O CORTIÇO
NATURALISMO
Movimento artístico e cultural que se desenvolveu na segunda metade do século
XIX; a característica principal foi a abordagem de temas sociais e um tratamento
objetivo da realidade do ser humano.
São características gerais:
* o cientificismo
* a valorização do objeto
* o sóbrio e o minucioso
* a expressão da realidade e dos aspectos descritivos
* o personalismo cede terreno ao universalismo
* o materialismo leva à negação do sentimentalismo
* determinismo
Aluísio de Azevedo, autor de O cortiço.
Romance Naturalista
Sua narrativa é marcada pela análise social a partir dos grupos humanos
marginalizados, valorizando o coletivo. A influência de Darwin é marcante na
máxima naturalista segundo a qual o homem é um animal, deixando-se levar pelos
instintos naturais, que não podem ser reprimidos pela moral da classe dominante. A
constante repressão leva às taras patológicas, bem ao gosto dos naturalistas; esses
romances são mais ousados, apresentando descrições minuciosas de atos sexuais,
tocando até em temas como o homossexualismo. Foi cultivado no Brasil por Aluísio
de Azevedo e Júlio Ribeiro. Existem várias semelhanças entre o romance realista e o
naturalista, podendo-se até mesmo afirmar que ambos partem de um ponto comum
para chegarem a mesma conclusão, sendo que percorrendo caminhos distintos.
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NARRADOR
A obra é narrada em terceira pessoa, com narrador onisciente (que tem
conhecimento de tudo), como propunha o movimento naturalista. O
narrador tem poder total na estrutura do romance: entra no pensamento
dos personagens, faz julgamentos e tenta comprovar, como se fosse um
cientista, as influências do meio, da raça e do momento histórico.
O foco da narração, a princípio, mantém uma aparência de imparcialidade,
como se o narrador se apartasse, à semelhança de um deus, do mundo
por ele criado. No entanto, isso é ilusório, porque o procedimento de
representar a realidade de forma objetiva já configura uma posição
ideologicamente tendenciosa.
TEMPO
Em O Cortiço, o tempo é trabalhado de maneira linear, com princípio, meio
e desfecho da narrativa. A história se desenrola no Brasil do século XIX,
sem precisão de datas. Há, no entanto, que ressaltar a relação do tempo
com o desenvolvimento do cortiço e com o enriquecimento de João
Romão.
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ESPAÇO
São dois os espaços explorados na obra. O primeiro é o
cortiço, amontoado de casebres mal-arranjados, onde os
pobres vivem. Esse espaço representa a mistura de raças e
a promiscuidade das classes baixas. Funciona como um
organismo vivo. Junto ao cortiço estão a pedreira e a
taverna do português João Romão.
O segundo espaço, que fica ao lado do cortiço, é o sobrado
aristocratizante do comerciante Miranda e de sua família. O
sobrado representa a burguesia ascendente do século XIX.
Esses espaços fictícios são enquadrados no cenário do
bairro de Botafogo, explorando a exuberante natureza local
como meio determinante. Dessa maneira, o sol abrasador
do litoral americano funciona como elemento corruptor do
homem local.
PERSONAGENS: Os personagens da obra são psicologicamente superficiais – são
desenvolvidos apenas como TIPOS sociais.
JOÃO ROMÃO – taverneiro português, dono da pedreira e do cortiço; representa o
capitalista explorador e, ao final, a hipocrisia social.
BERTOLEZA – quitandeira, escrava “amasiada” com João Romão, para quem ela
trabalha como uma máquina.
MIRANDA – comerciante português. Principal opositor de João Romão; mora num
sobrado aburguesado, ao lado do cortiço.
ESTELA – mulher de Miranda, trai o marido com caixeiros e com Henrique.
ZULMIRA – filha de Miranda e Estela, pretendente de João Romão.
JERÔNIMO – português “cavouqueiro”, trabalhador da pedreira de João Romão,
representa a disciplina do trabalho, num primeiro momento, e a preguiça.
RITA BAIANA – mulata sensual e provocante que promove os pagodes no cortiço; é
uma representação da mulher que age por instinto, usa seu corpo.
PIEDADE – portuguesa que é casada com Jerônimo, briga com Rita Baiana; representa
a mulher européia; ao final, é abandonada e começa a beber.
CAPOEIRA FIRMO – mulato e companheiro que se envolve com Rita Baiana; é
morto por Jerônimo.
POMBINHA – moça loura, pura e íntegra, “a flor do cortiço”; é corrompida ao
conhecer Léonie.
LÉONIE – prostituta “refinada”, inicia sexualmente Pombinha após um almoço em
sua casa.
D. ISABEL – mãe de Pombinha, acaba numa casa de saúde após a filha “perder-se na
vida”.
JOÃO DA COSTA – noivo de Pombinha.
LEANDRA, A “MACHONA” – lavadeira gritona, corpulenta, cujos filhos não se
parecem com o pai.
OUTRAS PERSONAGENS: Paula, a “bruxa” (tenta incendiar o cortiço duas vezes);
Augusta e Alexandre; Bruno e Leocádia (ele é ferreiro, ela o trai – ao final se
reconciliam); Albino (mora no cortiço, é lavadeiro e homossexual); Juju (afilhada de
Léonie).
Enredos...
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O Cortiço (1890), expressão máxima do Naturalismo Brasileiro, apresenta
como personagem principal João Romão, português que pode ser
encarado como metáfora do capitalismo selvagem, pois tem como principal
objetivo na vida enriquecer a qualquer custo. Ambicioso ao extremo, não
mede esforços, sacrificando até a si mesmo. Veste-se mal. Dorme no
mesmo balcão em que trabalha. Das verduras de sua horta, come as
piores: o resto vende.
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Mas sua ascensão não se vai basear apenas na autoflagelação. Explora
descaradamente o próximo. O vinho que vende aos seus clientes é diluído
em água (fica aqui nas entrelinhas a idéia de que o brasileiro está
destinado a ser explorado pelo estrangeiro). Mas o mais sintomático de seu
caráter está na sua relação com Bertoleza.
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Era essa uma escrava que ganhava a vida vendendo peixe frito diante da
venda de João Romão. Os dois tornam-se amantes. O protagonista
aproveita as economias dela e, mentindo que havia comprado a sua carta
de alforria, investe em seus próprios negócios, construindo três casinhas,
imediatamente alugadas.
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Aluísio Azevedo tem deficiências no trato de personagens,
tornando-as psicologicamente pobres, o que pode ser desculpável,
pois o Naturalismo tem uma predileção por tipos. Essa
característica vem a calhar a um autor que se notabilizara como
caricaturista.
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De fato, os moradores do cortiço vão formar uma galeria de tipos
extremamente rica, colorida, autorizando-nos a dizer que essa
coletividade é que se torna a melhor personagem da obra. A
moradia coletiva comporta-se como um só personagem, um ser
vivo.
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Nesse lugar, encontramos inúmeras figuras, cada uma
representando um mergulho nas diferentes taras (o enfoque das
patologias sexuais, apresentando o homem com um prisioneiro
dos instintos carnais – bem longe da imagem idealizada de
racionalidade e nobreza – é uma das predileções do Naturalismo)
e facetas da decadência humana.
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Há vários exemplos, como Neném, adolescente negra de libido
explosiva que acaba perdendo a virgindade nas mãos de um
empregado de João Romão. Cai na vida. Existe também Albino, de
tendências homossexuais, ou então Machona, de pulso firme,
tanto denotativa quanto conotativamente.
Botelho, homem corroído pelas hemorróidas (a menção a esse
detalhe, degradante, é típica do Naturalismo) e pelo pior tipo de
materialismo – o alimentado pela cobiça de quem não tem nada.
Pombinha, moça afilhada da prostituta Léonie, que é responsável
também por sua iniciação sexual. A menina é noiva de João da
Costa. Seu casamento seria a garantia de saída daquela moradia
pobre. Mas sua mãe tinha escrúpulos que adiavam o casamento:
enquanto a filha não se tornasse mulher – ou seja, tivesse sua
primeira menstruação – não podia casar-se.
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No entanto, a menarca estava por demais atrasada, o que se
transformava num drama acompanhado pelos moradores do cortiço, que a
tratavam como a flor mais preciosa (é também típica do Naturalismo essa
força que os aspectos biológicos exercem sobre o caráter da personagem.
Enquanto não tem sua primeira menstruação, é menina pura.
Tanto que, uma das poucas alfabetizadas e dotadas de tempo ocioso,
dedica-se a ler e a escrever as cartas dos diversos moradores do cortiço,
entrando em contato com a podridão das paixões humanas. Mas isso não
macula sua inocência até o momento em que, mulher – ou seja, já capaz
de menstruar e, portanto, cumprir seu papel biológico de reprodução –,
adquire maturidade para entender o que se passa entre aquela multidão
de machos e de fêmeas.
Com nojo de tudo o que via, desencanta-se). No fim, vira lésbica e cai na
vida, principalmente por influência de sua iniciadora, Léonie (outra leitura
interessante que se pode fazer em O Cortiço é captar o destino a que é
submetida a mulher. Ou se torna objeto do homem, ou sabe seduzir, de
objeto tornando-se sujeito, ou despreza-o totalmente. Qualquer uma
dessas posições é, na óptica da obra, degradante).
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Miranda, dono do sobrado ao lado do cortiço, não se dá com João
Romão, nem vê com bons olhos o cortiço perto de sua casa. No
cortiço moram os mais variados tipos: brancos, pretos, mulatos,
lavadeiras, malandros, assassinos, vadios, benzedeiras etc.
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Entre outros: a Machona, lavadeira gritalhona, - cujos filhos não
se pareciam uns com os outros; Alexandre, mulato pernóstico;
Pombinha, moça franzina que se desencaminha por influência das
más companhias; Rita Baiana, mulata faceira que andava amigada
na ocasião com Firmo, malandro valentão; Jerônimo e sua mulher,
e outros mais.
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João Romão tem agora uma pedreira que lhe dá muito dinheiro.
No cortiço há festas com certa freqüência, destacando-se nelas
Rita Baiana como dançarina provocante e sensual, o que faz
Jerônimo perder a cabeça. Enciumado, Firmo acaba brigando com
Jerônimo e, hábil na capoeira, abre a barriga do rival com a
navalha e foge. Naquela mesma rua, outro cortiço se forma.
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Firmo passara a morar no - Cabeça-de-Gato, onde se torna
chefe dos malandros. Jerônimo, que havia sido internado
em um hospital após a briga com Firmo, arma uma
emboscada traiçoeira para o malandro e o mata a pauladas,
fugindo em seguida com Rita Baiana, abandonando a
mulher.
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Querendo vingar a morte de Firmo, os moradores do Cabeça-de-gato travam séria briga com os - Carapicus. Um
incêndio, porém, em vários barracos do cortiço de João
Romão põe fim à briga coletiva. O português, agora
endinheirado, reconstrói o cortiço, dando-lhe nova feição e
pretende realizar um objetivo que há tempos vinha
alimentando: casar-se com uma mulher - de fina educação,
legitimamente. Lança os olhos em Zulmira, filha do
Miranda.
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Botelho, um velho parasita que reside com a família do
Miranda e de grande influência junto deste, aplaina o
caminho para João Romão, mediante o pagamento de vinte
contos de réis. E em breve os dois patrícios, por interesse,
se tornam amigos e o casamento é coisa certa.
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Só há uma dificuldade: Bertoleza. João Romão arranja um
plano para livrar- se dela: manda um aviso aos antigos
proprietários da escrava, denunciando-lhe o paradeiro.
Pouco tempo depois, surge a polícia na casa de João Romão
para levar Bertoleza aos seus antigos senhores. A escrava,
compreende o destino que lhe estava reservado, suicida-se,
cortando o ventre com a mesma faca com que estava
limpando o peixe para a refeição de João Romão.
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FIM
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