INTENSIVO III/ INTENSINVÃO FEDERAL/ FEDERAL PLENO /
AGU/DPU
Disciplina: Direito Previdenciário
Tema: Aula 04
Prof.: André Studart
Data: 26/08/2008
MATERIAL DE APOIO
INDICE
1.Jurisprudência
1.1. Processo: 2006.03.99.009757-2 – TRF 3ªR
1.2. PROCESSO: 2005.61.06.003948-5 – TRF 3ªR
2. Súmulas Correlatas
2.1. SÚMULA 9 da TNU
2.2. SÚMULA 16 da TNU
2.3. Súmula n. 30 da AGU
3. Artigo Correlato: Desaposentação
1.Jurisprudência
1.1. Processo: 2006.03.99.009757-2
ORIGEM: TRF 3ª REGIÃO
Classe: REOAC - REMESSA EX OFFICIO EM APELAÇÃO CÍVEL – 1098018
UF: SP
Órgão Julgador: DÉCIMA TURMA
Data do julgamento: 17/06/2008
Fonte: DJF3 DATA:25/06/2008
Relator: JUIZ SERGIO NASCIMENTO
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO.
DESAPOSENTAÇÃO. POSSIBILIDADE DE RENÚNCIA. DEVOLUÇÃO DE VALORES. PRINCÍPIO
CONSTITUCIONAL DA ISONOMIA. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. I - Da leitura do art. 18, §2º, da
Lei n. 8.213/91, depreende-se que as contribuições vertidas pelo aposentado, em razão do
exercício de atividade remunerada sujeita ao RGPS, não lhe proporcionarão nenhuma vantagem
ou benefício, à exceção do salário-família e a reabilitação profissional. II - As contribuições
vertidas posteriormente à data de início do benefício de aposentadoria por tempo de serviço
proporcional (16.03.1998; fl. 16), consoante atestam os documentos de fls. 25/26, não podem
ser utilizadas para a majoração do coeficiente do salário-de-benefício, posto que, do contrário,
configurar-se-ia reajustamento por via transversa, sem a devida autorização legal. III - É
pacífico o entendimento esposado por nossos Tribunais no sentido de que o direito ao benefício
de aposentadoria possui nítida natureza patrimonial e, por conseguinte, pode ser objeto de
renúncia. IV - Na hipótese acima mencionada, as contribuições vertidas pelo autor poderiam ser
aproveitadas para a concessão de novo benefício de aposentadoria por tempo de serviço com
coeficiente maior, todavia sua situação deve se igualar àquele segurado que continuou
exercendo atividade remunerada sem se aposentar, objetivando um valor maior para sua
aposentadoria. Vale dizer, os proventos percebidos até a concessão do novo benefício devem ser
devolvidos à Previdência Social devidamente atualizados, uma vez que, do contrário, criar-se-ia
odiosa desigualdade com o segurado que decidiu continuar a trabalhar sem se aposentar, com
vistas a obter a aposentadoria integral, em flagrante violação ao princípio constitucional da
isonomia (art. 5º, caput, da Constituição da República). V - Ante a sucumbência recíproca, cada
uma das partes arcará com as despesas que efetuou, inclusive verba honorária de seus
respectivos patronos, nos termos do art. 21 do Código de Processo Civil. VI - Remessa oficial
parcialmente provida.
1.2. PROCESSO: 2005.61.06.003948-5
ORIGEM: TRF 3ª REGIÃO
CLASSE: AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1245661
UF: SP
ÓRGÃO DO JULGADOR: DÉCIMA TURMA
-1–
INTENSIVO III/ INTENSINVÃO FEDERAL/ FEDERAL PLENO /
AGU/DPU
Disciplina: Direito Previdenciário
Tema: Aula 04
Prof.: André Studart
Data: 26/08/2008
DATA DO JULGAMENTO
FONTE: DJF3 DATA:07/05/2008
RELATOR: JUIZ SERGIO NASCIMENTO
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA. RENUNCIA. SEM RECEBIMENTO DE VALORES MENSAIS.
POSSIBILIDADE. PRAZO. ART. 181 DO DECRETO 3.048/99. DECRETO 6.208/2007. I - A
pretensão da parte autora não se confunde com a hipótese de desaposentação combatida pelo
réu, questão ainda controversa no mundo jurídico, pois, no caso em tela, o autor não recebeu
qualquer valor à título de aposentadoria, bem como não efetuou o saque do FGTS. Com efeito, a
autarquia-ré apenas não acolheu administrativamente o pedido de cancelamento do beneficio
por entender ultrapassado o prazo para deferi-lo (comunicado à fl.44). II - Não tendo o
segurado tomado ciência inequívoca do processamento de seu beneficio, não há que se lhe
aplicar o prazo de 30 dias previsto no art. 181 - B do Decreto 3.048/99, na redação dada pelo
Decreto 4.729/2003. Por outro lado, não tendo efetuado qualquer retirada de valores mensais e
saque do FGTS, a pretensão do autor encontra amparo no parágrafo único do mencionado
dispositivo legal. III - Ante as dificuldades operacionais e falhas existentes no envio de
correspondências ao segurado para ciência dos atos administrativos de concessão de
aposentadoria, veio a lume o Decreto 6.208/2007 que alterou o art. 181 do Decreto 3.048/99,
de forma que o simples transcurso de prazo não apresenta óbice ao pedido de cancelamento do
beneficio, ou seja, enquanto não houver retirada dos valores mensais ou FGTS, não se confirma
o ato concessório. IV - O pedido do autor de renuncia à aposentadoria, em que não foi efetuado
saque de qualquer valor mensal ou FGTS, encontra amparo, de forma expressa, na legislação
previdenciária. V - Apelação do réu improvida.
2. Súmulas Correlatas
2.1. SÚMULA 9 da TNU. O uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI), ainda que elimine
a insalubridade, no caso de exposição a ruído, não descaracteriza o tempo de serviço especial
prestado.
2.2. SÚMULA 16 da TNU. A conversão em tempo de serviço comum, do período trabalhado em
condições especiais, somente é possível relativamente à atividade exercida até 28 de maio de
1998 (art. 28 da Lei nº 9.711/98).
2.3. Súmula n. 30 da AGU: "A incapacidade para prover a própria subsistência por meio do
trabalho é suficiente para a caracterização da incapacidade para a vida independente, conforme
estabelecido no art. 203, V, da Constituição Federal, e art. 20, II, da Lei nº 8.742, de 7 de
dezembro de 1993."
3. Artigo correlato: Desaposentação.
Fundamentos jurídicos, posição dos tribunais e análise das propostas legislativas
Fonte: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10741
Autora: Gisele Lemos Kravchychyn
advogada em Santa Catarina e Sergipe, pós-graduada em Direito Previdenciário, sócia da Kravchychyn & Barreto Advogados Associados, Relações públicas da comissão de seguridade social
da OAB/SC
Para que possamos analisar de forma mais aprofundada a desaposentação ou renúncia à aposentadoria, devemos primeiro esclarecer a respeito do instituto da aposentadoria, bem como a
renúncia no direito em geral.
-2–
INTENSIVO III/ INTENSINVÃO FEDERAL/ FEDERAL PLENO /
AGU/DPU
Disciplina: Direito Previdenciário
Tema: Aula 04
Prof.: André Studart
Data: 26/08/2008
1.Do direito à aposentadoria – definições
A aposentadoria é um direito garantido à todo trabalhador pela Constituição Federal:
Art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria
de sua condição social: (...)
XXIV – aposentadoria;
Tal direito é mais uma vez tratado em nossa Carta Magna nos artigos 201 e 202, sendo regulamentado pelas Leis 8.213 e 8.212, ambas de 1991.
Segundo Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari, aposentadoria é:
A prestação por excelência da Previdência Social, juntamente com a pensão por morte.
Ambas substituem, em caráter permanente (ou pelo menos duradouro), os rendimentos do segurado e asseguram sua subsistência e daqueles que dele dependem. [01]
Já Marcelo Tavares considera os benefícios previdenciários, neles incluídos as aposentadorias
como:
Prestações pecuniárias, devidas pelo Regime Geral de Previdência Social aos segurados, destinadas a prover-lhes a subsistência, nas eventualidades que os impossibilite de,
por seu esforço, auferir recursos para isto, ou a reforçar-lhes aos ganhos para enfrentar os encargos de família, ou amparar, em caso de morte ou prisão, os que dele dependiam economicamente. [02]
A aposentadoria é, portanto, um direito social dos trabalhadores, com caráter patrimonial e pecuniário, personalíssimo e individual, com característica de seguro social. Vejamos o comentário
de Celso Barros Leite:
Embora se trate de poupança coletiva, a base está na participação individual. É a união que faz
a força, mas na realidade cada um de nós está cuidando de si mesmo e só depende dos outros
na medida que os outros dependem de nós (...) Falando em termos mais técnicos a previdência é um seguro obrigatório. [03]
As aposentadorias são concedidas mediante o requerimento do segurado [04] / beneficiário do
sistema, ou até de ofício, nos casos de regimes próprios.
A partir desse requerimento o órgão gestor fará a análise do cumprimento dos requisitos necessários para a aposentadoria e se considerar correta a documentação deferirá o requerimento,
emitindo o ato administrativo de concessão do benefício.
Se regularmente concedida, a aposentadoria nasceria com o ato de aposentação e acabaria com
a desaposentação (se considerarmos possível a mesma) ou com a morte do segurado.
Wladimir Novaes Martinez lembra ainda que a Carta Magna assegura o direito de permanecer
prestando serviço, mesmo após a aposentação. [05]
2.A renúncia no Direito brasileiro
A desaposentação consistiria no ato de renúncia à aposentadoria; portanto, consideramos importante o esclarecimento do leitor a respeito do instituto da renúncia do direito brasileiro.
A renúncia é um instituto de natureza eminentemente civil, de direito privado. Apenas direitos
de natureza civil são passíveis de renúncia, ante o caráter pessoal e sobretudo disponível destes, ao contrário dos direitos públicos e aos de ordem pública.
Os direitos de ordem privada têm como interessados e destinatários o indivíduo ou os indivíduos
envolvidos na relação, tendo assim caráter eminentemente pessoal e, portanto, comportariam a
possibilidade de desistência por seus titulares.
A renúncia passa a ser então uma das formas de extinção de direitos, sem que haja, contudo,
transferência do mesmo a outro titular.
Roseval Rodrigues da Cunha Filho conceitua renúncia como:
O abandono ou a desistência do direito que se tem sobre alguma coisa. Nesta razão, a
renúncia importa sempre num abandono ou numa desistência voluntária pela qual o titular
de um direito deixa de usá-lo ou anuncia que não o quer utilizar. [06]
Já Maria Helena Diniz define renúncia como:
Desistência de algum direito. Ato voluntário pelo qual alguém abre mão de alguma coisa
-3–
INTENSIVO III/ INTENSINVÃO FEDERAL/ FEDERAL PLENO /
AGU/DPU
Disciplina: Direito Previdenciário
Tema: Aula 04
Prof.: André Studart
Data: 26/08/2008
ou direito próprio. Perda voluntária de um bem ou direito. [07]
A renúncia típica ou própria constitui-se em ato explícito e voluntário de não exercício ou abandono de um direito sem que se opere a transferência do mesmo a outrem.
Importante destacar a ressalva que alguns doutrinadores fazem com relação à renúncia em favor de outrem. No caso, muitos consideram que a mesma não se configuraria propriamente em
renúncia, mas sim numa transferência de direito, ou até alienação, posto que tal depende do
consentimento do destinatário.
Outro ponto importante trazido pela doutrina é a diferenciação entre o abandono e a renúncia. O
abandono compõe-se do ato de abandonar a coisa e com o evidente propósito de abandonar,
sendo este segundo aspecto de caráter subjetivo.
Em tal ato, o adquirente da coisa não tem relação jurídica com aquele que a abandonou, tratando-se de aquisição originária, como exemplo o usucapião.
Assim, pode-se conceituar renúncia como ato unilateral do agente, consistente no abandono
voluntário de um direito ou de seu exercício; é ato, portanto, que independe da aquiescência de
outrem. [08]
Definimos portanto, no tocante a esse trabalho, que a renúncia é ato de caráter do
possuidor do direito, eminentemente voluntário e unilateral, através do qual alguém
abandona ou abre mão de um direito já incorporado ao seu patrimônio.
Cabe-nos agora analisar se a desistência da aposentadoria seria então uma renúncia ao direito e
se a mesma seria permitida no direito brasileiro. A definição do direito à aposentadoria como
direito público ou privado é ponto marcante na discussão quanto à possibilidade ou não da desaposentação, por isso passaremos ao tópico seguinte.
3.Do direito à desaposentação no sistema previdenciário brasileiro
Como já vimos a aposentadoria constitui direito personalíssimo, sobre o qual não se admite
transação ou transferência a terceiros – o que não significa que a mesma seja um direito indisponível do segurado.
Roberto Luis Luchi Demo explica:
A aposentadoria, a par de ser direito personalíssimo (não admitindo, só por isso, a transação quanto a esse direito, v. g., transferindo a qualidade de aposentado a outrem) é ontologicamente direito disponível, por isso que direito subjetivo e patrimonial decorrente da relação
jurídico-previdenciária. [09]
Assim, entramos na seara do instituto da desaposentação, que seria essa desistência ou renúncia expressa do segurado à aposentadoria já concedida.
De acordo com Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari:
a desaposentação é o direito do segurado ao retorno à atividade remunerada, com o
desfazimento da aposentadoria por vontade do titular, para fins de aproveitamento do
tempo de filiação em contagem para nova aposentadoria, no mesmo ou em outro regime previdenciário. [10]
Na Carta Magna, não há qualquer vedação à desaposentação. Na legislação específica da Previdência Social tampouco existe dispositivo legal proibitivo da renúncia aos direitos previdenciários. Existe apenas um ditame no Decreto regulamentador, o que se pode afirmar inconstitucional, posto que limitando direito quando a lei não o fez. É patente que um decreto, como norma
subsidiária que é, não pode restringir a aquisição de um direito do aposentado, prejudicando-o.
Destacamos, entretanto, que a desaposentação é muito mais fruto da construção doutrinária e
jurisprudencial do que propriamente retirada do texto legal.
O que existe no sistema previdenciário brasileiro é a ausência de norma proibitiva, tanto no tocante a desaposentação quanto no tocante à nova contagem do tempo referente ao período utilizado na aposentadoria renunciada.
No caso, por ausência de expressa proibição legal, subsiste a permissão, posto que a limitação
da liberdade individual deve ser tratada explicitamente, não podendo ser reduzida ou diminuída
por omissão.
-4–
INTENSIVO III/ INTENSINVÃO FEDERAL/ FEDERAL PLENO /
AGU/DPU
Disciplina: Direito Previdenciário
Tema: Aula 04
Prof.: André Studart
Data: 26/08/2008
Alguns princípios basilares do Estado brasileiro também coadunam com o instituto da desaposentação. Vejamos o entendimento de Felipe Epaminondas de Carvalho, que explica que o instituto da desaposentação objetiva "uma melhor aposentadoria do cidadão para que este benefício
previdenciário se aproxime, ao máximo, dos princípios da dignidade da pessoa humana e do
mínimo existencial, refletindo o bem estar social".
Hamilton Antonio Coelho define como desaposentação:
A contagem do tempo de serviço vinculado à antiga aposentadoria para fins de averbação em
outra atividade profissional ou mesmo para dar suporte a uma nova e mais benéfica jubilação. [11]
Devemos ter em mente ainda que a desaposentação não se confunde com a anulação ou revogação do ato administrativo da jubilação, que pode ocorrer por iniciativa do INSS, motivada por
ilegalidade na concessão.
O objetivo principal da Desaposentação é possibilitar a aquisição de benefícios mais
vantajosos no mesmo ou em outro regime previdenciário.
Isso acontece pela continuidade laborativa do segurado aposentado que, em virtude das contribuições vertidas após a aposentação, pretende obter novo beneficio em condições melhores, em
função do novo tempo contributivo.
Não se trata, portanto de tentativa de cumulação de benefícios, mas sim do cancelamento de
uma aposentadoria e o posterior início de outra.
Traduz-se, assim, na possibilidade de o segurado, depois de aposentado, renunciar ao benefício
para postular uma outra aposentadoria futuramente.
Um ponto a se destacar é que existem discordâncias doutrinárias a respeito da possibilidade de
desaposentação para o aproveitamento do tempo em um mesmo regime.
Não obstante o confronto de opiniões, deve-se enfatizar que predomina, notadamente, a concepção mais abrangente, que considera o instituto da desaposentação como cabível tanto na
hipótese em que o aproveitamento do tempo de contribuição se dê no mesmo regime previdenciário, quanto em um outro regime, admitindo assim o referido instituto em ambas as situações.
Marina Vasques Duarte adota tal posicionamento ao explicar que tanto quando se tratar de renúncia dentro do mesmo regime quanto entre regimes distintos não subsiste razão para a diferenciação, já que o órgão de origem deverá compensar sempre o órgão concessor, a teor do que
determina a Lei n.° 9.796/99. [12]
Isabella Borges de Araújo destaca ainda:
Pondere-se que na hipótese de mudança de regime previdenciário, isto é, entre regimes distintos, já existe o instituto da contagem recíproca que possibilita a contagem do tempo
de contribuição em determinado regime com o escopo de implementar os requisitos
legais para a concessão do benefício de aposentadoria em um outro regime previdenciário, ao qual o segurado esteja devidamente vinculado na ocasião do requerimento do benefício.
A contagem recíproca já é garantia constitucional, disposta no art. 201, § 9°, CF/88, e
assim não padece dúvida acerca desta, visto constar de forma expressa no texto constitucional.
[13]
Temos que destacar que, tanto na doutrina quanto na jurisprudência, pacificou-se o entendimento de que a aposentadoria é direito patrimonial disponível. É portanto, passível de renúncia
ou desistência para eventual obtenção de certidão de tempo de serviço/contribuição. Temos inúmeros precedentes, entre eles o julgamento, pelo STJ, do Agravo em recurso especial de nº.
497683, da competência da 5ª Turma, cujo Relator foi o Min. Gilson Dipp.
Achamos oportuno destacar o entendimento adotado pela Turma Recursal de Santa Catarina, no
julgamento do Processo n. 2004.92.95.003417-4, no qual a mesma diferenciou renúncia de desaposentação.
Na renúncia, o segurado abdica de seu benefício e, conseqüentemente, do direito de
utilizar o tempo de serviço que ensejou sua concessão, mas não precisa restituir o que
já recebeu a título de aposentadoria. Ou seja, opera efeitos ex nunc. Na desaposentação,
o segurado também abdica do seu direito ao benefício, mas não do direito ao aprovei-5–
INTENSIVO III/ INTENSINVÃO FEDERAL/ FEDERAL PLENO /
AGU/DPU
Disciplina: Direito Previdenciário
Tema: Aula 04
Prof.: André Studart
Data: 26/08/2008
tamento, em outro benefício, do tempo de serviço que serviu de base para o primeiro.
Para tanto, faz-se necessário o desfazimento do ato de concessão, restituindo-se as
partes, segurado e INSS, ao status quo ante, o que impõe ao segurado a obrigação de
devolver todos os valores que recebeu em razão de sua aposentadoria. Logo, a desaposentação nada mais é do que uma renúncia com efeitos ex tunc. [14]
Nessa decisão, a Turma diferenciou institutos que a doutrina comumente traz como idênticos.
Pelo entendimento adotado no julgamento acima citado, a diferenciação básica seria a devolução de valores e a intenção de utilização do tempo de serviço.
O TRF da 4ª Região já se manifestou sobre a matéria, mas de forma diversa da Turma Recursal,
tendo decidido, em Embargos Infringentes, favorável à desaposentação, nesse caso igualando a
mesma à renúncia da aposentadoria, mas salientando a necessidade de restituição dos valores
recebidos. Vejamos a ementa:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. RENÚNCIA À BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO EM OUTRO
SISTEMA DE PREVIDÊNCIA. NECESSIDADE DE RESTITUIR OS VALORES AUFERIDOS À TITULO
DE APOSENTADORIA. 1. Se o segurado pretende renunciar ao benefício concedido pelo
INSS para postular aposentadoria junto a outro regime de previdência, com a contagem do tempo que serviu para o deferimento daquele benefício, os proventos recebidos da autarquia previdenciária deverão ser restituídos. 2. Embargos Infringentes providos. [15]
O TRF da 3ª Região também considera necessário para o desfazimento da aposentadoria a devolução dos valores. Mas, no caso, não explica se essa devolução seria apenas no caso da utilização do tempo para outra aposentadoria. Segue a decisão:
Administrativo. Previdenciário. Aposentadoria proporcional por tempo de serviço. Desfazimento,
a pedido do próprio beneficiário, do ato de concessão. Possibilidade. Juros de moras, Correção
monetária. Honorários advocatícios.
I – Não mais convindo ao beneficiário a percepção de aposentadoria previdenciária, é
lícito o pleito de sua desaposentação, mediante a conseqüente devolução dos valores
pertinentes ao INSS, ante a inexistência de norma legal expressa em sentido contrário.
II- A cláusula constitucional do direito adquirido, esculpida como um dos direitos e garantias
individuais na forma do art. 5º, XXXVI, da Carta Magna, visa proteger o cidadão das investidas
do Poder Público, municia-o de instrumento para que possa ficar ao abrigo de eventuais medidas
que venham a lhe trazer prejuízos que de outro modo, restariam sem qualquer tutela. Logo, no
caso vertente, não cabe invocá-lo contra o apelado, com o intuito de obrigá-lo a permanecer
aposentado, contra os seus interesses. [16]
Resumimos, portanto, que a desaposentação é possível no direito brasileiro, existindo, entretanto, discordâncias no tocante à necessidade da devolução dos valores recebidos a título de aposentadoria para que o tempo possa ser reutilizado para a concessão de novo jubilamento.
Por isso, alguns julgadores e doutrinadores diferenciam a desaposentação da simples renúncia
da aposentadoria, que seria aquela na qual o aposentado não ressarce os cofres públicos, mas
também não manteria o direito de utilizar o tempo já considerado.
Muitos propõem que, para poder reutilizar esse tempo, o segurado seria obrigado a devolver os
valores recebidos anteriormente.
Entretanto, outro dado deve ser anexado ao estudo: a natureza alimentar das verbas recebidas
a título de aposentadoria. Como já definimos no item 2.1, a aposentadoria se destina a prover a
subsistência do aposentado.
É pacífico o entendimento de que os valores recebidos mensalmente a título de aposentadoria
têm natureza alimentar, ficando portanto, protegidos pelo princípio da irrepetibilidade ou da não
devolução dos alimentos. Tal posicionamento vem sendo adotado pelos tribunais pátrios, entre
eles o STJ. Vejamos:
Uma vez reconhecida a natureza alimentar dos benefícios previdenciários, é inadmissível a pretensão de restituição dos valores pagos aos segurados, em razão do princí-6–
INTENSIVO III/ INTENSINVÃO FEDERAL/ FEDERAL PLENO /
AGU/DPU
Disciplina: Direito Previdenciário
Tema: Aula 04
Prof.: André Studart
Data: 26/08/2008
pio da irrepetibilidade ou da não-devolução dos alimentos. [17]
É indevida a restituição dos valores recebidos a título de conversão da renda mensal do
benefício previdenciário em URV, por se tratar de benefício previdenciário, que tem natureza alimentar. [18]
Inadmissível o pleito de restituição dos valores pagos aos segurados por força da decisão rescindida, em razão do reconhecimento da natureza alimentar dos benefícios previdenciários. Incide, à espécie, o princípio da irrepetibilidade dos alimentos. Precedentes. [19]
A propósito do tema, elucidou o nobre Jurista PONTES DE MIRANDA que "os alimentos recebidos
não se restituem, ainda que o alimentário venha decair da ação na mesma instância ou em grau
de recurso". [20]
Cumpre aqui trazer à baila parte do voto proferido no processo nº 2002.04.01.049702-7/RS TRF da 4ª Região, in verbis:
Em primeiro lugar, deve ser destacada a natureza eminentemente alimentar dos proventos percebidos a título de benefício previdenciário, condição essa que, indiscutivelmente, não pode deixar de ser reconhecida.
Deve ser ressalvado, ainda, o caráter social das prestações pagas pela Autarquia Previdenciária,
notadamente pelo fato de garantirem, conquanto, minimamente, a subsistência dos seus beneficiários, pessoas que, na sua grande maioria, sempre tiveram uma vida de parcos recursos, e
que após o seu jubilamento não experimentaram qualquer melhora financeira, ao contrário, historicamente têm sofrido significativa redução nos seus ganhos.
Assim, a análise da devolução dos valores não é simples, como querem fazer parecer alguns
julgadores. E tampouco estaria atrelada à possibilidade de utilização do tempo com a devolução
dos valores recebidos. Isso porque não se podem considerar indevidos os vencimentos pagos
pelo INSS à época da aposentadoria; tampouco, pelo caráter alimentar, pode ser considerada
válida a vinculação da nova utilização do tempo à devolução das verbas recebidas.
4.Pontos levantados pelo inss e demais opositores à desaposentação e comentários da
autora
A autarquia previdenciária e alguns doutrinadores vêm defendendo a impossibilidade da desaposentação, tendo embasado seu posicionamento em diversos pontos.
Vejamos os mais comuns:
4.1.caráter irrenunciável da aposentadoria
Os opositores da desaposentação defendem o caráter indisponível e irreversível da aposentadoria, conforme disposto no artigo 181-B do Decreto n. 3.048/99. Vejamos os ditames do Decreto:
Art.181-B. As aposentadorias por idade, tempo de contribuição e especial concedidas
pela previdência social, na forma deste Regulamento, são irreversíveis e irrenunciáveis. (Artigo acrescentado pelo Decreto nº 3.265, de 29/11/99)
Parágrafo único. O segurado pode desistir do seu pedido de aposentadoria desde que manifeste
essa intenção e requeira o arquivamento definitivo do pedido antes do recebimento do primeiro
pagamento do benefício, ou de sacar o respectivo Fundo de Garantia do Tempo de Serviço ou
Programa de Integração Social, ou até trinta dias da data do processamento do benefício, prevalecendo o que ocorrer primeiro. Acrescentado pelo Decreto nº 4.729, de 9/06/2003)
Entretanto, é patente que um Decreto, como norma subsidiária que é, não pode restringir a aquisição de um direito do aposentado, prejudicando-o, quando a lei quedou-se omissa. E, no
tocante a admissibilidade da renúncia, a mesma já resta pacificada na jurisprudência pátria.
Não podem prosperar os argumentos de irrenunciabilidade e irreversibilidade da aposentadoria,
que constituem garantias em favor do segurado, quando da pretensão de tolhimento do benefício pelo concessor do mesmo, não cabendo sua utilização em desfavor do aposentado, quando o
mesmo optar pela desaposentação.
4.2.Necessidade de anuência do órgão previdenciário envolvido – administração pública ou INSS
Alguns doutrinadores sustentam sua posição no entendimento que a renúncia não poderia ser
-7–
INTENSIVO III/ INTENSINVÃO FEDERAL/ FEDERAL PLENO /
AGU/DPU
Disciplina: Direito Previdenciário
Tema: Aula 04
Prof.: André Studart
Data: 26/08/2008
configurada como renúncia, posto que depende de requerimento e concordância da Administração (órgão pagador e gestor do benefício), excluindo-se assim a necessária unilateralidade do
instituto.
Destacamos o posicionamento de Lorena de Mello Rezende Colnago:
É de suma relevância lembrar que um fato jurídico ingressa no mundo jurídico através de um
suporte que, geralmente, é uma norma. No caso da aposentadoria, o fato natural: inatividade
remunerada pelos cofres públicos torna-se jurídica e exigível através de um ato administrativo
vinculado: aposentação, que necessita de um agente capaz, de expressa previsão legal, de objeto lícito e moral, além do interesse público.
Assim, para que o fato jurídico aposentadoria seja retirado do ordenamento, pelo princípio da
paridade das formas, necessário se fará um outro ato administrativo vinculado: o ato da desaposentação, com requisitos idênticos à emissão do ato de aposentação, veículo introdutor da
aposentadoria.
Embora haja o interesse do segurado, no caso da desaposentação, não há interesse
público, previsão legal, e, nem mesmo, objeto lícito e mora – face à aferição de vantagem
em detrimento do equilíbrio financeiro dos Regimes de Previdência, ou seja, o enriquecimento
ilícito do segurado. [21]
Nesse tópico, devemos lembrar que, restando pacificado o entendimento da disponibilidade do
direito a aposentadoria, não haveria que se falar na impossibilidade de renúncia. E assim, a anuência do poder ou órgão gestor deveria ser automática. Isso porque, como vimos anteriormente, a aposentadoria, apesar de influir no direito da coletividade (fundo previdenciário do
regime geral, caráter solidário do sistema) é um direito eminentemente pessoal e individual,
sendo intransferível.
Portanto, se adotarmos tal entendimento, a Autarquia poderia apenas criar requisitos para a
anuência da desaposentação, como por exemplo a devolução dos valores, desde que prevista a
necessidade em lei.
Entretanto, não haveria que se falar no interesse público, até porque não nos parece lógico pensar que o interesse público (no caso, da continuidade da aposentadoria) poderia se sobrepor ao
do indivíduo (que seria o da desaposentação).
Não se pode portanto, obrigar alguém a continuar aposentado, da mesma forma que não se
poderia obrigá-lo a continuar trabalhando uma vez implementadas as condições para a concessão de uma aposentadoria.
Por óbvio que, no caso em análise, o direito individual se sobrepõe ao público, ainda que subsistam lado a lado.
4.3.ausência de previsão legal
Também é invocado pelo INSS, bem como pelos opositores da desaposentação, o princípio da
legalidade, de observância obrigatória para a administração pública, nos termos do artigo 37,
caput da CF/88. Sob esse enfoque, a ausência de previsibilidade legal para o procedimento de
desaposentação e suas implicações no sistema de seguridade seria impeditivos da concessão do
requerimento por parte da Autarquia.
No caso, os autores defendem que a Administração Pública estaria impedida de conceder a desaposentação por ausência de previsão legal, mas interpretando de forma oposta aos defensores
da tese.
Ou seja, uns defendem que no tocante ao segurado ela seria possível porque ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei. Já outros defendem que à Administração pública somente é permitido aquilo que a lei prevê. Logo, pela ausência de previsão, não
haveria que se falar em direito a desaposentação. Até porque, assim como a concessão do benefício, a desaposentação também seria um ato vinculado feito pela Autarquia Previdenciária.
Entretanto, para ponderar o defendido pela corrente, devemos novamente analisar na forma
direito individual versus direito coletivo ou da administração pública.
E, no nosso entender, mas uma vez sai vitoriosa a interpretação que a liberdade individual se
sobrepões ao direito da administração.
-8–
INTENSIVO III/ INTENSINVÃO FEDERAL/ FEDERAL PLENO /
AGU/DPU
Disciplina: Direito Previdenciário
Tema: Aula 04
Prof.: André Studart
Data: 26/08/2008
Portanto, a liberdade concedida e garantida constitucionalmente de que ninguém será obrigado
a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei é mais consistente do que o dever da
administração de somente fazer aquilo que a lei permite ou determina.
No caso, até se entende que, interna corporis, seja complicado para a autarquia previdenciária
criar um procedimento para a desaposentação em virtude da ausência da previsão legal – até
pelo que já foi levantado anteriormente no tocante à devolução dos valores, e no caso, da impossibilidade da Autarquia de cobrar, frente ao caráter alimentar da verba. Destacamos também
a impossibilidade do INSS de "abrir mão" desses valores em benefício de um único segurado,
em detrimento da coletividade.
Isso até se admite no âmbito administrativo. Agora, discutir esse enfoque de forma a justificar a
impossibilidade de deferimento, ainda que judicial, nos parece absurda.
4.4.Enriquecimento ilícito do segurado
Tema controverso no tocante a desaposentação é a devolução dos valores recebidos a título da
aposentadoria a que se está renunciando. No caso, existem, mesmo entre os autores que defendem a possibilidade de desaposentação, aqueles que acreditam ser necessária a devolução
dos valores ao erário para que o tempo possa ser contado para nova aposentadoria. O entendimento da jurisprudência muitas vezes tem pendido para tal necessidade, como já vimos anteriormente.
A propósito, há quem diferencie a renúncia simples (no caso, sem o interesse de utilização do
tempo, e portanto, sem a necessidade de devolução dos valores) da desaposentação, que seria
a desistência da aposentadoria com o intuito da utilização do tempo na busca de uma melhor
aposentadoria.
Entretanto, parece mais volumosa a corrente que defende a desnecessidade de devolução de
valores. Nesse caso, os opositores da desaposentação alegam o enriquecimento ilícito do segurado bem como o ferimento ao princípio da isonomia. Vejamos o posicionamento de Lorena de
Mello Rezende Colnago:
É de suma relevância lembrar que um fato jurídico ingressa no mundo jurídico através de um
suporte que, geralmente, é uma norma. No caso da aposentadoria, o fato natural: inatividade
remunerada pelos cofres públicos torna-se jurídica e exigível através de uma ato administrativo
vinculado: aposentação, que necessita de um agente capaz, de expressa previsão legal, de objeto lícito e moral, além do interesse público.
Assim, para que o fato jurídico aposentadoria seja retirado do ordenamento, pelo princípio da
paridade das formas, necessário se fará um outro ato administrativo vinculado: o ato da desaposentação, com requisitos idênticos à emissão do ato de aposentação, veículo introdutor da
aposentadoria.
Embora haja o interesse do segurado, no caso da desaposentação, não há interesse público,
previsão legal, e, nem mesmo, objeto lícito e mora – face à aferição de vantagem em detrimento do equilíbrio financeiro dos Regimes de Previdência, ou seja, o enriquecimento ilícito do
segurado. [22]
Mas, como já vimos, a natureza alimentar das verbas recebidas a título de aposentadoria impossibilitam a devolução das parcelas recebidas.
E, nesse ponto, se não é exigível do segurado a devolução das verbas por seu caráter alimentar,
não haveria que se falar em enriquecimento ilícito. Até porque o recebimento das verbas não foi
indevido ou ilícito, as mesmas restaram "consumidas" e não é exigível do segurado a devolução.
5.das sugestões de modificação legislativa - projeto de lei nº 7.154/2002
O Deputado Inaldo Leitão apresentou em 2002 o Projeto de Lei de nº 7.154, tendo por objetivo
acrescentar o parágrafo único do artigo 54 da Lei 8.213/91, que teria o seguinte teor:
As aposentadorias por tempo de contribuição e especial concedidas pela Previdência Social, na
forma da lei, poderão, a qualquer tempo, ser renunciadas pelo Beneficiário, ficando asseguradas
a contagem de tempo de contribuição que serviu de base para a concessão do benefício.
O projeto foi então modificado pela Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania, tendo sido
-9–
INTENSIVO III/ INTENSINVÃO FEDERAL/ FEDERAL PLENO /
AGU/DPU
Disciplina: Direito Previdenciário
Tema: Aula 04
Prof.: André Studart
Data: 26/08/2008
transferida a modificação para a seção que cuida da contagem de tempo recíproca de tempo de
serviço, mediante a alteração do art. 96, com nova redação a uma dos incisos e acréscimo de
um parágrafo único. Vejamos a redação final do referido projeto:
Art. 96 (...)
III – não será contado por um regime previdenciário o tempo de contribuição utilizado para fins
de aposentadoria concedida por outro, salvo na hipótese de renúncia ao benefício;
(...)
Parágrafo único. Na hipótese de renúncia à aposentadoria devida pelo Regime Geral da Previdência Social, somente será contado o tempo correspondente a sua percepção para fins de obtenção de benefício por outro regime previdenciário, mediante indenização da respectiva contribuição, com os acréscimos previstos no inciso IV do caput deste artigo.
6.críticas a respeito do projeto de lei nº 7.154/2002
No nosso entender, se o projeto for convertido em Lei, vai ao menos trazer a vantagem da previsão legal da desaposentação, ou seja, da possibilidade de renúncia da aposentadoria.
Claro que podemos interpretar o retorno ao trabalho ou à atividade especial como formas de
renúncias tácitas para a aposentadoria por invalidez ou especial, respectivamente. Entretanto,
isso não tem sido o bastante para que o INSS aceite, administrativamente, a desaposentação
nos demais casos.
Logo, uma previsão mais expressa da Lei no tocante a possibilidade de renúncia, por si só, já
seria benéfico para o sistema previdenciário brasileiro. Entretanto, a redação trazida, tanto no
projeto original quanto no projeto modificado, deixa inúmeras duvidas. Vejamos algumas:
No caso do projeto original, a redação prevê apenas a possibilidade de renúncia no caso de aposentados especial e por tempo de serviço. Isso deixa de fora os aposentados por idade. No nosso entender, não existe justificativa jurídica para essa diferenciação. Existiria aí um grave atentado ao princípio da isonomia, constante em nossa CF no art. 5º caput.
Destacamos que, na redação do projeto modificado (7.154-C), tal diferenciação já não resiste. A
possibilidade ali parece estar sendo aplicada a qualquer espécie de aposentadoria do RGPS.
Ao tratarmos ainda do projeto com alterações, ou seja, da modificação transferida para o artigo
96 [23], devemos considerar que a seção [24] em que estará inserida a norma será referente à
contagem recíproca. Assim, pode-se entender que a modificação legislativa diz apenas respeito
às situações em que o aposentado optaria por renunciar a aposentadoria e utilizar o tempo para
outro regime – o que não foi a intenção do projeto, ao menos em seu primeiro momento.
Acredito que esta localização da modificação no artigo 96 acabará por trazer confusões no tocante a possibilidade de desaposentação para utilização de tempo para um mesmo regime, sanando apenas o problema para a utilização em regimes diferenciados.
Outro ponto importante no tocante ao projeto de lei mencionado é a ausência de manifestação
acerca da devolução de valores ao regime do qual esta se renunciando a aposentadoria em
questão.
Tal omissão por certo levará a algumas discussões quando da aplicação da lei. Roseval Rodriges
da Cunha Filho levanta alguns:
Haverá quem argumentará que a inexistência de disposição na Lei pertinente à devolução de alguma importância ao regime concessor da aposentadoria renunciada, inviabilizaria o procedimento de desaposentação, ou mesmo a inconstitucionalidade da
Lei, suscitando princípios constitucionais, tais como o do necessário equilíbrio atuarial, da igualdade e da isonomia.
Também, não poderia o decreto que viesse a regulamentar a lei, a determinação de devolução
de "algo" ao regime concessor da aposentadoria renunciada, pois sem a previsão na lei regulamentada o decreto estaria extrapolando suas finalidades, conquanto estaria indo além da mera
regulamentação da lei, passando à excedê-la, o que constituiria ilegalidade e certamente suscitaria questionamentos neste ponto.
Assim, carece o referido projeto de lei de modificações, para que fixe a necessária devolução de
- 10 –
INTENSIVO III/ INTENSINVÃO FEDERAL/ FEDERAL PLENO /
AGU/DPU
Disciplina: Direito Previdenciário
Tema: Aula 04
Prof.: André Studart
Data: 26/08/2008
alguma importância ao regime do qual se retira o desaposentando, remetendo a instrumentalização de tal devolução, como aliás de todo o procedimento de desaposentação à norma regulamentadora. [25]
Roberto Luiz Luchi Demo sugere nova redação ao parágrafo único a ser inserido ao artigo 54 da
Lei nº 8.213/91. Vejamos a proposta:
Parágrafo único. As aposentadorias por tempo de contribuição e especial concedidas pela Previdência Social, na forma da lei, poderão, a qualquer tempo, ser renunciadas pelo Beneficiário,
ficando condicionada a certificação do tempo de contribuição que serviu de base para concessão
do benefício, ao pagamento de indenização proporcional à compensação previdenciária e ao total recebido a título de aposentadoria, nos termos do regulamento. [26]
Mas, nesse caso, novamente estaríamos criando uma diferenciação ilegal dos aposentados por
idade – e, ainda, erroneamente falando de devolução de verbas de natureza alimentar, o que já
resta pacificado na jurisprudência como indevido.
O projeto carece, portanto, de correção, no sentido de que se defina a questão da devolução de
importância ao regime concessor da aposentadoria renunciada, seja para determinar a devolução integral dos proventos aposentários até então recebidos, seja para afastar expressamente
tal devolução, ou mesmo para dar possibilidade de devolução de valores conforme uma equação
a ser definida e aplicável a cada caso concreto.
Logo, pelo que se apresenta até o momento, a existência de um projeto de lei que busca trazer
ao regime jurídico brasileiro uma solução para o impasse da desaposentação é muito válido.
Entretanto, no nosso entender, o projeto em si carece de enfoque técnico. Da maneira como
está atualmente, a sua inserção no direito brasileiro acabará por aumentar a confusão já existente na matéria.
Assim, importante a existência do projeto legislativo em comento, ao menos buscando a discussão da desaposentação; contudo, o mesmo necessita de ajuste no sentido de que se defina a
questão da devolução de importância ao regime concessor da aposentadoria renunciada.
7.Conclusão
Não restam dúvidas, portanto, quanto ao direito dos beneficiários de renunciarem a suas aposentadorias, fazendo uso do instituto da desaposentação.
Encontra-se fundamento doutrinário, jurisprudencial e legal (permissiva omissiva), além de uma
expectativa de fundamento legal, tudo a respaldar o direito de renuncia à aposentadoria para a
desaposentação e o conseqüente direito de aproveitamento do tempo de serviço que tenha dado
origem ao benefício para efeitos de nova jubilação.
No tocante a permissão legal, a ausência de impedimento expresso, no presente caso, deve ser
interpretado de forma a permitir a desaposentação.
O maior problema para a instrumentalização da desaposentação nos parece a necessidade ou
não de devolução dos valores recebidos a título da aposentadoria que se vai renunciar.
Como o assunto ainda não é pacífico, e a própria jurisprudência difere nos entendimentos sobre
a necessidade ou não da devolução aos cofres públicos, somente uma resolução legislativa poria
fim a discussão. Entretanto, o Projeto de Lei nº 7.154/2002, pelo menos como se encontra até o
momento, não parece trazer solução para esse problema.
Mas, com relação ao equilíbrio financeiro e atuarial do sistema, cabe lembrar a colocação do
Jurista Wladimir Novaes Filho, Procurador do Estado de São Paulo e graduando em atuária:
O aumento no tempo de contribuição e a diminuição da expectativa de vida podem, no caso
concreto, garantir o equilíbrio atuarial do sistema. Isso porque, devemos lembrar que uma aposentadoria concedida mais tarde significará um pagamento por menos tempo, o que acabará se
equilibrando com um aumento de valor do benefício. Sem falarmos nas parcelas vertidas ao regime após a primeira aposentadoria. [27]
Outro ponto importante a ser atentado pelos aposentados é que a legislação previdenciária tem
sofrido inúmeras modificações [28] tanto para o regime geral quanto para o regime próprio, que
acabaram por transformar de forma marcante o cálculo de renda mensal dos benefícios previ- 11 –
INTENSIVO III/ INTENSINVÃO FEDERAL/ FEDERAL PLENO /
AGU/DPU
Disciplina: Direito Previdenciário
Tema: Aula 04
Prof.: André Studart
Data: 26/08/2008
denciários.
Atualmente, nem sempre um benefício com mais tempo de contribuição resultará num valor de
renda mensal maior. Assim, a análise sobre o benéficio da desaposentação deve ser feita caso a
caso, já que ainda que legalmente cabível, pode ser mais vantajoso ao segurado permanecer
aposentado pelas regras anteriores.
Desta forma, ainda que reste comprovado o direito dos aposentados que continuarem contribuindo a optar pela desaposentação visando um aumento de seus benefícios, a análise deve ser
cuidadosa de forma a prever as modificações legais que poderão afetar o valor final desse novo
benefício – principalmente se estivermos considerando a hipótese, ainda não excluída totalmente, da devolução dos valores recebidos a título da aposentadoria renunciada.
bibliografia
ARAUJO, Isabella Borges. Desaposentação no direito brasileiro. Disponível em
http://www.unifacs.br/revistajuridica/edicao_marco2007/discente/dis6.doc.
Bramante, Ivani Contini. Desaposentação e nova aposentadoria. Revista de Previdência Social, ano XXV, nº 244, março 2001.
CARVALHO, Felipe Epaminondas de. Desaposentação: Uma Luz no Fim do Túnel. Disponível:
http//:www.forense.com.br/Artigos/Autor/FelipeCarvalho/ desaposen-tacao.html.
CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário.
7ª Edição. São Paulo: LTR, 2006.
COELHO, Hamilton Antônio. Desaposentação: Um Novo Instituto?. Revista de Previdência
Social, São Paulo: LTR, n.º 228.
COLNAGO, Lorena de Mello Rezende. Desaposentação. Revista de Previdência Social, ano
XXIX, nº 301, dezembro de 2005.
CUNHA FILHO, Roseval Rodrigues da. Desaposentação e Nova Aposentadoria. Revista de
Previdência Social, Ano XXVII, Nº 274, Setembro de 2003.
DEMO, Roberto Luiz Luchi. Aposentadoria. Direito disponível. Desaposentação. Indenização ao sistema previdenciário. Revista de Previdência Social, Ano XXVI, Nº. 263, outubro de
2002.
DINIZ, Maria Helena. Dicionário jurídico. Saraiva, 198.
DUARTE, Marina Vasques. Desaposentação e revisão do benefício no RGPS. In: ROCHA, Daniel
Machado da (Coord.).Temas Atuais de Direito Previdenciário e Assistência Social. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2003.
LEITE, Celso Barroso. A Previdência Social ao alcance de todos. 5ª edição. São Paulo: LTR,
1993.
MARTINEZ, Wladimir Novaes. Curso de Direito Previdenciário. Tomo II: previdência social.
2ª edição. São Paulo: LTR, 2003.
TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito Previdenciário. 4ª edição. Rio de Janeiro: Lúmen Júris,
2002.
Notas
CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 7ª Edição. São Paulo: LTR, 2006. p. 543.
02
TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito Previdenciário. 4ª edição. Rio de Janeiro: Lúmen Júris,
2002. p. 87.
03
LEITE, Celso Barroso. A Previdência Social ao alcance de todos. 5ª edição. São Paulo:
LTR, 1993, p. 14/15.
04
Podem ser concedidas também a requerimento do empregador, em alguns casos específicos.
05
MARTINEZ, Wladimir Novaes. Curso de Direito Previdenciário. Tomo II: previdência social.
2ª edição. São Paulo: LTR, 2003. p. 812.
06
CUNHA FILHO, Roseval Rodrigues da. Desaposentação e Nova Aposentadoria. Revista de
Previdência Social, Ano XXVII, Nº. 274, Setembro de 2003, p.782/783.
01
- 12 –
INTENSIVO III/ INTENSINVÃO FEDERAL/ FEDERAL PLENO /
AGU/DPU
Disciplina: Direito Previdenciário
Tema: Aula 04
Prof.: André Studart
Data: 26/08/2008
07
DINIZ, Maria Helena. Dicionário jurídico. Saraiva, 198, p. 36.
CUNHA FILHO, Roseval Rodrigues da. Desaposentação e Nova Aposentadoria. Revista de
Previdência Social, Ano XXVII, Nº 274, Setembro de 2003, p.782/783.
09
DEMO, Roberto Luiz Luchi. Aposentadoria. Direito disponível. Desaposentação. Indenização ao sistema previdenciário. Revista de Previdência Social, Ano XXVI, Nº. 263, outubro
de 2002, p.887.
10
CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 7ª Edição. São Paulo: LTR, 2006. p. 509.
11
COELHO, Hamilton Antônio. Desaposentação: Um Novo Instituto?. Revista de Previdência
Social, São Paulo: LTR, vol.228, p.1130-1134, nov 1999. p.1130-1134.
12
DUARTE, Marina Vasques. Desaposentação e revisão do benefício no RGPS. In: ROCHA, Daniel
Machado da (Coord.).Temas Atuais de Direito Previdenciário e Assistência Social. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2003, p. 91-92.
13
ARAUJO, Isabella Borges. Desaposentação no direito brasileiro. Disponível em
http://www.unifacs.br/revistajuridica/edicao_marco2007/discente/dis6.doc.
14
Turma Recursal dos Juizados Especiais de Santa Catarina. Proc. 2004.92.95.003417-4, Relator Juiz Ivori Luis da Silva Scheffer, Sessão de 5.8.2004.
15
EIAC nº 1999.04.01.067002-2/RS, 3ª Seção, Rel. Des Fed. Luiz Fernando Wowk Penteado.
DJU de 15.01.2003.
16
TRF-3º Reg.- Ac. 98.03.037653-5/SP-Ap. n. 420.325/SP, Proc. n. 98.03.037653-5- DJU
3.11.98, Rel. Theotônio Costa, in Revista de Previdência Social 219/119.
17
STJ, AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL 697397, Processo: 200401512200 UF: SC
Órgão Julgador: QUINTA TURMA, Data da decisão: 19/04/2005 DJ DATA:16/05/2005 PÁGINA:399.
18
STJ, AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL – 697633, Processo: 200401512008 UF:
SC Órgão Julgador: QUINTA TURMA, Relator (a) FELIX FISCHER. Data da decisão: 07/04/2005,
DJ DATA:16/05/2005 PÁGINA:399.
19
STJ, AGRESP - - 723228, Processo: 200500205672 UF: SC Órgão Julgador: QUINTA TURMA,
Relator (a) GILSON DIPP, Data da decisão: 07/04/2005, DJ DATA:02/05/2005 PÁGINA:414.
20
in Tratado de Direito Privado. Ed. Bookseller. Tomo 9, 200.p.288.
21
COLNAGO, Lorena de Mello Rezende. Desaposentação. Revista de Previdência Social, ano
XXIX, nº 301, dezembro de 2005, p.793.
22
COLNAGO, Lorena de Mello Rezende. Desaposentação. Revista de Previdência Social, ano
XXIX, nº 301, dezembro de 2005, p.793.
23
Art. 96. O tempo de contribuição ou de serviço de que trata esta Seção será contado de acordo com a legislação pertinente, observadas as normas seguintes: I - não será admitida a contagem em dobro ou em outras condições especiais; II - é vedada a contagem de tempo de serviço público com o de atividade privada, quando concomitantes; III - não será contado por um
sistema o tempo de serviço utilizado para concessão de aposentadoria pelo outro; IV - o tempo
de serviço anterior ou posterior à obrigatoriedade de filiação à Previdência Social só será contado mediante indenização da contribuição correspondente ao período respectivo, com acréscimo
de juros moratórios de um por cento ao mês e multa de dez por cento.
24
Seção VII - Da Contagem Recíproca de Tempo de Serviço.
25
CUNHA FILHO, Roseval Rodrigues da. Desaposentação e Nova Aposentadoria. Revista de
Previdência Social, Ano XXVII, Nº 274, Setembro de 2003, p.791/792.
26
DEMO, Roberto Luiz Luchi. Aposentadoria. Direito disponível. Desaposentação. Indenização ao sistema previdenciário. Revista de Previdência Social, Ano XXVI, Nº 263, outubro
de 2002, p.889/890.
27
Palestra concedida no 26º Congresso Brasileiro de Previdência Social, 6º painel, dia 27/06/07,
Tema Desaposentação.
28
Citamos as mais importantes: Emenda constitucional nº 20, Emenda constitucional nº 41,
Emenda constitucional nº 47, Lei 9.876/99.
08
- 13 –
INTENSIVO III/ INTENSINVÃO FEDERAL/ FEDERAL PLENO /
AGU/DPU
Disciplina: Direito Previdenciário
Tema: Aula 04
Prof.: André Studart
Data: 26/08/2008
- 14 –
Download

Direito Previdenciário Tema: Aula 04 Prof.: André Stu