenças", disse o ativista
sul-africano.
Naidoo voltou a lamentar a falta de ambição e os compromissos vagos do documento
final. "Nossos líderes abdicaram de suas responsabilidades. Vieram para cá às custas de
impostos e deveriam fazer um trabalho sério", declarou, acusando governos de serem
reféns de grandes corporações poluidoras. "Não temos ações implementadas para
reduzir as emissões até 2015."
O ativista sul-africano também citou a retirada do termo "direitos reprodutivos" do texto
final. "É uma realidade escandalosa quando um grupo preponderantemente masculino
se reúne para tomar decisões sobre direitos das mulheres."
COLABOROU FELIPE WERNECK
Jornais
23/06/2012
Compromissos voluntários passam de 700
Serão investidos US$ 513 bilhões, nos próximos 10 ou 15 anos, em áreas de transporte,
energia limpa, e redução de desastres
GIOVANA GIRARDI , ENVIADA ESPECIAL AO RIO - O Estado de S.Paulo
Se o resultado oficial da Rio+20 foi pouco ambicioso, o evento ao menos foi importante
para o estabelecimento de compromissos voluntários em torno do desenvolvimento
sustentável. No total, foram contabilizados 705 compromissos. Somente nos 13
maiores, serão investidos US$ 513 bilhões, para os próximos 10 ou 15 anos, em ações
principalmente nas áreas de transporte e energia limpa, redução de desastres e
proteção ambiental.
A cerimônia de anúncio, feita pelo secretário-geral da Rio+20, Sha Zukang juntamente
com representantes de algumas das principais iniciativas, deixou transparecer o tom de
desabafo de que coube à sociedade civil e aos governos locais trazerem algum grau de
força para a Rio+20.
"O planeta não é grande o bastante para falhar. Quem falhou foram os governos. Não
as empresas, não as ONGs", desabafou José Maria Figueres, presidente da Carbon War
Room, diante de um Sha Zukang que arregalou os olhos e abriu a boca em cara de
divertido espanto.
O anúncio do montante de compromissos foi ainda agitado por um casal de
manifestantes que, de repente, enquanto Figueres falava, foi ao centro da sala, pegou
uma pétala das orquídeas que enfeitavam a bancada e tentaram passar uma
mensagem.
"Vocês não nos representam. Queremos uma democracia real. Queremos um novo
tempo de imaginação e de poesia", foi tudo o que conseguiram gritar antes de serem
imediatamente arrastados para fora pelos seguranças da ONU. "Se eles estivessem
esperado teriam direito à fala", riu Brice Lalonde, coordenador executivo da Rio+20, que
mediava a apresentação.
Transporte. A maior fatia desses investimentos virá dos oito maiores bancos de
desenvolvimento do mundo. Eles anunciaram o compromisso de investir US$ 175
bilhões para financiar sistemas sustentáveis de transporte, que podem ser desde meios
de transporte público, até ciclovias, bicicletas e uma melhor infraestrutura para
pedestres. A iniciativa visa ajudar a minimizar congestionamentos, poluição, acidentes e
as emissões de gases de efeito estufa.
Bindu N. Lohani, do Asian Development Bank, disse também que parte do investimento
deve ser focado em BRT (trânsito rápido de ônibus) principalmente em Mongólia,
Bangladesh e China para atender de 100 mil a 1 milhão de pessoas.
Outro fatia significativa é a do programa "Energia sustentável para Todos", proposta
pelo secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, com US$ 50 bilhões. O Japão vai investir
US$ 6 bilhões em programas sobre economia verde e redução de desastres, e a
Alemanha se comprometeu a ajudar em ações sobre acesso a energia com US$ 3,3
bilhões.
No total, foram envolvidas 500 empresas, indústrias, universidades, entre outros - nos
eventos oficiais e paralelos realizados antes e durante a conferência da ONU no Rio de
Janeiro. 50 acordos envolvem governos, 72 entre o Sistema ONU e ONGs, 226 entre
empresas e a indústria, 243 entre universidades e escolas de todo mundo.
Jornais
23/06/2012
Ministra diz que falta clareza a trechos do texto
GLAUBER GONÇALVES / RIO - O Estado de S.Paulo
Na primeira ressalva pública feita por uma autoridade do governo brasileiro ao
documento oficial da Rio+20, a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, lamentou
ontem a falta de clareza no texto final da conferência sobre as obrigações dos países
desenvolvidos com relação ao estabelecimento de novos padrões de consumo e
produção no planeta.
"Além da adoção do plano, podíamos ter deixado claro o que significa isso. O plano é
excepcional, mas como é que nós vamos transformar essas obrigações dos países
desenvolvidos?", questionou.
Apesar de ter iniciado seu balanço sobre a Rio+20 em tom bastante otimista, durante
evento no Forte de Copacabana, a ministra emitiu opiniões que contrastaram com
declarações anteriores dadas por ela mesma e por outras autoridades do governo
federal.
Izabella também disse que o documento poderia ter avançado em dois outros pontos:
na questão dos direitos reprodutivos das mulheres e na parte do texto final que trata
dos oceanos. No entanto, ela não deu detalhes sobre os avanços que considerava
necessários.
"Vitória." Logo quando da elaboração do rascunho que foi apresentado aos chefes de
Estado e de governo no segmento de alto nível, o embaixador Luiz Alberto Figueiredo
Machado, negociador-chefe do País para a Rio+20, afirmou que o texto era "estupendo".
A presidente Dilma Rousseff classificou o documento como "uma grande vitória".
A própria Izabella teve duas reações similares. "Estou particularmente muito satisfeita",
disse na terça-feira. No dia seguinte, elogiou mais uma vez o texto, listando várias
conquistas, entre elas o início do processo que levará à criação dos Objetivos do
desenvolvimento sustentável e à reafirmação dos princípios da Eco-92.
Ontem, antes das objeções, a ministra disse que os resultados da Rio+20 são bastante
positivos. Ao ressaltar que foram tomadas "decisões e mais decisões", enfatizou que as
pessoas não sabem ler os documentos das ONU. "Muitas vezes as pessoas não sabem
ler os documentos das Nações Unidas. Sinto isso, às vezes elas não entendem as
decisões", declarou.
Jornais
23/06/2012
Oba-oba sustentável :: Guilherme Fiuza
A Rio+20 foi um sucesso. E não poderia ser diferente. Tudo foi muito bem montado
para que não houvesse chances de falha. A estratégia é perfeita: anuncia-se uma
megaconferência para salvar o mundo; convida-se mais de uma centena de chefes de
Estado para assinar a salvação à beira-mar; produz-se um documento que naturalmente
não salva nada nem ninguém; cada governante que chega tem a chance de dizer ao seu
eleitorado que esperava mais; até Ahmadinejad, o tarado atômico, declara-se
"frustrado"; todos ficam bem na foto "histórica", com seus crachás de gladiadores da
sustentabilidade; e o mundo continua piorando com a consciência limpa.
Os ecologistas reunidos no Rio de Janeiro estão certos: para o mundo não acabar, é
preciso economizar tudo. Menos o bufê das festas ecológicas, que ninguém é de ferro. A
milionária produção da Rio+20 é o melhor exemplo de sustentabilidade: se essa era a
última chance de salvar a Terra, como avisaram os organizadores, por que poupar para
o próximo banquete? Não há no mundo contemporâneo negócio tão sustentável
quanto a propaganda do Apocalipse. É o único em que o cliente paga para que a
entrega não seja feita.
E, por falar no fim do mundo, o empresário Fernando Cavendish está entre os que
aprovaram os resultados da Rio+20. Durante a conferência, a convocação do excomandante da Delta para depor na CPI do Cachoeira foi barrada. Maior caixa-preta do
Brasil hoje, Cavendish contou com a proteção da já famosa "tropa do cheque" para não
ter que interromper o sossego de sua aposentadoria nababesca e ir se explicar em
Brasília. E contou, principalmente, com a colaboração da opinião pública nacional, que
estava muito ocupada com a salvação do planeta no Rio.
Há muito tempo a República não vivia um momento tão decisivo quanto o da
convocação de Cavendish pela CPI. As investigações indicam que o empreiteiro regia, ao
lado do bicheiro, uma máfia sem precedentes no assalto ao Estado brasileiro. A
construtora que centralizava o esquema era nada menos que a líder do PAC - e
continuou recebendo contratos mesmo depois que o governo federal foi avisado, pela
Controladoria Geral da União, dos superfaturamentos em série. Quem esquentava as
costas de Cavendish?
A convocação do empreiteiro para depor no Congresso colocaria a bola na marca do
pênalti. Pênalti para o Brasil contra a corrupção. E, quando a CPI foi votar essa
convocação, o povo foi às ruas. Foi às ruas contra o gás carbônico, contra a Vale do Rio
Doce, contra a ditadura de 64, contra o capitalismo individualista e o que mais o
carnaval fora de época da Rio+20 inspirasse. Fernando Cavendish deve ter assistido
emocionado à passeata das mulheres pelo direito constitucional de mostrar os peitos no
jornal (em protesto contra a falta de sustentabilidade).
Não se sabe se toda essa bravura cívica mobilizada pela Rio+20 salvará o planeta. Mas
salvou Cavendish, o que já é um começo.
A CPI do Cachoeira é um fracasso de público. O ano da Rio-92 foi também o do
impeachment, mas não apareceu agora um único cara-pintada para a Collor+20. O
presidente deposto é hoje um soldado do PT na CPI, escalado para bombardear a
imprensa e atrapalhar a divulgação das investigações. E os estudantes não estão nem
aí. A UNE, comprada por Lula e Dilma, conquistou seu sustento sustentável. O resto da
turma deve estar ocupado com o gás carbônico.
E a OAB, que tanto brilhou na CPI do PC? Por onde anda essa entidade tão vigilante na
defesa do estado de direito? Onde está a OAB no momento em que a quadrilha tenta
manipular juízes para anular as provas gravadas pela Polícia Federal? Não se sabe. O
que se sabe é que a democracia foi posta em risco por uma máfia que alicia agentes
públicos, comprando parlamentares, alugando governadores e dando ordens em
ministérios endinheirados. E que, na hora da verdade, essa máfia está sendo defendida
por advogados de ponta, como o ex-ministro Márcio Thomaz Bastos, muito bem pagos
com o dinheiro sujo do esquema.
O que a OAB tem a dizer sobre isso? Aparentemente, nada. Em time que está ganhando
não se mexe.
Na hora de cercar a máfia Delta-Cachoeira, o Brasil resolveu discutir sustentabilidade.
Que desenvolvimento sustentável é possível num país onde o orçamento de
infraestrutura foi dominado por uma quadrilha? Discute-se a criação de mesadas
ecológicas (segure sua carteira) para o crescimento limpo, enquanto a gangue do
bicheiro pilota a aceleração do crescimento sujo. Apertem os cintos e financiem o bem,
para que os governos possam continuar gastando mal.
O sucesso da Rio+20 aparece nas imagens mais sutis, como a do ministro da Integração
Nacional, Fernando Bezerra (que mandou para Pernambuco 90% das verbas contra
enchentes), palestrando no Espaço Humanidade sobre desigualdades. O melhor lugar
para discutir a salvação da Terra é mesmo o mundo da Lua.
GUILHERME FIUZA é jornalista
Jornais
23/06/2012
A Rio+20 e o elogio da reciclagem
É REPÓRTER DO ESTADO - O Estado de S.Paulo
Ánalise: Marta Salomon
Prevaleceu a diplomacia da reciclagem na Rio+20. Foi isso o que os chefes de Estado e
de governo fizeram com o conceito do desenvolvimento sustentável, tema principal
da conferência das Nações Unidas: um jovem de quase 30 anos, mas que ainda ronda
políticas e planos de negócios de empresas como se fosse um embrião incerto de
vingar.
Ao longo dos nove dias da conferência, os países renovaram compromissos anteriores
que não haviam saído do papel, como a redução da pobreza em países em
desenvolvimento e a diminuição das emissões de gases de efeito estufa, responsáveis
pelo aquecimento global.
Nada de novo foi criado. Combinou-se no Riocentro que uma nova agenda mundial do
desenvolvimento sustentável deverá ser apresentada até 2015. Até lá, novas
rodadas de negociação devem apontar as metas, as formas de medir seu sucesso ou
insucesso e os caminhos para torná-las realidade. Por ora, não é possível saber se
haverá metas sobre a redução da pobreza, o acesso a água, a produção de energia
limpa ou as emissões de carbono. Faltou consenso para isso. Já se falava ontem em
Rio+20+20 para essa nova fase da agenda.
O mundo ficará mais sustentável depois da cúpula no Rio? Por algum acordo mundial
que seja possível verificar no curto prazo, não. Nada antes de 2015, quando o mundo
também deverá encontrar um jeito novo de lidar com o aumento das emissões de
carbono, segundo o cronograma das complicadíssimas negociações do clima.
Pela mobilização de empresários e da sociedade civil, é possível que sim, o mundo se
torne menos insustentável depois da Rio+20. A falta de ambição que as ONGs
enxergaram no documento final da conferência poderá ser, pelo menos em parte,
compensada pelo reforço das pressões sobre políticas públicas, a atuação de empresas e
o comportamento dos consumidores. Nada impede avanços locais.
O engajamento exibido por líderes empresariais pode resultar em mudanças nos
padrões de produção, independentemente da agenda das Nações Unidas - ainda que a
adesão aos princípios do desenvolvimento sustentável venha acompanhada pela
cobrança de incentivos fiscais, uma conta a ser paga pelo contribuinte. Reciclado, o
tema do desenvolvimento sustentável mostrou, ao menos, que não está morto.
Jornais
23/06/2012
Conferência acaba em "consenso possível"
No fim do encontro ambiental, presidente Dilma elogia texto destacando a dificuldade de
acordo entre 193 países
GABRIEL
DENISE
ENVIADOS ESPECIAIS
MASCARENHAS
ROTHENBURG
Rio de Janeiro — A presidente Dilma Rousseff encerrou oficialmente a conferência das
Nações Unidas sobre desenvolvimento sustentável — Rio+20, ontem, da mesma
forma como deu início a ela: defendendo o documento elaborado durante a
conferência, alvo de críticas da sociedade civil e de parte dos chefes de Estado. Mais
cedo, em entrevista coletiva, ela reafirmou o discurso adotado pela diplomacia brasileira
de que o texto final é resultado do "consenso possível", mas admitiu também que as
políticas de desenvolvimento sustentável do Brasil estão mais avançadas do que as
propostas no documento.
"Obviamente, o texto não atende às nossas práticas. Aqui, nossa matriz energética é
45% renovável, enquanto em outras nações é de apenas 7%. Ainda assim, a minha
expectativa foi plenamente atendida", justificou. Embora tenha preferido não comentar
as manifestações de desagrado feitas por líderes de governo, Dilma deixou claro que
não aprovou o comportamento dos colegas. Repetindo a todo momento a importância
da multilateralidade, ela lembrou que o texto foi avalizado por representantes dos 193
países presentes na Rio+20. "Ninguém aqui pode ficar apontando o dedo para ninguém.
Acho que essa não é uma boa prática. Respeitar a posição do outro, seja ela qual for, é
fundamental".
No discurso que colocou ponto final à Rio+20, a presidente voltou a cutucar os países
desenvolvidos e, como já havia dito, considera a conferência "um ponto de partida",
de onde as nações devem avançar daqui para frente. "Aplaudo em especial os países em
desenvolvimento, que assumiram compromissos concretos com o desenvolvimento
sustentável, mesmo na ausência do necessário financiamento prometido pelos países
desenvolvidos", alfinetou.
A principal fragilidade do acordo firmado no evento, principalmente na avaliação dos
representantes da sociedade civil, é a ausência de metas e prazos para implementação
de medidas que visem ao desenvolvimento sustentável. Integrantes da Cúpula dos
Povos, eventos paralelo a conferência, que reúne integrantes das mais variadas
entidades, classes e raças, classificaram o documento como um fracasso. Entre os
pontos negativos da versão final, admitido inclusive pela diplomacia brasileira, foi a
supressão do termo "direitos reprodutivos", que diz respeito a autonomia das mulheres
em escolherem quantos filhos querem ter.
O tema em questão, retirado a pedido do Vaticano, foi abordado pela secretária de
Estado dos Estados Unidos, Hillary Clinton, que representou o presidente americano
Barack Obama. "Temos que assegurar os direitos reprodutivos. As mulheres têm de ter
o direito de decidir se querem e quando querem ter filhos. Os Estados Unidos irão
trabalhar para assegurar que esses direitos sejam respeitados em acordos
internacionais", comprometeu-se Hillary. A secretária americana aproveitou para fazer
um afago na delegação brasileira, que ocupou a presidência da conferência e ficou
responsável por mediar os impasses entres as nações. "Apesar do momento difícil,
graças ao Brasil conseguimos finalizar um documento."
"Ninguém aqui pode ficar apontando o dedo para ninguém. Acho que essa não é uma
boa prática. Respeitar a posição do outro, seja ela qual for, é fundamental"
Dilma Rousseff, presidente
Raios
X
da
Rio+20
Durante nove dias (13 a 22 de junho), milhares de eventos foram realizados na Rio+20,
a conferência das Nações Unidas sobre desenvolvimento sustentável, em todo Rio
de Janeiro, incluindo mais de 500 encontros oficiais e paralelos no Centro de
Convenções Riocentro. A Rio+20 foi a maior conferência já realizada pela ONU, com
ampla participação de líderes dos setores privado, do governo e da sociedade civil, bem
como funcionários da ONU, acadêmicos, jornalistas e o público em geral.
Compromissos
» Mais de 513 bilhões de dólares mobilizados em compromissos para o
desenvolvimento sustentável, incluindo áreas como energia, transportes, economia
verde, redução de desastres, desertificação, água, florestas e agricultura;
» 692 compromissos voluntários para o desenvolvimento sustentável registrados
por governos, empresas, grupos da sociedade civil, universidades e outros;
Participantes
» Total: 45.381
» Delegações de 188 estados-membros e três observadores
» Mais de 100 chefes de Estado e de governo
» Delegados: aproximadamente 12.000
» ONGs e Major Groups: 9.856
» Mídia: 4.075
» Credenciais para os dias dos diálogos para a
sociedade civil (16 a 19): 1.781
» Pessoal de Segurança: 4.363
» Cerca de 5.000 pessoas trabalharam no Riocentro diariamente.
Mais informações sobre a Rio+20: www.uncsd2012.org e www.onu.org.br/rio20
Para
participar
da
conversação
global
sobre
a
Rio+20,
visite:
www.ofuturoquenosqueremos.org.br
Fontes: Nações Unidas e do Comitê Nacional Organizador (CNO) do Brasil para a Rio+20
Análise da notícia
Na
hora
errada
A Rio+20 termina com muitos fazendo discursos de que não ficaram satisfeitos com os
resultados expostos no documento final, mas não se pode deixar de levar em conta o
que diz a presidente Dilma Rousseff: não é fácil buscar um consenso em 193 países.
Partindo-se dessa premissa, ela tem ainda razão, quando cita o documento da Rio+20
como o ponto de partida para futuras cobranças. E, nesse sentido, a diplomacia
brasileira não falhou.
Prevaleceu a defesa do multilateralismo, do respeito às diferenças entre os países. É
importante destacar que ninguém levantou da mesa. Todos assinaram o documento. O
próximo passo é cobrar o financiamento, algo difícil a curto prazo, diante da crise na
zona do Euro e também nos Estados Unidos. Daí o fato de muitos classificarem a
Rio+20 como a conferência certa, no momento errado.
Os diplomatas costumam dizer que é preciso ter em mente que o tempo da diplomacia
não é tão rápido quanto de Ongs e da sociedade civil. A luta continua ainda mesmo que,
para muitos, seja imperceptível. E como bem colocou a ex-senadora Marina Silva, dá
para perder uma batalha, mas não a esperança. É essa esperança e a energia de muitos
que moverão o mundo em direção a medidas mais audaciosas de implementação da
economia sustentável. E esse caminho começa agora. (DR e GM)
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