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Brasília, 06 de novembro de 2005
Correio Braziliense - Brasília/DF
STF | Ministros Aposentados | Ministro Maurício Corrêa
Aos sopapos e pontapés do vale-tudo
OPINIÃO
Maurício Corrêa
Advogado
Primeiro foi o senador Arthur Virgílio, líder do PSDB no Senado, que prometeu dar uma surra no presidente da República "se ameaçarem um filho meu.
Sou de escorpião. Jamais desonraria o meu signo.
Sou inesquecível como inimigo". Em seguida, no
mesmo tom, dois outros pronunciamentos se sucederam. Um do deputado Antonio Carlos Magalhães Neto, que textualmente disse: "O presidente
da República, ou qualquer um de seus que tiver coragem de se meter na minha frente, assim como disse
o senador Arthur Virgílio, tomará uma surra". Outro
da senadora Heloísa Helena, que, em linguagem
mais candente, acompanhou a mesma indignação,
concluindo: "Eu não seria capaz, eu sou capaz".
Tudo bem que sejam figuras de retórica exacerbadas
com boa dose de emocionalismo. Se verdadeiros os
fatos subjacentes à repulsa dos parlamentares, não
resta dúvida de que precisam ser devidamente apurados para a responsabilização dos culpados. Nem é
de se supor que tais atitudes não sejam factíveis num
governo que faz lá, sim, suas tretas persecutórias e se
dispõe a outras coisas do arco-da-velha. Haja vista os
recentes acontecimentos que cobriram de opróbrio
todos nós brasileiros que acordamos com os estrépitos das bandalheiras que tiveram início e meio
nos redutos do governo, em seu partido e em outros
tentáculos orgânicos que o sustentam. A questão, entretanto, não deve ser vista apenas sob esse ângulo.
A linguagem virulenta, prenhe de bravatas e grosserias, tem lá também suas explicações. Sua etiologia. Mostra o estágio de verdadeiro
desmoronamento moral a que chegou o presidente.
Quando se presta ao desafio da rinha dos socos e bofetões é porque suas bases morais há muito atingiram
profundezas abissais. É a mais evidente demonstração de desrespeito ao princípio da austf.empauta.com
toridade, que, lamentavelmente, a cada dia que passa,
perde-a o supremo mandatário da nação. Não é para
menos. Há motivos para tanto.
A pusilanimidade com que se tem havido no enfrentamento das turbulências que se multiplicaram
no seio da administração pública e no cerne do poder
traduz, já de pronto, a carência de autoridade de um
chefe moralmente fraco e, pois, sujeito a escarmentos
semelhantes. Até agora dele não se ouviu nenhuma
palavra segura acerca dos recentes fatos que tiveram
seu embrião em gabinetes da Presidência da República e que contaram, inclusive, com a apimentada
participação de membros do Congresso Nacional; de
empresários do naipe de um Marcos Valério ou de um
Duda Mendonça; de doleiros; de bancos como o Rural, do Brasil e BMG; de gestores de fundos de previdência; de servidores graduados de estatais; e de
mais uma infinidade de pessoas - físicas e jurídicas espalhadas por esse Brasil afora.
Tenha-se, em conseqüência, o brado de estupefação
dos parlamentares ao elevar o tom da voz - e de carregar a verve da revolta - na degradação de atos que
desonraram o compromisso presidencial, tão solenemente jurado, de lisura no exercício da administração do país - então proclamadamente
pautado no estrito respeito à ética.
A despeito desse festejado bordão, os escândalos que
tiveram desdobramentos na sucessão de crimes perpetrados no comando petista sempre contaram com a
ciência direta ou indireta do senhor Lula; do mesmo
modo, diga-se das estripulias de sua parentela, ora como agenciadores de tráficos de influência, ora como
beneficiários diretos de privilégios oficiais; dos mensalões e mensalinhos pagos com o dinheiro do povo e
da montagem do estratagema de sua concepção; dos
dispêndios com as abusivas viagens internacionais
por todos os quadrantes do planeta, não se sabe a que
título; do alheamento ao torvelinho que lançou o país
no pantanal da sujeira; da falta de atitudes definidas
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Continuação: Aos sopapos e pontapés do vale-tudo
na colaboração das apurações dos crimes ocorridos
em órgãos federais; da frouxidão de atitudes no período que precedeu à instalação das CPIs dos Correios, da Compra de Votos e dos Bingos; do silêncio
acerca de tudo que envolveu seus mais diretos assessores; tudo isso e mais do que isso içaram-no aos
ventos do descrédito, se não de toda a nação, pelo menos de boa parte dela que tem a exata dimensão das
patifarias que tiveram curso em seu governo.
Essa desventura, que tem como causa a fragilidade da
autoridade do chefe da nação, conduziu-o a esse estado paradoxal que permite afirmações tão provocadoras e aparentemente afrontosas, mas que, na
verdade, são uma resposta à indolência e à inação, an-
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te o caótico quadro de que se viu tomado o país. Claro
que não é parâmetro de comparação, mas o certo é que
a densa veiculação diária de piadas, charges, anedotas, vídeos, filmes, enfim, gozações de todo o tipo,
que é transmitida via internet, dá um pouco o sentido
da decadência moral da autoridade presidencial. Recusando-se o senhor Lula a dar entrevistas a repórteres, coletivas ou selecionadas, salvo as que em
migalhas são pautadas, força-os a fazer perguntas ao
largo quando o vêem passar. Por isso são chamados
de mal-educados. Isso cada vez mais aumenta o fosso
entre ele e a sociedade. O que nunca pensei mesmo é
que se pudesse chegar ao disparate de um vale-tudo
com sopapos e pontapés.
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