artigos e ensaios
Natureza, arqueologia e romantismo:
influência romântica na obra de Frank Lloyd Wright
Paulo Yassuhide Fujioka
Arquiteto e urbanista, professor doutor do Departamento de
Arquitetura e Urbanismo da Escola de Engenharia de São Carlos,
Avenida Trabalhador Sancarlense, 400, CEP 13566-590, São
Carlos, SP, (16) 33739294, [email protected]
Resumo
Na história do Movimento Moderno, a vertente orgânica recebeu atenção
um pouco menor do que a racionalista. A obra organicista de Wright só
passou a ser estudada com mais vigor a partir dos anos 80, descobrindo-se
aspectos novos que surpreenderam pela sua complexidade. O campo da
influência romântica na arquitetura de Wright ainda não foi completamente
explorado. Este ensaio é o primeiro de uma série sobre o tema, discutindo as
influências de Emerson, Thoreau, Whitman, o culto romântico à natureza no
século XX e a inspiração nas descobertas arqueológicas na obra de FLLW.
Palavras-chave: Arquitetura orgânica de Frank Lloyd Wright.
U
m aspecto ainda pouco detalhado na historiografia
da Arquitetura Moderna é o estudo da influência
romântica na obra e no pensamento orgânico de
Frank Lloyd Wright (1867-1959). A arquitetura e o
design do mestre americano foram muitas vezes
classificadas como “românticas”, particularmente
os grafismos e ornatos de inspiração “exótica” que
pareciam estar em desacordo com o axioma
moderno que condenava o ornamento.
Entretanto, há poucas pesquisas que estudem
sistematicamente a origem e a manifestação da
inspiração romântica em Wright. Discutimos esta
questão em nossa Tese de Doutorado, Princípios
da Arquitetura Organicista de Frank Lloyd Wright e
suas Influências na Arquitetura Moderna Paulistana
(2004), e este ensaio é uma continuação desta
discussão.
O conceito de arquitetura orgânica não é tão
definido quanto os princípios do racionalismo
corbusiano. Para efeito deste ensaio, consideramos
que o organicismo wrightiano é regido pelos
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revista de pesquisa em arquitetura e urbanismo
princípios da unidade (na relação do projeto com
a paisagem, na modulação espacial-construtiva);
da plasticidade (os materiais devem fluir, amoldarse e crescer dentro do espaço, ao invés de cortados,
montados – estrutura, piso e fechamento podem
ser um única coisa); da continuidade (fluidez espacial
que, pelo sentido de plasticidade, pode conformar
um espaço livre e aberto, sem existir um limite claro
entre o que é construído e a natureza ao redor); da
obediência à natureza dos materiais (uso funcional
e racionalizado de materiais e estruturas
aparentes, sem ornamentação exceto para
arremates, acabamentos e esquadrias) e de um
novo sentido de escala baseada na
horizontalidade e na integração do edifício com
a paisagem natural.
Como se manifesta a “inspiração romântica” na
obra de Wright? Difícil de responder quando
lembramos que FLLW projetou mais de 600 edifícios
(sem contar o design de móveis, luminárias, pratos,
talheres, aparelhos de chá, etc.), ao longo de cerca
de 70 anos de carreira.
programa de pós-graduação do departamento de arquitetura e urbanismo
eesc-usp
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Natureza, arqueologia e medievalismo: influência romântica na obra de Frank Lloyd Wright
A carreira de Wright inicia-se em 1887 e somente
seria interrompida pelo seu falecimento em 1959.
O período de tempo abrangido pela prolífica
produção é surpreendentemente longo,
principalmente em comparação com outros mestres
do Moderno. FLLW começa a produzir numa era
em que o Ecletismo convivia nos EUA com o Federal
Style, o Shingle Style, Arts and Crafts e a Escola de
Chicago. Apesar do surto de urbanização provocado
pela Conquista do Oeste, pelo surto industrial e
pela imigração, ainda era um país de população
predominantemente pobre e rural. Os rancores da
Guerra Civil (1861-65) ainda dividiam os estados
do Norte e do Sul. Entretanto, ao falecer, os EUA já
eram potência mundial, tinham passado por duas
guerras mundiais, a maior parte de sua população
vivia nas cidades e os arranha-céus racionalistas
dominavam os centros urbanos.
Figura 1- Robie House em
Chicago (1908-10). Fonte:
foto Ercio Barbugian.
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A maior parte dos especialistas concorda que a
carreira de Wright pode ser dividida em três fases
distintas. A fase primordial (1893/1910) inclui as
prairie houses como a Susan Lawrence Dana House
(1900-04) e a Robie House (1909); além do Unity
Temple (1905) e o Larkin Building (1903). A fase
intermediária (1910/30) é caracterizada pelo Hotel
Imperial em Tokyo (1913-23), a Hollyhock House
(1916-21) e as textile-block houses (fase “maia”)
como a Alice Millard House (1923). Finalmente,
temos a fase final onde Wright reinventa seus
conceitos (1930/59), com obras-primas como a
Fallingwater (1934-37), a sede da SC Johnson (193639), várias usonian houses e, por fim, o Museu
Guggenheim (1943-59).
Mas, retomando a pergunta inicial, uma rápida
passagem pelo inventário da obra do arquiteto
mostraria esta influência “romântica” impregnando
projetos ao longo de toda a carreira: as prairie houses
(com uma sutil presença da arte e arquitetura
japonesa, além de temas medievais tão caros a
William Morris), o Hotel Imperial (visto por alguns
como uma “fantasia oriental”), a Hollyhock House
e as casas textile-block, a proposta da Broadacre
City (o abandono da cidade industrial por uma
nova proposta de organização social em meio à
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Natureza, arqueologia e medievalismo: influência romântica na obra de Frank Lloyd Wright
natureza), a Fallingwater (uma nova relação entre
o habitar e a natureza), a sede da SC Johnson (com
sua floresta de colunas-cogumelo), algumas usonian
houses e seus detalhes ornamentais, como a Jester
House, a VC Morris Gift Shop e a torre HC Price
(ornatos de inspiração indígena), além do Museu
Guggenheim.
Portanto, a chamada “inspiração romântica” em
Wright poderia ser melhor definida como
“influências não-classicistas”. De fato, seu discurso
foi construído na rejeição do classicismo, vinculado
por Wright ao anacronismo do Classic Revival e aos
valores do imperialismo e capitalismo. De certa forma
inspirado nos ideais do movimento Arts and Crafts,
Wright sempre advogou uma arte única e original,
ao mesmo tempo em que buscava inspiração num
passado “alternativo” (composto pela arte medieval,
arte e design oriental, arquitetura e arte précolombiana e dos índios do Meio-Oeste dos EUA).
Então, a influência não-classicista pode ser
interpretada como uma invenção ou re-invenção
romântica , mas que leva a uma expressão
conceitualmente original . De fato, a busca da
originalidade em Wright, faz com que a presença
desta inspiração seja sentida quase intuitivamente,
e de difícil classificação ou sistematização (a
geometrização destes motivos “exóticos” ainda no
século XIX, por exemplo, pode ser considerada
precursora do Cubismo). Os muitos textos escritos
por FLLW não esclarecem esta influência, devido a
sua retórica exaltada e complicada.
Esta reinvenção romântica manifesta-se em quatro
aspectos: o culto à natureza, a invocação do ideal
medieval, a inspiração em civilizações antigas e na
arte indígena , e a influência da arte oriental,
principalmente japonesa. Destes aspectos,
analisaremos aqui os três primeiros, em função do
espaço disponível para este ensaio. A influência
oriental (Japão, China e Coréia) já foi abordada
por muitos pesquisadores, particularmente dos anos
90 em diante (Kevin Nute, Julia Meech, Neil Levine,
Kathryn Smith, etc.).
Grant Carpenter Manson, o primeiro scholar a
desenvolver uma pesquisa acadêmica sobre Wright
(1940), esteve entre os primeiros a identificar a
influência da arte e arquitetura japonesa na
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arquitetura orgânica (in Frank Lloyd Wright to 1910
– The First Golden Age). Mas foi Dimitri Tselos o
primeiro pesquisador a levantar sistematicamente
as influências de civilizações antigas na obra de
Wright. Seu ensaio Frank Lloyd Wright and World
Architecture (1969, pp. 58-72) tornou-se referência.
Vincent Scully, Jr. tocou de leve na questão em seu
Frank Lloyd Wright (1960), principalmente em
relação às similaridades formais entre as colunas
das ruínas de Knossos e a coluna-cogumelo da
sede da SC Johnson, que consideramos questionável
– na medida em que Wright só menciona de leve a
arquitetura minóica em seus textos principais (ele
admitiu admirar a arquitetura pré-colombiana,
indígena, oriental, suméria, gótica e românica).
Numa passagem da antologia de textos The Future
of Architecture (1953), Wright afirma que “(...) A
terra é a forma mais simples de arquitetura. Construir
sobre a terra é tão natural para o homem como
para outros animais, pássaros ou insetos (...) Em
tempos antigos suas limitações serviram para manter
suas construções arquitetura. Exemplos esplêndidos:
maia, egípcio, grego, bizantino, persa, gótico,
indiano, chinês, japonês.” (p. 35)
Uma referência fundamental para o debate sobre
a influência “romântica” é a monumental
monografia de Neil Levine, The Architecture of Frank
Lloyd Wright (1996), a mais aprofundada e inovadora
pesquisa feita sobre Wright desde os anos 60. Dos
capítulos 4 a 9, temos uma nova interpretação,
original e erudita, das origens míticas de Taliesin,
da casas da fase “maia”, da inspiração da paisagem
desértica e do vernáculo regional/indígena do MeioOeste, da influência da arte pré-colombiana em
Taliesin West. Levine foi o primeiro a abordar a
questão das “influências exóticas” em Wright desde
Dimitri Tselos.
Durante muito tempo, a apropriação romântica na
arquitetura wrightiana era vista com embaraço,
principalmente durante a fase de consolidação do
Movimento Moderno. Já nos anos 50, mesmo os
divulgadores mais entusiasmados da obra de FLLW
pareciam um tanto constrangidos com seus
arroubos ornamentais. Peter Blake, em sua biografia
Frank Lloyd Wright-Architecture and Space (1962),
critica e ao mesmo tempo parece tentar justificar a
insistência de Wright na ornamentação
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Natureza, arqueologia e medievalismo: influência romântica na obra de Frank Lloyd Wright
arquitetônica, atribuindo-a ao temperamento
poético e romântico de FLLW (Blake chega a escrever
que Wright tinha “fraqueza pelo ornato”).
Blake está em certo em afirmar que Wright, com
seu ideal moldado pelos textos de William Morris,
jamais se libertaria por completo do século XIX.
Philip Johnson também afirmava que Wright era o
maior arquiteto moderno...do século XIX! Blake
também estava correto ao concluir que Wright foi
demasiado avant-garde para o século XIX e
romântico demais para o século XX.
Assim sendo, é no século XIX que devemos buscar
as origens da influência romântica em Wright. Lorde
Kenneth Clark – no Capítulo 11 de Civilisation (1982)
– argumenta que, por quase 1000 anos, o
Cristianismo foi a principal força criativa na civilização
ocidental. Então, por volta de 1725, esta força passa
a declinar e desaparecer. Um dos motivos já tinha
sido descrito em seu Capítulo 10: o advento da Era
da Razão, e o posterior surgimento do Romantismo.
Este último Lorde Clark discute no Cap. 11 (pp.
108-205), apropriadamente intitulado de The
Worship of Nature, a “Adoração da Natureza” –
que é um termo-chave para entender as idéias de
Wright. No século XIX, pela primeira vez, a Natureza
deixa de ser motivo de ameaça e temor para tornarse elegíaca e idílica.
Lorde Clark não menciona Wright, retendo-se mais
em exemplos da pintura, filosofia e literatura dos
séculos XVIII e XIX. Através deles identifica o advento
do culto à natureza como um substituto da religião.
E conclui que é o ideal romântico da total imersão
do artista com a natureza “a razão definitiva por
que o amor à natureza foi aceito por tanto tempo
como uma religião. É um meio pelo qual nós
podemos perder nossa identidade no todo e ganhar
assim uma consciência mais intensa de ser.”
(p. 205)
Neste caso, onde e quando surge a questão da
“adoração da natureza” e como esta influencia de
fato o organicismo wrightiano? Para William Cronon
a formação religiosa unitariana recebida dentro
do clã familiar dos Lloyd-Jones é essencial para
compreender as origens da arquitetura orgânica
(v. ensaio Inconstant Unity: the passion of Frank
Lloyd Wright in Frank Lloyd Wright Architect, 1994,
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pp. 8-28). O unitarianismo pode ser resumido
como uma forma mais aberta de protestantismo,
com ênfase na educação, tolerância, conhecimento
e debate.
Na imersão do ser humano e da arquitetura na
Natureza temos o sentido de unidade entre
arquitetura e paisagem, um dos princípios da
arquitetura organicista. E a unidade entre Homem
e Natureza está regulada pelo unitarianismo, com
sua noção peculiar de união – como explicou FLLW
em An Autobiography: “O Unitarianismo dos LloydJones foi uma tentativa para amplificar na confusão
dos credos de seus dias, a idéia da vida como um
presente da Fonte Divina, um DEUS onipotente,
todas as coisas sendo um com ele. UNIDADE era
seu lema, o sinal e o símbolo que os emocionava,
a UNIDADE de todas as coisas!” (p. 20)
Portanto, para identificar as origens da arquitetura
wrightiana, voltemos ao vale verdejante do Rio
Helena perto de Spring Green, Wisconsin, cenário
das explorações do menino Frank Lloyd Wright. A
fé unitariana propiciava um ambiente imerso em
arte, música erudita, filosofia e literatura. E acima
de tudo, lia-se muito Emerson (Cronon, pp. 1215). E na educação unitariana, tudo remonta à
matriz original do profeta demiurgo de Concord,
Ralph Waldo Emerson (1803-1882).
Emerson, poeta e pensador, foi autor de Homens
Representativos, Natureza (1836) e Ensaios (1841).
Junto com Henry David Thoreau (1817-1862), é a
principal figura do transcendentalismo, tendo sido
influenciado pelo romantismo alemão e inglês.
Também tornou-se um dos primeiros intelectuais
a ter sua obra popularizada fora do circuito
acadêmico, graças ao circuito de palestras, uma
febre do século XIX. Influenciou poesia de Walt
Whitman (1819-1892), cuja obra também forma,
junto com Emerson e Thoreau, a base do
pensamento orgânico de Wright. O axioma
sullivaniano da forma que segue a função foi
parcialmente inspirado na célebre passagem do
ensaio Arte (1841) de Emerson – que diz muito
sobre a rejeição, por parte de Wright, dos valores
do classicismo:
No presente, os homens não vêem a natureza
como bela e botam-se a esculpir uma estátua que
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Natureza, arqueologia e medievalismo: influência romântica na obra de Frank Lloyd Wright
deva sê-lo (...). A beleza tem de voltar ao domínio
dos artefatos, a distinção entre objetos das belasartes e objetos úteis tem de ser esquecida (...). Na
natureza, tudo é útil, tudo é belo. É belo porque é
vivo, movimenta-se, reproduz-se, é útil porque é
simétrico e formoso. A beleza não atenderá ao
chamado da legislatura nem repetirá na Inglaterra
ou na América sua história vivida na Grécia. Virá,
como sempre, não anunciada e brotará entre os
pés de homens valentes e convictos. (pp. 244-245)
Figura 2- Imagens do Frank
Lloyd Wright Studio em Oak
Park, Illinois (1898-1910).
Fonte: foto Ercio Barbugian.
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Harold Bloom em seu ensaio Walt Whitman – A
Medida da Alma Americana (1992), afirma que a
“imagem da ‘selvageria’, wildness [sic], é um tropo
predileto de Emerson e Thoreau (...) e substitui o
Sublime como imagem da prioridade e da liberdade
(...)”. E cita uma passagem reveladora de Emerson,
“mestre da alegria perfeita”: “Parado aqui neste
terreno, minha cabeça banhada pelo ar festivo e
elevada a um espaço infinito, todo egoísmo
mesquinho desaparece. Eu me transformo num
globo ocular transparente: eu não sou nada, eu
vejo tudo, circulam por mim as correntes do Ser
Universal, eu sou uma parte e parcela de Deus (...)”.
Podemos identificar nesta passagem a perda da
identidade individual num todo maior que Kenneth
Clark discute em The Worship of Nature, bem como
o advento de uma “consciência mais intensa de
ser”. O tema da imersão do homem do homem
com a natureza (e sua total identificação com ela)
também está presente, evidentemente, em Thoreau,
principalmente em A Natural History of
Massachusetts (1842), A Winter Walk (1843), The
Maine Woods (1848), A Week on the Concord and
Merrimack Rivers (1849) e finalmente em Walden
(1854). Escritor, poeta, ensaísta e naturalista,
elaborou grande parte de suas idéias a partir das
observações da natureza. Em Thoreau temos
também a defesa do não-conformismo militante
em Civil Disobedience (1849), que influenciou
Mahatma Gandhi e o Rev. Martin Luther King. O
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Natureza, arqueologia e medievalismo: influência romântica na obra de Frank Lloyd Wright
não-conformismo ativista é outra faceta do rebelde
Frank Lloyd Wright, que militou contra o racismo,
a guerra, o imperialismo e o macarthismo.
Como escreveu Joyce Carol Oates, Thoreau sempre
pergunta quem somos, onde estamos. “E até
mesmo o objeto de seu amor extático, a Natureza,
é ilusório e indefinido. Mais rica e mais palpitante,
sob todos os aspectos, do que Natureza de Emerson,
a Natureza de Thoreau é às vezes aereamente
platônica, de outras vezes precisa, gráfica, corajosa,
impiedosa. Ela é alternadamente transcendentalista
e sentimental, puritana e ‘obscena’, existencial e
amoral.” (in O Misterioso Thor eau, 1988, p. 3).
Ludwig Hilberseimer nota que Thoreau desprezava
a “arquitetura romântica sentimental, com seus
ornamentos falsos e sem sentido” e também era
interessado na arte primitiva, como Wright. Para
Hilberseimer, Thoreau pode ter sido o primeiro
pensador a descobrir a “beleza natural” das
construções simples do povo, que construíam de
forma franca e honesta apenas para atender suas
necessidades, expressando assim uma “verdade
essencial”, fruto de uma abordagem direta dos
construtores e sua preocupação com o artefato
como um todo e não apenas com sua aparência (in
Contemporary Architecture – its roots and trends,
1964, pp. 19-20). Neste caso, o autor se refere a
passagens escritas or Thoreau em Walden (1854,
in The Portable Thoreau, 1987, pp. 301-303).
Robert Twombly, na biografia Frank Lloyd Wright
– His Life and Architecture (1979), repara que FLLW
associava a capacidade criativa humana à “relação
entre o homem e o cosmos [cit. Wright]”, concluindo
que esta “crença transcendental de que o lado
artístico da humanidade representava sua divindade
levou Wright a insistir que um tipo de estrutura –
um padrão coerente – caracterizaria toda vida:
‘Arquitetura orgânica sente-se em casa com o ideal
de unidade’, ele declarou certa vez. Uma de suas
duas palavras-chave em seu vocabulário
filosófico, de fato, era ‘unidade’, um atributo
definidor da segunda palavra-chave, ‘natureza’,
de onde todo o resto fluia. As duas tornaramse uma na estrutura orgânica que trazia unidade
cósmica à variedade natural e era, segundo Wright
acreditava, a base apropriada de todas as relações
sociais” (p. 304).
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Não temos espaço neste ensaio para discorrermos
sobre a complexa poesia de Walt Whitman e como
se relaciona com Emerson e Thoreau. Mas Louis
Sullivan admirava Whitman e possivelmente a leitura
de Leaves of Grass (Folhas da Relva, 1855) foi uma
das inspirações da busca de Sullivan por uma
ornamentação “orgânica” baseada na vegetação
regional, descartando os padrões classicistas.
Considerado o bardo americano da democracia,
do labor manual e dos grandes espaços abertos,
sentimos em numerosos versos a presença do
espírito da passagem de Emerson citada acima.
Mas Whitman vai mais além.
Num único aspecto, por exemplo, como escreveu
Gilles Deleuze, “A América coleciona extratos,
apresenta amostras de todas as idades, todas as
terras e todas a nações. A História de amor mais
simples já coloca em jogo Estados, povos e tribos;
a autobiografia mais pessoal é necessariamente
coletiva, como se vê ademais em Wolfe ou em Miller
(...) A literatura americana [clássica, diríamos] tem
como objetivo pôr em correlação os aspectos mais
diversos da geografia dos E.U.A., Mississippi,
Rochosas e Prados [pradarias], e de sua História,
lutas, amor, evolução. Relações em número cada
vez maior, e de qualidade mais fina, é como o motor
da natureza e da História.”
O texto de Deleuze refere-se a Whitman, mas poderia
aplicar-se também a Wright: “(...) A própria
Democracia, mesmo a Arte, só formam um todo
na sua relação com a Natureza (o espaço aberto, a
luz , as cores, os sons,a noite...); sem o que a arte
cai no mórbido, e a democracia no embuste. (...) A
sociedade dos camaradas é o sonho revolucionário
americano, para o qual Whitman colaborou
poderosamente. Sonho malogrado e traído bem
antes que o da sociedade soviética. Mas é também
a realidade da literatura americana, sob esses dois
aspectos: a espontaneidade ou o sentido inato do
fragmentário; a reflexão das relações vivas a cada
vez adquiridas e criadas (...)” (no ensaio Deleuze
escreve sobre Whitman, 1996)
Giulio Carlo Argan também nota que “o termo
orgânico é inseparável do naturalismo de Wright:
um naturalismo de origem ruskiniana, mas
revigorado no mais engajado e religioso naturalismo
de Walt Whitman” (Arquitetura orgânica, 1945,
artigos e ensaios
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Natureza, arqueologia e medievalismo: influência romântica na obra de Frank Lloyd Wright
in Projeto e Destino, p. 264). Há pouca menção a
John Ruskin nos textos de Wright, embora
possivelmente fosse tema de discussão entre FLLW
e Louis Sullivan. Ruskin permeia todo o pensamento
de Wright através de Morris, como veremos abaixo.
Nos textos de Frank Lloyd Wright sempre temos a
aproximação de sua idéia de arquitetura orgânica
com a Natureza e com seu conceito peculiar de
Democracia. Mas, como vimos, a adoração da
natureza fazia parte do espírito do século XIX, ao
menos no mundo ocidental. E nos EUA, coincidiu
com o primeiro grande florescer das artes e da
filosofia da jovem República, ainda isolada e
provinciana em relação às metrópoles da Europa
imperial.
Depois de Emerson, Thoreau e Whitman viria a
geração erudita de Henry James (com seu irmão
William James na filosofia), Edith Wharton, William
Dean Howells, Emily Dickinson; e os renovadores
O. Henry, Edgar Allan Poe, Jack London e Herman
Melville, com este último nascendo o romance
moderno.
Uma característica do artista romântico é sua busca
por uma existência tão intensa quanto a de seus
personagens. Melville (1814-1891), Mark Twain
(1835-1910) e London (1876-1916) viveram vidas
tão movimentadas quanto a de seus livros. A rebeldia
e a busca de novas experiências é um traço comum,
principalmente em relação a Twain, que foi um
dos líderes da Liga Anti-Imperialista; e em London,
que foi militante da causa socialista e viveu uma
existência nômade em grande parte de sua vida. E
não tinham muito apreço pela Academia.
Tudo isso os aproxima mais de Wright, o rebelde
que cresceu no Wisconsin, não terminou a
faculdade, iniciou a carreira em Chicago, morou
por muitos anos no Japão, estabeleceu escritório
na Califórnia ao voltar, fundou Taliesin West no
Arizona e foi enterrado em Taliesin East, no
Wisconsin, voltando ao ponto de partida.
Mais além, o século XIX viu florescer também nos
EUA a primeira grande escola de pintura, com a
Hudson River School, que se destacou
principalmente pela pintura de paisagens. Aqui a
landscape painting adquiriu caráter épico, mítico,
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grandioso e epifânico, o que seria de esperar num
país de tradição puritana tão forte, onde os arroubos
do Barroco não criaram raízes.
Entretanto, a celebração da natureza virgem e
selvagem tem algumas diferenças com a apropriação
da natureza no discurso de Goethe, Wordsworth e
Byron (ainda no final do século XVIII), onde o culto
à natureza manifesta-se numa contemplação
meditativa, quase mística, da paisagem, da fauna
e da flora: a majestade das montanhas, rios, lagos
e cachoeiras, os jogos de luz e sombra das florestas,
etc. Para Robert Hughes (in Manifest Destiny in
Paint, 1984, p. 41), a descoberta da singular natureza
dos grandes espaços abertos (a pradaria tão cara a
Wright) foi uma das peças-chave do alvorecer da
grande arte americana.
Estes artistas apenas seguiam a trajetória dos
exploradores e naturalistas que exploraram a
natureza selvagem do interior dos EUA na expansão
das 13 colônias originais de 1776 para o Oeste.
Seguindo as primeiras expedições científicas dos
exploradores-naturalistas – Lewis e Clark (180306), John Baur e Lloyd Goodrich – os artistas
retrataram a wilderness, incendiando o imaginário
popular, ajudando a criar o “espírito de fronteira”.
A Hudson River School foi apenas um ponto de
partida de uma arte que ajudou a popularizar o
culto à natureza e, mais tarde, estimularam os
primeiros esforços de preservação do que restaria
dela.
Assim, o culto à natureza está vinculado não
somente aos valores românticos europeus, mas
também ao próprio espírito de fronteira (outra
característica da trajetória de Wright) e a uma
descoberta da própria grandeza do território
nacional. Na monumental pintura Twilight in the
Wilderness (1860), de Frederic Edwin Church temos,
por exemplo, a “essência verdadeira da emoção
ianque em face do sublime da natureza”, como
escreveu Hughes (1984, p. 40). E o mesmo poderia
ser dito de outros mestres como Asher B. Durand,
Albert Bierstadt, Thomas Cole, John F. Kensett,
Martin Johnson Heade, Fitz Hugh Lane (embora
estes dois últimos tenham um approach mais
meditativo, como nota Hughes, 1980). E estes ainda
abriram caminho para outros mestres como Frederic
Remington (que podemos considerar como um
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Natureza, arqueologia e medievalismo: influência romântica na obra de Frank Lloyd Wright
Delacroix americano), Charles Marion Russell, George
Caleb Bingham e Winslow Homer. Como disse
Hughes em entrevista a Carlos Graieb (1997):
(...) a pintura de paisagens se tornou a primeira
forma de expressão religiosa nos EUA. Não houve
o equivalente da arte religiosa européia, exceto
por poucos exemplos coloniais de origem européia.
Para os puritanos, a representação de santos era
idolatria. Numa cultura suspeitosa do ícone, numa
cultura sem passado grandioso, a natureza
preencheu vários espaços. Os americanos não
precisavam de Chartres, porque tinham andaimes
de Deus no Grand Canyon. Desde seus primórdios,
a pintura de paisagens teve conotações espirituais.
E quando você chega ao século XIX, quase tudo
que is críticos escreviam era a respeito de paisagens
em termos de elevação, reforma, revigoramento moral.
Remington e Homer também celebraram a vida
dura do trabalhador humilde ao ar livre no campo
e no litoral: agricultores, vaqueiros, lenhadores,
índios e pescadores. Mas se ambos podem ser
considerados artistas de primeira grandeza, temos
também o registro cotidiano da conquista do Oeste
feito por Karl Bodmer e George Catlin, menos
conhecidos. Catlin não pintava com o mesmo talento
de Remington ou Homer, mas dedicou-se a registrar
respeitosamente, na pintura, o modo de vida
indígena que estava desaparecendo. Assim, tornouse um dos primeiros brancos a valorizar e divulgar
a cultura indígena, numa época em que esta ainda
era vista com preconceito. Suas pinturas, que tiveram
repercussão nos EUA e na Europa da época, mostram
claramente a dignidade do modo de vida dos índios
e a sofisticação técnica e expressiva de sua arte.
Catlin conseguiu sensibilizar ao menos parte das
elites para a defesa dos direitos dos povos indígenas.
Wright também esteve entre os primeiros intelectuais
da segunda metade do século XIX a valorizar a arte
dos povos indígenas.
A descoberta da grandeza da natureza americana
continental pelos artistas levou também naturalistas
e fotógrafos a empreender esforços para estudar
sistematicamente a geologia, fauna e flora do
território ainda virgem. Na trilha de Lewis e Clark
veio o artista e naturalista Jean-Jacques Audubon
(1785-1851), com seu estudo Os Pássaros da
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América. Audubon, tal como Wright, era um
apaixonado pela flora e pela vida rústica no campo.
Além disso, o célebre naturalista de origem alemã
Louis Agassiz (1808-1873) efetuou diversas
expedições nas Américas entre 1848 e 1870.
As repercussões das atividades acadêmicas de
Agassiz só encontram par nas pesquisas de seu
colega, o botânico Prof. Asa Gray, autor do maior
levantamento exaustivo e pioneiro da flora
americana, School and Field Botany (1869). Esta
obra causou impressão em Louis Sullivan,
encorajando-o a abandonar os cânones classicistas.
As folhas de acanthus das capitéis coríntios perdiam
sentido diante da grandeza e vitalidade da flora
americana recém-descoberta. Daí o conceito
orgânico de Sullivan, um sistema ornamental
original, aparentado com o Art-Nouveau, baseado
em abstrações da flora regional. Sullivan trabalhou
intensamente com Wright esta ornamentação
“orgânica”, discutindo não somente o livro de Gray
como também outra obra: Grammar of Ornament
(1856), do arquiteto inglês Owen Jones, filiado ao
Aesthetic Movement.
Já no final do século XIX, a necessidade de
preservação dos majestosos espaços do Meio-Oeste
firmava-se na consciência nacional, graças aos
pintores de paisagem, naturalistas e fotógrafos,
como John Muir, naturalista que passou 40 anos
explorando a natureza selvagem do Oeste; os
fotógrafos Carleton Watkins (só redescoberto no
final do século XX e que também documentou os
núcleos urbanos da colonização imigrante) e William
Henry Jackson e o pintor Thomas Moran.
Não há muitos registros na imensa obra escrita de
Wright (25 livros e cerca de 219 artigos, palestras e
outros textos) sobre o papel dos pintores de
paisagem na formação do organicismo (mas
reconhece a influência de Emerson, Whitman,
Thoreau, Sullivan, Asa Gray e Owen Jones).
Entretanto, o discurso wrightiano não ignora a
grandeza lírica da paisagem, do qual o grande
público conscientizou-se através de artistas como
Bierstadt, Moran, Watkins. Nos EUA do século XIX,
a natureza romântica adquire caráter forte, viril,
épico e majestoso, bem além da frágil Arcadia pastoril
dos europeus (ou dos pintores acadêmicos brasileiros
da época) – ao mesmo tempo zeitgeist e weltgeist,
artigos e ensaios
11
Natureza, arqueologia e medievalismo: influência romântica na obra de Frank Lloyd Wright
ou seja, espírito do tempo e espírito de identidade
nacional.
Wright era um espírito atento a seu tempo, nada
tinha de nostálgico. Em seus textos, FLLW evoca as
pradarias do Meio-Oeste, o vale do Rio Helena, os
cactos do tipo saguaro, as árvores de Wisconsin, o
Grand Canyon e o Paradise Valley do Arzona, bem
como as grasslands e badlands do solo agreste de
South Dakota.
No ideal orgânico, desde Sullivan, a arquitetura
torna-se metáfora da natureza e anuncia uma nova
morfologia do sítio, através do que poderia ser
uma metáfora de uma imaginação geológica,
argumenta Richard A. Etlin (in Frank Lloyd Wright
and Le Corbusier – The Romantic Legacy, 1994,
p. 33). FLLW sempre admirou o que chamava de
earth-architecture (“arquitetura da terra”): tolteca,
asteca, maia, inca. Wright imaginava seus edifícios
como extensões afloradas da terra bruta. Etlin
também nota que a terra em si apresentava-se como
uma arquitetura natural (“a gramática da terra”
de FLLW). Nas lajes de pedra de Taliesin I em Spring
Green Wright começa a imitar e abstrair formas da
natureza circundante.
civilização democrática, um novo homem. Para além
do ornato floral exuberante de Sullivan, a prairie
house surge plana e horizontal como a pradaria,
com os espaços internos fluidos e abertos, com as
amplas janelas dissolvendo os limites entre o interior
e exterior – uma nova relação do homem com a
paisagem. A casa emerge como um retorno às
origens, longe da corrupção das cidades, buscando
a unidade entre o ser humano e a Natureza. É a
partir da prairie house onde Wright tenta concretizar
o ideal romântico: a total imersão com a natureza,
perdendo-se “a identidade no todo e ganhar assim
uma consciência mais intensa de ser”.
A união do ser humano com o Divino se dá através
da Natureza, pois, para Wright, “... quando eu uso
Em Taliesin I temos também a força de outra
apropriação romântica tão importante quanto a
imersão na natureza, que é a nostalgia da Idade
Média, via Morris.
A união do artista com a natureza e o medievalismo
manifestam-se pela primeira vez na obra de Wright
com a construção de Taliesin I (1911-59). Projetada
para ser a residência-atelier de FFLW, o próprio nome
“Taliesin” aludia a uma postura romântica e
medievalista, pois significava “rosto brilhante” no
gaélico dos ancestrais celtas de Wright do País de
Gales. Mas também, segundo FLLW, Taliesin era
nome de um druida e bardo galês que teria sido
membro da Távola Redonda do Rei Arthur, na
tradição galesa (v. Levine Cap. 7).
a palavra natureza, noto que não a uso como a
maioria das outras pessoas usam-na. Porque para
mim, a natureza é a forma verdadeira do que nós
chamamos Deus” (in The Oral History of
Architecture , de John Peter, 1994, p. 125). A
manifestação mais eloquente deste ideal de unidade
entre Deus/Natureza e o Homem estaria na
Fallingwater House (1934-37). Ali, na união entre
ser humano e Natureza temos a dissolução dos
limites entre interior e exterior através das amplas
aberturas para a paisagem e pela pedreira do sítio
que emerge diretamente no salão, além do acesso
Já haviam traços de influência celta e de outras
culturas da Antiguidade nos motivos ornamentais
das primeiras prairie houses (como no caso do vitral
Tree of Life). As idéias de William Morris (bem como
o Art-Nouveau) eram bem conhecidas através de
publicações européias recebidas nos escritórios de
arquitetura de Chicago. Wright e outros jovens
arquitetos tiveram contato com o Arts and Crafts e
o Art-Nouveau, através dos mestres mais velhos
(Root, Sullivan, Adler, etc.) e de revistas como Studio
e The Craftsman – porta-voz que divulgava as obras
de Baillie Scott, Voysey e Mackintosh.
direto do salão à torrente da cascata. A volumetria
dos balcões e o núcleo estrutural em pedra
aparente emergem como metáfora da paisagem
circundante.
Vários autores já discutiram a relação da arquitetura
wrightiana (principalmente a doméstica) com a
r sco
6 2[2007
O vínculo de FLLW com Morris e o movimento Arts
and Crafts reforçou-se ao fazer parte da comunidade
de intelectuais, ativistas sociais e artistas chamada
Chicago Renaissance (v. Levine, Cap. 2-4). FLLW
teve contato com a líder social Jane Addams, que
também era militante do movimento Arts and Crafts.
artigos e ensaios
12
Natureza, arqueologia e medievalismo: influência romântica na obra de Frank Lloyd Wright
Foi na Hull House, sede da organização social de
Addams (tombada como patrimônio histórico), que
Wright fez sua primeira palestra, The Art and Craft
of the Machine (1894), onde menciona publicamente
pela primeira vez o termo “arquitetura orgânica”.
O contato com o movimento Arts and Crafts permitiu
a FLLW observar a experimentação geométrica
estilizada do Arts and Crafts, levada adiante pelos
secessionistas vienenses como J.M. Olbrich e Josef
Hoffmann (v. Levine p. 27). Wright conheceu na
Hull House, o arquiteto e designer inglês C.R.
Ashbee (1863-1942), líder internacional do Arts
and Crafts e que tornou-se amigo de FLLW e
divulgador de sua obra.
Fugir da realidade cruel do século XIX para um
mundo pré-industrial foi, como escreveu James Joll
(in El Siglo XIX - Las Contradicciones del Progreso,
Figura 3- Thomas Gale
House em Oak Park, Illinois
(1904). Fonte: foto Ercio
Barbugian.
r sco
6 2[2007
org. Asa Briggs, 1973, p. 84), um “reiterado sonho
do século XIX” atraindo tanto românticos –
nostálgicos do passado, como o rei Ludwig II da
Baviera – como progressistas. A fuga poderia ser
através da imersão na natureza ou do resgate de
valores perdidos da Idade Média (como Richard
Wagner e William Morris, este último desejando
reviver a dignidade do trabalho artesanal da Idade
Média). Frank Lloyd Wright, que ainda jovem conheceu
horrorizado as mazelas de Chicago e leu Victor Hugo
com entusiasmo, estaria neste último grupo.
Wright lembrou em vários textos (como An
Autobiography) a profunda impressão que causou
a leitura de O Corcunda de Notre-Dame (1831). A
obra despertou em muitos a paixão pelo medieval.
Wright citaria várias vezes a passagem de Hugo
sobre a Renascença ser um crepúsculo que a
Humanidade tomou erroneamente por alvorecer
(a profecia de Frollo). Hilberseimer (pp. 34-35) nota
que a leitura de Hugo pode ter levado Viollet-leDuc (in Entretiens sur l’architecture, 1863-72) a
convencer-se de que os princípios da arquitetura
medieval, se descobertos poderiam tornar-se guias
para o desenvolvimento da arquitetura. E Viollet-
artigos e ensaios
13
Natureza, arqueologia e medievalismo: influência romântica na obra de Frank Lloyd Wright
le-Duc estava entre os poucos arquitetos europeus
cujos textos eram apreciados por Wright.
A nostalgia pela Idade Média disseminou-se pela
Europa do século XIX, mas a invocação medievalista
mais forte na América foi a vertente inglesa, que
foi discutida por Carl E. Schorske em seu ensaio A
revivificação medieval e seu conteúdo moderno:
Coleridge, Pugin e Disraeli (in Pensando com a
História, 1998, pp. 88-107). Aqui, Schorske observa
que o fantasma da Idade Média fez suas primeiras
aparições na Inglaterra do século XVIII (como parte
do gosto em voga pelo exótico, o grotesco e o
sublime), mas seu foco está na valorização do
passado, feita por pensadores ingleses preocupados
com a situação social de seu país no segundo quartel
do século XIX: o poeta Samuel Taylor Coleridge, o
escritor e político Benjamin Disraeli e o arquiteto
Augustus Pugin. Estes concebiam a civilização
medieval inglesa de modo holístico, como uma
cultura integrada. Viam neste passado medieval
idealizado “um símbolo abrangente da boa
sociedade – tudo o que a Inglaterra moderna não
era”. A Idade Média inglesa seria um paraíso perdido
– principalmente diante dos excessos da política,
do capitalismo da Revolução Industrial.
Em outro ensaio instigante, Carl Schorske faz uma
ponte entre William Morris e Richard Wagner,
discutindo vínculos comuns entre ambos (e onde
podemos perceber também paralelos com Wright):
A busca do Graal: Wagner e Morris (pp. 108-123).
Na abertura do texto, o próprio Schorske pergunta:
qual o vínculo que poderia unir um designer e
artesão vitoriano, socialista inglês e um compositor
nacionalista alemão, 21 anos mais moço do que o
primeiro? A resposta é que, embora um não
conhecesse a obra do outro, “ambos se tornaram
artistas numa época em que a arte estava mudando
sua função na cultura européia: deixando de
expressar os valores dominantes da sociedade, ela
começou a apresentar seus próprios valores, às vezes
sob o disfarce de um passado desaparecido, às
vezes com os trajes de um futuro almejado. Tanto
Wagner como Morris buscaram o futuro nas relíquias
do passado. Ambos pensaram com a história sobre
a função do artista em seu tempo.” (p. 108)
Para Schorske, “Wagner e Morris fizeram variações
alemães e inglesas sobre um tema comum da cultura
r sco
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do século XIX: o desencanto com a civilização
moderna. Eles buscaram uma visão pela qual os
males de sua época pudessem se curados” (p. 109).
A obra que influenciou inicialmente Morris foi
Stones of Venice, de John Ruskin, “ao demonstrar
a superioridade das formas do gótico sobre a
tirania do desenho racional antigo e moderno,
proporcionou uma base teórica para o
medievalismo romântico tardio de Morris e seus
amigos.” (idem)
Tanto Morris como Wagner inspiraram-se em temas
comuns, embora em épocas diversas. Ambos
também acreditavam na união indissolúvel entre o
futuro político da humanidade e o da arte
(revolucionária). Em Os Mestres-Cantores de
Nuremberg (1867) Wagner celebra a comuna
medieval, onde uniam-se a vida social, econômica
e artística, fazendo uma crítica arcaizante do mundo
moderno (Schorske, p. 118). Wagner e Morris (e
Wright, acrescentamos) exaltavam o ideal da guilda
medieval. Schorske nota que, ao longo da carreira,
Wagner lutou também contra as convenções da
tradição clássica e do contraponto. Frank Lloyd
Wright também combateu o classicismo e também
admirava o ideal da comuna medieval, inspiradora
de Taliesin e da Broadacre City.
Qual seria o papel da origem familiar de Wright
em sua apropriação medievalista? A força da tradição
celta em Wright foi pouco pesquisada até
recentemente – FLLW faz algumas observações
esparsas na autobiografia. Levine e Meryle Secrest
estiveram entre os primeiros a levantar as origens
celtas de Wright (clã Lloyd Jones) e de como a arte
e poesia medieval do País de Gales influenciaram
sua obra. Secrest, no primeiro capítulo da biografia
Frank Lloyd Wright (1992), investigou a história de
seus antepassados galeses, abrindo novas pistas
para a esta questão – em relação à natureza/
transformação dos materiais e ao edifício com o
meio-ambiente.
Emigrando do País de Gales, os Lloyd-Jones firmaramse no vale do Rio Helena. Sabemos que Wright
sentiu-se vinculado a esta paisagem desde a infância.
Richard Etlin analisou esta questão (op. cit., pp.
33-39), apontando um texto de FLLW onde este
especula que o solo entre Madison e Janesville,
perto de Taliesin, teria sido o leito de uma antiga
artigos e ensaios
14
Natureza, arqueologia e medievalismo: influência romântica na obra de Frank Lloyd Wright
geleira: a região caracterizava-se por pedreiras e
vales com blocos de rochas estratificadas em texturas
horizontais e lajes de pedra, cuja monumentalidade
inspirava o arquiteto.
A cantaria de Taliesin I foram erguidas sobre bases
de pedra calcárea típica do sítio. A cantaria era
feita de placas sobrepostas que reproduziam as
lajes de pedra estratificada da região, uma marca
registrada. Em seu capítulo sobre Taliesin (pp. 75112), Levine mostra que as massas e volumes foram
geradas como referências diretas a formas naturais
do sítio – numa representação metafórica da
paisagem na arquitetura. Assim, a construção
parece emergir naturalmente das encostas da colina.
Há em Taliesin uma complexidade de espaços
internos, adjacentes e exteriores, perceptível na escala
do olhar do explorador pedestre: pátios, claustros,
nichos, terraços, tanques d’ água, árvores e arbustos
– como um mosteiro de fantasia medieval
desenhado por um escritor romântico exuberante.
Assim, Wright procuraria fundir geometria e
natureza, abstração e representação, estabelecendo
uma identidade contínua entre ambos. A natureza
e a arquitetura se juntariam, sob inspiração da
poética medieval. Nas faces da encosta abraçadas
pelos pavilhões teríamos uma representação
metafórica da deusa da natureza da mitologia celtagaélica Ceridwen (da lenda original de Taliesin)
mediando os mundos da natureza e do homem e,
literal e figurativamente, a transformação de um
em outro (v. Levine, p. 100).
A nostalgia romântica do século XIX por valores
pré-classicistas também ultrapassava os limites da
Idade Média. De fato, a febre das descobertas
arqueológicas foi outra característica oitoentista
que terminou por inspirar arquitetos e designers,
particularmente os seguidores do Art-Nouveau.
Levine também mostra que Wright descreveu as
formas da “arquitetura primitiva americana como
“abstrações” de formas naturais, e sua finalidade
ritual como “tão cósmicas como o sol, lua e
estrelas!”. Segundo FLLW, estas eram as “earth-
architectures [ou “arquiteturas da terra”]: massas
gigantescas de alvenaria levantadas sobregrandes
terrenos pavimentados de pedra, tudo planejado
r sco
6 2[2007
como uma montanha, um vasto platô (...)”. Para
Wright, à medida em que “as construções maias
cresceram para tornar-se montanhas feitas pelo
homem” estas “tornaram-se uma com as
características do entorno da terra montanhosa”;
e porque todos os prédios “foram construídos como
e para rituais religiosos para erguer-se para sempre
no olhar do sol como encarnação terrena do mistério
da majestade humana”. (Levine, p. 141)
Etlin vê alguns paralelos formais entre espaços
wrightianos e formas arquitetônicas da Antiguidade
ou pré-colombianas – como o escritório da sede
da SC Johnson e a sala hipostila típica de um palácio
egípcio; a Richard Lloyd-Jones House (Tulsa,
Oklahoma, 1928) e as ruínas da Grande Galeria de
Aké (Yucatán), o aqueduto romano e o Marin County
Civic Center, o Museu Guggenheim e o ziggurat
sumério (invertido), etc. (Etlin, p. 160).
De fato, a rampa escalonada do tipo ziggurat esteve
presente nos primeiros estudos do Museu
Guggenheim. Esta solução terminou por ser
combinada com a solução em rampa espiralada
que Wright já vinha estudando desde os anos 20 –
com os projetos não construídos para o Gordon
Strong Automobile Objective and Planetarium
(Sugarloaf Mountain, Maryland, 1924-25) e da Steel
Cathedral (Nova York, 1926). O próprio Wright
assume a inspiração do ziggurat ao apelidar a
solução invertida de “taruggiz” (ziggurat escrito
ao contrário) – como nota Frampton (p. 71). Neste
sentido o Guggenheim pode ser considerado como
ponto culminante da sequência de experiências
de FLLW com rampas em espiral, círculos e
intersecções.
É possível que Wright tenha se interessado pela
rampa espiralada através de exemplos como o
minarete com rampa em espiral de Samarra (Iraque,
dinastia abássida). Entretanto, não há registros sobre
isto, apesar do interesse de FLLW pela arte, poesia
e arquitetura islâmica. Wright visitaria o Iraque
somente nos anos 50, bem depois da apresentação
do projeto do Guggenheim Museum.
Taliesin I foi iniciada por volta de 1911, após o
retorno de Wright da temporada na Europa para a
edição dos catálogos Wasmuth. Junto com a
inspiração celta, Wright iniciaria uma série de
artigos e ensaios
15
Natureza, arqueologia e medievalismo: influência romântica na obra de Frank Lloyd Wright
experiências com outra vertente, que culminaria
na chamada “fase maia” de sua carreira. O primeiro
exemplar desta vertente seria a célebre Hollyhock
House, feita para Aline Barnsdall, em 1916-21. A
escala monumental da casa justifica-se por ter sido
projetada originalmente para servir de núcleo para
um grupo teatral de vanguarda.
Entretanto, a inspiração “maia” na arquitetura
wrightiana já podia ser vista muito antes, conforme
Dimitri Tselos, Blake e Frampton. É aceito atualmente
na historiografia wrightiana que a origem da
ornamentação de inspiração “pré-colombiana”
remonta aos detalhes dos capitéis do Unity Temple
de 1905. Igualmente os frisos, colunatas e painéis
de concreto do Midway Gardens (1913-14) denotam
esta influência, mas de forma bem mais abstrata.
Blake também faz uma leitura “maia” do Hotel
Imperial (1916-22), particularmente em relação ao
seu lay-out e aos blocos esculpidos de pedra
vulcânica oya.
A presença “maia” começaria a se firmar com o
friso do armazém A.D. German em Racine, Wisconsin
(1915-20) e que foi seguido pelo magnífico friso
“cubista” da prairie house F. Bogk House em
Milwaukee, Wisconsin (1916). Em nossa opinião,
os dois exemplos parecem inspirados levemente,
em proporção e grafismo, nos frisos da arquitetura
maia puuc do Palácio dos Governadores em Uxmal,
Yucatán (séculos VIII-IX). Já para Secrest, a arquitetura
dos dois edifícios lembra o Templo dos Três Lintéis
em Chichen-Itza, Yucatán (v. também a interessante
análise de Levine sobre a fase “maia”, pp. 141147).
Scully especula que a influência maia na obra inicial
de FLLW possa ter se manifestado a partir do trabalho
de arquiteto Bruce Price, cujo cliente Pierre Lorillard,
de Nova York, financiou as expedições de Désiré
Charney às ruínas maias (1857-1882). As expedições
foram divulgadas em publicação de grande porte
com muitas ilustrações: Les Anciennes Villes du
Nouveau Monde (1885) seguida por uma edição
americana em 1885. Dimitri Tselos não encontra
evidências de que Wright tenha sido inspirado pelo
trabalho de Price e acha improvável que a publicação
de Charney tenha tido impacto sobre o arquiteto,
levando em conta a imensa exposição de arte
r sco
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pré-colombiana na Exposição Mundial de Chicago
de 1893.
Concordamos com Tselos, mas pessoalmente
consideramos possível que Wright talvez tivesse
conhecimento sobre a arquitetura maia ainda antes
de 1893. As ruínas maias foram descobertas e
exploradas pela primeira vez por John Lloyd Stephens
e Frederick Catherwood, na rocambolesca expedição
em Honduras (1839). Stephens publicou suas
descobertas no hoje clássico Incidents of Travel in
Central America, Chiapas and Yucatan (1842),
seguido pelo álbum de desenhos de Catherwood,
que mostraram as ruínas maias pela primeira vez
ao Ocidente. Ambos os trabalhos tiveram imensa
repercussão na época.
Já vimos que Wright mencionou, desde a infância,
a admiração pelas construções maias. O contato
inicial talvez tenha sido através do erudito clã dos
Lloyd Jones ou ainda através das bibliotecas da
Igreja Unitariana.
O referido ensaio de Dimitri Tselos é ainda uma
referência para esta questão. Trata-se de corolário
de outro ensaio paradigmático do autor, Exotic
Influences on Frank Lloyd Wright (in Magazine of
Art, 47:4, 1953, pp. 160-169 e 184). Tselos observa
várias evidências instigantes para a inspiração maia
em Wright, além das casas do período 1923-24.
Por exemplo, o curioso capitel das colunas da arcada
do hall da William Winslow House, que possui um
desenho piramidal, e que lembra um ornato tipo
“métopa” do friso do “Convento” de Uxmal
(apontado a Tselos por Kathryn Johnson); há também
similaridades entre alguns espaços do FLLW Home
and Studio em Oak Park e alguns edifícios de
Chichen Itzá. Além disso, haviam curiosos ornatos
em Midway Gardens que teriam sido inspirados
nos grafismos de um baixo-relevo do Templo do
Sol em Palenque. Tselos também aponta a “cabeça”
maia cubista no friso da Bogk House.
O designer e arquiteto streamline Norman Bel
Geddes colaborava na época como cenógrafo para
os projetos teatrais de Barnsdall e conheceu Wright
durante o período da obra. Para ele, a Hollyhock
House parecia “um palácio em miniatura de alguma
civilização antiga” (v. Levine, p. 129).
artigos e ensaios
16
Natureza, arqueologia e medievalismo: influência romântica na obra de Frank Lloyd Wright
Particularmente, acreditamos que, na Hollyhock
House, os frisos e platibandas pré-moldados com
motivos florais abstratos apresentam um arranjo
similar aos dos ornatos de pedra do Palácio dos
Governadores em Uxmal (que, tal como esta casa,
está implantada no topo de uma colina) ou das
ruínas de Kabah (Yucatán). Há paredes internas
inclinadas, como realmente ocorre nas pirâmides
e no Arco de Pedra em Labná (Yucatán).
Apesar destas evidências, a historiografia wrightiana
atual põe em certa dúvida a presença “maia” na
Hollyhock House. Lloyd Wright Jr., filho de FLLW e
sócio dele na fase californiana, argumentou que
este projeto foi inspirado nos pueblos indígenas
do Sudoeste. Lloyd Wright foi colaborador de Irving
Gill quando este fez um projeto habitacional em
estilo Pueblo Revival em 1912-13 (Levine, p. 455).
disponível para uma arquitetura nova nos EUA,
que ainda vivia a febre do Classic Revival. Irving
Gill (ex-companheiro no escritório de Sullivan),
Rudolph Schindler e seu filho Lloyd Wright já estavam
lá desde 1922.
As origens do sistema textile-block sempre estiveram
envoltas em mistério e controvérsia, talvez devido
à falta de interesse num período que foi, durante
algum tempo, considerado como “menor” na obra
de Wright, por muitos autores. Arquitetos e
historiadores do Movimento Moderno nos anos
50-60 viam a fase “maia” como um equívoco
anacrônico – dada a profusão de ornamentos dos
blocos de concreto.
O conceito definitivo deste sistema de blocos
armados viria depois de iniciada a construção de
Levine também mostra que Wright sentia no
“caráter primitivo” da arquitetura maia “a mais
pura afinidade com a natureza elemental” e utilizou
“(...) a escala poderosa de suas construções
horizontais de pedra” como a expressão natural
das “vastas perspectivas” propiciadas pela “árida,
ensolarada costa da Califórnia.” (p. 141) Assim,
para Levine, na Hollyhock House, a arquitetura précolombiana inspirou mais do que apenas uma
expressão de monumentalidade, como no Armazém
AD German ou na Bogk House. “Em Los Angeles,
tornou-se modelo e um equivalente das formas da
própria paisagem.” (idem)
Por fim, temos a monumental lareira de concreto
da Hollyhock House, que alude a quatro elementos
primitivos sagrados: água, fogo, terra e ar (céu),
através de uma clarabóia e um canal/espelho d’
água ao redor da lareira, arrematada por um
monumental baixo-relevo de Wright (que em si já
é uma obra-prima e objeto de muitas interpretações).
Levine levantou muitas hipóteses acerca desta lareira
inusitada (pp. 141-145), mas não há espaço aqui
para discuti-las.
A Hollyhock House foi construída durante o período
em que Wright morou no Japão (1915-22). Em
1923, Frank Lloyd Wright estabelece-se no sul da
Califórnia. Lá, junta-se a uma pequena comunidade
de arquitetos vanguardistas que estavam tentando
prosperar no que parecia ser o último território
r sco
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La Miniatura, a primeira textile-block house (192324), conforme mostrou R. Sweeney em Wright in
Hollywood (1994), o primeiro grande estudo sobre
esta fase da carrreira de FLLW.
Dada a rica ornamentação dos blocos, muitos
autores defendem que estes seriam uma expressão
industrializada do bloco artesanal de pedra oya do
Hotel Imperial. (desde a volta aos EUA, FLLW estava
às voltas com a elevação dos custos da mão de
obra de qualidade na construção civil, resultado
da I Guerra Mundial). Além disso, o arquiteto já
vinha se interessando pela construção pré-fabricada
e industrializada desde o início do século. E, com
certeza, o baixo-relevo formado pelos blocos reforça
os sentidos de unidade e plasticidade tão caros a
Wright. Para Argan, o “geometrismo abstrato” dos
ornatos californianos indicava uma tentativa de
chegar a “uma definição construtiva, orgânica da
mais imaterial e mais livremente cósmica das
matérias, a luz” (op. cit., p. 276)
O termo “fase maia” surgiu devido a uma pretensa
similaridade de volumes e texturas dos blocos entre
estas obras e a arquitetura maia. Mas, em detalhe,
percebemos que quase nada existe de inspiração
maia direta. De fato, o textile-block era em si um
dos vários sistemas de pré-fabricação in situ da
época. A compreensão desta arquitetura passa
obrigatoriamente pela questão da racionalização /
artigos e ensaios
17
Natureza, arqueologia e medievalismo: influência romântica na obra de Frank Lloyd Wright
pré-fabricação em canteiro. O textile-block não é
uma vertente historicista de fundo decorativo, mas
um sistema construtivo industrializado.
Mesmo em relação ao aspecto ornamental dos
blocos, não há correspondência literal entre os
grafismos presentes nas cinco casas e, por exemplo,
os entalhes de pedra do Palácio dos Governadores
de Uxmal. Isto não causa surpresa pois Frank Lloyd
Wright era, de fato, obcecado com o ideal de
originalidade.
A referência “maia” seria mais sutil. Por exemplo,
Tselos assinalou a presença de um motivo
ornamental em forma de cruz gamada no baixorelevo do bloco quadrado de concreto maciço ou
vazado da Alice Millard House (Pasadena, Califórnia,
1923). A origem pré-colombiana deste motif foi
revelada a Tselos através de um incisão idêntica
que ele encontrou num selo cilíndrico maia
encontrado em Tlatilco, México, e que agora está
exposto no Milwaukee Museum (Tselos, p. 67).
Entretanto, Meryle Secrest também aponta que o
motivo gráfico da cruz gamada já tinha sido utilizado
por Wright anteriormente (em uma versão inicial
de dua marca-símbolo, por exemplo, onde a cruz
está inscrita num quadrado vermelho) e sua origem
poderia remontar à cruz céltica de quatro pontas
iguais (p. 134). Pessoalmente, acreditamos que
ambos estão corretos – a inspiração pode vir de
muitas fontes, conscientemente ou não.
Outra hipótese interessante levantada pelo Prof.
Tselos é a similaridade de arranjo volumétrico, em
planta, entre a Unity Temple (1904) e de dois templos
ligados por um elemento de transição no complexo
Arroyo (em ruínas) da cidade maia de Mitla (p. 67).
Para ele, a adaptação da arte pre-colombiana já
por volta de 1895 revela uma abertura precoce a
um primitivismo romântico ou uma abertura étnicocultural inusitada que precede em uma década a
“descoberta” e assimilação da arte primitiva africana
pelos artistas europeus de vanguarda (p. 62).
A evolução dos motivos ornamentais utilizados por
Wright, desde as prairie houses até as usonian
houses e passando pela fase maia, revela um
processo de abstração formal dos temas figurativos,
através de uma operação de depuração contínua
da realidade até atingir uma geometrização essencial
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da figura (até chegar, por exemplo, na figura
“cubista” do friso da Bogk House). Wright admirava
a arte japonesa, e em particular as gravuras ukiyo-
e, pois descobrira justamente nela a manifestação
concreta da geometrização que buscava.
Tselos também comenta a similaridade vista por
Scully entre a coluna cretense e a da sede da S.C.
Johnson and Son, Inc. Administration Building. Este
edifício, mais conhecido como Johnson Wax
Administration Building, foi construído em Racine,
Wisconsin (1936-39). Apesar da elegância
aerodinâmica da volumetria, ao adentrar-se o
pavilhão, o olhar do observador é logo atraído pela
elegância ainda maior do esguio pilar-cogumelo,
denominado por Wright como coluna dendriforme.
O design inusitado da coluna é considerado como
uma metáfora orgânica da natureza. Basicamente
possui uma configuração que lembra um cogumelo,
com tronco afunilado na base e um fuste em forma
de tronco de cone, sem ábaco e equino. Há
tubulações dentro da coluna para conduzir água
pluvial. Wright denominava o capitel da coluna de
pétala e o fuste, de cálice.
Para Tselos, a similaridade faz sentido e pode ser
indicativa do fenômeno de que nada se perde na
memória visual de um arquiteto criativo (p. 71) –
como no caso da cruz gamada, diríamos. Mas este
autor afirma que a analogia é uma explicação
insuficiente para a coluna-cogumelo – mostrando
que, com as repetidas referências de Wright à sua
“árvore”, a transição escalonada do fuste e o capitel
em forma de disco não podem ser nada além da
abstração de uma planta, como a palmeira
californiana tão familiar a FLLW. Se a forma cônica
do fuste, conclui Tselos com razão, foi motivada
pela coluna minoana, ou pelo desejo de aumentar
a área útil do escritório, ou para conquistar uma
sensação de leveza formal, ou ainda pela
surpreendente novidade da inversão da coluna
toscana – ainda é uma questão em aberto.
Vincent Scully em Frank Lloyd Wright (1960)
desenvolve a idéia de que Wright teria tido influência
da arquitetura cretense (civilização minóica-micênica),
e da tradição “mediterrânea não-grega”. Segundo
Scully, “Está claro que Wright sempre conheceu e
admirou a arquitetura cretense desde as primeiras
artigos e ensaios
18
Natureza, arqueologia e medievalismo: influência romântica na obra de Frank Lloyd Wright
publicações dela por Evans, que surgiram desde o
fim do século dezenove em diante e por todos os
anos iniciais de Wright”. Scully com certeza se refere
ao arqueológo sir Arthur Evans – curador do
Ashmolean Museum em Oxford – que escavou e
preservou as ruínas de Knossos (1900-01).
Entretanto, os numerosos textos escritos por Wright
mal citam as ruínas de Knossos. A autobiografia
de FLLW dá importância muito maior à influência
oriental. Todavia, no ensaio The Heritage of
abundante na época, e que Wright apreciava).
Grandes vãos foram vencidos pelos imensos caibros
inclinados de redwood, cujos cotovelos estão
ancorados em gigantes de concreto ciclópico. Estes
pesados caibros sustentam a cobertura de lona
que banha o estúdio de luz suave.
Wright (1961), Scully insiste de novo na presença
de uma inspiração mediterrânea mas nãohelência em Wright na última fase de sua
carreira, nas formas arquitetônicas da
Antiguidade em Creta, Malta, Sardenha e na
Roma de Adriano (p. 12).
Desta forma, apesar da forte expressão formal e
estrutural da arquitetura, Taliesin West se insere
na paisagem através das texturas e cores terrosas
dos materiais aparentes: sienna, russet (castanhoavermelhado), burnt umber (umbra queimada),
Como mostramos em nossa tese, a árvore era
símbolo e inspiração arquitetônica para Wright
(Levine desenvolve esta questão detalhadamente
no Cap. 8, pp. 472-473). Em sua autobiografia (p.
362), FLLW associa um elemento vegetal como
símbolo cultural para cada cultura antiga – o lótus
para os egípcios, a madressilva para os gregos, o
acanthus para os romanos; e mantém a esperança
de que o florescer de uma cultura orgânica na
atualidade tenha como símbolo cultural a árvore.
Na coluna-cogumelo a unidade entre arte e natureza
é levada à estrutura como metáfora, e não mais
como ornato.
O projeto da sede da Johnson Wax Company foi
antecedido pela implantação de Taliesin West, talvez
a menos valorizada entre os projetos de Wright da
fase final de sua carreira. As origens e a evolução
da sede de inverno da Taliesin Fellowship são bem
conhecidas e remontam ao acampamento Ocatillo
montado por Wright nos arredores de Chandler,
Arizona, no fim dos anos 20. Taliesin West foi
construída aos poucos, a partir de 1937, num
sítio remoto de 800 acres em Paradise Valley no
Arizona, perto de Scottsdale e Phoenix. Tal como
a residência-estúdio de Oak Park e Taliesin Spring
Green, era uma obra aberta, um work in progress
que foi ampliado e modificado até seu
falecimento.
Não é possível apreender o projeto de Taliesin West
de imediato na medida em que trata-se de um
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complexo de edifícios agrupados num sítio remoto
agreste e selvagem. Os principais pavilhões, como
o estúdio de arquitetura, foram construídos de forma
austera, com poucos materiais: lona, concreto, rocha
local e redwood (uma variedade de sequóia, mais
verde-oliva, areia, etc. Mas a arquitetura permanece
tão proeminente quanto os volumes de pedra
dos pueblos do Colorado, Arizona e Novo
México. Neste sentido, é uma legítima continuação da Taliesin I.
Com as grelhas sobrepostas, Wright trabalha com
eixos ortogonais e diagonais definindo volumes,
espaços abertos e fechados, circulações e vistas da
paisagem. Levine mostra que FLLW procurou aos
poucos amarrar a arquitetura à paisagem
circundante através da articulação e alinhamento
dos eixos aos marcos da topografia e os sítios préhistóricos do entorno. Ou seja, os eixos estão
alinhados com a paisagem e a memória histórica
da região. Em algumas articulações axiais, Wright
posicionou petroglifos pré-históricos encontrados
ao redor e pedras similares a menires (uma tradição
celta, mostrando que FLLW não queria apenas aludir
a civilizações ameríndias). Os petroglifos do sítio
original são provavelmente vestígios da civilização
pré-colombiana hohokam, e que foram incorporados
ao projeto.
Assim, temos em Taliesin West não apenas a
manifestação concreta do sentido de unidade entre
homem e natureza, como também a ponte com as
“arquiteturas da terra” pré-históricas e précolombianas que admirava. Com os eixos de
implantação amarrando espaços com as montanhas
e os marcos pré-históricos, Wright também invoca
os espaços druídicos da cultura celta. Assim, Wright
procura inserir Taliesin West dentro do continuum
artigos e ensaios
19
Natureza, arqueologia e medievalismo: influência romântica na obra de Frank Lloyd Wright
histórico e cultural do sítio e da própria memória
e história de seus antepassados (v. Levine, 255297).
propostas como a Broadacre City e Living City –
uma nova relação harmônica entre sociedade, cidade
e campo.
Em sua nova sede no Arizona, com seus alunosaprendizes da Taliesin Fellowship, Frank Lloyd Wright
preparou sua visão definitiva para a solução dos
problemas urbanos: Broadacre City, ou o abandono
das cidades em favor do retorno ao campo a partir
de novos sistemas econômicos de produção e de
gestão pública (USONIA) – uma “cidade” antiurbana. Apesar de estar configurada como uma
proposta arquitetônica, econômica e política, tratavase da visão de um artista apontando seu caminho
para o futuro, uma utopia no sentido original de
Thomas Morus, o “lugar nenhum”. A Broadacre
City é uma proposta que ignora a história da
cidade, que rejeita o próprio conceito de cidade
e de ocupação histórica do território – a
legitimação das diferentes camadas de ocupação
ao longo do tempo. Vale também mencionar a
Broadacre City em função da invocação
wrightiana da imersão do homem com a
Natureza (Culto à Natureza de Lorde Clark).
Frank Lloyd Wright sempre procurou voltar-se para
as raízes de sua terra, não somente de forma épica
e lírica, mas também crítica. Nunca deixou de criticar
os aspectos negativos que julgava ver em seus
compatriotas e nas atitudes de seus governantes,
desde o racismo e a intolerância religiosa até a
Guerra Fria (como unitariano, era pacifista convicto)
– frequentemente causando estranheza e rejeição.
A chave para a compreensão do conceito da
Broadacre City estaria em Thomas Morus e William
Morris. Wright assumiu que o termo USONIA veio
do romance de Samuel Butler, Erewhon , uma
fantasia futurista popular na época. O título é o
avesso de nowhere, lugar nenhum, utopia. Por outro
lado, William Morris escreveu em 1892 outra obra
de ficção futurista, News from Nowhere (de novo,
a utopia), onde imagina uma Londres do futuro
(“1962”) – como um amontoado de aldeias sem
fábricas, um idílio pastoril onde a população se
dedica a trabalhos criativos e artísticos, com o Tâmisa
despoluído, sem as indústrias poluentes e
desumanas (v. Schorske p. 123).
Se a Broadacre City é de fato apenas um discurso
de um visionário, podemos também sentir a
atualidade da mensagem desta proposta nos dias
de hoje, quando tantos pensadores e ambientalistas
advogam um sistema econômico coerente com o
meio-ambiente, a sociedade e a cultura – embora
termos como “ecologia” (em sua conceituação atual)
e “sustentabilidade” ainda não existissem nos anos
30-50. Muito antes dos ecologistas pioneiros dos
anos 50-60, Wright já advogava – através de
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Numa cultura suspeitosa do ícone e sem passado
grandioso, como disse Hughes, a Natureza
preencheu vários espaços e a pintura de paisagem
teve conotações espirituais. Frank Lloyd Wright, filho
dessa época, faz a unidade entre paisagem natural,
ser humano e construção, evocando, na arquitetura,
Emerson, Thoreau, Whitman, Gray, Morris, Ashbee,
Wagner e Bierstadt. Rompe com o cânone europeu
em busca de fontes de inspiração que mantivessem
uma relação mais íntima e direta com as forças
místicas da Natureza, da terra bruta, como a arte
medieval, a cultura celta, a arquitetura maia e
indígena, a arte e o design japonês.
Carl Schorske observa que Wagner e Morris não
conseguiram vencer os dragões contra os quais
lutavam: a fábrica inglesa ou o Estado alemão, “mas
as visões que tinham em sua busca quixotesca,
visões penetrantes das necessidades sociais e
psicológicas da civilização do século XIX, essas estão
vivas até hoje” (p. 123).
Da mesma forma que Morris e Wagner, Wright
também não conseguiu impor sua visão organicista
e pacifista junto à indústria e o Estado. A luta
quixotesca de Wright contra os males da sociedade
e da metrópole industrial espelha as batalhas e a
herança de Morris e Wagner: se a visão wrightiana
para os problemas urbanos foi considerada utópica
e romântica, estes só aumentaram de escala e
complexidade desde então. FLLW não foi
compreendido e talvez ainda não seja compreendido
por grande parte de seus conterrâneos, embora
tenha se tornado cada vez mais popular e
reverenciado nos últimos vinte anos – o que mostra
que, afinal, a História quiçá esteja fazendo justiça
a seu legado.
artigos e ensaios
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Natureza, arqueologia e medievalismo: influência romântica na obra de Frank Lloyd Wright
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