UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS
CURSO DE DIREITO
O DIREITO INTERNACIONAL DOS REFUGIADOS E SUA
APLICAÇÃO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
GEISA SANTOS SCAGLIA
Itajaí (SC), novembro de 2.009
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS
CURSO DE DIREITO
O DIREITO INTERNACIONAL DOS REFUGIADOS E SUA
APLICAÇÃO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
GEISA SANTOS SCAGLIA
Monografia submetida à Universidade
do Vale do Itajaí – UNIVALI, como
requisito parcial à obtenção do grau de
Bacharel em Direito.
Orientador: Professora MSc. Márcia Sarubbi Lippmann
Itajaí (SC), novembro de 2.009
AGRADECIMENTO
Agradeço, primeiramente, a Deus
que sempre me iluminou na longa caminhada
acadêmica, dando saúde e disposição para a
conclusão do curso e da presente monografia.
Agradeço especialmente aos meus
pais, Wanderson e Maria Helena, pelo suporte
familiar e financeiro que me disponibilizaram até
então, arcando com meus estudos aqui e no
exterior, e tudo aquilo que o rodeia, se
esforçando o máximo para minha formação
acadêmica, dando assim forças para ultrapassar
os obstáculos que surgiram no decorrer do
curso.
Aos
meus
queridos
amigos
Cristiany Schaefer, Carolina Rebelo, Daniele
Lisandro, Ezequiel Cunha e Suelen dos Santos,
pelo carinho, parceria, incentivo, apoio e
amizade compartilhada durante essa longa
caminhada e por ter feito dela uma caminhada
muito mais prazerosa e divertida.
Ao meu chefe Antonio Fernando
Monteiro Garcia - Dr. Monteiro, pela dedicação,
paciência, e por me instruir a cada dia,
agregando conhecimentos para minha formação
profissional.
Por fim, agradeço a ilustre
professora Márcia Sarubbi Lippmann, que com
sua presteza e inteligência colaborou de forma
significativa na realização deste trabalho.
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho aos meus pais,
Wanderson Martins Scaglia e Maria Helena
Santos Scaglia e ao meu irmão Wanderson
Santos Scaglia, pelo imensurável e pelo infinito
esforço dedicados a mim, e as amigas Cristiany
Schaefer e Suelen dos Santos, que
participaram desta jornada de cinco anos, com
muito amor e parceria.
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo
aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do
Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o
Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
Itajaí, novembro de 2.009
Geisa Santos Scaglia
Graduanda
PÁGINA DE APROVAÇÃO
A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale
do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Geisa Santos Scaglia, sob o título
O Direito Internacional dos Refugiados e sua Aplicação no Ordenamento
Jurídico Brasileiro, foi submetida em 19 de novembro de 2.009 à banca
examinadora composta pelos seguintes professores: MSc. Márcia Sarubbi
Lippmann (Presidente e Orientadora), e MSc. Maria Fernanda do Amaral Pereira
Gugelmin Girardi (Examinadora), aprovada com a nota [
Itajaí, [
] (
]
Professora MSc. Márcia Sarubbi Lippmann
Orientadora e Presidente da Banca
Prof. MSc. Antônio Augusto Lapa
Coordenação da Monografia
).
ROL DE CATEGORIAS
Rol de categorias que a Autora considera estratégicas à
compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.
Apátrida
Indivíduo que não é titular de nenhuma nacionalidade, ou seja, é uma pessoa que
não é considerado nacional por nenhum Estado1.
Asilo
Constitui exercício de um ato soberano do Estado, sendo decisão política cujo
cumprimento não se sujeita a nenhum organismo internacional. Normalmente
decorre de casos particulares, onde o indivíduo é vítima de perseguição pessoal por
motivos de opinião ou de atividades políticas. Quando a dissidência política acarreta
perseguição, procura um país onde estará protegido. É comum sua concessão às
personalidades notórias2.
Direitos Humanos
É o conjunto mínimo de direitos necessários para assegurar a vida do ser humano
baseada na liberdade e na dignidade3.
Direito Internacional Humanitário
Ramo do direito que cobre a proteção das vítimas de conflitos bélicos e estabelece
as normas internacionais para a conduta em hostilidades4.
1
CUNHA, Sérgio Sérvulo da. Dicionário Compacto do direito. 4. ed. rev. – São Paulo: Saraiva,
2005. p. 09
2
http://www.mj.gov.br/data/Pages/MJ7605B707ITEMIDCBF557A0019E4760B81DDA1B144E65BFPT
BRIE.htm, acesso em 04 de outubro de 2009, as 17:03 horas.
3
RAMOS, André de Carvalho. Direitos humanos em juízo. São Paulo: Max Limonad, 2001. p. 27.
4
RAMOS, André de Carvalho. Direitos humanos em juízo. p. 54.
Direito Internacional Público
É o conjunto de normas jurídicas criadas pelos processos de produção jurídica
próprios da comunidade internacional, e que transcendem o âmbito Estadual (direito
Interno). Direitos e deveres entre os Estados soberanos, quanto aos tratados,
convenções e acordos entre eles5.
Extradição
É o processo oficial pelo qual um Estado solicita e obtém de outro a entrega de uma
pessoa condenada por, ou suspeita de infração criminal6.
Refúgio
Considerado uma instituição convencional de caráter universal, aplica-se de maneira
apolítica, visando a proteção de pessoas com fundado temor de perseguição. É
aplicado a casos em que a necessidade de proteção atinge a um número elevado de
pessoas, onde a perseguição tem aspecto mais generalizado. Normalmente o
indivíduo está fugindo de agressões generalizadas, dando origem na maioria das
vezes a fluxo massivo de população que atravessa a fronteira em busca de
proteção7.
Revelia
Falta de defesa do réu. Recurso formal legítimo, adotado em nossa lei8.
5
LITRENTO, Oliveiros. Curso de Direito Internacional Público. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p.
12.
6
CUNHA, Sérgio Sérvulo da. Dicionário Compacto do direito, 2005. p. 28
7
http://www.mj.gov.br/data/Pages/MJ7605B707ITEMIDCBF557A0019E4760B81DDA1B144E65BFPT
BRIE.htm, acesso em 04 de outubro de 2009, as 17:03 horas.
8
CUNHA, Sérgio Sérvulo da. Dicionário Compacto do direito, 2005. p. 36
1
SUMÁRIO
RESUMO ............................................................................................ X
INTRODUÇÃO ................................................................................... 1
CAPÍTULO 1 ...................................................................................... 4
ASPECTOS DESTACADOS DOS DIREITOS HUMANOS NO
CONTEXTO INTERNACIONAL.......................................................... 4
1.1 OS DIREITOS HUMANOS E O POSITIVISMO DE SUAS NORMAS .............. 4
1.2 A PROTEÇÃO INTERNACIONAL DA PESSOA HUMANA NO DIREITO
INTERNACIONAL PÚBLICO.................................................................................. 6
1.3 O DIREITO INTERNACIONAL HUMANITÁRIO ............................................. 13
CAPÍTULO 2 .................................................................................... 18
ASPECTOS HISTÓRICOS DO REFÚGIO........................................ 18
2.1 RUDIMENTOS HISTÓRICOS SOBRE O REFÚGIO NA ESFERA
INTERNACIONAL ................................................................................................ 18
2.2 CONVENÇÃO RELATIVA AO ESTATUTO DOS REFUGIADOS DE 1951.....24
2.3 RUDIMENTOS HISTÓRICOS SOBRE O REFÚGIO NO BRASIL ................... 28
2.4 DIFERENCIAÇÕES ENTRE O INSTITUTO DO ASILO X INSTITUTO DO
REFÚGIO .............................................................................................................. 30
CAPÍTULO 3 .................................................................................... 34
PROTEÇÃO NACIONAL AOS REFUGIADOS................................. 34
3.1 MOTIVOS ENSEJADORES DA CONCESSÃO DO REFÚGIO NA
LEGISLAÇÃO BRASILEIRA ................................................................................ 34
3.2 O AVANÇO DAS BASES LEGAIS DE PROTEÇÃO NACIONAL:
CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 E A LEI 9.474/97...................................... 36
3.3 O COMITÊ NACIONAL PARA OS REFUGIADOS (CONARE) ....................... 41
3.4 ATUAÇÃO DA POLÍCIA FEDERAL................................................................ 44
3.5 A ATUAÇÃO DA CÁRITAS ............................................................................ 50
3.6 A CONCESSÃO DO REFÚGIO AO ITALIANO CÉSARE BATTISTI –
ANÁLISE DO CASO CONCRETO. ...................................................................... 52
3.7 PERSPECTIVAS DA PROTEÇÃO NACIONAL AOS REFUGIADOS ............. 57
CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................. 61
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS .......................................... 64
2
RESUMO
A presente pesquisa aborda sobre o reconhecimento do instituto do refúgio no
Brasil, aplicando o Direito Internacional dos Refugiados no contexto nacional.
Para tanto foi necessário um relato histórico do surgimento dos Direitos Humanos,
do Direito Internacional Público e Humanitário, bem como as origens do refúgio no
âmbito nacional e internacional. A abordagem do tema compreende desde a
natureza jurídica do instituto, passando pela importante diferenciação do asilo,
analisando o caso concreto de concessão de refúgio à Cesare Battisti,
compreendendo as razões pelas quais se reconhece como refugiado e se dá a
proteção a uma pessoa no Brasil. Foi apresentada a visão doutrinária e
jurisprudencial atual acerca do refúgio no Brasil, bem como apresentada as várias
opiniões que dividem a comunidade jurídica, acerca do tema. Por fim, como
produto final da investigação, discorre sobre as perspectivas do instituto do
refúgio no cenário nacional, a fim de promover a afirmação da dignidade humana,
sobretudo dos estrangeiros que se dirigem ao Brasil em busca de proteção
internacional.
Palavras-chave: Direitos Humanos. Direito Internacional dos Refugiados. Refúgio.
Proteção. Legislação Nacional.
INTRODUÇÃO
A
presente
Monografia
tem
como
objeto
o
Direito
Internacional dos Refugiados e sua aplicabilidade no contexto nacional.
O seu objetivo é análise do instituto do refúgio no Brasil,
apresentando o avanço da proteção nacional ao longo dos tempos, culminando
com a análise do caso ruidoso do italiano Senhor Cesare Battisti que recebeu o
status de refugiado, mesmo sendo acusado por homicídio em seu país de origem,
tendo como objetivo institucional, produzir uma monografia para obtenção do
título de Bacharel em Direito.
Para tanto, principia–se, no Capítulo 1, tratando de realizar
uma síntese do Direito Internacional Público, localizando o Direito Humanitário,
com suas origens e seu conteúdo. No mesmo raciocínio, refletir-se-á, brevemente
os Direitos Humanos, sua origem, consolidação e internacionalização acima da
soberania estatal, e por fim, os Direitos Humanos analisados sob o a forma de
princípios, dos quais estão introduzidos a idéia da Proteção à Pessoa Humana.
Uma vez localizada a posição do Direito Internacional dos
Refugiados no âmbito geral do Direito, iniciar-se-á no Capítulo 2, a discussão
acerca do tema, através dos rudimentos históricos na esfera nacional e
internacional do instituto do refúgio, destacando a Convenção relativa ao Estatuto
dos Refugiados de 1951, culminando na importante diferenciação do instituto do
asilo com o refúgio na América Latina.
Por fim, no Capítulo 3, será discutida a proteção nacional
dos refugiados, segundo as bases legais da Constituição de 1988 e a Lei
9.474/97, destacando os verdadeiros motivos ensejadores da concessão do
refúgio no Brasil, juntamente com a atuação da Polícia Federal, da Cáritas e do
CONARE. Será tópico de discussão e profunda análise, chegando assim ao
objetivo principal do trabalho, a análise do caso concreto do ex-ativista Cesare
Battisti, que teve a proteção concedida pelo Ministro da Justiça, e por fim,
registraremos as futuras expectativas para os refugiados no Brasil.
2
O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as
Considerações
Finais,
nas
quais
são
apresentados
pontos
conclusivos
destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões
sobre o Direito Internacional dos Refugiados no contexto nacional.
Para a presente monografia foram levantadas as seguintes
hipóteses, a qual, após o desenvolvimento da pesquisa, será confirmada ou não
nas Considerações Finais:
- Existe um instituto ou mecanismo, capaz de coibir o Estado
infrator dos direitos humanos, à submissão de normas internacionais relativa aos
direitos fundamentais do homem.
- A legislação nacional é referencial no que tange à proteção
aos refugiados.
- A concessão de refúgio ao italiano Cesare Battisti, não
provoca impactos significativos entre o Brasil e a Itália.
- As perspectivas futuras para o instituto do refúgio no Brasil
não são utópicas, mas sim uma realidade vivenciada nos dias atuais.
Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase
de Investigação9 foi utilizado o Método Indutivo10, na Fase de Tratamento de
Dados o Método Cartesiano11, e, o Relatório dos Resultados expresso na
presente Monografia é composto na base lógica Indutiva.
9
“[...] momento no qual o Pesquisador busca e recolhe os dados, sob a moldura do Referente
estabelecido [...]. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. 11
ed. Florianópolis: Conceito Editorial; Millennium Editora, 2008. p. 83.
10
“[...] pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma
percepção ou conclusão geral [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica:
teoria e prática. p. 86.
11
Sobre as quatro regras do Método Cartesiano (evidência, dividir, ordenar e avaliar) veja LEITE,
Eduardo de oliveira. A monografia jurídica. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p.
22-26.
3
Nas diversas fases da pesquisa, foram acionadas as técnicas do
Referente12, da Categoria13, do Conceito Operacional14 e da Pesquisa
Bibliográfica15.
12
“[...] explicitação prévia do(s) motivo(s), do(s) objetivo(s) e do produto desejado, delimitando o
alcance temático e de abordagem para a atividade intelectual, especialmente para uma
pesquisa.” PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 54.
13
“[...] palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou à expressão de uma idéia.” PASOLD,
Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 25.
14
“[...] uma definição para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja
aceita para os efeitos das idéias que expomos [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da
pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 37.
15
“Técnica de investigação em livros, repertórios jurisprudenciais e coletâneas legais. PASOLD,
4
CAPÍTULO 1
ASPECTOS DESTACADOS DOS DIREITOS HUMANOS NO
CONTEXTO INTERNACIONAL
1.1 OS DIREITOS HUMANOS E O POSITIVISMO DE SUAS NORMAS
A definição de direitos humanos é bastante ampla na
comunidade jurídica.
Segundo Ramos16, os direitos humanos é o conjunto mínimo
de direitos necessários para assegurar a vida do ser humano baseada na
liberdade e na dignidade.
Dallari17 menciona que os direitos humanos são nada menos
que uma forma resumida de mencionar os “direitos fundamentais da pessoa
humana”, considerados aqueles direitos inerentes à condição humana, que
garantem a dignidade e a personalidade.
São fundamentais os direitos que, se negados ao indivíduo,
privam ele da própria existência ou então suprimem a capacidade de se
desenvolver e de participar plenamente da vida.
No
âmbito
internacional,
os
direitos
humanos
são
considerados todos os direitos reconhecidos como fundamentais por tratados
internacionais ou por normas não-convencionais.
O reconhecimento de uma norma internacional de direitos
humanos
é
de
suma
importância,
pois
a
sua
violação
Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 209.
16
RAMOS, André de Carvalho. Direitos humanos em juízo. p. 27.
17
Apud RAMOS, André de Carvalho. Direitos humanos em juízo. p. 55.
importa
em
5
responsabilidade internacional do Estado, que, com isso, pode ser acionado
perante uma corte internacional de direitos humanos.
Cabe salientar, que a violação de uma norma internacional
acarreta, em princípio, responsabilidade do Estado que a infringiu, mas a
responsabilidade internacional por violação de direitos humanos decorre, com a
violação da norma internacional de mesma natureza, levando o Estado à
submissão de um tribunal internacional de direitos humanos.
Nota-se que não há um rol taxativo de direitos fundamentais,
visto que não existe um conjunto finito de direitos humanos. Mesmo ocorrendo
uma constante positivação da matéria, nunca haverá um catálogo exaustivo de
direitos fundamentais. Ademais, com a evolução da sociedade, a tendência é de
deferir caráter de essencialidade a uma quantidade cada vez mais crescente de
direitos, que, incorporando-se ao catálogo existente, tornar-se-ão inalienáveis a
partir de então. Assim sendo, é notório o caráter aberto dos direitos fundamentais,
que percorrem marcante evolução histórico-temporal.
Pode-se afirmar também que os direitos humanos têm por
fundamento o direito natural, visto que o princípio da dignidade da pessoa
humana, base dos direitos fundamentais, decorre da própria natureza do homem,
sendo anteriores à legislação humana.
Quanto à eficácia dos direitos essenciais a personalidade,
Ramos18 manifesta-se:
A expressão “direitos fundamentais da pessoa humana”, que
conclui, a idéia de direitos essenciais à personalidade, aparenta
conter força suficiente para permitir a sustentação de que os
direitos humanos possuem eficácia erga omnes. Isso porque, a
despeito de terem os direitos humanos fundamentos no direito
natural, a experiência histórica da humanidade revela de todo
conveniente, senão mesmo necessária a sua positivação.
Esta positivação mencionada surge devido à violação
constante dessas normas, ocorrendo o desrespeito aos direitos fundamentais,
18
RAMOS, André de Carvalho. Direitos humanos em juízo. p. 34.
6
mesmo após a proteção legislativa. Neste norte, a positivação dos direitos
humanos, embora não possua eficácia garantida, é instrumento útil para o
controle da conformidade dos atos estatais às normas imperativas internacionais.
No âmbito internacional, nota-se que os tratados de direitos
humanos aplicam-se somente aos Estados que os ratificam. Mesmo ocorrendo
um caso de violação de direitos fundamentais, a submissão de um Estado à Corte
de Direitos Humanos, depende de reconhecimento prévio, por parte do Estado
infrator, da jurisdição obrigatória de respectivo tribunal.
Neste sentido, Medeiros19 entende:
[...] o Estado violador contumaz de direitos humanos,
simplesmente, não reconhece, numa expressão de sua soberania,
os tratados sobre a matéria, muito menos a jurisdição de uma
corte temática interestatal. Esse Estado, nesse contexto, escapa
do controle do Direito Internacional dos Direitos Humanos.
Diante de tal afirmação, indaga-se então como a comunidade
internacional reage diante de um Estado que viola os direitos essenciais do
homem, e que invocando a sua soberania, mantém-se inalcançável pelo Direito
Internacional. No decorrer do trabalho, buscar-se-á a resposta se haveria algum
instituto ou mecanismo, capaz de coibir o Estado infrator, mesmo sem seu
consentimento, à submissão de normas internacionais relativa aos direitos
fundamentais do homem.
1.2 A PROTEÇÃO INTERNACIONAL DA PESSOA HUMANA NO DIREITO
INTERNACIONAL PÚBLICO
Segundo LITRENTO20, em qualquer sociedade, pode-se
admitir a cooperação voluntária dos homens para um fim comum. O efeito deste
“fim”, manifesta-se nas relações sociais, individuais, religiosas, etc., entretanto, é
necessário que cada indivíduo integrante do grupo se prive de algo para a
19
MEDEIROS, Antonio Paulo Cachapuz de. O poder de celebrar tratados: competência dos
poderes constituídos para a celebração de tratados, à luz do direito internacional, do
direito comparado e do direito constitucional brasileiro. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris,
1995.
20
LITRENTO, Oliveiros. Curso de Direito Internacional Público. p. 12
7
cooperação e realização de seus fins e, o Estado enquanto fenômeno jurídicosocial é também resultado dessa cooperação humana e não apenas de uma
evolução econômica.
A política de convivência e de cooperação mútua, juntamente
com a disputa pela dominação, desde negócios até de guerras, fez com que o
Estado passasse a observar as normas comuns, mínimas, que assegurassem a
sobrevivência tanto para o homem quanto para o Estado, interagindo com os
demais e com outras instituições, a partir de práticas construídas ao longo do
tempo ou de normas estabelecidas e admitidas pelos membros igualados pela
soberania.
O Direito Internacional Público, traz esta idéia de respeito
mútuo e reciprocidade de tratamento, construindo uma história onde há
cooperação entre os Estados através de uma ordem jurídica. Essas relações
ocorrem entre dois ou mais Estados - bilaterais ou plurilaterais - obrigando
somente o que os participantes concordaram do evento jurídico ocorrido.
A relação histórica entre os Estados resulta no Direito
Internacional Público, que registrou grande avanço em seus limites com a
inclusão das organizações internacionais.
SOARES21 contribui neste sentido, quando afirma que:
Admite-se, hoje, a personalidade de Direito Internacional à pessoa
humana mesmo sem a maioria dos atributos reconhecidos ao
Estado. Assim, mesmo a pessoa humana não tendo o poder de
celebrar tratados e convenções internacionais, tampouco de poder
instituir e ser membro pleno de organizações internacionais e
muito menos de representar-se a si mesma, por um direito próprio,
perante Estados ou organizações internacionais, tais como
estabelecer relações diplomáticas e consulares com essas
entidades, é certo, por outro lado, que podem ser lhe imputados
fatos ilícitos internacionais, relacionadas ao meio ambiente e que
sejam da alçada dos tribunais penais internacionais.
21
SOARES, Guido Fernando Silva. Curso de Direito Internacional Público. v.1.São Paulo:
Atlas, 2004, p. 158.
8
Neste entendimento, a pessoa humana pode ser considerada
como detentora de personalidade internacional, com restrições factuais e com
condicionamentos legais, ficando ultrapassadas as teorias que negavam a
personalidade jurídica à pessoa humana e a colocavam como simples objeto,
resolvendo o problema de violações de direitos humanos por parte dos Estados e
de danos eventualmente causados pela atuação internacional de terroristas, de
contrabandistas, de traficantes de drogas, etc.
Importante, para melhor compreensão do tema, é trazer a
conceituação de Direito Internacional Público, oferecida pelos estudiosos, tendo
como ressalva a idéia de que há casos em que certos conceitos jurídicos são
considerados errados, na conjuntura atual, porquanto toda uma geração foi
formada sob este conceito, além de todo histórico legal vigente e que foi criado
para atender à definição jurídica ora criticada.
Portanto, por questão de método, é necessário assinalar
alguns conceitos oferecidos pelos estudiosos, mas será com as ressalvas acima,
que traremos a este texto algumas definições e conceitos.
Para Accioly22, o Direito Internacional Público é:
[...] o conjunto de normas jurídicas que regulam as relações
mútuas dos Estados e, subsidiariamente, as demais pessoas
internacionais, como determinadas organizações, e dos
indivíduos.
HUSEK23, entende que:
São teorias que abrangem o estudo das entidades coletivas,
internacionalmente
reconhecidas:
estados,
organizações
internacionais e outras coletividades – além do próprio homem,
em todos os seus aspectos, incluindo os princípios e regras que
regem tais sujeitos de direito nas respectivas atividades
internacionais.
22
ACCIOLY, Hildebrando; SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento. Manual de Direito
Internacional Público.São Paulo: Saraiva, 1998, p. 3
23
HUSEK, Carlos Roberto. Curso de Direito Internacional Público. São Paulo LTr, 2000, p. 21.
9
No início, a soberania dos Estados, representou a maior
barreira para o avanço do Direito Internacional. A legislação de cada País e seus
respectivos governantes, eram impedidos de intervir no outro pela própria
soberania, visto que só era aceita a relação com outros Estados ou com
organismos criados pelos próprios Estados. No entanto, isso não impediu a
criação de diversos tratados abordando e muitas vezes disciplinando o
comportamento de certos indivíduos.
Muito embora, estas normas fossem dirigidas aos próprios
Estados, já se apresentava a necessidade de se ampliar o Direito Internacional
Público, dando espaço para novos atores de ter capacidade jurídica internacional.
Essa necessidade foi resolvida a criação das normas de proibição de tráfico de
escravos, a proibição de atos de piratas e de corsários, ou ainda as regras quanto
ao comportamento de soldados em guerra, o tráfico de espécies de animais e
vegetais e o tráfico de mulheres.
Em
seguida,
veio
à
fase
de
implementação,
do
aperfeiçoamento e a atual fase da inter-relação das normas internacionais.
Anteriormente,
não
havia
órgãos
internacionais
que
recebessem e examinassem as denúncias de casos de violação contra o ser
humano, e também não havia possibilidades de um particular denunciar tal
violação, somente os grupos sociais é que ofereciam denúncias, por meio de
petições ad hoc, em conferências diplomáticas. Com o avanço, cria-se uma
sistemática nova em que a vítima, seu familiar ou representante legalmente
constituído, podem denunciar um Estado ou autoridade, caso a violação ocorra
sob a jurisdição de um Estado membro, que tenha firmado o compromisso
internacional de prevenir e reparar as violações ocorridas em seu território.
Com tal aperfeiçoamento no Direito Internacional Público, é
notório que os procedimentos e mecanismos internacionais voltaram-se a favor
dos direitos humanos e não mais às prerrogativas dos Estados.
10
Entretanto, foi em 1945 com a criação das Nações Unidas,
que se registra uma revolução jurídica, que internacionalizou de maneira definitiva
os direitos humanos.
Os sistemas de petições e de denúncias para os casos
individuais de violação aos direitos humanos foram aperfeiçoados e agregou-se
mais dois mecanismos de implementação internacional – o sistema de relatórios e
o sistema de investigações ou de determinação dos fatos.
VELASCO VALLEJO24, explica:
O sistema de relatórios é utilizado principalmente pelos órgãos
internacionais que elaboram relatórios sobre a situação dos
direitos humanos em determinados países e realizam visitas para
investigar in loco, através do sistema de fatos. A obrigação dos
Estados de encaminhar relatórios sobre a situação de direitos
humanos está prevista em diversos Tratados e em convenções
sobre direitos humanos globais e regionais. Já o método de
determinação dos fatos ou de investigações pode operar de forma
permanente, institucionalizada, conforme previsto nos tratados de
direitos humanos, ou ad hoc, através de missões de investigação
por países, ou temáticas, estabelecidas por resoluções dos
organismos.
Importante destacar, outro marco no avanço do Direito
Internacional Público, que foi a aprovação da Convenção Européia dos Direitos
Humanos, em 1950. Este tratado trouxe uma grande inovação, pois abre a
possibilidade de o indivíduo, na condição de sujeito de direito internacional, sendo
cidadão nacional, estrangeiro, de forma individual ou coletiva, de ajuizar petições
à Comissão Européia de Direitos Humano – hoje chamada de Corte Européia dos
Direitos Humanos – denunciando violações dos direitos e das liberdades
enunciadas na Convenção.
Logo após, em 1969 foi assinada a Convenção Americana
sobre Direitos Humanos, em São José da Costa Rica, que também prevê o
recebimento
de
reclamações
de
particulares
diretamente
à
Comissão
Interamericana de Direitos Humanos que, por sua vez, pode requerer a
24
VELASCO VALLEJO, Manuel Diez de. Instituciones de Derecho Internacional Público.
Madrid: Tecno, AS, 1999, p. 85.
11
participação da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Há também a
Convenção Internacional sobre a eliminação de todas as formas de discriminação
racial de 1965, a Convenção contra tortura e outros tratamentos cruéis de 1984,
que adotaram o mesmo procedimento. O Brasil aderiu a este mecanismo somente
em 1992, através do Decreto 678, de 06 de novembro de 1992 (Soares, 2004, p.
360).
Segundo TRINDADE25, atualmente, alcançamos um estágio
de complementaridade e de interação de vários instrumentos de proteção aos
direitos humanos e de total ausência de hierarquia entre eles.
A evolução do Direito Internacional Público ou “Direito das
Gentes” é bastante considerável, visto que as obrigações internacionais
assumidas entre os Estados soberanos e comunidades nacionais, se não
cumpridas
acarretam
sanções,
principalmente
tratando-se
dos
direitos
fundamentais da pessoa humana, por isso, atualmente estão baseadas no
consentimento, percorrendo um caminho até o sistema do Direito Humanitário até
chegarmos à proteção aos Refugiados.
O caminho percorrido com êxito pelo “Direito das Gentes” é
resultante de atitudes repetidas, julgadas necessárias pelos cidadãos, Estados,
entidades e organismos internacionais, criando o Direito Internacional Público,
que se impõe diante do Estado e de suas leis, no que divergirem.
No Brasil houve dificuldades para aplicação de alguns
tratados e convenções internamente, sendo necessário definir que, quanto às
regras de proteção internacional à pessoa humana, a Constituição Federal de
1988 prevê que todos os tratados dos quais o Brasil seja parte e dirijam-se à
proteção da pessoa são também Constitucionais, tanto quanto qualquer outro
mandamento previsto no artigo 5º da Magna Carta Brasileira.
25
TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. O Direito Internacional em um Mundo em
Transformação. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 719.
12
Entretanto,
o
Supremo
Tribunal
Federal
entendia
diferentemente, no sentido de que qualquer tratado internacional, ratificado pelo
Brasil, passava a fazer parte do direito interno brasileiro, no âmbito da legislação
ordinária, sem força para mudar o texto constitucional, pois sendo a Constituição
Federal a expressão máxima da soberania nacional, estaria ela acima de
qualquer tratado ou convenção internacional que com seu texto conflite. Portanto,
para o STF, não havia garantia de privilégio hierárquico dos tratados
internacionais sobre o direito interno brasileiro, devendo-se garantir a autoridade
da norma mais recente.
Porém, o Supremo Tribunal Federal, ao não conceder às
normas internacionais igualdade com as normas constitucionais, contrariava a
constituição de 1988 e seus princípios contidos nos artigos 1º e 4º e, a um só
tempo, mascarava a decisão do povo em favor da dignidade humana, da
solidariedade e da cooperação internacional.
Para solucionar esta contradição, a Emenda 45 de 31 de
dezembro de 2004, prevê que os tratados e as convenções internacionais,
submetidos ao mesmo regime de aprovação das emendas constitucionais a elas
se equipararão, bem como, desde logo, declara que o Brasil se submeterá à
jurisdição de qualquer Tribunal Internacional a cuja criação tenha aderido,
conforme estabelecem os §3º e §4º, acrescidos ao artigo 5º da Constituição pela
Emenda 45. Na mesma emenda, o Poder Legislativo estende a competência dos
juízes federais para incluir as causas relativas a direitos humanos, inciso V-A, a
que se refere o § 5º do artigo 109, e refere-se à federalização dos crimes de
graves violações de direitos humanos.
Por fim, existem duas formas para solucionar os conflitos
entre tratados internacionais e leis internas infraconstitucionais, quando se trata
de proteção à pessoa humana: a primeira prevalece os tratados sobre o direito
interno, garantindo o compromisso internacional firmado pelo País; e a segunda
submete a legislação interna, inclusive constitucional, ao que é estabelecido em
tratados internacionais de proteção à pessoa. Isso ocorre devido a proteção à
pessoa, ser sempre constitucional, devendo ser compreendida sob três vertentes
13
conforme consta na Constituição de 1988, no capítulo dos direitos e das garantias
individuais:
1) direitos e garantias expressos na Constituição;
2) direitos e garantias decorrentes do regime e dos princípios pela Constituição
adotados; e
3) direitos e garantias inscritos nos tratados internacionais em que a República
Federativa do Brasil seja parte, em obediência ao inscrito nos artigos 1º, 4º e 5º, §
2º da Constituição da República.
1.3 O DIREITO INTERNACIONAL HUMANITÁRIO
O Direito Internacional Humanitário teve surgindo em 1864,
com a primeira Convenção de Genebra. Os dez artigos de seu conteúdo, já eram
considerados costumeiros, visto que foram praticados desde o século XVI,
tratando sobre a proteção das vítimas da guerra e exigindo que fossem poupados
pelos beligerantes, os feridos e os enfermos, os médicos, os enfermeiros e outras
pessoas relacionadas ao trabalho de socorro, capelães, prisioneiros, população
civil, enfermeiros e transportes hospitalares, criando assim a instituição
internacional da “Cruz Vermelha”.
Sob o ponto de vista formal, o Direito Internacional
Humanitário pode ser entendido, como um conjunto de regras que se
convencionou chamar “direito de Genebra”, “direito de Haia” e “direito de Nova
York”.
O
direito
de
Genebra
foi
fundamentado
nas
quatro
convenções ocorridas na cidade de Genebra, na Suíça, em 1949, das quais a
primeira procura aliviar a sorte dos militares em campanha terrestre; a segunda se
preocupa com os mesmos militares em campanha no Mar; a terceira regra o
tratamento a ser dispensado aos prisioneiros de guerra e a quarta e última visa à
proteção dos civis durante a guerra.
14
Cabe salientar que todos os protocolos relacionados às
convenções de Genebra, adotados em 1977, foram todos internacionalizados.
REZEK26 contribui:
O Direito Internacional Humanitário é uma construção
marcadamente costumeira, portanto, resultado do acúmulo de
diversos e sucessivos momentos, com surgimento formal
simultâneo ao da Cruz Vermelha. Ele só veio a ficar conhecido
como tal a partir das convenções de Genebra de 1949, sendo
certo que sua expansão e seu aperfeiçoamento devem-se,
também, principalmente, ao Comitê Internacional da Cruz
Vermelha, que é, na verdade, uma instituição internacional que
pratica o Direito Humanitário, e não um centro de estudos, razão
pela qual se consideram também como integrantes do Direito
Internacional Humanitário, inclusive, as convenções que visavam
à proteção do Homem, anteriores à existência destas convenções
e outros documentos, como as declarações multilaterais ou
convenções, inclusive já revogadas ou que nunca estiveram em
vigor.
O Direito Internacional Humanitário, traz a preocupação com o
ser o humano, distinguindo e separando da religião e do homem político, em
caráter internacional, preenchendo a lacuna e complementando a idéia de
proteção também em tempo de paz.
Após a Primeira Guerra Mundial, surge a Liga das Nações
com o objetivo de promover a cooperação, a paz mundial e a segurança
internacional,
condenando
as
agressões
a
integridade
territorial
e
a
independência política de seus membros. Os Estados também assumem com a
OIT – Organização Internacional do Trabalho, o compromisso de garantir
condições dignas de trabalho para homens e mulheres, e se tal compromisso
fosse violado, o Estado infrator sofreria sanções econômicas e militares. Junto
com tais organizações, vieram importantes contribuições para o chamado
processo de internacionalização dos Direitos Humanos.
Já com a Segunda Guerra Mundial, e com o objetivo de
proteger as pessoas das atrocidades do Holocausto e das agressões cometidas
26
REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público: Curso Elementar. 10. ed. rev. e atual.
São Paulo: Saraiva, 2005, p. 369-370
15
pelos nazistas contra os judeus, surgiram as mais profundas preocupações no
que tange à proteção internacional dos Direitos Humanos. Estas preocupações
consistiam em afirmar que a soberania estatal era limitada pelo respeito aos
Direitos Humanos, não sendo, portanto, totalmente absoluta. E foi justamente
essa preocupação que impulsionou a internacionalização dos Direitos Humanos,
resultando na criação de normas de proteção internacional que possibilitaram a
responsabilização do Estado, quando as instituições nacionais se mostrarem
falhas ou omissas na tarefa de proteção dos Direitos Humanos.
Outro
marco
importante
para
o
Direito
Internacional
Humanitário, foi o ano de 1948 com a criação da Carta das Nações, onde foram
abandonados os aspectos territoriais, religiosos, lingüísticos, étnicos, políticos
garantindo-se a teórica igualdade entre os seres.
Analisando o aspecto histórico, os Direitos Humanos de
primeira geração, englobam os direitos civis e políticos, também chamados de
liberdades clássicas, negativas ou formais, surgidos com o Iluminismo, tinham
com objeto a consagração e o reconhecimento dos direitos humanos no plano
interno, no espaço jurídico de cada país.
Posteriormente, teríamos os Direitos Humanos de segunda
geração, nascido no fim do século XIX com as preocupações da nova classe
trabalhadora, surgidas com a industrialização, dos quais os mais destacados
documentos são a Constituição mexicana de 31 de janeiro de 1917, a Revolução
Soviética de 1917, seguida pela declaração Soviética dos Direitos do Povo
Trabalhador e Explorado de 1918, e a Constituição de Weimar de 11 de agosto de
1919, cuja ênfase eram os direitos socioeconômicos (trabalho, subsistência,
amparo na doença e na velhice), liberdade – concreta ou positiva – e a igualdade
(MORAES, 1997, p.45).
Logo
após,
vieram
os
direitos
de
terceira
geração,
considerados os direitos coletivos, que consagram o princípio da solidariedade ou
da fraternidade, consubstanciado na saudável qualidade de vida, no progresso,
na paz e em tantos outros direitos difusos, como a autodeterminação dos povos.
16
Baseando-se na clássica doutrina do saudoso Norberto
Bobbio “A Era dos Direitos”, surgem, por fim, os direitos humanos de quarta
geração que seriam os direitos relacionados à ética e à biologia, especialmente a
genética, cuidando dos progressos da engenharia genética.
A evolução dos Direitos Humanos também pode ser
analisando por outra vertente, seguindo a separação feita pela ONU nos pactos
de 1966, relacionados aos Direitos Civis e Políticos e aos Direitos Econômicos,
Sociais e Culturais - primeiros a serem chamados de Liberdades Públicas ou de
direitos liberais, exigíveis dos Estados, porque estes se responsabilizam pelo
cumprimento do pacto, tornando-o efetivo, entretanto, os Direitos Econômicos,
Sociais e Culturais não seriam obrigatórios, na medida em que os Estados
assumem apenas o compromisso de adotar medidas tendentes a satisfazê-los.
Neste norte, MELLO27 manifesta-se sobre o conceito de
direitos humanos, afirmando que é o conjunto de normas que estabelece os
direitos que os seres humanos possuem para o desenvolvimento de sua
personalidade e estabelece mecanismos de proteção a tais direitos.
MORAES28, de acordo com este pensar, define:
O conjunto institucionalizado de direitos e garantias do ser
humano que tem por finalidade básica o respeito a sua dignidade,
por meio de sua proteção contra o arbítrio do poder estatal e o
estabelecimento de condições mínimas de vida e desenvolvimento
da personalidade humana.
Em nosso País, a causa pela proteção dos Direitos
Humanos ganhou força quando o Presidente Fernando Henrique Cardoso, criou o
Programa Nacional de Direitos Humanos onde são propostas medidas
audaciosas para enfrentar a violência urbana, a discriminação de toda espécie e
para a proteção de menores e adolescentes, de indígenas, de mulheres, de
imigrantes, de migrantes, de refugiados, entre outros.
27
MELLO, Celso Duvivier de Albuquerque. Direitos Humanos e Conflitos Armados. Rio de
Janeiro: Renovar, 1997, p. 6.
17
Importante ressaltar que neste Programa Nacional de
Direitos Humanos, já constava no plano governamental um projeto de Lei, criando
o Estatuto dos Refugiados e a reformulação da atual Lei dos Estrangeiros.
Este programa foi regulamentado pelo Decreto 1.904 de 13
de maio de 1996, ratificado e ampliado pelo Decreto 4.229 de 13 de maio de
2002, sendo que a partir de 2003 com o governo do atual Presidente Luiz Inácio
Lula da Silva, houve o desenvolvimento dos planos e a implementação de
algumas propostas apresentadas nos Planos Nacionais de Direitos Humanos,
através das Secretarias Especiais de Direitos Humanos; de Política de Promoção
da Igualdade racial e de Políticas para as mulheres.
Nos
últimos
tempos,
diversas
organizações
não
governamentais, foram criadas com o intuito de implementar e promover regras
relacionadas aos direitos humanos, que por sua vez, interagem com os propósitos
das autoridades políticas e com o Poder Público como o Ministério Público, as
Defensorias Públicas e as Procuradorias.
28
MORAES, Alexandre. Direitos Humanos Fundamentais: Comentários aos arts.1º a 5º da
Constituição de 1988, doutrina e jurisprudência.São Paulo: Atlas, 1997, p. 39.
18
CAPÍTULO 2
ASPECTOS HISTÓRICOS DO REFÚGIO
2.1
RUDIMENTOS
HISTÓRICOS
SOBRE
O
REFÚGIO
NA
ESFERA
INTERNACIONAL
Com o término da 1ª Guerra Mundial em 1918, vieram as
complicações de ordem econômica e social, devido ao contingente de refugiados.
Eles não gozavam de nenhuma proteção estatal, em função de suas opiniões
políticas, crenças religiosas ou perseguição de raça, nacionalidade, etc.
Com esse cenário colapsado, em 1920, surge a Liga das
Nações, precursora da atual Organização das Nações Unidas (ONU), composta
pelos países europeus colonialistas, França, Alemanha, Holanda e Inglaterra que era a principal potência na época - tendo como objetivo manter a paz
mundial, promover a cooperação e a segurança internacional.
A convenção da Liga das Nações condenava agressões
externas contra o território e a independência política dos seus membros, bem
como estabelecia sanções econômicas e militares aos Estados que violassem as
regras impostas pela comunidade internacional, surgindo assim, uma nova
definição para o conceito de soberania estatal.
Para ARAUJO29, a Liga das Nações teve papel fundamental
na proteção dos refugiados:
Embora a Liga das Nações tivesse se preocupado com a proteção
de outros grupos hostilizados no mundo, como, por exemplo, os
Indigentes Estrangeiros, é preciso dizer que foi, sobretudo, por
meio dela que a comunidade internacional iniciou o enfrentamento
do problema mundial representado pelos refugiados.
29
ARAUJO, Nádia de; ALMEIDA, Guilherme Assis de. O Direito Internacional dos Refugiados:
Uma Perspectiva Brasileira. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 123.
19
Com efeito, logo após a Primeira Guerra Mundial, todos
enfrentavam a dificuldade de ordenar os assentamentos, prestar socorro aos
necessitados e definir uma condição jurídica adequada aos refugiados.
Com o início dos trabalhos, verificou-se a necessidade de
criar uma Instituição para proteção efetiva dos Refugiados, uma vez que, desde
então, verificam-se as principais dificuldades que acompanham os Refugiados até
o presente momento.
De um lado, surge a condição de apátrida, estabelecida de
forma instantânea. De maneira inédita, o governo russo em 1921, retirou a
nacionalidade dos que se não residiam no país, por se oporem ao regime, dos
que partiram sem autorização das autoridades russas, dos que faziam parte das
atividades contra o governo soviético e daqueles que não optarão pela
nacionalidade soviética. Cabe salientar, que ainda hoje, esse mecanismo é
utilizado por governos oriundos da intolerância e da força.
De outro lado, existia o abandono, a desnacionalização e a
perseguição por parte do próprio país de origem da pessoa, que em regra,
deveria garantir a proteção. Fato este, aliás, corriqueiro atualmente. No entanto,
os nacionais, sem que tivessem a nacionalidade reconhecida por algum país, não
possuíam documentos de identidade, tornando-os indocumentados aonde quer
que fosse, e conseqüentemente, impedidos de serem repatriados, visto que não
possuíam nacionalidade legal.
A Rússia possuía o Alto Comissariado para Refugiados
Russos, e neste clima delicado, foi que em julho de 1922 em uma conferência em
Genebra, instituiu o Certificado de Identidade para Refugiados Russos, aprovado
por 53 países, que passou a ser conhecido como passaporte Nansen.
Pelo êxito logrado na iniciativa russa, a Liga das Nações
convida o Dr. Nansen em 1923, a expandir o sistema de proteção aos armênios
que se encontravam na Turquia e que de lá foram expulsos com o término da
Primeira Guerra Mundial, somando um contingente humano de mais de 300.000
pessoas, espalhadas pela Síria, Iraque, Palestina, Grécia e demais países
20
europeus; sendo em 1924 finalmente expedido o Certificado de Identidade para
os Refugiados Armênios. Logo após, em 1926, através de um novo acordo,
resolveu-se, e de fato expediu-se, um documento que serviu para russos e para
armênios, denominado Certificado de Identidade para Refugiados Russos e
Armênios.
A Turquia, com o objetivo de uniformizar a população de seu
Estado, expulsou de suas terras, cerca de 30.000 assírios que lutaram contra os
turcos durante a Primeira Guerra, e da mesma forma que se solucionou o caso
dos armênios, o Alto Comissariado, liderado pelo Dr. Nansen, estendeu a
proteção aos refugiados turcos, assírios e assimilados em 1928.
Com a morte do Dr. Nansen, a Liga das Nações cria em
1931, o Escritório Internacional Nansen para Refugiados, subordinado ao
conselho da Liga e com o objetivo de dar continuidade aos trabalhos já
desenvolvidos pelo Alto Comissariado para os Refugiados Russos. Porém, com
os acontecimentos daquela década, impediram que o Escritório Nansen,
assumisse todas as competências do Alto Comissariado para os Refugiados
Russos, devido a forte pressão política que a Liga das Nações recebia por parte
da então URSS – União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, que era a grande
causadora do grande contingente de refugiados, para que diminuíssem os
trabalhos de proteção aos refugiados. Este motivo, agregado por uma nova onda
de pessoas em fuga, abandonadas pelo governo alemão e a diminuição de
verbas de caridade, foram as principais causas para que o Escritório Nansen não
conseguisse realizar com sucesso os planos idealizados pelos seus criadores.
Não obstante todas as dificuldades, pode-se contar como
uma das mais positivas ações do Escritório Nansen, a criação da Convenção
Relativa ao Estatuto Internacional dos Refugiados de 1933, assumida por apenas
oito Estados. Essa convenção não definiu o que seja refugiado, mas positivou a
recomendação e o princípio costumeiro do Non Refoulement. A década foi intensa
e movimentada, fruto da política do Partido Nacional-Socialista, liderado por Adolf
Hitler, na Alemanha.
21
Surge, neste contexto, novo grupo de refugiados que
passam a viver em condições precárias, devido ao abandono de proteção por
parte da Alemanha. Esse grupo era composto pelos judeus e por opositores ao
regime. Entretanto, o Escritório Nansen, não pôde intervir nos Estados que
agrediam os direitos humanos de seus nacionais, visto que estes Estados
reuniam forças para acabar com os trabalhos do Escritório, além de a Alemanha,
quanto membro da Liga das Nações, pressionar pelo não reconhecimento dos
judeus alemães como refugiados.
FISCHEL30 agrega que:
Essa foi a razão pela qual a Liga das Nações criou uma
administração ad hoc com sede em Londres, procurando
assegurar aos perseguidos um lugar, além mar, (para os novos
refugiados) optando pela criação, em 1938, de uma nova e
paralela estrutura de proteção dos refugiados.
Esta
administração
em
Londres,
culminou
no
Alto
Comissariado para os Refugiados Judeus, oriundos da Alemanha, entretanto, em
1938, por sugestão da Noruega, a Liga das Nações decide extinguir o Escritório
Nansen e o Alto Comissariado para os Refugiados Judeus, unificando os órgãos
no Alto Comissariado da Liga das Nações para Refugiados, através de cinco
resoluções da Assembléia da Liga das Nações, em Genebra, em 30 de setembro
de 1938.
A situação se agrava com a Segunda Guerra Mundial (19391945), visto que com seu término os Estados Unidos da América (EUA) emplaca
com a Rússia, a conhecida Guerra Fria, aumentando o deslocamento forçado de
grandes contingentes humanos, devido ao conflito bélico contínuo.
Durante a 2ª Guerra Mundial, foi necessário estabelecer um
organismo responsável pelos civis deslocados em razão do conflito bélico, que
30
ANDRADE, José Henrique Fischel. O Direito Internacional dos Refugiados em Perspectiva
Histórica. São Paulo: Universidade de São Paulo, 1999, p.94.
22
daria socorro e assistência, e como conseqüência, em 1943, ocorre à criação da
Administração das Nações Unidas para o Socorro e a Reconstrução (ANUAR)31.
Antes mesmo do fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945,
representantes de 51 países, reuniram-se em San Francisco (E.U.A), e redigiram
a Carta das Nações Unidas. Em outubro do mesmo ano, China, Estados Unidos,
França, Reino Unido e a antiga União Soviética ratificaram a carta e ganharam
assento permanente no Conselho de Segurança, e em 1947 a organização criou
sua bandeira com a cor azul, simbolizando a paz.
Com efeito, a ONU nasceu preocupada com os refugiados,
pois com o fim da Liga das Nações e de seu Alto comissariado, o Comitê
Intergovernamental assumiu suas funções em 1946 até o ano de 1947, quando
também foi extinto juntamente com o ANUAR. Por isso, já sob coordenação da
ONU e com as mesmas atribuições de todos os órgãos que substituía, foi criada
em 1948, a Organização Internacional para Refugiados, com data prevista de
encerramento para junho de 1950, mas encerrou suas atividades somente em
fevereiro de 1952.
Entretanto, em dezembro de 1949, antes do fim formal da
Organização Internacional para Refugiados, discutiu-se na Assembléia Geral da
ONU a criação de um organismo que a sucedesse.
O organismo criado, como subsidiário da ONU, para que
houvesse a efetiva proteção dos refugiados e delimitassem responsabilidades de
buscar soluções para essas pessoas, foi o Alto Comissariado das Nações Unidas
para os Refugiados (ACNUR), criado em 1951.
O ACNUR possui atualmente mais de 300 escritórios,
espalhados por 120 países. Sua sede está localizada em Genebra, onde existe
um
Comitê
Executivo
composto
por
representantes
de
53
Estados,
supervisionando o orçamento e fornecendo os princípios gerais à organização.
Para exercer efetivamente seu objetivo, o ACNUR é representado por escritórios
31
Doravante “UNRRA”, tendo seu significado em inglês como United Nations Relief and
Rehabilitation Administration.
23
continentais, sub-regionais e nacionais e também por parcerias com a sociedade
civil e órgãos da ONU, relacionados aos direitos humanos.
Quanto à sua manutenção, o ACNUR conta apenas com a
contribuição voluntária dos países membros da ONU, de organizações nãogovernamentais e da sociedade em geral, sendo importante registrar que nos
acontecimentos de Kosovo e Timor Leste, a contribuição arrecadada chegou a 30
milhões de dólares.
Sobre a responsabilidade do Alto Comissariado das Nações
Unidas para os Refugiados (ACNUR), ANDRADE32, manifesta-se:
Da análise das tarefas encarregadas ao Alto Comissariado, notase que, ademais da proteção jurídica, não lhe cabia nenhuma
tarefa de assistência direta, mas sim a de coordenação desta. De
fato, os recursos dos numerosos fundos e pelas diversas taxas,
eram distribuídos pelo Alto Comissariado às organizações
privadas que tinham, estas sim, contato direto com os refugiados,
responsabilizando-se, portanto, pela ajuda humanitária in loco,
pela emigração, pelo assentamento permanente e pela absorção
dos refugiados na vida econômica dos países de refúgio.
Alguns doutrinadores defendem que, dentre as funções do
ACNUR, está incluído o poder ou a capacidade de assinar acordos ou tratados.
Sobre esta discussão, existem duas correntes: a primeira, definida como
interpretação restritiva, argumenta que a ONU não é uma entidade independente
dos Estados membros, portanto, os poderes concedidos só poderiam ser
alterados por novo acordo entre os Estados membros e não por resoluções da
Assembléia Geral da ONU. A segunda teoria, denominada interpretação
extensiva, defende que a carta das nações unidas estabelece as principais metas
da ONU, podendo constar dentro desses parâmetros o poder de assinar acordos
ou tratados. Ainda na teoria extensiva, há um segundo posicionamento que
32
ANDRADE, José Henrique Fischel de. Direito Internacional de Refugiados: evolução
histórica (1921-1952). 1996. p. 116.
24
defende que na carta das nações existem poderes implícitos. E essa é a teoria
mais aceita entre os doutrinadores, segundo JUBILUT33.
Desta forma, mesmo a ONU não tendo recebido poderes
expressos na Carta das Nações, recebia-os de forma implícita à medida que
fossem essenciais ao desempenho de suas tarefas, bem como, o poder de
celebrar tratados ao órgão que cria, como no caso do ACNUR. Neste
entendimento, o ACNUR pode estabelecer acordos com organizações nãogovernamentais,
mesmo
considerando
que
estas
últimas
não
sejam
necessariamente sujeitos de direito internacional.
Com o período pós-guerra e o mundo inteiro abalado com as
atrocidades cometidas pelo holocausto, a ONU elaborou a Declaração Universal
dos Direitos Humanos, que traz em seu artigo 14, o direito ao asilo, conforme
segue:
Artigo 14 - Todo homem vítima de perseguição, tem o direito de
procurar e se beneficiar do asilo em outros países.
Essa premissa foi confirmada com a Convenção relativa ao
Estatuto dos Refugiados, que será analisada a seguir.
2.2 CONVENÇÃO RELATIVA AO ESTATUTO DOS REFUGIADOS DE 1951
O Direito Internacional dos Refugiados, de maneira formal,
nasceu com a Convenção de 1951, considerada um instrumento internacional de
autoria da ONU, e assinada por doze países34, levando a comunidade
internacional a reconhecer sua obrigação de garantir segurança e apoio aqueles
que necessitavam deixar sua terra natal.
33
JUBILUT, Liliana Lyra. O Direito Internacional dos Refugiados e sua Aplicação no
Ordenamento Jurídico Brasileiro. Dissertação de Mestrado. São Paulo: Faculdade de Direito
da Universidade de São Paulo, 2003, p. 154-155.
34
Os países que firmaram a Convenção em 1951 foram: Áustria, Bélgica, Colômbia, Dinamarca,
Holanda, Iugoslávia, Liechtenstein, Luxemburgo, Noruega, Reino Unido, Suécia e Suíça.
(ACNUR, 2000a, p 1-5)
25
Esta Convenção contribuiu de forma fundamental, à situação
do refugiado. Adotou-se o sistema de análise individual de cada caso, por isso,
definiram-se requisitos dos quais os refugiados eram obrigados a se
enquadrarem, para que possuíssem o reconhecimento legal de “refugiado”.
Instituiu-se também, princípios dos quais os Estados tinham a obrigação de
respeitar em relação aos solicitantes de refúgio, como o princípio da nãodevolução (non-refoulement), do qual o refugiado teria o direito de não ser
mandado ao país de origem, onde seus direitos já foram violados ou estejam sob
ameaça, entretanto, o mesmo princípio não poderia ser aplicado no caso do
refugiado ou solicitante ser considerado uma ameaça à segurança do país que o
acolheu ou pelo fato de ter cometido um delito considerado grave, passou a ser
uma ameaça a comunidade do país35. Outros princípios importantes de destaque,
definidos na Convenção, foi a possibilidade de recurso, após decisão
desfavorável e também o princípio da reunião familiar.
A Convenção, em seu artigo 1º define o refugiado:
[...] em virtude dos eventos ocorridos antes de 1º de janeiro de
1951 e devido a fundado temor de perseguição por motivo de
raça, de religião, de nacionalidade, de participação em
determinado grupo social ou de opiniões políticas, esteja fora de
seu país de nacionalidade e não pode ou, em razão de tais
temores, não queira valer-se da proteção desse país; ou que por
carecer de nacionalidade e por estar fora do país, onde antes
possuía sua residência habitual não possa ou, por causa de tais
temores ou de razões que não sejam de mera conveniência
pessoal, não queira regressar a ele.
Cabe salientar, que a Convenção desta forma, limitou de
forma temporal e geográfica, uma vez que a condição de refugiado se restringia a
aos acontecimentos ocorridos até dia 1º de janeiro de 1951 no continente
europeu. Embora aplicável a grande maioria dos refugiados – já que até a década
35
Conforme artigo 33 da Convenção, o princípio da não-devolução:
“(...) não poderá ser invocado por um refugiado que haja razões sérias para considerar perigo para
a segurança do país onde se encontra, ou que, tendo sido objeto de uma condenação definitiva
por um crime ou delito particularmente grave, constitua ameaça para a comunidade do dito país”
(ACNUR, 1996b, p. 74).
26
de 50 a maioria deles eram europeus – tal definição mostrou-se pouco aplicável
com o passar dos anos.
Por oportuno, é preciso lembrar, que a reserva geográfica
estabelecida no Estatuto dos Refugiados era uma faculdade, uma opção dos
países signatários da Convenção de 1951, conforme segue:
a) “Acontecimentos ocorridos antes de 1º de janeiro de 1951 na Europa”, ou;
b) “Acontecimentos o ocorridos antes de 1º de janeiro de 1951 na Europa ou
alhures”.
O Brasil, optou pela definição “b” do parágrafo 1º, seção B do
artigo 1º da Convenção de 51.
O
período
pós-guerra
(1960-1975),
foi
marcado
por
movimentos de independência na Hungria, África e China, e devido ao grande
contingente de pessoas deslocadas, o ACNUR solicita aos demais países
signatários da Convenção de 1951, que acolhessem os refugiados, dando lhe a
assistência necessária, ao menos temporariamente.
Diante disto, Canadá, Chile, Noruega, Suécia, Reino Unido,
EUA, entre outros, concedem refúgio para mais de 130 mil refugiados ao total.
Porém, o grande contingente de pessoas advindas da África
e demais localidades, justificava a necessidade de alterar a definição de
refugiado, estabelecida na Convenção de 1951. Por isso, em 1967 é elaborado
um Protocolo sobre o Estatuto dos Refugiados, que em seu artigo 1º supriu todas
as limitações quanto à definição, visto que em determinado período a maioria dos
refugiados foi composta por africanos e asiáticos, dos quais 80% eram mulheres e
crianças36.
36
ARAUJO, Nádia. O Direito Internacional dos Refugiados: uma perspectiva brasileira. p. 27.
27
No que tange esse entendimento calha citar a manifestação
37
de Piovesan :
Desde a adoção da Convenção de 1951 e do Protocolo de 1967,
constata-se principalmente nos âmbitos regionais africanos e
americano o esforço de ampliar e estender o conceito de
refugiado. A respeito, merecem destaque a Convenção da
Organização da Unidade Africana de 1969 e a Declaração de
Cartagena de 1984, que prevêem a violação maciça dos direitos
humanos como caracterizadora da situação de refugiado, situando
assim a matéria no universo conceitual dos direitos humanos (...)
A Declaração de Cartagena das Índias, Colômbia, sobre os
Refugiados de 1984, aplicável aos países da América Latina, recomenda que se
proceda a uma definição de Refugiados, de maneira que se incluam as pessoas
que fugiram de seu país, porque “sua vida, sua segurança ou sua liberdade foram
ameaçadas pela violência generalizada, pela agressão estrangeira, pelos conflitos
internos, pela violação maciça dos direitos humanos, ou por outras circunstâncias
que hajam perturbado a ordem pública”, incluídos aí os elementos constantes na
definição da convenção de 51 e do Protocolo de 67.
Nos períodos de 1975 a 1990, ocorrem graves conflitos nos
países da Ásia, África e América Central, surgindo uma grande massa de
refugiados, distribuídos pelo mundo todo. Isso gerou atitudes distintas dos países,
uns adotaram medidas restritivas em relação às pessoas que chegavam em seu
território, enquanto outros demonstravam grande solidariedade em acolher os
refugiados. Estes posicionamentos, estavam interligados à Guerra Fria, pois
dependendo da origem do refugiado e de seu país de origem, poderia ser
interessante acolhê-los ou não.
Devido a estas transições, a ACNUR foi obrigada a modificar
sua ação, expandindo sua área de atuação, devido às crises que ocorriam em
diferentes localidades, ampliaram seu orçamento e o número de funcionários,
ademais, passava a contar com o ajuda de organizações não-governamentais
que começavam a surgir.
37
PIOVESAN, Flávia. O Direito Internacional dos Refugiados: uma perspectiva brasileira. O
28
O cenário internacional pós - Guerra Fria modificou-se
completamente com a queda do Muro de Berlim (1989) e a desintegração da
URSS (1991), proporcionando transformações significantes na esfera econômica,
política e militar, e levando ao ápice de refugiados no mundo inteiro38.
A
partir
deste
momento,
iniciam-se
projetos
de
reassentamento, destacando-se os EUA, Canadá, Austrália e Nova Zelândia, que
definiram
cotas
anuais
para
refugiados,
através
de
programas
de
reassentamento, que será analisado no capítulo seguinte.
2.3 RUDIMENTOS HISTÓRICOS SOBRE O REFÚGIO NO BRASIL
Os registros do refúgio no Brasil, começam com o
recebimento de 19.000 refugiados europeus, deslocados pela Segunda Guerra
Mundial, em 1948, através do decreto 25.796 de 1948 (PAIVA, 2000, p.28)
39
.
Entretanto, acredita-se que o Brasil já recebia em 1930, grande número de
refugiados judeus, tendo chegado a mais de 55.000 em 1940.
Oficialmente, o governo brasileiro não recebeu essas
pessoas na condição de refugiado, mas, a partir do chamamento dos judeus já
residentes, dos que omitiam suas origens verdadeiras às autoridades brasileiras,
aos cônsules e aos embaixadores do Brasil na Europa, muitos deles conseguiram
abrigo neste país em situação, de fato, perfeitamente enquadrada na definição de
refugiado observada na Convenção de 1951.
A
legislação
no
contexto
internacional
foi
adotada
plenamente pelo Brasil, com sua participação ativa na Declaração Universal dos
Direitos Humanos, e com a assinatura, ratificação e promulgação da Convenção
do Estatuto dos Refugiados de 1951 e seu Protocolo de 196740.
Direito de Asilo e a Proteção Internacional dos Refugiados, 2001. p. 59.
38
4 milhões de refugiados, em 1999.
39
PAIVA, Odair da Cruz. Refugiados de Guerra e Imigração para o Brasil nos anos 1940 e
1950 Apontamentos. In Travessia Revista do Imigrante. São Paulo n.37 p.25-30, mai-ago,
2000, p. 28.
40
ARAUJO, Nádia. O Direito Internacional dos Refugiados: uma perspectiva brasileira. A
internalização dos tratados internacionais no Direito Brasileiro, p. 67.
29
Porém, ao ratificar e promulgar a Convenção sobre o
Estatuto dos Refugiados em 1951, o Brasil ainda possuía duas tarefas
importantes para implementar este tratado internacional, das quais eram:
primeiro, promover a elegibilidade dos casos individuais, e segundo, a elaboração
de políticas públicas que visassem à integração local dos refugiados. Para
atender a estes requisitos, promulga-se a Lei 9.474/1997.
A partir desta Lei, o Brasil estabelece critérios para a
concessão do estatuto do refugiado, bem como, um procedimento para sua
elegibilidade, e cria, no âmbito da Administração Pública Federal, o Comitê
Nacional para os Refugiados (CONARE), responsável pela elegibilidade de casos
individuais e pela elaboração de políticas públicas que facilitem a integração local.
No que tange as competências do Comitê, conforme artigo
12 da Lei 9.474/97, Garcia41 manifesta-se:
Das competências do Comitê, duas merecem destaque. Uma diz
respeito aos aspectos legais (análise do pedido e declaração do
reconhecimento); a outra, cuida da orientação e coordenação das
ações necessárias à eficácia da proteção e assistência, bem como
apoio jurídico aos refugiados.
Importante salientar que a atuação do CONARE e a
interpretação da respectiva Lei, devem ocorrer em harmonia com a Convenção de
1951, o Protocolo de 1967 e por fim com a Declaração Universal dos Direitos
Humanos.
A Lei Brasileira é considerada, segundo ALMEIDA42, como
umas das mais avançadas e generosas do continente americano, em relação à
temática do Direito Internacional dos Refugiados, devido à definição ampliada que
concede ao refugiado, conforme seu artigo 1º, inciso III:
41
GARCIA, Márcio Pereira Pinto. O Direito Internacional dos Refugiados: uma perspectiva
brasileira. Refugiado - o dever de solidariedade, 2001. p. 152.
42
ALMEIDA, Guilherme Assis de. O Direito Internacional dos Refugiados: uma perspectiva
brasileira. A Lei 9.474/97 e a definição ampliada de refugiado: breves considerações, 2001.
p. 165.
30
Artigo 1º - Será reconhecido como refugiado todo indivíduo que:
[...]
III – devido à grave e generalizada violação de direitos humanos,
é obrigado a deixar seu país de nacionalidade para buscar refúgio
em outro país.
Na América do Sul, a Argentina não possui previsão legal
ampliada, entretanto aplica ao refugiado, a prática da “elegibilidade”. Já no
Equador, apesar de possuírem previsão legal, o mesmo não se aplica.
Até o ano de 2001, dos 107 casos decididos pelo CONARE,
81 casos foram de acordo com a definição ampliada de refugiado, o que reforça e
demonstra a aplicação desta prática no ordenamento jurídico brasileiro.
Durante os períodos de 1977 a 1994, o Brasil acolheu cerca
de 1.370 refugiados, vindos do Vietnã, Irã e Angola, perseguidos por razões
religiosas e políticas e a partir deste histórico, nosso ordenamento jurídico tenta
aperfeiçoar a matéria sobre a proteção dos refugiados, sendo um marco
importante o dia 26 de maio de 1999, onde o CONARE aprova a resolução nº 06,
que regulamenta a autorização de estada provisória em nosso país ao solicitante
do refúgio, até que seu pedido seja definitivamente julgado, e também autoriza a
emissão de Carteira de Trabalho Provisória, que permite ao solicitante trabalhar,
de forma regular, em território brasileiro. Atitudes essas, que demonstram o grau
de comprometimento do governo brasileiro para com os refugiados.
2.4 DIFERENCIAÇÕES ENTRE O INSTITUTO DO ASILO X INSTITUTO DO
REFÚGIO
Embora o asilo e o refúgio, sejam institutos diferentes, os dois
possuem as mesmas finalidades – a proteção da pessoa humana, e que por fim
se complementam.
A primeira diferenciação importante a ser feita, é que o asilo
seria o “gênero” do qual o refúgio seria a “espécie”.
31
De Plácido e Silva43, destaca que:
Refúgio e asilo possuem significações distintas. Asilo é a proteção
que se busca para se livrar da perseguição de quem tem maior
força; refúgio é o abrigo que se procura para se furtar ao perigo de
que se é ameaçado. No asilo, o asilador ou asilante torna-se
protetor do asilado para defendê-lo e livrá-lo da perseguição. No
refúgio, quem o concede apenas o abriga até que passe ou cesse
o perigo, mas não lhe assegura proteção.
Neste entendimento, foi apresentado um estudo pelo
Ministério Público Português, em processo que tramitou junto ao Tribunal de
Relação de Lisboa, conforme segue:
2. [...] Um primeiro considerando que daqui decorre é a manifesta
e óbvia distinção entre estes dois institutos. Esta separação
decorrente da Lei não teria sentido se os conceitos se
identificassem. Ao fazer referência ao Estatuto de Refugiado,
como corolário do Direito de Asilo, o legislador quis dar expressão
ao reconhecimento do que a respeito do refugiado vêm
consagrado na Convenção de Genebra de 1951 e no Protocolo
Adicional de Nova Iorque, ambos ratificados por Portugal (em
01.10.61 e 13.07.76, respectivamente).
3. Trata-se efetivamente de institutos distintos. Na verdade, se
pode dizer que o estatuto de refugiado, uma vez concedido, vale
“erga omnes”, estatuto que passa a valer internacionalmente, já o
mesmo se não poderá dizer tratando do direito de asilo (ou
candidato a asilo) e o país do acolhimento. Veja-se a este
propósito que, se relativamente ao primeiro instituto existe um
entendimento genérico entre os países, já o mesmo não se pode
dizer quanto ao segundo, pois até hoje não se chegou a um
acordo entre as nações, quanto ao direito de asilo, sua
obrigatoriedade e extensão. Fica a responsabilidade de cada país
a regulamentação deste instituto como bem entender. Já o mesmo
se não dirá tratando-se do refugiado, cujo estatuto demarca bem
os seus atributos, entre os quais se incluem o do bem estar, o
alojamento, assistência pública, educação pública, e ainda o de
continuidade de residência, sem que para tanto se tenha que
confundir com o asilo.
4. Numa apreciação simbólica dir-se-á que se o direito de asilo
implica e envolve “ipso facto” o reconhecimento do estatuto de
refugiado, já a inversa não é forçosamente verdadeira. Isto é,
43
SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995. 4 v.
32
pode existir o estatuto de refugiado (com reconhecimentos dos
correspondentes atributos) sem que ao mesmo corresponda
forçosamente o direito de asilo.
O refúgio é um instituto convencionado mundialmente,
enquanto o asilo representa um instituto convencionado regionalmente, na
América Latina.
Os motivos ensejadores do asilo são mais limitados que os
que concedem o refúgio, pois a qualificação da delinqüência política pertence ao
Estado que concede o Asilo. Outra distinção importante é que para o refúgio
basta haver o temor de perseguição, enquanto para o asilo há a necessidade
perseguição atual e presente, contra uma pessoa.
No refúgio a proteção ocorre fora do país de origem, visto que
normalmente o indivíduo foge de agressões ao seu direito, podendo ocorrer em
casos de ocupação ou dominação estrangeira, ou acontecimentos que alteram
bruscamente a ordem pública interna no seu país de origem, já o asilo, a proteção
pode ocorrer no próprio país ou na embaixada do país de destino (asilo territorial
e asilo diplomático).
Uma diferença fundamental, que pode ser apontada é que o
asilo compreende uma relação de ser humano perseguido e o Estado o
acolhendo. Já o refúgio normalmente decorre de graves transformações na ordem
pública de um país ou região, gerando grande número de contingentes
perseguidos, que têm seus direitos humanos ameaçados, sendo objeto de
preocupação da comunidade internacional.
Ainda no refúgio, existem cláusulas de cessação, perda e
exclusão, conforme a Convenção de 1951, assim como, suas bases legais
prevêem programas de assistência mediante o ACNUR. Porém, o asilo não prevê
em suas convenções, nenhum organismo encarregado do seu cumprimento ou
supervisão e não possuem cláusulas para sua regulamentação.
Quanto à natureza do ato de concessão do refúgio, o mesmo
possui caráter declaratório, visto que a resolução concede refúgio a um
33
peticionário, já o asilo, possui caráter constitutivo, pois depende exclusivamente
da decisão do país, sendo um exercício de um ato soberano próprio dos Estados.
Porém, os dois institutos se identificam em algumas
semelhanças importantes:
- excluem a possibilidade de extradição;
- estão relacionadas com a proteção da pessoa humana sujeita à perseguição e
coincidem com seu caráter humanitário;
- são medidas unilaterais;
- não se sujeitam a reciprocidade;
Desta premissa, advém a necessidade de complementação dos dois institutos.
Piovesan44, entende:
Importa, pois, uma adequada harmonização dos instrumentos de
direitos humanos, já que todos integram o sistema internacional
destinado a proteger e garantir a dignidade e os direitos de todos
os seres humanos, em todas e quaisquer circunstâncias.
Sobre este tema também manifesta-se Gros Espiell45:
Urge como conclusão a necessária complementaridade dos
regimes universais e regionais, para que se alcance a mais ampla
e completa proteção dos direitos humanos. Há também que se
aplicar, para a garantia e salvaguarda de direitos, de forma
específica e apropriada os textos referentes aos refugiados
(Convenção de 1951 e Protocolo de 1967) e ao asilo territorial
(Declaração da ONU de 1967, Convenção de Havana de 1928,
Montevidéu de 1933, Caracas de 1954 e Montevidéu de 1889 e
1940).
44
PIOVESAN, Flávia. O Direito Internacional dos Refugiados: uma perspectiva brasileira. O
Direito de Asilo e a Proteção Internacional dos Refugiados, p. 59.
45
GROS ESPIELL, Hector. El derecho internacional de los refugiados y el artículo 22 de La
Convención Americana sobre Derechos Humanos. 1988, p. 278
34
CAPÍTULO 3
PROTEÇÃO NACIONAL AOS REFUGIADOS
3.1
MOTIVOS
ENSEJADORES
DA
CONCESSÃO
DO
REFÚGIO
NA
LEGISLAÇÃO BRASILEIRA
Para a concessão do refúgio, a legislação brasileira (Lei
9.474/97), baseia-se nas disposições da Convenção de 1951 e no Protocolo de
1967, dando uma redação mais precisa às cláusulas de inclusão de indivíduos
com status de refugiado.
Conforme artigo 1º, da Lei 9.474/97, os requisitos para ser
considerado refugiado, são os seguintes:
Artigo 1º - Será reconhecido como refugiado todo indivíduo que:
I – devido a fundados temores de perseguição por motivos de
raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas
encontra-se fora do seu país de nacionalidade e não possa ou
não queira acolher-se à proteção de tal país;
II – não tendo nacionalidade e estando fora do país onde antes
teve sua residência habitual, não possa ou não queria regressar a
ele, em função das circunstâncias descritas no inciso anterior;
III – devido à grave e generalizada violação de direitos humanos,
é obrigado a deixar seu país de nacionalidade para buscar refúgio
em outro país.
Sendo assim, os requisitos para o reconhecimento dos
refugiados, contidos no artigo 1º, capítulo um, são:
a) A existência de fundados temores de perseguição;
35
b) A perseguição deve ser por motivos de raça, religião,
nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas;
c) O requerente de refúgio deve encontra-se fora de seu
país de origem e,
d) Não deve poder ou querer retornar ao seu país de
origem46.
Analisando o primeiro requisito, que é o fundado temor de
perseguição, verifica-se que o temor, é um estado psicológico, variando de
pessoa para pessoa, mas que deve ser reconhecido como fundado, se o
requerente demonstrar o nexo de causalidade entre o seu temor e as situações
que colocam risco ao livre exercício de seus direitos humanos.
Quanto à raça, essa deve ser entendida por todos os tipos
de grupos culturalmente identificáveis. Em relação à perseguição por motivos de
religião, essa pode originar-se de diversas maneiras, como a proibição de fazer
parte de um grupo religioso, de praticar o culto ou de receber educação religiosa.
Referente à perseguição por motivos de nacionalidade, esta pode ser entendida
como atitudes e medidas divergentes, dirigidas contra uma minoria que possui a
étnica ou lingüística distinta. Sobre a perseguição à grupo social, pode ocorrer por
desconfiança da lealdade do grupo ao governo ou devido às posições políticas,
quando a própria existência do grupo social é considerada um obstáculo à política
do governo.
Em relação a divergências das opiniões políticas, AGUIAR47
entende que o fato de se possuir opiniões políticas diferentes do governo, por si
só, não é motivo para reconhecer alguém como refugiado. Deve haver
perseguição ou o fundado temor que esta se realize.
46
AGUIAR, Renan. O Direito Internacional dos Refugiados: uma perspectiva brasileira. Lei
9.474/97: Cláusulas de Inclusão e Exclusão, 2001. p. 217.
47
AGUIAR, Renan. O Direito Internacional dos Refugiados: uma perspectiva brasileira. Lei
9.474/97: Cláusulas de Inclusão e Exclusão, 2001. p. 200.
36
Analisando o terceiro requisito, quanto ao solicitante do
refúgio estar fora do seu país de origem, pode ser considerado como fora do
território do Estado que originalmente concedeu sua nacionalidade, podendo a
nacionalidade ser comprovada por seu passaporte nacional.
No caso do último e quarto requisito, referente ao solicitante
não querer ou não poder retornar ao seu país, se aplica na existência de uma
impossibilidade física ou jurídica do retorno ao país de onde o requerente é
originário ou então do simples desejo, vontade do requerente de não regressar ao
seu país de origem.
Analisando a cláusula dois, do artigo 1º da Lei 9.474/97,
verifica-se que, para o solicitante do refúgio não ter nacionalidade, o mesmo deve
ser apátrida. Quanto ao requerente considerado apátrida, estar fora do país onde
teve sua residência habitual, parte da idéia de que todos os apátridas possuíram
uma residência, antes de ingressarem no território do país, em que solicitam
refúgio. Porém, diante da inexistência de país anterior, onde havia habitualidade
de se residir, considera-se o apátrida como refugiado, desde que os locais por
onde transitava, ocorriam perseguições.
Com relação à cláusula terceira, a existência de grave e
generalizada violação dos direitos humanos, deve ser avaliada, verificando a
situação do país de origem do requerente, analisando o Estado que comanda a
violação até o país que não consegue proteger seus nativos.
3.2
O
AVANÇO
DAS
BASES
LEGAIS
DE
PROTEÇÃO
NACIONAL:
CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 E A LEI 9.474/97
A Constituição Federal de 1988, em seu Título I, apresenta
os princípios fundamentais, dos quais devem ser regidos em suas relações
internacionais, pela República Federativa do Brasil. Dentre o leque de princípios
existentes no Título I da Constituição, o artigo 4º nas alíneas II e X trazem
37
respectivamente, o princípio da prevalência dos direitos humanos e a concessão
de asilo político48.
Logo após, verifica-se que o artigo 5º da Constituição,
determina, in verbis:
Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros
residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade [...].
Os
princípios
da
prevalência
dos
direitos
humanos,
concessão de asilo político e igualdade, são os fundamentos constitucionais à
proteção dos refugiados. Porém, em relação à Constituição citar apenas o termo
“asilo político”, segundo Barbosa e Hora49, este deve ser entendido de forma
ampla, já que a própria Convenção de 1951 utiliza-se do mesmo termo.
A Convenção de 1951 e o Protocolo de 1967, eram
aplicados no Brasil de forma precária até meados de 1997, por meio de portarias
ministeriais, interministeriais, instruções normativas e de serviço da Polícia
Federal. Entretanto, foi em 22 de julho de 1997 que a Lei 9.474 foi publicada,
definindo critérios avançados e procedimentos de concessão de refúgio, criando
também um setor responsável exclusivamente a tratar deste tema.
Depois da publicação da referida Lei, surgiram os conflitos
de aplicabilidade da norma interna e dos tratados internacionais vigentes sobre os
refugiados. Diante desta questão, Barbosa e Hora (2007, p. 45), se manifestam
afirmando que a Lei 9.474 é norma posterior, especial e tem abrangência maior
que as próprias determinações estabelecidas pela Convenção de 51 e legislação
pertinente.
48
Conforme analisado no capítulo anterior, o instituto do asilo é a proteção que um Estado
concede a um indivíduo que busca refúgio em seu território ou num lugar fora deste.
49
BARBOSA, Luciano Pestana; Hora, José Roberto Sagrado da. A Polícia Federal e a proteção
internacional dos refugiados. 2007 p. 44.
38
A referida legislação também discorre sobre todas as
características da condição de refugiado ou sua exclusão, trata sobre seu
ingresso em território brasileiro, a formalização e a burocracia do pedido de
refúgio, a cessação e a perda da condição de refugiado, sobre a extradição e a
expulsão, sobre repatriação, integração local e reassentamento – chamadas de
“soluções duráveis”.
As
chamadas
“soluções
duráveis”,
proclamadas
pelo
ACNUR, estão previstas em nossa legislação sob três formas:
1 – Repatriação: quando o refugiado retorna ao seu país de
origem, por vontade própria. Porém, é necessário que o país garanta os direitos
econômicos, sociais e culturais da pessoa.
2 – Integração Local: quando o estrangeiro se integra e se
adapta aos costumes da comunidade em que está vivendo. Porém, para que haja
a integração do estrangeiro, é necessário o reconhecimento de diplomas,
certificados e preencher os requisitos para obtenção da condição de residente50
no país ou para ingresso em instituição de ensino.
3 – Reassentamento: quando o refugiado é deslocado para
um terceiro país, devido ao caso de não ser aceito pelo país de destino ou nele
não se adaptar. Possui caráter voluntário, no caso de não adaptação.
No que se refere ao ingresso em território nacional e ao
pedido de refúgio, cabe salientar que dentre os direitos protegidos aos refugiados
e que constitui o princípio de maior importância junto ao sistema de proteção, é o
direito de não ser devolvido51, considerado também um princípio dos Direitos
Humanos, previsto na Convenção de 1951, em seu artigo 33 in verbis:
Artigo 33. Nenhum dos Estados Contratantes expulsará ou
repelirá um refugiado, seja de que maneira for, para as fronteiras
dos territórios onde a sua vida ou a sua liberdade sejam
50
A permanência definitiva no Brasil, é regulamentada pela Resolução Normativa nº 06, de 21 de
agosto de 1997 do Conselho Nacional de Imigração.
51
Também conhecido como princípio do non-refoulement.
39
ameaçadas em virtude de sua raça, religião, nacionalidade,
filiação em certo grupo social ou opinião política.
E esse direito de não – devolução, também está previsto na
Lei 9.474/97 de proteção aos refugiados, conforme segue:
Artigo 7º. O estrangeiro que chegar ao território nacional poderá
expressar sua vontade de solicitar reconhecimento como
refugiado a qualquer autoridade migratória que se encontre na
fronteira, a qual lhe proporcionará as informações necessárias
quanto ao procedimento cabível.
§ 1º Em hipótese alguma será efetuada sua deportação para
fronteira de território em que sua vida ou liberdade esteja
ameaçada, em virtude de raça, religião, nacionalidade, grupo
social ou opinião política. (grifo)
[...]
Artigo 8º. O ingresso irregular no território nacional não constitui
impedimento para o estrangeiro solicitar refúgio às autoridades
competentes. (grifo)
Analisando a legislação nacional, conclui-se que é vedado à
autoridade policial ou agente, de realizar um “juízo de admissibilidade”,
independente de entrada irregular no porto, aeroporto ou fronteira. Essa tarefa é
exclusiva do CONARE.
Neste mesmo entendimento, o Tribunal Regional Federal da
3ª Região52, manifesta-se:
PENAL
E
PROCESSO
PENAL.
HABEAS
CORPUS
PREVENTIVO. ESTRANGEIRO. INGRESSO IRREGULAR NO
PAÍS. PEDIDO DE REFÚGIO. INDEFERIMENTO LININAR DE
HABEAS CORPUS POR AUSÊNCIA DE REQUISITOS DE
PROCEDIBILIDADE. REQUISITOS ATENDIDOS. PROVA PRÉCONSTITUÍDA DA PERSEGUIÇÃO POLÍTICA E RELIGIOSA
PARA FINS DE REFÚGIO É DESPICIENDA “IN CASU”. PROVA
52
Processo nº 2001.61.19.002993-0 – RHC 482 – TRF 3ª Região
40
A SER ANALISADA NO PROCEDIMENTO DE REFÚGIO PELA
AUTORIDADE COMPETENTE. RECURSO PROVIDO.
1. Havendo a indicação genérica de Delegado ou Chefe de Equipe
da Polícia Federal que será responsável pela averiguação do
embarque e desembarque de estrangeiros no Aeroporto, vez que
impossível nominá-los, em razão dos turnos de policiais que
prestam serviço nos Aeroportos, cumprido está o requisito
constante do § 1º, alínea “a”, do artigo 654 do Código de Processo
Penal.
2. O temor de que ao ingressarem no País em situação irregular
pudesse ser a eles aplicado o disposto na Lei nº 6.815/80, sem
que lhe fosse dada a oportunidade de pleitear o benefício
constante da Lei nº 9.474/97, ou seja, o refúgio, demonstra qual o
ato coator que pretendem os pacientes afastar o presente feito.
3. A prova pré-constituída da perseguição política ou religiosa
para fins de refúgio é despicienda neste feito, pois, somente será
analisada no procedimento de refúgio, pela autoridade
competente para tanto.
4. Alegações não comprovadas e alheias ao discutido no presente
feito não devem ser apreciadas, sob pena de decidir-se sobre fato
estranho aos autos.
A Lei 9.474/97, prevê ainda o sigilo, a gratuidade dos
processos de reconhecimento da condição de refugiado, e o caráter urgente que
os mesmos devem receber.
Sobre a legislação nacional e seu avanço, FISCHEL53,
manifesta-se:
A lei brasileira sobre refugiados é um instrumento legal moderno e
oportuno. É coerente e caminha ‘pari passu’ tanto com as práticas
implementadas pelas autoridades nacionais, como com as normas
vigentes em relação aos refugiados nos planos internacional e
regional.
53
ANDRADE, José Henrique Fischel. O Direito Internacional dos Refugiados em Perspectiva
Histórica. p.174.
41
Por fim, observa-se que a legislação brasileira é utilizada
como modelo de harmonização das políticas e instrumentos legais para a
proteção dos refugiados junto à comunidade internacional.
3.3 O COMITÊ NACIONAL PARA OS REFUGIADOS (CONARE)
O CONARE é constituído por um representante dos
seguintes órgãos: Ministério da Justiça, Relações Exteriores, Ministério do
Trabalho, Ministério da Saúde, Ministério da Educação e Desporto, um
representante da Polícia Federal e um representante da CÁRITAS Brasileira54.
Também está presente no Comitê, como membro convidado, o Alto Comissariado
das Nações Unidas (ACNUR), com direito a voz, porém, sem direito a voto.
Esta formação gera uma combinação tripartite: sociedade
civil, governo e organismo internacional.
Para que as reuniões ocorram, é necessário um quorum
mínimo de quatro membros com direito a voto, deliberando por maioria simples
onde, em caso de empate, o voto da Presidência será considerado decisivo.
O CONARE tem por finalidade e competência55:
a) analisar o pedido sobre o reconhecimento da condição de
refugiado;
b) deliberar quanto à cessação “ex officio” ou mediante
requerimento das autoridades competentes, da condição de refugiado;
c) declarar a perda da condição de refugiado56;
54
Organização não – governamental, ligada à Igreja Católica, que se dedica há anos, à
assistência e proteção dos refugiados.
55
Conforme o disposto no artigo 12 da Lei 9.474/97.
56
É de competência do Conare a decisão em primeira instância sobre cessação ou perda da
condição de refugiado, cabendo, dessa decisão, recurso ao Ministro de Estado da Justiça, no
prazo de quinze dias, contados do recebimento da notificação. A notificação conterá breve relato
dos fatos e fundamentos que ensejaram a decisão e cientificará o refugiado do prazo para
interposição do recurso. Não sendo localizado o estrangeiro para a notificação prevista neste
artigo, a decisão será publicada no Diário Oficial da União, para fins de contagem do prazo de
interposição de recurso. A decisão do Ministro de Estado da Justiça é irrecorrível e deverá ser
42
d) orientar e coordenar as ações necessárias à eficácia da
proteção, assistência, integração local e apoio jurídico aos refugiados, com a
participação dos Ministérios e instituições que compõem o Conare; e
e) aprovar
instruções
normativas
que
possibilitem
a
execução da Lei nº 9.474/97.
Devido a sua composição heterogênea, o alcance de sua
competência, e a efetiva implementação de programa de reassentamento, surge a
confiança no trabalho executado por este órgão, o que motivou com que a
ACNUR reabrisse seu escritório em 2004, que havia sido fechado por motivo de
contenção de recursos.
No cumprimento de seu mister, o CONARE juntamente com
o escritório da ACNUR, com a dotação orçamentária própria por parte do Governo
Federal e as novas parcerias com diversas ONG’s para integração de refugiados,
viabilizou o reassentamento de famílias colombianas, aplicando o estabelecido na
Lei 9.474/97, in verbis:
Artigo 46. O reassentamento de refugiados no Brasil se efetuará
de forma planificada e com a participação coordenada dos órgãos
estatais
e, quando possível,
de organizações
nãogovernamentais, identificando áreas de cooperação e de
determinação de responsabilidades.
No caso das famílias colombianas, este reassentamento
ocorreu com uma seleção formada por representantes do CONARE, de
organizações não-governamentais e do escritório do ACNUR no Brasil, que
entrevistaram, em território equatoriano, as famílias interessadas em tentar uma
nova vida no Brasil.
Em 2004, na Cidade do México, foi comemorado o 20º
aniversário da Declaração de Cartagena sobre Refugiados de 1994, do qual
resultou com a elaboração da “Declaração e Plano de Ação do México”, que tinha
notificada ao Conare, que a informará ao estrangeiro e ao Departamento de Polícia Federal,
para as providências cabíveis.
43
como objetivo fortalecer a proteção internacional dos refugiados na América
Latina.
O grande destaque deste encontro, foi a proposta do Governo
brasileiro, na criação de um programa de reassentamento regional para
refugiados latino-americanos, do qual qualquer país da América Latina poderia
associar-se, oferecendo-se para receber refugiados que se encontrem em outros
países da América Latina.
Este programa era marcado pelos princípios de solidariedade
internacional e da responsabilidade compartilhada, ficando conhecido com o
nome de “reassentamento solidário”, reforçando o papel de grande destaque que
o Brasil desempenha no que tange a questão humanitária.
Os testemunhos recentemente transmitidos pela televisão
brasileira, refletem a desolada realidade da vida de milhares de colombianos na
região amazônica brasileira. A maioria são vítimas de conflito armado entre o
exército e as forças irregulares, e estas vítimas fazem parte da população de
interesse da ACNUR Brasil, do CONARE e das ONG’s para proteção dos
refugiados.
Em
entrevista
a
publicação
semestral
da
ACNUR57,
colombiana que precisou fugir e que depende da Igreja Católica para sobreviver,
manifesta-se:
Um dos grupos criou um cemitério clandestino para seus
membros em nossa terra e depois eles assassinaram aos meus
quatro irmãos e não tive outra opção que deixar minha casa com
meus filhos. Depois de alguns dias em Bogotá, fugimos para o
Brasil58. (Tradução Livre)
Durante a crise asiática dos anos 70, o reassentamento se
consolidou como alternativa de proteção para milhares de pessoas do Vietnam,
57
VANDRESE, Luis. Refugiados na América Latina. Revista ACNUR. v. 20. n. 52, 2008.
58
Uno de los grupos créo un cementerio clandestino para sus miembros em nuestra tierra y
después ellos asesinaron a mis cuatro hermanos y no tuve otra opción que dejar mi casa con
mis hijos. Después de algunos días en Bogotá, salimos para Brasil - Texto original.
44
Camboja e Laos, que se lançavam ao mar, fugindo da violência e eram
interceptados em águas internacionais sem um país de asilo que as acolhesse,
ficando conhecidos como boat people. Igualmente quando alcançavam terra,
muitos países não eram signatários da Convenção ou do Protocolo não
permitindo a integração local desses refugiados, transformando o reassentamento
em uma solução para os que não podiam permanecer no mar ou em países onde
havia terra.
Quanto a esta limitação geográfica, no histórico brasileiro,
nosso País recebeu, em caráter excepcional, cerca de 150 refugiados vietnamitas
(boat people). Tendo sido salvo por navios brasileiros, este grupo foi aceito no
País na condição de imigrantes, graças à intervenção do ACNUR.
3.4 ATUAÇÃO DA POLÍCIA FEDERAL
A Carta Magna de 1988, trouxe um novo paradigma no que
tange a aplicação do Direito Internacional com o Direito Interno, do qual é
necessária a observância à respeito dos Princípios e Direitos Fundamentais,
principalmente quanto a dignidade da pessoa humana.
Conforme estabelece o artigo 144, parágrafo 1º, inciso III da
Constituição Federal, a Polícia Federal é um órgão permanente, organizado e
mantido pela União, com a função de exercer com exclusividade em todo o
território brasileiro, os serviços de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras.
Mas, é o Decreto nº 73.332/73, que define a estrutura da Polícia Federal, também
chamada por DPF, estabelecendo em seu primeiro artigo, a competência para
apurar as infrações às normas de ingresso ou permanência de estrangeiros no
País59.
O Estatuto do Estrangeiro60, bem como seu regulamento,
também estabelece como função da Polícia Federal a inspeção da migração,
consistente no controle e fiscalização da entrada, permanência e saída de
estrangeiros no Brasil.
59
Conforme Decreto nº 73.332, de 19 de dezembro de 1973, artigo 1º, inciso I, letra “h”.
45
Considerando a dimensão do território brasileiro, bem como, a
disponibilidade de efetivo humano e infra-estrutura, é bastante difícil o papel da
Polícia Federal em exercer de forma plena e satisfatória a atribuição que lhe cabe.
Entretanto, Barbosa e Hora (2007 – p. 56) entendem que sua competência e
atuação é bastante expressiva, pois o procedimento para o reconhecimento do
status de refugiado inicia-se com a entrada do solicitante no Brasil e o pedido de
refúgio, formalizado através da tomada de suas declarações, perante a autoridade
policial federal, independente de sua condição de entrada e obedecido o princípio
do non-refoulement, nos termos da Lei 9.474:
Artigo 9º. A autoridade a quem for apresentada a solicitação
deverá ouvir o interessado e preparar termo de declaração, que
deverá conter as circunstâncias relativas à entrada no Brasil e as
razões que o fizeram deixar o país de origem.
Para o refugiado, o momento mais sensível e importante é do
seu ingresso em um país estranho, pois, caso seja obrigado a regressar, poderá
correr sérios riscos de perseguição ou colocar sua vida em risco. No caso de
autoridade policial que obrigue o solicitante de refugio a retornar ao país de
origem, o mesmo estará desrespeitando o princípio do non-refoulement, o que
poderá incorrer no crime de abuso de autoridade.
Neste entendimento, o MM. Juiz Federal da 27ª Vara Federal
da Seção Judiciária do Rio de Janeiro, concede em 19/06/1999 Habeas Corpus
para quatro cidadãos chineses, que desembarcaram no Aeroporto Internacional
do Rio de Janeiro em busca de refúgio e encontravam-se a ponto de serem
repatriados:
Em primeiro lugar, a competência para apreciar a pretensão de
refúgio dos pacientes não é nem deste Juízo Federal, nem do
Delegado de Polícia Federal, mas sim do Comitê Nacional para os
Refugiados - CONARE, órgão do Ministério da Justiça, conforme
artigos 11 e 12, da Lei 9.474, de 22.07.97.
60
Decreto nº 86.715, de 10 de dezembro de 1981
46
Por estas razões, os questionamentos acerca da veracidade das
alegações a serem formuladas pelos pacientes, bem como de
suas reais pretensões, não devem ser considerados pelas
autoridades incompetentes para decidir se cabem suas inclusões
na condição de refugiados.
Pela mesma lei, igualmente, resta claro que basta aos pacientes
expressarem sua vontade de solicitar reconhecimento como
refugiado a qualquer autoridade migratória que se encontre na
fronteira, a qual lhe proporcionará as informações necessárias
quanto ao procedimento cabível (art. 7º).
Como evidente tal manifestação não terá que ser no idioma
nacional, podendo ser por terceiro, que o represente, ou por
tradutor.
Tal manifestação, então, para a qual a lei não exige qualquer
formalidade, é que dará ensejo ao termo de declaração de que
tratam os artigos 9º e 10º, da Lei 9.474/97.
Por isso, considero irrelevante a observação de que até a
impetração deste “habeas corpus”, os pacientes nenhuma alusão
teriam feito ao refúgio, até pela dificuldade natural de
comunicação, e incompreensão daqueles quantos aos termos da
lei. Deve a autoridade impetrada buscar entender suas intenções,
sem questionar seu cabimento ou criar objeções formais sem
fundamento legal.
Ressalto, ainda, que a lei, criada no âmbito do Poder Legislativo,
vincula a Administração, que sua aplicação deve buscar, ainda
que não a considere perfeita ou adequada. Ao Poder Judiciário
não é dada a possibilidade de excluir a Administração do
cumprimento da Lei 9.474/97 e Portaria 756, de 05/11/98, que à
mesma se destinam, ainda que recente suas vigências.
Em contrapartida, o ACNUR publicou recomendação61, já
prevendo pedidos de refúgio infundados ou abusivos, porém, é necessário que
medidas políticas a fim de prevenir a imigração legal, sejam aplicadas com
sensibilidade e acompanhadas com garantias processuais, como por exemplo:
requisito de visto e a seleção nos aeroportos. Desta forma, será assegurado que
61
Recomendação EXCOM nº 30 (XXXIV) – 1983.
47
aqueles que necessitem de proteção internacional não sejam impedidos de obtêla, independentemente de onde a solicitação do refúgio seja realizada.
Importante ressaltar que a aplicação do artigo 10 da Lei
9.474/97, também requer bom senso e noção jurídica por parte daquele que irá
decidir o status de refugiado ou não ao solicitante, em face de que a solicitação
de refúgio suspende qualquer procedimento administrativo ou criminal pela
entrada irregular.
Neste entendimento Barbosa e Hora62, manifestam-se:
Primeiro, entendemos que a lei não impede a instauração do
procedimento legal cabível, apenas determinando a sua
suspensão até decisão final do pedido; segundo, porque se aplica
apenas à entrada irregular.
As Superintendências e as Delegacias de Polícia Federal,
também receberam recomendações63, quanto à identificação do solicitante de
refúgio, orientando que o Termo de Declarações deverá se fazer acompanhar das
individuais dactiloscópicas, e, sempre que possível, de fotografias e cópia do
documento de viagem apresentado. Entretanto, tal orientação é cabível para fins
administrativos e não deve ser confundido com a garantia estabelecida no artigo
5º, LVII, da Constituição Federal, in verbis:
Artigo 5º - LVII - o civilmente identificado não será submetido à
identificação criminal, salvo nas hipóteses previstas em lei.
Também é de responsabilidade da Polícia Federal, a emissão
dos documentos do refugiado, desde o momento de sua chegada, mediante
concessão de Protocolo, até a expedição da Carteira de Identidade de
Estrangeiro (CEI), e posteriormente fornecendo-lhe o Passaporte caso seja
concedido o refúgio.
62
BARBOSA, Luciano Pestana; Hora, José Roberto Sagrado da. A Polícia Federal e a proteção
internacional dos refugiados. 2007 p. 59
63
Ofício-Circular nº 002 – GAB/CGPMAF
48
Interessante ressaltar que, enquanto o postulante do refúgio
estiver aguardando a decisão de seu processo, o mesmo terá direito ao Protocolo
Provisório. Este Protocolo também permitirá que o postulante tenha a carteira de
trabalho provisória, expedida pelo Ministério da Justiça.64
Para evitar qualquer discriminação ao refugiado, a Carteira de
Trabalho emitida pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), não utiliza a
nomenclatura “REFUGIADO” na identificação do documento laboral, mas sim,
utiliza-se das expressões “ESTRANGEIRO COM BASE NA LEI Nº 9.474 DE
22/07/1997” para as carteiras definitivas; e “ESTRANGEIRO COM BASE NO
ART. 21, § 1º DA LEI Nº 9.474 DE 22/07/1997”, para as carteiras provisórias.
Caso o refúgio seja concedido, é responsabilidade da Polícia
Federal realizar o registro do refugiado, conforme art. 28 da Lei 9.474/97, in
verbis:
Artigo 28. No caso de decisão positiva, o refugiado será
registrado junto ao Departamento de Polícia Federal, devendo
assinar termo de responsabilidade e solicitar cédula de identidade
pertinente.
Após o registro, a Polícia Federal também deverá emitir a
Carteira de Identidade de Estrangeiro (CEI)65. Este documento segue os mesmos
padrões e características dos documentos emitidos aos demais estrangeiros
registrados no Brasil.
Porém, caso a solicitação de refúgio seja negado, abre-se
prazo de quinze dias para recurso, conforme art. 29 da Lei 9.474/97, in verbis:
Artigo 29. No caso de decisão negativa, esta deverá ser
fundamentada na notificação ao solicitante, cabendo direito de
recurso ao Ministro de Estado da Justiça, no prazo de quinze dias,
contados do recebimento da notificação.
64
Conforme art. 21, § 1º da Lei 9.474/97.
65
Conforme art. 30 da Lei 6.815/80
49
Esgotada a instância recursal, o indivíduo ficará sujeito ao
Estatuto do Estrangeiro, entretanto, sob sua transferência ao país de sua
nacionalidade, Barbosa e Hora66, entendem que:
A transferência para seu país de origem ou de residência habitual,
só ocorrerá depois de cessado as circunstâncias que põem em
risco sua vida, integridade física e liberdade, sendo que compete à
Polícia Federal realizar sua expatriação.
Nas situações que impliquem na perda da condição de
refugiado, como por exemplo a saída do país sem a autorização de autoridades
legais, o DPF tem a atribuição de fiscalizar, verificar a situação e aplicar as
medidas cabíveis.67
Considerando a importância nos procedimentos cabíveis para
a plena aplicação do Estatuto do Refugiado, bem como, o correto treinamento dos
órgãos e instituições que o aplica, o Comitê Executivo do ACNUR, publicou a
Recomendação EXCOM nº 8 (XXVII), que estabelece:
(i) O funcionário competente (por exemplo, funcionário de
imigração ou da polícia de fronteiras) a quem o requerente,
pessoalmente, se dirige na fronteira ou no território de um Estado
contratante, deverá ter instruções claras para lidar com casos que
possam cair no âmbito de instrumentos internacionais relevantes.
Deve ser-lhe exigido que atue de acordo com o princípio de “nonrefoulement” e que submeta esses casos a uma autoridade
superior.
A plena eficácia das proteções sociais dispensadas aos casos
de refúgio, ficam ameaçadas, em face da imigração irregular e clandestina, que
66
BARBOSA, Luciano Pestana; Hora, José Roberto Sagrado da. A Polícia Federal e a proteção
internacional dos refugiados. 2007 p. 60
67
Instrução de Serviço nº 003-DPMAF, de 29 de setembro de 1997, que assim estabelece, in
verbis: Art. 28. Quando do Retorno ao Brasil de estrangeiros residente e registrados, deverá o
agente fiscalizador observar o seguinte:
[...] III - em se tratando de asilado ou de refugiado, a exigência da autorização para saída e o
prazo de ausência, nela previsto, são os mesmos do passaporte para estrangeiros
[...] § 3º. Tratando-se de refugiado, deverá ser permitida a entrada, encaminhando-se
imediatamente o estrangeiro à Chefia de PMAF para que sejam tomadas por termo suas
declarações que serão encaminhadas ao CONARE, para decidir sobre a cessação do refúgio,
nos termos do Artigo 12, II, da Lei 9.474 97.
50
envolve até crimes de tráfico de pessoas e órgãos humanos, contribuindo para
incentivar as atividades irregulares e deteriorar as condições de emprego.
Diante de algumas impossibilidades, não pode ser confundido
aquele que postula à proteção em um novo país, em busca de uma vida melhor,
sem perseguições. Por isso, fica evidente o papel e a atuação do DPF, que
necessita de constante orientação e treinamento para pleno exercício de sua
função, o controle e proteção do refugiado.
3.5 – A ATUAÇÃO DA CÁRITAS
A Cáritas é uma organização internacional sem fins lucrativos,
criada em 1950 pela Igreja Católica. Destaca-se pela atuação em diversos
projetos sociais espalhados por mais de 150 países, defendendo os direitos
humanos, inclusive estabelecendo parcerias com organismos nacionais e
internacionais.
Por ter sua atuação reconhecida, a Cáritas Internacional por
mais de trinta anos, mantém o status de observadora junto ao Conselho
Socioeconômico da ONU e no Brasil, possui um papel fundamental no que diz
respeito à proteção dos refugiados.
No Brasil, a Cáritas surgiu em 1956, e encontra-se atrelada à
Pastoral Social e a CNBB – Conferência Nacional dos Bispos, destacando-se as
Arquidioceses de São Paulo e Rio de Janeiro, no atendimento e acolhida de
refugiados em três linhas de atuação: proteção, assistência e integração local.
Importante lembrar, a atuação do ex-cardeal arcebispo de São Paulo, Dom Paulo
Evaristo Arns, reconhecido pela luta incessante dos direitos humanos e agraciado
com a medalha Nansen, concedida pelo ACNUR as pessoas que lutam pela
proteção dos refugiados.
Quanto à proteção, é considerada ação prioritária, com o
intuito de garantir as liberdades individuais do refugiado, como o direito à vida, à
segurança e à não-expulsão, proporcionando também a supervisão e orientação
jurídica, para que o refúgio ocorra de forma segura.
51
Em relação à assistência, é realizada de forma provisória aos
refugiados que ainda não apresentam condições econômicas e psicológicas que
facilitem sua inclusão no mercado de trabalho brasileiro. Esta assistência
comporta o auxílio moradia, alimentação, saúde e educação.
Sobre a integração local, as Cáritas atuam prestando auxílio
para a revalidação de títulos educacionais, promovendo o acesso à educação,
desde cursos profissionalizantes até bolsas universitárias, com o objetivo de
capacitar o refugiado, torná-lo auto-suficiente e tendo seus direitos respeitados.
MILESI68, contribui sobre a organização da Cáritas brasileira:
No que diz respeito aos Refugiados, a Cáritas brasileira atingiu tal
nível de organização e de especialização que consegue promover
o efetivo fornecimento de habitação, de atendimento médico,
psicológico, jurídico, a inserção do refugiado no mercado de
trabalho e o apoio educacional no sentido de revalidar títulos, ou
mesmo o acesso a cursos profissionalizantes e a aprendizagem
de idiomas. A CÁRITAS tornou-se imprescindível em todo o
procedimento de recepção e de reconhecimento da condição de
refugiado no Brasil.
Neste sentido, PETRUS69 complementa:
Assim, a CÁRITAS realiza entrevistas e fornece ajuda financeira
aos refugiados que chegam a todo o território nacional, através
das CÁRITAS de São Paulo e do Rio de Janeiro, pioneiras no
socorro aos refugiados em nosso país, sendo a passagem por
essas instituições uma etapa quase obrigatória para o regular
processamento do pedido de reconhecimento da condição de
refugiado, por força de um convênio entre o ACNUR, no Brasil, e
as CÁRITAS.
A Cáritas possui parcerias importantíssimas com a sociedade
civil, como entidades de classe, agências internacionais, empresas privadas e
públicas, como a Associação Internacional para o Desenvolvimento - SP
(Assindes), o Serviço Social da Indústria (SESI), o Instituto Migrações e Direitos
68
MILESI, Rosita. Refugiados Realidade e Perspectivas. Brasília: Loyola, 2003, p. 141-142.
69
PETRUS, Maria Regina. Emigrar de Angola e Imigrar no Brasil. Jovens imigrantes
angolanos no Rio de Janeiro: História(s), Trajetórias e Redes Sociais. Dissertação de
Mestrado. Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2001, p. 7-8.
52
Humanos (IMDH); o Centro Scalabriano de Estudos Migratórios (CSEM); a Ordem
dos Advogados do Brasil (OAB), por sua Comissão de Direitos Humanos, bem
como diversas universidades, que se empenham para capacitar os refugiados e
os solicitantes, com cursos de Português, cursos profissionalizados nas áreas de
informática, mecânica, eletrônica e construção civil, além de disponibilizar o
acesso a bibliotecas e à internet.
3.6 A CONCESSÃO DO REFÚGIO AO ITALIANO CÉSARE BATTISTI –
ANÁLISE DO CASO CONCRETO.
Nos últimos tempos, o Brasil acompanhou o caso do italiano
Cesare Battisti, escritor e ex-ativista, que ingressou em 1976 no grupo terrorista
“PAC – Proletários Armados do Comunismo”, grupo que optou pela luta armada
como tática de ataque, oriundo das “Brigadas Vermelhas”.
Acusado pela morte de quatro pessoas: Antonio Santoro,
agente penitenciário; Pierluigi Torregiani, joalheiro; Livio Sabatini, açougueiro; e
Andréa Campagna, policial; Cesare Battisti teve como condenação a prisão
perpétua. Porém, por ser fugitivo, o julgamento dos últimos dois crimes, correu-lhe
à revelia.
Durante
anos
de
fuga,
viveu
em
diversos
países
clandestinamente, até que o Presidente francês François Miterrand, concedeu
asilo político aos militantes que abandonassem a luta armada, negando a
extradição de Cesare à Itália.
Após 14 anos vivendo em Paris, quando o italiano já era um
escritor policial conhecido, a Itália refez o pedido de extradição à França, dessa
vez sendo concedido pelo então Ministro dos Interiores, Nicolas Sarkozy.
Uma vez mais, Cesare se encontrava na situação de fuga,
clandestinidade e perseguição midiática, para ao final, refugiar-se no Brasil, até
ser localizado e preso em 2007, na cidade de Rio de Janeiro.
Em 28 de dezembro de 2008, o CONARE recusa, por maioria
simples, o pedido de refúgio no Brasil, sob o argumento de que não foram
53
apresentadas provas convincentes de que Cesare sofre perseguição política pelo
Estado Italiano70. Entretanto, para surpresa de muitos, em 12 de janeiro de 2009,
a situação do italiano foi revertida, e o Ministro da Justiça, Dr. Tarso Genro,
concedeu o status de refugiado à Cesare Battisti.
O Governo da Itália, que já havia impetrado o pedido de
extradição junto ao Supremo Tribunal Federal desde 2007 - quando ocorreu à
prisão do italiano - criticou a concessão do refúgio à Battisti. Para os euro
deputados, a decisão de Tarso Genro foi uma “amostra de desconfiança” em
relação à União Européia.71
O Presidente da Comissão dos Direitos Humanos e Minorias
da Câmara dos Deputados, Dr. Pompeo de Mattos72 manifesta-se sobre o repúdio
da Itália:
Note-se que nenhum Estado, compreensivelmente, aceita que
pessoas acusadas de crime simplesmente fujam, com isso
livrando-se das conseqüências de seus atos. Essa fuga só se
justifica em países de governo extremamente violento e primitivo,
em que a justiça é uma óbvia farsa. Alguns países da África, sob
regime ditatorial — Idi Amin Dada, por exemplo, em Uganda, ou
Saddam Hussein, no Iraque —, não dispunham de Justiça
confiável, sendo aceitável a justificativa do réu de não comparecer
a julgamento. Seus juízes, apavorados, decidiriam conforme
ordenava o ditador.
O caso de Cesare Battisti, poderia ser mais um caso de
extradição, entre muitos analisados pelo STF, se não fosse o fato de Battisti ter
recebido o status de refugiado político, pois, pela lei a concessão do refúgio
impede a extradição do preso. Desta forma, o caso é considerado complexo não
apenas pela extradição em si, mas também por questões políticas e diplomáticas
entre os dois países.
70
Imprensa
Mídia
Independente.
Disponível
em
http://www.midiaindependente.org/pt/red/2008/12/434699.shtml, acesso em 26 de setembro de
2009.
71
Conjur, portal de notícias jurídicas. Disponível em http://www.conjur.com.br/2009-fev09/governo-italia-reforca-pedido-extradicao-cesare-battisti. acesso em 26 de setembro de 2009.
54
Neste diapasão, uma grande dúvida surge em meio à
comunidade jurídica brasileira: se Battisti deve ou não ser extraditado.
A tese defendida, por aqueles que são favoráveis a extradição
e contra o refúgio concedido, é de que a lei ordinária, como a lei do refúgio73, não
pode retirar a competência do STF de julgar os processos de extradição, prevista
em nossa Constituição Federal de 1988.
Os argumentos utilizados são de que os crimes cometidos por
Cesare Battisti não foram crimes políticos, que a decisão da Justiça italiana foi
democrática, e que ele não correria nenhum risco de ser perseguido politicamente
ao voltar à Itália74.
Sobre os impactos significativos entre o Brasil e a Itália, caso
não seja concedida a extradição de Cesare Battisti, Daniella Buzaid Fleury75,
consultora internacional, manifesta-se:
O Brasil tem Tratado de Extradição com a Itália e quando o
Executivo atropela, literalmente o Judiciário, afeta a tripartição dos
Poderes (teoria de Kelsen, Bobbio e Montesquieu)
[...]
O Direito Internacional é claro, a partir do momento em que temos
um tratado Internacional assinado e ratificado pelo Presidente da
República para inserção no direito interno como o caso em pauta
e, de acordo com a CF devemos cumprir este mandamus para
não termos problemas futuros. Podemos ter graves problemas
com a Itália, no Comércio Internacional com a União Européia,
digo eu, no plano macro, posto que no plano micro tal situação
deve ser regida pelo Pacto de São José da Costa Rica assinado
72
Comissão dos Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados. Disponível em
http://www.direitoshumanos.etc.br/index.php?option=com_content&view=category&layout=blog&i
d=25&Itemid=166, acesso em 26 de setembro 2009.
73
Lei 9.474/94.
74
Jornal Online Estadão. Disponível em http://www.estadao.com.br/especiais/entenda-o-casocesare-battisti,49329.htm, acesso em 26 de setembro de 2009, as 22:40 horas.
75
Jornal
Online
Migalhas.
Disponível
em
http://www.migalhas.com.br/mostra_noticia_leitores.aspx?op=true&cod=92493, acesso em 18 de
outubro de 2.009, as 19:30 horas.
55
pelo Brasil e reconhecido e ratificado pelo nosso Executivo no
nosso ordenamento jurídico interno.
Já os que se posicionam contra a extradição do italiano e a
favor do refúgio, decorrem do entendimento de que passadas três décadas do
contexto da Guerra Fria em que Cesare Battisti atuou no PAC – Proletários
Armados pelo Comunismo, não se justifica mais a intenção de impor ao refugiado
a prisão com possível risco de morte dentro de cárceres italianos, sob o pretexto
de se fazer justiça ou reparação naquele país, até porque Battisti foi a princípio
julgado e condenado por crime de subversão e não de terrorismo ou homicídio. A
acusação posterior de homicídios surge de delação premiada com base na "Lei
dos Arrependidos", pelo depoimento - nunca comprovado - de Pedro Mutti, excompanheiro da organização na qual Battisti militara.
O Professor Celso Antônio Pereira de Mello, citado por vários
ministros no julgamento da extradição de Cesare Battisti76 manifesta-se:
Mesmo deixando de lado, o fato de que a imputação de crimes de
morte contra CESARE BATTISTI, em julgamento à sua revelia,
assentou-se sobre depoimento dos chamados "pentiti", justamente
os que dantes haviam sido condenados por este mesmo fato (que
no julgamento anterior não lhe havia sido irrogado pela Justiça
Italiana), é o rancor atualmente evidentíssimo em diversas
manifestações provenientes de autoridades italianas, o que, não
pode deixar de suscitar "fundados temores de perseguição",
identificados seja pelo ângulo objetivo ou subjetivo.
Aqueles que defendem o refúgio político, argumentam
também que os crimes contra a humanidade, terrorismo e tortura têm sido
julgados pelo Tribunal Penal Internacional e diante disto, justifica-se tal prudência
capitaneada pelo Direito Internacional Público, face aos conflitos políticos e
ideológicos entre as forças internas dos países.
Entendem que o governo brasileiro, ao conceder refúgio
político a Cesare Battisti, atua em plena consonância com nossa Carta Magna,
que veda a extradição motivada por crimes políticos e estatui que, neste país não
76
O julgamento sobre a extradição de Cesare Battisti teve início em 9 de setembro de 2009, e até
a conclusão do presente trabalho, o STF não havia concluído o julgamento.
56
haverá penas de morte ou de caráter perpétuo (art. 5º, XLVII, “a” e “b”). Também
o faz com o respaldo da Legislação Brasileira, clara ao normatizar a extradição,
por meio do Estatuto do Estrangeiro (Lei nº 6.815/80), artigo 77, incisos III e VII, in
verbis:
Artigo 77. Não se concederá a extradição quando:
(...)
III - O Brasil for competente, segundo suas leis, para julgar o crime
imputado ao extraditando;
(...)
VII - o fato constituir crime político.
O pedido do governo italiano – até então sem julgamento final
– de extradição do ex-ativista Cesare Battisti, se caso for atendido pelo STF e
autorizado pelo atual Presidente da República Sr. Luis Inácio Lula da Silva,
Battisti ainda poderá recorrer, pedindo novo refúgio ao CONARE, no entanto,
necessitaria de novos argumentos para convencer os cinco integrantes do
Comitê, porquanto que foi o CONARE que recusou seu primeiro pedido de
refúgio, sob alegação de não haver relação entre a perseguição política que o
italiano alega sofrer e os crimes por ele cometidos.
Em face do reconhecimento do status de refúgio ao italiano
Cesare Battisti, mesmo que em grau recursal, por ato do Ministro da Justiça,
cumpre ao STF não reconhecer do pedido de extradição e extinguir o processo de
Extradição 1.085, sem julgamento de mérito, sob pena de, não o fazendo,
contrariar o Direito Internacional dos Refugiados e fazer com que o Brasil incida
em um ilícito internacional.
O caso em tela, configura-se mais um capítulo que comprova
a necessidade de uma unificação de regras sobre o convívio internacional. O
57
impasse, porém, paradoxalmente, terá algo de bom: forçar os juristas da área
internacional – e os governos, de modo geral -, a encarar de frente a necessidade
uma norma geral que unifique os critérios substanciais relacionados com a
extradição, como por exemplo o tempo de prescrição das penas.
3.7 PERSPECTIVAS DA PROTEÇÃO NACIONAL AOS REFUGIADOS
Na década anterior, a preocupação do governo brasileiro era
com o contingente de migrantes angolanos, que fugiram da guerra civil e se
refugiaram no Brasil, porém, na conjuntura atual, o fluxo maior passou a ser de
famílias colombianas, que se encontravam abrigadas em meio às florestas entre o
Equador e a Colômbia. Estas famílias, que sofrem com graves conflitos entre
guerrilheiros, forças governamentais e paramilitares, já somam mais de duzentos
refugiados, acolhidos pelo programa de reassentamento no Brasil.
Aproximadamente 95% dos refugiados, são provenientes da
África e da Américas Latina, conforme se pode observar no quadro no quadro
abaixo77:
Foi devido a definição ampliada de refugiado, adotada pelo
Brasil com a Lei 9.474, que estes refugiados encontram em nosso país
oportunidade para se estabelecer.
De acordo com Marcolini78:
58
A escolha deste caminho se faz possível em face da sociedade
brasileira ser o resultado de uma combinação de pessoas com
diferentes ascendências nacionais, o que a torna aberta e
tolerante em relação à chegada de refugiados imigrantes em
geral. Ademais, boa parte da elite política de hoje sofreu com o
exílio ou sua ameaça há alguns anos.
O Governo brasileiro firma com o ACNUR em 1999, um
acordo para Reassentamento de Refugiados, melhor denominado como
“Programa de Reassentamento Solidário”, com base nos artigos 45 e 46 da Lei
9.474, tendo como objetivo realocar pessoas que na condição de refugiados
foram assentadas em outros países e continuaram sofrendo perseguições,
ameaças ou a falta de integração no primeiro país de refúgio, por isso, a missão
do Brasil é a integração dos refugiados na sociedade brasileira de forma
paulatina, promovendo a auto-suficiência.
Conforme previsto no acordo, a responsabilidade do ACNUR,
através de agências implementadoras79, é assistir por um prazo inicial e limitado
os refugiados reassentados, auxiliando na moradia, no transporte, no ensino da
língua portuguesa, capacitando-os profissionalmente e propiciando o acesso ao
micro-crédito. Já o papel do Brasil, é recepcionar os refugiados, facilitar a
integração e disponibilizar o seu acesso à saúde, educação e emprego.
Desde 1999 até os dias de hoje, muitos foram os obstáculos
encontrados, principalmente depois do atentado de 11 de setembro em Nova
Iorque, que refletiu em uma instabilidade política gerada com os países de onde
viriam os refugiados, resultando em acordos temporariamente suspensos e
alguns cancelados. Outros motivos também devem ser apontados, como
significativos para o fracasso da operação, como a diferença nos costumes, na
língua, no clima e em geral quanto à adaptação.
77
MRE – Ministérios das Relações Exteriores. Disponível em: <www2.mre.gov.br>, acesso em 16
de setembro de 2.009.
78
MARCOLINI, Adriana. A política brasileira de proteção e de reassentamento dos
refugiados – breves comentários sobre seus principais características. In: Revista
Brasileira de Política Internacional. Vol. 45, nº 1, 2002. p. 172.
79
As agências implementadoras, são as Entidades executoras do projeto de integração dos
refugiados, mantidas pelo aporte de recursos do ACNUR.
59
No entanto, mesmo com estas dificuldades oriundas dos
países receptores e dos próprios migrantes, o ACNUR, a CONARE, a Polícia
Federal e demais parceiros deram prosseguimento ao programa, recebendo mais
de 75 refugiados colombianos no ano de 2007, que foram estabelecidos no Rio
Grande do Sul, Rio Grande do Norte e São Paulo, onde o ACNUR possui
parceiros que cuidam da integração dos reassentados.
Alguns países de reassentamento de refugiados, estipulam
quotas anuais e seus próprios critérios de seleção, como refugiados vítimas de
violência ou tortura, mulheres em perigo, refugiados sem perspectivas de
integração no país do primeiro refúgio e pessoas com necessidades especiais.
Entretanto, o Brasil não adota as quotas anuais pré-determinadas, pelo fato de
que as ações não são financiadas pelo governo, nem por entidades privadas,
como ocorre nos demais países e também não temos um perfil preferencial, pois
chegam casos de refugiados sozinhos e até de mulheres chefes de família.
O resultado positivo logrado pelo Brasil, reforça o acerto no
retorno do Escritório da ACNUR em nosso país, e eleva o Brasil a posição como
um dos 16 Estados a adotarem e praticarem a modalidade de “solução durável”80,
reafirmando o compromisso brasileiro quanto aos direitos humanos e quanto à
proteção dos refugiados.
O reassentamento até ganhou um slogan especial na página
da ACNUR em espanhol - “AMÉRICA LATINA: TIERRA DE ASILO CON
SOLUCIONES INNOVADORAS”81
É evidente que o ACNUR possui a preocupação de ampliar
o número de países com o objetivo de ajudar ao maior número de refugiados; e é
notável as medidas restritivas adotadas pelos países tradicionalmente receptores.
Embora a maior atenção esteja voltada a proteção dos refugiados e de suas
famílias vítimas da violência, não se pode deixar de lado as possibilidades de
80
Conforme dados da ONU, os outros países são: Austrália, Benin, Burkina Faso, Canadá, Chile,
Dinamarca, Finlândia, Islândia, Irlanda, Países Baixos, Noruega, Nova Zelândia, Suécia, Suíça e
os Estados Unidos. Disponível em: <http://www.onu-brasil.org.br/agencias_acnur.php>. Acesso
em 16 de setembro de 2.009.
81
Frase estampada na abertura da página do ACNUR em espanhol. Ver em: www.acnur.org
60
integração nos países receptores. A participação dos refugiados nos programas
do governo (saúde, educação, habitação, crédito, trabalho e renda), são
fundamentais para garantir condições de ter uma integração social e econômica,
para tanto, é necessário a adoção de novas estratégias que visem a expansão de
redes locais de integração, participação e direitos dos refugiados.
61
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Direito Internacional Público, baseia-se na premissa do
respeito mútuo e reciprocidade de tratamento entre os Estados, motivando a
ordem jurídica almejada. Essas relações ocorrem entre dois ou mais Estados,
obrigando-os somente no que concordam de determinado instrumento jurídico.
Tal mecanismo é evidenciado no presente trabalho monográfico, para concluir
que os Estados e também a pessoa humana, possuem personalidade de Direito
Internacional,
podendo
ser
lhe
imputados
sanções
sobre
fatos
ilícitos
internacionais, submetendo-os assim as normas internacionais, relativas aos
direitos fundamentais do homem.
Já o Direito Internacional dos Refugiados possui registros
formais de seu surgimento, bem como, carrega uma história marcada pela
perseguição, rechaço social e demais dificuldades. Este instituto possui raízes no
asilo e no princípio de “non refoulement”, com fundamento nos direitos humanos.
Princípio este que proíbe o envio de estrangeiro de um país para outro que sua
liberdade ou sua vida possam estar em perigo.
A definição de refugiado na legislação brasileira, encontra-se
no art. 1º da Lei 9.474/97, sendo que a universalização da definição do que deve
ser considerado refugiado, é considerado um mérito da legislação brasileira por
muitos doutrinadores, devido a definição ampliada que concede ao refugiado,
abrindo precedentes para que mais pessoas recebam a proteção.
Contudo, pode-se afirmar que esta definição, é fortemente
marcada pela Convenção relativa ao Estatuto dos Refugiados de 1951, acrescida
por sucessivos instrumentos jurídicos como o Protocolo de 1967 e da Declaração
de Cartagena de 1984, visto que ainda observa o princípio da soberania dos
Estados, na medida em que não admite certos órgãos para dirimir conflitos no que
tange a interpretação de normas internacionais; também porque não vislumbra a
parte econômica, social e ambiental como um dos fatos para a concessão de
refúgio; porque exige a perseguição ao indivíduo, como condição de refúgio,
62
quando, sabe-se, somente o abandono do Estado se torna suficiente para deixar
determinado local; e por fim, porque impõe aos países receptores de refugiados a
concessão de direitos, que outros nacionais ou estrangeiros não podem gozar,
mesmo estando em situações semelhantes. Talvez, porque se esperava que os
refugiados fossem em grande maioria europeus e os países receptores deveriam
oferecer condições jurídicas iguais ou melhores que as existentes nos países
europeus.
Quanto ao reconhecimento do status de refugiado ao exativista Senhor Cesare Battisti, a mídia até então, realizou uma cobertura ruidosa
sobre o processo perante o STF: extradição nº 1.085, baseando-se em questões
políticas a favor e contra à concessão do refúgio, considerando aspectos jurídicos
relevantes e a aplicação do Direito Internacional dos Refugiados. Entretanto, a
comunidade jurídica, possui opinião bastante dividida sobre os impactos com a
Itália, caso o resultado da extradição seja negativa. Basta salientar que poderá
sim, desencadear uma crise diplomática, caso a Itália não compreenda os motivos
considerados decisivos por nossa Suprema Corte e pelo Presidente da República.
Infelizmente, no contexto internacional, as perspectivas para
os próximos anos é desanimador no que diz respeito ao refugiado. Mesmo com
todo o esforço do ACNUR e da comunidade internacional, bem como a queda nas
estatísticas, não se vislumbra, a curto ou médio prazo, uma solução para o
problema dos refugiados. Pelo contrário, a crescente evolução do processo de
globalização, intensificou as diferenças entre os ricos e os pobres, agravando a
situação.
A atuação do ACNUR no sentido de desenvolver uma
estratégia
mundial,
afim
de
solucionar
as
dificuldades
oriundas
dos
deslocamentos em massa, mediante a prevenção através da erradicação da
pobreza, investimento na paz, promoção da democracia e dos direitos humanos,
é também distante, para não dizer impossível.
Com efeito, impossível não destacar o impacto negativo dos
ataques terroristas em 11 de setembro de 2.001 no E.U.A, que abalou a
63
solidariedade das nações, estreitando as políticas imigratórias e refletindo
negativamente na precária situação dos refugiados.
Em contrapartida, o Brasil vem em uma feliz contramão da
história, desenvolvendo um trabalho moderno sobre o tema, de forma responsável
e humana, dentro de suas possibilidades. Cabe aqui, as palavras de Dom Hélder
Câmara “o Brasil não é tão rico que nada possa receber, nem tão pobre que nada
tenha a dar”.
Neste contexto, ressalta-se a importância de uma contínua
interação dos órgãos do CONARE, Polícia Federal e Cáritas, responsáveis pelo
processo de reassentamento, reconhecimento, documentação, controle e
proteção do refugiado, para que se mantenha a condição destacada do Brasil, no
cenário mundial.
Importante salientar que o problema de contingente de
refugiados ainda existe, e poderá ser solucionado, havendo a cooperação entre
os países, porém, devido aos interesses muitas vezes divergentes, está
cooperação tão desejada, nem sempre vingará.
Assim, tem-se por encerrada a presente monografia,
valendo ressaltar que as hipóteses apresentadas, restaram comprovadas e
respondidas, uma vez que a preservação do instituto do refúgio, a disseminação
do seu conhecimento no âmbito das sociedades de acolhida, e a prática contínua
da solidariedade, são fatores que contribuem para consolidar os princípios
democráticos que devem reger os povos, principalmente nos dias de hoje onde a
segurança se sobrepõe à dignidade e o direito à vida. Nós brasileiros, somos
responsáveis pela construção e consolidação de uma das mais iluminadas ações
humanitárias da história pátria. Às gerações vindouras, lhes tocará uma tarefa
nada fácil, manter e avançar tão exemplares ações humanitárias.
64
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