MARIANA RAIMUNDO
enquanto que a corrupção activa para acto lícito foi descriminalizada – e assim se
manteve até à revisão de 1995.
O tipo objectivo ou descrição da acção dos crimes de corrupção na versão inicial
do Código de 1982, à semelhança do que se passava até aí, baseava-se na solicitação
ou recebimento efectivo de dinheiro ou de vantagem patrimonial não devidos.
Já no caso do crime de peculato passou a encarar-se a questão da medida da pena
de uma forma diferente do que era feito no diploma de 1886: enquanto aqui se ligava
a pena ao valor da coisa subtraída ou ilegitimamente apropriada pelo funcionário (daí
a aplicação do critério seguido pelo crime de roubo), no diploma de 1982 essa ligação deixou de ser relevante, passando a dar-se maior ênfase ao facto de ser um crime
cometido por funcionário, no exercício das suas funções, cometido relativamente a
bens ou coisas que lhe estão acessíveis ou entregues e cuja gravidade, maior ou
menor, não releva só do maior ou menor valor da coisa.
Objectivamente, o crime de peculato passou a ser unido mais gravemente relativamente a coisas de valor não muito elevado. Já no que respeita a coisas ou bens de
grande valor, aparentemente o crime de peculato passou a ser punido mais levemente
pela norma do art. 424.º, mas o facto de a norma do art. 424.º ser expressamente, uma
norma de carácter subsidiário, acaba por diluir esse abaixamento da medida da pena.
O crime de concussão – art. 315.º do Código Penal de 1886 – é descriminalizado
em 1982 – podemos encontrar alguns traços dele no art. 429.º designado de “Imposição
de contribuições ou impostos”, o qual fica com uma pena meramente simbólica – multa de 10 a 90 dias ou ainda no art. 427.º, n.º 3 – Participação Económica em Negócio –,
também com uma pena simbólica – multa de 30 a 120 dias.
Mesmo no Código de 1886 a pena nunca foi de prisão mas de multa e suspensão
do funcionário – esta última pena desapareceu enquanto pena principal do elenco das
penas do Código Penal de 1982.
Por outro lado, na sequência do movimento neocriminalizador também estabelecido
na Parte Especial do Código Penal de 1982, o crime de “Participação Económica em
Negócio” aparece pela 1.ª vez na versão original do Código de 1982 – art. 427.º.
Este artigo previa na sua formulação inicial e relativamente ao tipo principal,
uma pena de prisão até 4 anos e multa de 30 a 90 dias e tinha como missão principal
dar cobertura jurídico-penal a situações graves de lesão aos interesses públicos por
actos de má gestão ou fiscalização sobretudo nos casos em que não havia apropriação
ilegítima nem, por vezes, enriquecimento efectivo apesar de dever ser provado que o
funcionário agiu com intenção de obter uma participação económica ilegítima.
Finalmente cabe salientar o alargamento da figura jurídico-penal do funcionário.
O art. 437.º da versão original do Código Penal de 1982 criou o conceito jurídico-penal de funcionário, bem mais amplo que o conceito administrativista até então
aceite.
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enquanto que a corrupção activa para acto lícito foi descriminalizada