CRIANDO JOGOS NA SALA DE AULA
Adriana M. M. Bulos
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A aprendizagem a partir da diversão parece ser algo novo, presente apenas nos
métodos mais atuais de ensino. Porém, este é um recurso utilizado há muito tempo;
surgiu com os gregos e romanos, apesar dos jogos só passarem a ser valorizados com os
estudos de Fröebel.
Os jogos são instrumentos de grande importância no processo de construção de
conhecimento do indivíduo, visto que possibilita intervenções, facilitando o
desenvolvimento do raciocínio, dos conceitos aritméticos, lógico-matemático, dentre
outros.
O Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), 1998, trazem os jogos como um
recurso para “fazer Matemática” em sala de aula. Logo, o trabalho com jogos deve ser
visto pelo professor como algo de grande valia, pois, se isso não ocorre, as crianças
também não os valorizarão. Durante essas atividades, o professor precisa se envolver e
participar junto aos alunos, tendo sempre em vista que eles se envolvem mais com esses
jogos à medida que se sentem desafiados e tentam superar suas dificuldades.
Para Kamii, 2002, o professor não deve agir com sua autoridade nos jogos, mas,
sim, discutir com o grupo os problemas a fim de encontrar formas de resolvê-los. Uma
das sugestões é fazer com que o grupo pense, antecipadamente, os possíveis problemas
e as possíveis soluções. Além disso, durante todo o processo, é preciso avaliar o que
está acontecendo.
Trabalhar com jogos de regras é trabalhar com situações-problema, já que estes
possuem objetivos, dos quais depende o resultado final, e um conjunto de regras a ser
respeitado. O jogador precisa encontrar e/ou criar estratégias para vencer o adversário.
As regras dos jogos podem e devem ser mudadas pelo professor e/ou pelas
crianças de forma que se adaptem à realidade do grupo. Segundo Kamii, 2002,
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“as regras de um jogo pertencem ao conhecimento social
(convencional) e cada convenção pode ser mudada por
concordância entre os membros do grupo. Portanto, quando
as crianças dizem que querem mudar uma regra de um jogo,
nós geralmente dizemos que elas devem perguntar aos
outros membros do grupo se eles concordam com a
mudança proposta”. (p. 242).
O jogo não deve ser imposto e os sujeitos envolvidos precisam se interessar pelo
mesmo, pois para cada um o objetivo é ganhar; este é o seu primeiro desafio como
indivíduo, não como jogador.
A criança que joga com prazer utiliza seu raciocínio e sua inteligência a fim de
alcançar os objetivos e vencer o jogo, aprendendo, assim, a pensar. Essa situação,
segundo Brenelli, 1996, favorece a criação do “espaço para pensar”.
“No ‘espaço para pensar’ criado pela atividade lúdica, estão presentes os
aspectos cognitivos e afetivos indissociáveis numa mesma ação”. É através da
inteligência que a criança busca e/ou cria estratégias para vencer desafios e é sua
afetividade que a leva ao alcance dos objetivos. (BRENELLI, 1996: 173)
Além das contribuições pedagógicas e psicopedagógicas, “os jogos podem
contribuir para um trabalho de formação de atitudes – enfrentar desafios, lançar-se à
busca de soluções, desenvolvimento da crítica, da intuição, da criação de estratégias e
da possibilidade de alterá-las quando o resultado não é satisfatório – necessárias para a
aprendizagem da Matemática” (PCNs, 1998: 47).
Depois de fundamentar teoricamente esse tema, resolvi desenvolver um trabalho
diferente com alunos entre 12 e 13 anos de idade, das duas turmas de 6a série do
Colégio Vida, instituição da rede privada da cidade de Feira de Santana, Bahia, na qual
trabalho com a disciplina Matemática. Quando conclui com as turmas os estudos com os
números inteiros, positivos e negativos, fiz a proposta que eles criassem jogos utilizando
os conteúdos já construídos até então.
Essa seqüência didática teve como objetivos sistematizar e garantir conteúdos de
grande relevância para essa idade, desenvolver a criatividade, o interesse pela pesquisa,
além da habilidade de trabalhar em grupo. Ela durou cerca de cinco semanas,
totalizando oito horas/aula.
A primeira etapa desse trabalho foi para dividir a turma em cinco equipes,
quando foram sorteados cinco alunos que escolheram seus grupos de acordo com suas
afinidades. Depois das equipes formadas, sorteamos os temas: Frações, Situaçõesproblema, Números decimais, Números Inteiros, Porcentagem.
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Então, as equipes se reuniram e levantaram possíveis dificuldades que as pessoas
têm ao resolver questões com os temas propostos: problemas do próprio conteúdo ou de
interpretação.
Nesse momento foi interessante o envolvimento dos alunos, pois, em alguns
casos, eles não tinham dificuldades, então teriam que pensar nas das outras pessoas,
relembrando as discussões nas aulas e as colocações dos colegas durante essas aulas.
A partir daí, eles começaram a pensar os jogos, recordando os que possuíam ou
que já haviam jogado e que mais se identificavam. Às vezes, eles encontravam jogos,
mas sentiam dificuldades em adaptá-los ao conteúdo proposto, ou descobriam que
teriam problemas na hora de confeccioná-lo.
A etapa seguinte foi a elaboração das regras para participação, quando havia
uma preocupação com a idade do jogador, a quantidade de participantes, maneira de
jogar, objetivos finais, etc. Definido o jogo e suas regras, eles começaram a listar os
materiais necessários para a sua construção (tabuleiros, cartas, pinos, dados, etc.).
O envolvimento do grupo foi fascinante, pois pude perceber que eles interagiam
entre si e conseguiam opinar, além de ouvir e discutir a partir da opinião do outro.
Surge um novo momento: a elaboração das questões para os jogos. Eu solicitei
que eles não colocassem questões diretas do tipo: (-3) + 5 = ?. Assim, eles criaram
situações-problema diversas, envolvendo seu conteúdo, além de pesquisarem na
biblioteca da escola em livros didáticos.
Na semana seguinte, as equipes apresentaram seus trabalhos para os colegas e
tiveram a oportunidade de trocar entre eles os jogos, quando um grupo jogou o do outro.
Vale destacar que, nesse momento, houve grande crescimento, pois dois grupos não
conseguiram jogar seguindo as regras escritas e puderam fazer intervenções diante da
turma para que os que tinham criado os jogos repensassem estas regras.
No final, tínhamos uma variedade de jogos: trilha, dominó, batalha fracionária,
caça ao tesouro, jogo da memória, etc.
O encerramento do projeto foi na semana do dia dos pais, quando estes foram
convidados a jogar com os seus filhos e colegas na escola. Eles curtiram esse momento,
pois alguns pais não lembravam mais alguns desses conteúdos e os alunos faziam
intervenções fantásticas para ensiná-los.
A revisão literária feita sobre esse tema pôde ser reafirmada durante todo o
desenvolvimento do trabalho, visto que foram contemplados conteúdos conceituais
(relacionados ao saber), procedimentais (relacionados ao saber fazer) e atitudinais
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(relacionados ao ser: valores) nas aulas de Matemática, além de trabalhar a afetividade
dos alunos.
Numa avaliação final, considero que o trabalho alcançou os objetivos
preestabelecidos, visto que os alunos conseguiram sistematizar os conteúdos, foram
criativos, se interessaram pela pesquisa e trabalharam harmoniosamente em grupos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais:
Matemática. Brasília: MEC / SEF, 1998. 148p.
BRENELLI, Rosely P. O jogo com espaço para pensar – a construção de noções
lógicas e aritméticas. Campinas: Papirus, 1996. 208p.
KAMII, Constance; HOUSMAN, Leslie B. Crianças pequenas reinventam
aritmética – implicações da teoria de Piaget; trad. Cristina Monteiro. 2a ed. Porto
Alegre: Artmed Editora, 2002. 268p.
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