Projeto de Lei 549/2010 - Lula aprofunda política do estado mínimo e propõe
congelamento salarial para o funcionalismo.
Paulo Barela
Oposição ASSIBGE-SN
Membro da Secretaria Executiva da Conlutas
No crepúsculo do ano passado, o governo Lula conseguiu aprovar no Senado Federal o PLS-611/2007
(antigo PLP-001/2007), que restringe os recursos orçamentários para despesas com pessoal e estabelece
novos limites de gastos com o funcionalismo na Lei de Responsabilidade Fiscal. Leia-se: limitação de verbas
para reajuste no salário do funcionalismo (congelamento salarial), redução de novas contratações para o
quadro de pessoal (concursos públicos) e em investimentos na máquina administrativa.
A limitação corresponde a um gasto máximo com pessoal, não superior a correção do Índice Nacional
de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA-IBGE) somado a 2,5%, ou ao percentual de crescimento do PIB
(Produto Interno Bruto), o que for menor. Se aprovado, o PLS 611/07, agora como PLP-549/2010, impedirá
qualquer reajuste, já que os limites propostos no projeto são inferiores ao crescimento vegetativo das folhas,
com progressões, reposição de servidores que se aposentam e outras despesas. O projeto agora segue para a
Câmara dos Deputados e, se aprovado, vai para sanção presidencial. Caso rejeitado ou alterado volta para o
Senado para nova apreciação.
No Brasil, os governos, a imprensa e a classe dominante – empresários, banqueiros e latifundiários –
costumam responsabilizar os servidores públicos pelos problemas econômicos do país e, invariavelmente,
atribuem-lhes a culpa pelo déficit nas contas publicas e no sistema previdenciário. No entanto, seja em
relação ao número de trabalhadores desse setor em comparação ao total da população, e mesmo na média
salarial, se relacionada aos países desenvolvidos da Europa e América do Norte – como nos mostram as
tabelas e gráficos abaixo – é possível observar, com toda a clareza, que essa ladainha não passa de
propaganda enganosa para desmoralizar o funcionalismo público diante da população. O objetivo, é claro,
levar a cabo medidas que congelam seus salários e reduzem seu efetivo, a partir de medidas ditas de
“austeridade”.
Países
selecionados
Servidores
Públicos adm.
Central¹
População (2000) / Servidores / 1000
1000 hab
hab.
Alemanha
501.700
82.160
Áustria
169.003
8.110
Canadá
336.603
30.689
Coréia
563.682
47.962
Espanha
770.956
40.264
EUA
2.770.000
282.194
Finlândia
125.481
5.176
França
2.270.100
59.013
Hungria
277.894
10.211
Irlanda
207.926
3.790
México
835.007
98.658
Brasil (2000)
964.798
172.540
Brasil (2006)²
997.739
187.850
Fontes: OCDE; IBGE; Boletim Estatístico de Pessoal (SRH/MP)
Elaboração: DISOC/IPEA
Notas: (1) Inclusive Forças Armadas
(2) Inclusive empregados de empresas públicas e de economia mista
TD 1319 IPEA jan 2008.
6,10
20,84
10,97
11,75
19,15
9,82
24,24
38,47
27,22
54,86
8,46
5,52
5,32
Servidores / 1000
hab. Outros países
/ Brasil
1,11
3,78
1,95
2,09
3,41
1,78
4,31
6,83
4,83
9,74
1,53
Brasil tem menos servidores públicos que a Média Internacional
O IPEA tem feito estudos a fim de montar uma radiografia do Emprego Público no Brasil. Comparando-se
os resultados disponíveis até agora com o resto dos países do mundo, desenvolvidos ou não, os resultados
são esclarecedores e surpreendentes, como se pode ver abaixo:
Fonte: IPEA/DISOC/NINSOC – Núcleo de Informações Sociais PNAD/Tabulações Especiais.
O gasto público nos países organizados absorve uma quantidade de recursos nunca menor do que
cerca de 45% do Produto Interno Bruto e, em muitos países, esse percentual é bem superior a 50% do PIB.
No Brasil, o setor público, incluído a União, os Estados e os Municípios, absorve cerca de 20% a 25% do
PIB. Quando nos referimos aos gastos de pessoal, os números são ainda mais conclusivos, como podemos
observar na tabela que segue. Ainda que os números sejam do final da década 90, por falta de um estudo
comparativo mais atualizado, o fato relevante é a espantosa discrepância verificada entre os gastos com
pessoal no Brasil e vários países do mundo.
Despesa com Pessoal como percentagem do PIB nominal
Final década de 90
País
Austrália
Canadá
França
Alemanha
Itália
Espanha
Suécia
Estados Unidos
Brasil
%
11,5
12,5
14,4
10,0
11,8
11,3
17,6
9,6
5,4
Fonte: OECD e Consultoria de Orçamento e
Fiscalização
Financeira
da
Câmara
Federal
Porém, em uma tabela mais recente, referenciada no ano de 2008, mas que restringe a análise
comparativa à apenas alguns países da Europa, podemos ter uma idéia mais clara do comportamento dos
gastos com pessoal brasileiro em relação aos mesmos gastos no continente europeu.
Despesa com salários dos servidores públicos como percentagem do PIB nominal
Brasil na comparação com a Europa – Ano de 2008
País
%
Portugal
Noruega
Dinamarca
Grécia
Itália
Espanha
Suécia
Reino Unido
Europa
13,6
11,9
16,9
10,8
11,0
10,0
15,7
11,2
20,6
Brasil
5,0
Fonte: EUROSTAT
Dez anos de congelamento salarial e precarização do trabalho público
O projeto, aprovado sorrateiramente pelo Senado, traz como conseqüência, não apenas o arrocho
salarial e a precarização das relações de trabalho – prejuízo inegável e irreparável para os trabalhadores
públicos – mas também aprofunda a já combalida e frágil prestação de serviços à população pobre brasileira,
que necessita desses mesmos serviços. É a política do Estado Mínimo, idealizada pelo neoliberalismo a partir
de Collor, no início da década de 90 e levada às últimas conseqüências por Fernando Henrique Cardoso em
seus dois mandatos na Presidência da República. No entanto, para surpresa da maioria dos funcionários
públicos desse país, Lula seguiu a cartilha de seus antecessores e aprofundou essa política, aplicando o
mesmo receituário à serviço dos interesses das oligarquias empresariais de nosso país, do FMI e do
imperialismo.
Para bem ilustrar essa análise, tomemos o exemplo do estudo feito pelo economista Washigton Lima
¹, que elaborou um cálculo retroativo desde 2000 até 2009, portanto por dez anos, utilizando os critérios do
projeto. Nesse estudo, Lima comprova que a folha de pagamento da União seria reduzida em R$ 38,8
bilhões, passando de R$ 153,1 bilhões, que foi o valor liquidado em 2009, para R$ 114,2 bilhões. Ou seja, o
valor da remuneração de cada servidor, ativo ou inativo, deveria diminuir em mais de um quarto ou, mais
precisamente, em 25,37%. Significa afirmar hoje, que se um servidor ganha R$ 1.000,00, sua remuneração
deveria ser de R$ 746,31 se o PLS-611/07 (ou PLP-549/10) tivesse sido aplicado nos últimos dez anos.
Evidentemente, esse é um cálculo que considera a involução média dos salários da União, não considerando,
portanto, as variáveis entre os Três Poderes, entre si, e também em relação às Três Esferas.
Comportamento da Folha de Pagamento e Salários da União
Aplicação hipotética do PLS-611/07 (2.000 x 2.009)
Variáveis
2000
2009
Perda
Redução %
Folha Pagamento União
R$ 153,1 bilhões R$ 114,2 bilhões R$ 38,8 bilhões
25,37
Salário 1
R$ 1.000,00
R$ 746,31
R$ 253,69
25,37
Salário 2
R$ 7.000,00
R$ 5.224,10
R$ 1.775,90
25,37
Conlutas apóia o calendário da CNESF e aponta unidade nas três esferas
A derrota sofrida pelos servidores no Senado foi apenas uma batalha em meio a guerra que a CNESF
– Coordenação Nacional das Entidades dos Servidores Federais, sindicatos, federações e associações
representativas já começam a desenvolver para derrubar o projeto. No último dia 09 de fevereiro, a CNESF
realizou sua primeira reunião neste ano e aprovou uma série de medidas para promover a mobilização dos
servidores na luta contra o projeto. Faixas, adesivos, cartazes e cartas-abertas estão sendo confeccionados
para dar ampla divulgação ao conteúdo perverso da proposta do governo. Ao mesmo tempo, o calendário de
mobilização aprovado aponta para ações nos estados e em Brasília e uma grande plenária nacional do
funcionalismo federal em 14 de março.
As medidas da reunião estão corretas, mas também é fundamental e necessário construir a unidade
entre as organizações das três esferas do funcionalismo público para ampliar essas ações no Congresso
Nacional e fortalecer a luta na base das categorias, promovendo atos públicos e mobilizações unitárias para
exigir de Lula a retirada desse nefasto projeto e pressionar os parlamentares na Câmara dos Deputados contra
sua aprovação.
A CONLUTAS esteve na reunião da CNESF em Brasília e vai estar na vanguarda das ações contra a
aprovação do PLP-549/2010. No mesmo sentido, as entidades e oposições da CONLUTAS, representativas
das três esferas do funcionalismo público, devem incorporar em suas pautas de discussão, a mobilização e
elaboração de um calendário de luta conjunto para enfrentar a proposta do governo Lula, mas que também é
apoiada por prefeitos e governadores.
- Exigir de Lula a retirada imediata do PLP-549/2010;
- Total apoio ao calendário de mobilização da CNESF e unidade das três esferas (municipais, estaduais e
federais) para derrotar essa proposta de arrocho salarial
- Desenvolver ações na Câmara de Deputados pela não aprovação do projeto.
São Paulo, 12 de fevereiro de 2010.
¹ Em entrevista, por email, concedida ao jornalista Hélcio Duarte Filho, do Luta Fenajufe Notícias.
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