TV: SABER DEMOCRATIZADO OU
DIVERTIMENTO SEM QUALIDADE
FRANCISCO RUI CÁDIMA
Será a televisão o objecto mais democrático das
sociedades democráticas ou o objecto mais
totalitário das sociedades totalitárias?
Os efeitos da televisão na segunda metade
do
século
XX
são
extremamente
complexos e de natureza multimodal.
«A televisão não é
boa
nem
má,
depende do uso que
se faça dela.»
Marcelo Caetano
Contexto
• A televisão entrou nas nossas vidas como um
dos
mais
poderosos
instrumentos
de
entretenimento e informação.
• Quando a televisão começou, nos anos 30, a
grande inquietação era saber se constituiria um
progresso civilizacional ou se seria a
decadência.
Hoje, essas questões permanecem.
A televisão foi o primeiro meio
de comunicação que
submergiu a aldeia global sem
que esta a pudesse, em boa
parte, entender. Mas desde
cedo se compreendeu a sua
importância:
– Havia exemplos de uso
amigável do aparelho, mas
também de “ódios de
estimação”.
– A chegada da publicidade
não se fez sem forte
oposição
– No início dos anos 60 um
legislador do estado da
Califórnia
inscreveu
a
televisão na lista dos
«objectos
de
primeira
necessidade».
Kennedy em 1961 convida todos os países a
participar na organização de um sistema por
satélite “para concorrer para a paz mundial e
para a fraternidade entre os povos”.
De Gaulle afirmava a sua
esperança de ver a nova
tecnologia contribuir para
“as relações entre os
povos, para a sua
compreensão recíproca,
para a sua amizade,
alguma coisa que será
provavelmente decisiva
na evolução da história e
do relacionamento entre
os homens”.
Actualmente que balanço fazer da presença
massificante da televisão?
– Mutação no plano da mentalidade e dos
comportamentos
– Miscigenação ou mesmo aculturação a novos
padrões de vida
– Mutações sociais e políticas
– Emancipação da opinião pública
– Espectacularização do real
– Negação do acesso e dos particularismos
– Aculturação por “empréstimo”
– Abuso de violência
– Desautorização e desafio de valores tradicionais
– Atribuição de notoriedade ao prevaricador
Várias personalidades que conferiram à televisão
uma importância civilizacional começam a
descobrir o seu lado negro
o Arthur Clarke, criador da Mundivisão: «a
televisão era pior que a bomba...»
o Portugal: um responsável do Instituto Piaget
propôs a suspensão temporária das emissões
às horas das refeições
o Gerald Long, antigo director do Times:
chamava à televisão uma «chaga da
sociedade»
A questão da privacidade
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A televisão dos anos 90 é a
televisão da convivialidade, da
participação,
das
grandes
audiências. Surgem programas
cujos temas podem ir desde
alguém que procura um familiar,
que declara o seu amor a outrem,
que pede perdão em directo ou
casos limite como o incesto e o
sexo.
A
televisão
tornou-se
algo
demasiadamente familiar, mais
íntima do que as pessoas com as
quais se compartilha a vida de
todos os dias.
Transforma-se a esfera do íntimo
no verdadeiro show do real –
surgimento dos reality shows.
Existem três modos de encarar
este tipo de programas:
– Denegar e criticar, ser totalmente contra
– Ponto de vista do telespectador passivo, que
contribui para as audiências
– Constatação da existência do problema,
necessidade de reflexão
Verifica-se actualmente uma inversão
perversa na partilha do espaço público: o
facto dos excluídos sociais ascenderem à
primeira página não significa que lhes
esteja a ser dada uma voz. Significa
apenas que foi criada uma forma de
reparação dessa exclusão: enquanto ela
não é resolvida no plano da educação e
na sociedade, a televisão vai criando as
suas ilusões.
A Questão da Violência e do Sexo
• Segundo a linha mais conservadora da sociedade
americana, é imperioso que as principais redes de
televisão passem a emitir, em horário nobre, séries
televisivas dirigidas à família.
• Em Portugal, a partir de Fevereiro de 1997, a Alta
Autoridade para a Comunicação Social e os operadores
de televisão assinaram um protocolo em que se
comprometem a respeitar regras elementares face à
questão da violência na TV.
• Len Masterman considera ser vital para a democracia
que as mensagens dos media possam ser
descodificadas pelo espírito crítico do cidadão.
Televisão versus Poder
 De uma forma geral,
a televisão sempre se
deu bem com o
poder. Uma relação
demasiado estreita ou
um afastamento total
entre
política
e
televisão pode ser
fatal para a política.
Serge Moati propôs à TF1 um projecto que se
chamava «O Ringue»: dois políticos deviam
afrontar-se perante as câmaras, em directo,
precisamente no ringue de boxe do ElyséeMontmartre.
• Debates Nixon-Kennedy 1960
– a imagem dos candidatos foi
determinante para a escolha
do
Presidente.
Também
pequenas alterações do tipo
técnico podem condicionar
enormemente uma prestação.
• No
passado
a
gestão
televisiva da política fazia-se
num registo de teatralidade e
de marketing político. Agora, a
tendência
é
para
a
exteriorização convival do
protagonismo
e
da
performance. Exemplo: Canal
Parlamentar.
Teoria da recepção
• Estudo do impacto dos programas num público que já não é um
simples consumidor do discurso dominante, mas participa na
construção do sentido. Implica:
– Análise das práticas de ver televisão e da competência do
telespectador em integrar uma estética da recepção
– Ver como a recepção organiza o texto
– Pensar a recepção como apropriação, ou seja, compreender os
efeitos do ficcional no real de cada espectador.
– O audímetro não foi destinado a medir a experiência da
audiência, mas apenas a contabilizar o número de
telespectadores.
Parâmetros pelos quais se devem reger as rádios
e as televisões públicas europeias, à luz do
Conselho da Europa e do Parlamento Europeu:
– Ser uma referência para o público, factor de coesão social e de
integração de todos os indivíduos, grupos e comunidades
– Fornecer um fórum de discussão
– Difundir informações e comentários imparciais e independentes
– Desenvolver uma programação pluralista, inovadora e
diversificada correspondendo a normas éticas
– Estruturar grelhas de informação para um largo público sem
descurar as minorias
– Contribuir, graças à programação, para um melhor
conhecimento e apreciação da diversidade do património
cultural nacional e europeu
– Alargar a escolha de que dispõem os telespectadores e os
ouvintes
• Os operadores privados
também têm de responder
a algumas exigências,
nomeadamente ao nível
da programação cultural
• Diferentes concepções de
audiência:
– Normativa – o seu
objectivo
é
dar
conformidade a uma
norma cultural.
– Funcionalista
–
modificar as atitudes
e o comportamento
do público.
– Subjectivista
(tem
predominado
historicamente)
–
responder
às
necessidades
imediatas do público
na perspectiva de
venda de espaço
comercial.
– Para Meneer, existe uma incompatibilidade entre
«audiência» e «diversidade». Assim, o serviço público
deve ser complementar em relação aos difusores
privados, deve ter uma oferta variada, promover a
cultura local e ter em conta a sensibilidade do público.
– Os índices de audiência devem ser complementados
com estudos qualitativos: mais do que saber quantos
telespectadores viram um programa, importa saber a
razão por que o viram, a reacção ao que viram e
sobretudo a disponibilidade para o mundo de coisas que
não viram.
– Os estudos qualitativos em televisão devem possuir
dados sobre o agrado do público mas também procurar
definir modelos de programação que encontrem o
equilíbrio entre o agrado do público e a responsabilidade
de fornecer um serviço público.
Será que compete apenas às televisões públicas
programar conteúdos que promovam o acesso ao saber
e à cultura? Segundo o autor, a resposta é não, e
existem vários exemplos de obrigatoriedade das
televisões privadas também o fazerem.
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Susana Fernandes e Ana Cristina Cachola