www.profasoninha.weebly.com
“ E naquela terra encharcada e fumegante, naquela
umidade quente e lodosa, começou a minhocar, a
esfervilhar, a crescer, um mundo, uma coisa viva, uma
geração, que parecia brotar espontânea, ali mesmo,
daquele lameiro, e multiplicar-se como larvas no
esterco.” (...)
Cortiço:
João Romão e Bertoleza
Rita Baiana e Firmo
Jerônimo e D. Piedade
Pombinha e D. Isabel
Léoni
João da Costa
Bruno e Leocádia
Albino
Machona
Augusta Carne Mole
Senhorinha
Sobrado:
Miranda e Estela
Zulmirinha
Henrique
Botelho
Ano de publicação 1890
Gênero:
Romance experimental ou Romance de
tese⇒ pesquisa + criação literária ⇒ protesto
e crítica social
Romance de espaço/massas ⇒ cenas
coletivas: pátio das lavadeiras, casa
de pasto, domingos de pagode e samba, lutas
entre os dois cortiços e contra a polícia
Corrente/estilo: Naturalismo
Naturalismo ⇒ darwinismo, determinismo:
* Fixação nos aspectos patológicos/”doentios”
do ser humano [sexualidade exagerada,
homossexualismo]
* Antropomorfismo (cortiço), zoomorfismo
(animalização), fitomorfismo (personagens
⇒ equiparação a animais e vegetais)
Foco narrativo ⇒ 3ª- pessoa –
Narrador onisciente/observador:
olhar panorâmico, perspectiva do
alto;
Estrutura linear: princípio, meio,
clímax e desfecho (irônico – João
Romão “abolicionista”);
Tempo: décadas finais do II
Reinado, período da imigração
estrangeira, transformação do Rio
de Janeiro (modernização)
Espaço: Microcosmo de uma
sociedade:
Cortiço – Horizontal: (povo –
coletivo - pobreza)
Sobrado – Vertical (burguesia
– individual - riqueza);
Atenção: os espaços físicos
(sobrado X cortiço)
são diferentes, mas a miséria
moral/vícios são os mesmos – a
diferença é apenas na classe
social/físico;
Temática
* Denúncia do código social vigente
⇒ crítica ao capitalismo brutal
* Herança negativa da colonização
portuguesa ⇒ estrutura social
perversa
* João Romão: ascensão social ⇒
enriquecimento criminoso/arrivismo
* Homem lobo do homem ⇒
superexploração do trabalho,
fervilhamento dos instintos ⇒ ser
humano animalizado
Trechos:
“Eram cinco horas da manhã e o cortiço acordava, abrindo, não os
olhos, mas a sua infinidade de portas e janelas alinhadas.
Um acordar alegre e farto de quem dormiu de uma assentada sete
horas de chumbo. “ (...)
“A roupa lavada, que ficara de véspera nos coradouros, umedecia o ar
e punha-lhe um farto acre de sabão ordinário. As pedras do chão,
esbranquiçadas no lugar da lavagem e em alguns pontos azuladas
pelo anil, mostravam uma palidez grisalha e triste, feita de
acumulações de espumas secas.
Entretanto, das portas surgiam cabeças congestionadas de sono;
ouviam-se amplos bocejos, fortes como o marulhar das ondas;
pigarreava-se grosso por toda a parte; começavam as xícaras a
tilintar; o cheiro quente do café aquecia, suplantando todos os
outros”. (...)
“Daí a pouco, em volta das bicas era um zunzum crescente; uma aglomeração
tumultuosa de machos e fêmeas. “ (...)
“Sentia-se naquela fermentação sangüínea, naquela gula viçosa de plantas
rasteiras que mergulham os pés vigorosos na lama preta e nutriente da vida, o
prazer animal de existir, a triunfante satisfação de respirar sobre a terra.” (...)
“ Uma transformação, lenta e profunda, operava-se nele, dia a dia, hora a hora,
reviscerando-lhe o corpo e alando-lhe os sentidos, num trabalho misterioso e
surdo de crisálida. A sua energia afrouxava lentamente: fazia-se contemplativo e
amoroso. A vida americana e a natureza do Brasil patenteavam-lhe agora
aspectos imprevistos e sedutores que o comoviam; esquecia-se dos seus
primitivos sonhos de ambição; para idealizar felicidades novas, picantes e
violentas; tornava-se liberal, imprevidente e franco, mais amigo de gastar que de
guardar; adquiria desejos, tomava gosto aos prazeres, e volvia-se preguiçoso
resignando-se, vencido, às imposições do sol e do calor, muralha de fogo com
que o espírito eternamente revoltado do último tamóio entrincheirou a pátria
contra os conquistadores aventureiros. E assim, pouco a pouco, se foram
reformando todos os seus hábitos singelos de aldeão português: e Jerônimo
abrasileirou-se.
“Pombinha arfava, relutando; mas o
atrito daquelas duas grossas pomas
irrequietas sobre seu mesquinho
peito de donzela impúbere e o roçar
vertiginoso
daqueles
cabelos
ásperos e crespos nas estações mais
sensitivas da sua feminilidade,
acabaram por foguear-lhe a pólvora
do sangue, desertando-lhe a razão
ao rebate dos sentidos.
Agora,
espolinhava-se
toda,
cerrando os dentes, fremindo-lhe a
carne em crispações de espasmo; ao
passo que a outra, por cima, doida
de
luxúria,
irracional,
feroz,
revoluteava, em corcovos de égua,
bufando e relinchando.”
E Leocádia olhou para os lados, assegurando-se de que estavam a sós. Henrique, sem largar o
coelho, atirou-se
sobre ela, que o conteve:
— Espera! preciso tirar a saia; está encharcada!
— Não faz mal! segredou ele, impaciente no seu desejo.
— Pode-me vir um corrimento!
E sacou fora a saia de lã grossa, deixando ver duas pernas, que a camisa a custo só cobria até o
joelho, grossas,
maciças, de uma brancura levemente rósea e toda marcada de mordeduras de pulgas e
mosquitos.
— Avia-te! Anda! apressou ela, lançando-se de costas ao chão e arregaçando a fralda até a
cintura; as coxas abertas.
O estudante atirou-se, sôfrego, sentindo-lhe a frescura da sua carne de lavadeira, mas sem
largar as pernas do coelho.
Passou-se um instante de silêncio entre os dois, em que as folhas secas do chão rangeram e
farfalharam.
— Olha! pediu ela, faz-me um filho, que eu preciso alugar-me de ama-de-leite... Agora estão
pagando muito bem as amas! A Augusta Carne-Mole, nesta última barriga, tomou conta de um
pequeno ai na casa de uma família de tratamento, que lhe dava setenta mil-réis por mês!... E
muito bom passadio!... Sua garrafa de vinho todos os dias!... Se me arranjares um filho dou-te
outra vez o coelho! E o pobre brutinho, cujas pernas o estudante não largava, começou a
queixar-se dos repelões que recebia cada vez mais acelerados.
— Olha que matas o bichinho! reclamou a lavadeira. Não batas assim com ele! mas não o soltes,
hein! Ia dizer ainda alguma coisa, mas acudiu-lhe o espasmo e ela fechou os olhos e pôs-se a
dar com a cabeça de um lado para o outro, rilhando os dentes.
"Naquela mulata estava o grande mistério, a
síntese das impressões que ele recebeu
chegando aqui. Ela era a luz ardente do meiodia; ela era o calor vermelho das sestas de
fazenda; era o aroma quente dos trevos e das
baunilhas, que o atordoara nas matas
brasileiras, era a palmeira virginal e esquiva
que se não torce a nenhuma outra planta; era
o veneno e era o açúcar gostoso, era o sapoti
mais doce que o mel e era a castanha do caju,
que abre feridas com o seu azeite de fogo;
e/a era a cobra verde e traiçoeira, a lagarta
viscosa, e muriçoca doida, que esvoaçava
havia muito tempo em torno do corpo dele,
assanhando-lhe os desejos, acordando-lhe as
fibras, embambecidas pela saudade de terra,
picando-lhe as artérias, para lhe cuspir
dentro da sangue uma centelha daquele
amor setentrional, uma nota daquela música
feita de gemidos de prazer, uma larva
daquela nuvem de cantáridas que zumbam
em tomo da Rita Baiana o espalhavam-se
pelo ar numa fosforescência afrodisíaca."
"A negra, imóvel, cercada de
escamas e tripas de peixe,
com
uma
das
mãos
espalmada no chão e com a
outra segurando a faca de
cozinha, olhou aterrada para
eles, sem pestanejar.
Os policiais, vendo que ela
se
não
despachava,
desembainharam os sabres.
Bertoleza então, erguendose com ímpeto de anta
bravia, recuou de um salto, e
entes
que
alguém
conseguisse alcançá-la, já de
um só golpe certeiro e fundo
rasgara o ventre de lado a
lodo.
E depois emborcou para a frente,
rungindo e esfocinhando moribunda
numa lameira de sangue.
João Romão fugira até o canto
mais escuro do armazém, tapando o
rosto com os mãos.
Nesse momento parava à
porta da rua uma carruagem. Era
uma comissão de abolicionistas que
vinha, de casaca, trazer-lhe
respeitosamente o diploma de sócio
benemérito.“
FIM
Samba do Cortiço
Se você não tá lembrado
Dá licença eu vou contar
Ali onde agora está
Aquele cortiço vasto
Era um grande terreno
Logo atrás de um sobrado
Foi ali, seu moço
Que Romão e Bertoleza
Começaram a juntar riqueza
Mas um dia nem é bom de se
Lembrar, apareceu a polícia
Pra Bertoleza buscar
João Romão para acertar as coisas
A amiga resolveu denunciar
Que tristeza, que a pobre mulher sentia
Por instinto que ironia,
Preferiu se suicidar!
E hoje ao ler a obra Naturalista sim.
Pra não esquecer nós cantamos assim:
Refrão:
É o Naturalismo chagas Sociais
Tratando os personagens como
meros animais.
É o Naturalismo chagas Sociais
misérias e adultérios, muitas taras
sexuais
Download

Cortiço