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Revista Filosofia Capital
Vol. 6, (2011) - Edição Especial
Dossiê Søren Aabye Kierkegaard.
ISSN 1982 6613
OU UMA COISA OU OUTRA: UM ESTÁDIO NA
FILOSOFIA DE KIERKEGAARD
ONE OR THE OTHER: A STAGE IN KIERKEGAARD´S
PHILOSOPHY
Deyve Redyson
RESUMO
O presente artigo pretende fazer uma análise da obra Ou um Ou outro, A Alternativa do
pensador dinamarquês Søren Kierkegaard onde se manifesta uma estética que percorre sua
obra pseudonímica e seus estádios de vida entre o estético e o ético. Analisa também a
sedução, o amor e a ironia presentes nos escritos que envolvem os anos de 1843 a 1845.
Palavras-Chave: Estética; Amor; A alternativa.
ABSTRACT
The present article intends to do an analysis of the work Either/Or A Fragment of life, the
thinker Danish's Søren Kierkegaard where shows an aesthetics that travels its work
pseudonyms and its life stadiums between the aesthetic and the ethical. It also analyzes the
seduction, the love and the irony presents in the writings that involve the years from 1843 to
1845.
Keywords: Aesthetics; Love; Alternative.

Doutor em Filosofia (Oslo, Noruega) Professor adjunto da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) onde atua
nos Programas de Pós-Graduação em Filosofia e Ciências das Religiões. E-mail: [email protected].
Revista Filosofia Capital – RFC ISSN 1982 6613, Brasília, DF.
Edição Especial - Dossiê Søren Aabye Kierkegaard, vol. 6, 2011, p. 23-30.
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ISSN 1982 6613
1. Introdução
A obra de Søren Kierkegaard Ou um
Ou outro, A Alternativa1 de1843, é sem
dúvida um livro notável dentro da obra
deste
pensador
dinamarquês,
pois,
inaugurou a obra pseudonímica e nos
apresenta os estádios2 Estético e Ético. A
publicação desta obra, originariamente em
dois volumes, chocou a sociedade
dinamarquesa pela sua densidade e
paradoxidade, pois os dois volumes juntos
chegam a 800 páginas e é apresentada por
pseudônimos diferentes que desenvolvem
cada qual uma esfera de pensamento. Os
dois tomos de Ou um ou outro foram
publicados
simultaneamente
por
Kierkegaard aos 29 anos de idade na cidade
de Copenhague em fevereiro de 1843, após
sua volta de Berlim onde se decepcionara
com as aulas de Friedrich J. Schelling. A
obra tem o prefácio de um certo Victor
Eremita, que mais tarde escreverá um
discurso no banquete In vino veritas
publicado nos Estádios no caminho da vida
de 1845 que, aparentemente, é uma quase
continuação de Ou Ou, o livro segue com
os papeis de A e os papeis de B.
No prefácio de Victor Eremita, há a
descrição de como estes escritos e
apontamentos chegaram-lhe a mão, ele
narra um episódio de que comprara uma
1
Enten-Eller. Et Livs Fragment in Søren
Kierkegaard Skriffer (SKS) København. Gads
Forlag, 1998. Bind 2 og 3. Utilizaremos aqui além
da edição dinamarquesa as seguintes traduções:
Either/Or. Princenton: Princenton University Press,
1987, 2 vols; Entweder/Oder. in: Gesammelte
Werke. Düsseldorf/Köln, 1986 e O lo Uno o lo
Outro: Um Fragmento de Vida I e II. Madrid: Trotta,
2006-2007. Quando possível utilizamos algumas
traduções ao português.
2
A palavra dinamarquesa é Stadier que por ser
entendido (traduzido) como estágios, estádios,
estações ou etapas; a tradução alemã usa Stadier a
inglesa Stage a francesa Étaps e a italiana Stadi.
Aqui utilizarei Estádios.Veja-se também GREVE,
William.
Kierkegaads maieutische Ethik. Von
«Entweder / Oder II» zu den « Stadien». Frankfurt
am Main. Suhrkamp Verlag. 1990.
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escrivaninha em um antigo antiquário e
descobriu que em uma de suas gavetas
existia dois maços de papeis, que percebera
serem redigidos por dois autores diferentes,
daí os batiza de A e o outro de B. Os papeis
de A se iniciam com um melancólico
conjunto de aforismos intitulados de
Diapsálmata redigidos ad se ipsum, isto é,
para si mesmo, onde se vê a extrema
essência de Goethe, Lichtemberg e outros,
o pseudônimo A é o esteta, isto é, dá uma
grande ênfase a fantasia, ao embelezamento
das coisas e praticamente tem delírios, é
dele a autoria de Os Estágios eróticos
imediatos, ou o erotismo musical; O reflexo
do trágico antigo no trágico moderno;
Silhuetas; O Primeiro amor e o Diário do
Sedutor. Os papeis de B são o segundo
volume de Ou um ou Outro, este é o
pseudônimo do pseudônimo Juiz Wilhelm
que é o eticista, que nos exorta sobre o
matrimônio e a personalidade, dele atribuise a autoria de Da validez estética do
matrimônio e O equilíbrio entre a estética e
a ética, na verdade estes ensaios são cartas
de B para A, tentar convencê-lo de que a
vida ética é mais verdadeira que a estética.
2. A representação do estádio estético e
ético
O Estádio estético é a forma de vida
que existe. O esteta é aquele que vive
poeticamente, que vive de imaginação e de
reflexão. É dotado de sensibilidade delicada
que lhe permite descobrir na vida o que ela
tem de interessante e sabe tratar os casos
vividos como se fossem obra da imaginação
poética, isto é, num estado de embriaguez
intelectual. A vida estética é protagonizada
por Johannes o Sedutor no Diário do
sedutor que sabe colocar o seu prazer, não
na busca desenfreada do amor, mas na
limitação e na intensidade da satisfação.
Mas a vida estética revela sua insuficiência
“Todo o que vive esteticamente é um
desesperado, tenha ou não consciência
disso, o desespero é o último termo da
concepção
estética
da
vida”
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(REICHMANN, 1978, p. 125). A partir
desse desespero entende-se o ato de se fazer
a escolha. Quem desespera, escolhe de
novo e escolhe a si próprio dentro de uma
validade eterna. A vida ética nasce,
portanto, dessa escolha. Ela implica uma
estabilidade e uma continuidade que a vida
estética, como incessante busca da
variedade, exclui por si: a vida ética é o
domínio da reafirmação de si, do dever e da
fidelidade a si próprio: o domínio da
liberdade pela qual o homem se forma ou se
afirma por si. “O elemento estético é aquele
para o qual o homem é imediatamente
aquilo que é; o elemento ético é aquele para
o qual o homem se transforma no que se
transforma” (REICHMANN, 1978, p. 190).
Na vida ética, o homem singular sujeita-se
a uma forma, adequa-se ao universal e
renuncia a ser exceção. Tal como a vida a
vida estética é encarnada pelo sedutor, a
vida ética é encarnada pelo marido. O
matrimônio é a expressão típica da
eticidade. Enquanto que na concepção
estética do amor, duas pessoas excepcionais
só podem ser felizes por força da
excepcionalidade, na concepção ética do
matrimônio todos os esposos podem ser
felizes.
A característica da vida ética é a
escolha que o homem faz de si próprio. A
escolha de si próprio é uma escolha
absoluta porque não se trata da escolha de
uma qualquer determinação finita, mas a
escolha da liberdade (REICHMANN, 1978,
p. 228). Uma vez efetuada esta escolha, o
individuo descobre em si uma riqueza
infinita, descobre que existe em si uma
história onde reconhece a identidade
consigo próprio. Ao se encontrar nesta
escolha reconhece-se dentro destes aspectos
e arrepende-se. O arrependimento é a
última palavra da escolha ética, pois daí
atrela-se a religião, no sentido absoluto do
reconhecimento da própria culpa. Assim a
esfera ética busca até alcançar a vida
religiosa3. No entanto, não existe
continuidade entre vida ética e a vida
religiosa. Entre eles existe um enorme e
profundo abismo que Kierkegaard esclarece
em Temor e tremor que se situa entre o
estádio ético e o religioso (REICHMANN,
1978, p. 238) inaugurando a intitulada –
Religiosidade A – direcionando a vida
religiosa para Abraão.
Na parte de Ou ou intitulada
Silhuetas
passa-tempo
psicológico
Kierkegaard descreve a história da três
seduzidas que inspiram a intensidade da
ideia do valor estético que culminará no
matrimônio. As seduzidas seriam os
personagens de Maria Beaumarchais, Dona
Elvira e Margarida. Maria Beaumarchais é
a personagem da obra de Goethe Clavigo.
Clavigo abandona Maria, ela tenta se
convencer de que não mais o ama por conta
do sofrimento que a acomete, mais já é
tarde demais, pois ela o ama intensamente,
os outros que a vêem e a forma da qual
sofre tentam convencê-la do contrário, mais
é em vão. A personagem Maria fala da pena
que é sofrer, seria uma primeira forma de se
deixar seduzida, isto é, fazê-la sofrer por ter
perdido. A segunda é Dona Elvira de
Mozart, que é retirada do convento pela
sedução de Don Juan, que a seduz e em
seguida a abandona. Ao deixar o convento
Elvira percebe que perdeu o céu e ao ser
deixada por Don Juan perdeu o mundo,
logo restam apenas três alternativas; voltar
a religião, continuar amando Don Juan ou
se consolar em outro homem. Elvira prefere
continuar amando Don Juan e sofrer de
outro modo, o estar sempre amando que
não lhe ama. A terceira, Margarida, também
personagem de Goethe, mais desta vez de
Fausto. Fausto seduz Margarida de tal
forma que a faz pensar que ele a ama muito,
pois Fausto quer uma mulher que possa ser
3
Entre estes dois estágios conferir: Pulmer, K. Die
dementierte
Alternative.
Gesellschaft
und
Geschichte in der ästhetischen Konstruktion von
Kierkegaards «Entweder / Oder». Frankfurt / Bern:
Peter Lang. 1982.
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instalada em sua imediatidade, a perda é
terrível, a perda que Margarida sente
quando é deixada por Fausto é
necessariamente uma perda de si mesma,
pois ela entende que só existia por que ele a
fez existir, ele a fez se sentir como era, por
isso esta perda é a mais terrível. Uma coisa
é perder o seu amor por uma morte outra
coisa é ser abandonada, enganada ou traída
pelo seu amor. A dor neste caso é maior.
O detalhe é que o admirável elogio
ao casamento empreendido no volume II de
Ou Ou confronta-se com alguns termos de
Estádios no caminho da vida. Tal como no
plano estético provêm em grande arte da
presença da mulher, esse ser belo e
caprichoso que é tão difícil de fixar numa
relação definida. Dificuldade que atinge
aqui o paradoxismo se é verdade, como
Kierkegaard diz, que a mulher se situa ela
própria na vida estética e só se revela
plenamente na vida religiosa. Kierkegaard
trata o amor, como algo necessário para o
indivíduo, mas o amor tem artimanhas, isto
é, engana, faz sofrer, liberta e realiza as
pessoas. É efetivamente pelo fato de ter
muitas divisões que Kierkegaard se propõe
a investigá-lo.
No texto A validez estética do
matrimônio, que inicia o segundo volume
de Ou Ou, Kierkegaard apresenta o amor
em cinco partes: Os limites do amor
romântico, o Exame do matrimônio cristão,
Os porquês do matrimônio, O Mistério do
matrimônio e o Matrimônio como categoria
estética do amor.
O amor é assimilado por
Kierkegaard como o pensamento de
matrimoniar-se, unir-se em amor, por isso
que ele trata o amor como ponto
fundamental do matrimônio, mais se
questiona, qual matrimônio?
Segundo Kierkegaard, o amor
romântico baseia-se em uma ilusão e sua
eternidade no tempo; que se bem que esteja
intimamente convencido da constância
absoluta de seu sentimento, o cavalheiro do
amor romântico não tem, a seu respeito,
nenhuma certeza, porque até agora o
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buscou nas vicissitudes de um meio
totalmente exterior (KIERKEGAARD, s/d,
p. 27).
Kierkegaard também ironiza o amor
romântico: “... pelos quais um jovem,
encostado a janela de sua noiva, vê uma
moça passar na esquina, sente a ‘flechada’ e
se lança em se encalço. Porém, logo tropeça
com outra e assim tudo se repete”
(KIERKEGAARD, s/d, p. 26).
Estes são dois momentos do amor
romântico, um representa o seu limite e
outro a idéia de não o ter. Kierkegaard nos
faz pensar que este amor é solitário até o
momento de encontrar com o seu outro
“eu” solitário, isto é, o amor é uma união de
dois “eus” solitários, que resultado dará
isso? A solidão, isso porque Kierkegaard
afirma que o amor romântico baseia-se em
ilusão.
Ainda em A Validez estética do
matrimônio de Ou ou, Kierkegaard aborda
o matrimônio cristão, que não é romântico e
sim Sob os olhos do Senhor, dando uma
estrutura ética-religiosa a substância do
amor, para que se questione se o amor
nasce antes do casamento e ao matrimoniarse acaba? Ou a uma seqüência após o
casamento. Segundo a Igreja Cristã a
mulher tem um importante papel no
matrimônio: “A Igreja proclama logo a
pena que cabe ao pecado, a mulher deve dar
a luz com dores e ser submissa a seu
marido... Parece-te bonito, e é conforme a
estética, que o filho nasça entre dores?”
(KIERKEGAARD, s/d, p. 87-88).
Logo em seguida, Kierkegaard tenta
inverter o sentido estrito das sagradas
escrituras, que avaliando a frigidez da
mulher e sua atitude de submissão ao
marido, segundo a Bíblia, deveria ser ao
contrário, no lugar do texto bíblico ser o
homem deixará seu pai e sua mãe e se
juntará a sua mulher, deveria ser: a mulher
deixaria seu pai e sua mãe e se juntaria a
seu marido, porque é a mais frágil. “A
Escritura reconhece implicitamente o valor
da mulher, e não há cavalheiro que possa
ser mais galante” (KIERKEGAARD, s/d, p.
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88).
Kierkegaard vai encerra este texto,
apresentando o amor como o bom
entendimento e o valor estético que
acontecerá, isso o torna um grande mistério,
que será resolvido mediante o matrimoniarse. O matrimônio é a expressão típica da
eticidade. É um objetivo que pode ser
comum a todos.
3. O caso do Diário
(Forforerens Dagbog)
do
Sedutor
Em Diário do Sedutor, também em
Ou Ou, mas em sua parte I, Kierkegaard
reúne uma série de cartas de Johannes4 e
Cordélia5, que eventualmente se separam,
sendo que Johannes faz Cordélia se sentir
culpada e responsável por tudo de ruim que
acontecera, isto é, ele inverte toda a
situação e passa de culpado para vitima, é
este o segredo do sedutor segundo
Kierkegaard. A sedução significa isso, fazer
com que o outro se sinta dependente, sem
mais nenhuma força e que tudo que faça, o
faça em prol do outro. Vejamos um dos
trechos do Diário do Sedutor onde
Johannes seduz a jovem Cordélia:
Johannes! Havia um homem rico que
possuía ovelhas e gado em grande
quantidade; havia uma pobre rapariga
que apenas possuía uma ovelha que
comia do seu pão e bebia de sua água.
Tu eras o homem rico, rico de tudo o
que de mais de esplêndido existe sobre
a Terra, eu era a pobre rapariga que
apenas possuía o seu amor. Tomaste-o e
regozijaste-te com ele; depois o desejo
acenou-te e sacrificaste o pouco que eu
4
Não confundir com Johannes Climacus, este do
Diário do sedutor é Johannes, O sedutor.
5
Lembrando que Cordélia é o nome de uma das
filhas, a mais querida, (Gonereil, Regane e Cordelia)
de Rei Lear, peça de Willian Shakespeare, por quem
Kierkegaard tinha grande apreço. Esta peça de
Shakespeare é como um jogo de xadrez, peças pretas
e brancas. Pretas: Edmundo, Goneril, Regane e
Cornwall. Brancas: Lear, Cordelia, Edgar,
Glouceaster, Kent e Albany.
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possuía; mas das tuas próprias riquezas
nada pudeste sacrificar; havia uma
pobre rapariga que apenas possuía o seu
amor. Tua Cordélia (KIERKEGAARD,
1979, p. 10).
Minha Cordélia, Sou pobre – és minha
riqueza; sombrio – és a minha luz.
Nada possuo, nada necessito. E
também. Como poderia eu possuir
alguma coisa? Pois não será uma
contradição pretender que aquele que
nem a si próprio se possui possua
alguma coisa? Sou feliz como uma
criança, que nada deve possuir, pois a ti
pertenço; não existo, cessei de existir a
fim de ser teu.Teu Johannes
(KIERKEGAARD, 1979, p. 10).
A carta de Cordélia, é espelhada na
história bíblica do rei Davi; que
desobedecera a Deus e por isso lhe foi
enviado o profeta Natã (II Samuel 12, 1-14)
que lhe conta a história semelhante, de um
homem que tinha muitas cabeças de bois e
ovelhas, e o outro pobre que só tinha uma
ovelha, o rico recebeu uma visita e não
matando de seus animais, foi e roubou a
única ovelha do pobre. Assim o profeta
Natã compara o homem rico com o rei
Davi, que tinha cometido um homicídio,
para casar-se com a mulher de um dos seus
servos. Kierkegaard quer demonstrar o
amor que Cordélia e Johannes sentiam, que
resulta em seu afastamento e dor, levando o
indivíduo a angústia que tornasse-á
desespero. Em um outro trecho vemos coisa
semelhante:
Minha Cordélia! Lê-se nos velhos
contos que um rio se enamorou de uma
jovem. A minha alma é também um rio
enamorado de ti. Tão depressa está
calmo e deixa a tua imagem refletir-se
nele, profunda e tranqüila, como logo
imagina que captou a tua imagem, e as
tuas ondas erguem-se para ti impedirem
de escapar, para em segredo enrugar a
sua superfície e brincar com a tua
imagem, mas por vezes perde-a, e então
as
suas
ondas
escurecem
e
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desaparecem. É assim a minha alma:
um rio enamorado de ti. Teu Johannes
(KIERKEGAARD, 1979, p. 78-79).
“Como é belo estar apaixonado e
como é interessante saber que se está”
(KIERKEGAARD, 1979, p. 26). Quando
Cordélia está apaixonada por Johannes só
resta a ele fazer uma coisa, acabar o
noivado, mais que acabe de forma que seja
um espetáculo prazeiroso. Johannes esta
consciente sobre seu projeto. O rompimento
não se deu por um acidente de percurso,
mas, já estava previsto desde o começo. No
início de As obras de amor de 1847,
Kierkegaard nos diz: “Enganar-se a si
mesmo quanto ao amor, é o mais horrível, é
uma perda eterna, para a qual não há
reparação nem no tempo nem na
eternidade” (KIERKEGAARD, 2005, p.
19). O amor sucede ao mesmo tempo uma
felicidade profunda e uma amargura furiosa
entre os homens. “Mesmo aquele que ao
longo de toda sua vida foi enganado pela
vida, pode receber da eternidade uma
copiosa reparação; mas o que se enganou a
si mesmo impediu a si mesmo de conquistar
o eterno” (KIERKEGAARD, 2005, p. 20).
O amor tem suas armadilhas e
segundo Kierkegaard liga-se diretamente
com o eterno, pois tem implicações eternas,
quem perde o seu amor terá que aceitar não
mais amar enquanto amor. Ter que arder as
conseqüências de ter perdido, amar somente
uma vez, ter, dessa forma, vários amigos,
poucas paixões e um único amor. Arder
eternamente por ter perdido seu amor é uma
condenação eterna a solidão6.
Ainda em As obras de amor: “Pois é
verdade que a vida do amor é cognoscível
em seus frutos, os quais se manifestam, mas
a vida, ela mesma é mais do que os frutos
6
Isso implica muito na vida de Kierkegaard, pois
sua vida foi de um único amor (Regine Olsen),
Kierkegaard acreditava realmente que só se ama
uma vez na vida. Sobre a solidão e melancolia de
Kierkegaard ver Reichmann, Ernani. Intermezzo
Lírico-Filosófico: “Como um melancólico poderia
escrever tanto” (REICHMANN, 1963, p. 110).
particulares e mais do que todos os frutos
tomados em conjunto, se te fosse possível
enumera-los
num
só
instante”
(KIERKEGAARD, 2005, p. 21). A árvore
boa é aquela que dá bons frutos, o amor
bom é reconhecido pelo que “poderá”
produzir. “Pois o paradoxo é a paixão do
pensamento e o pensador sem um paradoxo
é como um amante sem paixão”
(KIERKEGAARD, 1995, p. 61).
“O amor é a origem de tudo e, no
sentido espiritual, o amor é o fundamento o
mais profundo da vida espiritual [...] o amor
é longânimo” (REICHMANN, 1978, p. 320
e 323).
O eterno também se faz no amor. Se
faz de tal forma que rompe a ligação entre a
filosofia que nasce num anseio de vontade e
parte para a compreensão de uma esfera que
não sendo reducionista é na clareza do ser
uma conotação imbricada no eu que é
formado pela amor e pela paixão. “A
verdade é que o mundo não compreende a
eternidade...
a
eternidade
afirma
impertubavelmente que o mais importante é
a misericórdia” (REICHMANN, 1978, p.
326).
Os Três discursos em ocasiões
imaginárias são de mesma data dos
Estágios do caminho da vida, cada um
destes três discursos representa um dos
estágios de modo de vida. Os discursos são:
A Ocasião de uma confissão estética, A
ocasião de um casamento ético e Junto a
um túmulo religioso. Sobre a publicação
dos Estágios no Caminho da Vida escreve
Kierkegaard nos Diários “Os Estágios não
terá tantos leitores quanto Ou Ou”
(KIERKEGAARD, Journals, VI A 79) e
depois “Em Ou Ou o momento estético era
um presente em luta com a ética. O
momento ético era a – eleição – por meio
da qual a gente se afasta do estético”
(REICHMANN, 1978, p. 40).
4. Conclusão
obra
Concluímos lançando nosso leitor a
seguinte de Kierkegaard, onde
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efetivamente realiza-se uma continuação:
Os Estágios no caminho da vida
compreendem três textos que resultam em
450 páginas: In Vino Veritas, Referências
acerca do matrimônio em resposta a
algumas objeções e Culpado – Inocente. O
livro se inicia com uma advertência do
editor, um certo Hilário Encadernador
(Bogbinder), que diz ter achado num canto
um amontoado de manuscritos. Este texto
na verdade é uma rememoração ao
Banquete de Platão, é escrito pelo
pseudônimo Wilhelm Afram que convida
cinco pessoas para discursarem sobre o que
é o amor, os cinco convidados foram: Um
Jovem (que talvez seja A de Ou Ou),
Constantin Constantino, Victor Eremita, O
Modista e Johannes O Sedutor.
O primeiro discurso é do jovem que
tem medo do amor infeliz e que acabará por
dizer que o amor é ridículo, acha cômico
duas pessoas quererem se pertencer
eternamente, quererem penetrar um ao
outro (Cf. KIERKEGAARD, 2002, p. 7778). Durante os discursos muito se comenta
sobre o amor, a infelicidade de amar, como
também a alegria de se ter um amor, textos
e expressões nostálgicas que revelam uma
determinada misticidade em relação a
mulher e suas funções no amor e de como
amar: “Insistiu Johannes, porque não há
coisa mais desagradável do que uns
destroços a lembrar o que a gente já amou”
(KIERKEGAARD, 2002, p. 49). No
discurso de Victor Eremita, a mulher é
colocada como uma das causadoras de
infelicidades e desastres, pois é dona de um
belo sexo, que tem por finalidade atrair os
homens, que dispõe de uma possibilidade
inacreditável de enganar, coisa que,
segundo ele, nenhum homem teria e
conseqüentemente chega a conclusão de
que ser mulher é uma desgraça, e que a
maior desgraça ainda não é esta e sim o fato
de descobrir que se é mulher (Cf.
KIERKEGAARD, 2002, p. 105)7.
Por isso a Alternativa, ou uma coisa
ou outra, a efetividade da realidade nos
transporta a alternância do ser e das coisas
que interagem sobre ele. Kierkegaard um
mestre tanto da ironia como da beleza ainda
tem muito a nos dizer.
Referências
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Compreender
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GREVE,
William.
Kierkegaads
maieutische Ethik. Von «Entweder / Oder
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Suhrkamp Verlag. 1990.
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University Press, 1987, 2 vols.
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______. O Banquete. Lisboa: Guimarães,
2002.
7
Estas palavras ficaram conhecidas quando Simone
de Beauvoir utilizou-as como epigrafe em O
Segundo Sexo.
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______. Diário de um sedutor. São Paulo:
Abril Cultural, 1979 (Os pensadores).
______. Migalhas filosóficas. Petrópolis:
Vozes, 1995.
______. As Obras do Amor. Algumas
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Universitária São Francisco; Petrópolis:
Vozes, 2005.
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Livsåskådning. Lund: Doxa Press. 1980.
PULMER, K. Die dementierte Alternative.
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OU UMA COISA OU OUTRA: UM ESTÁDIO NA FILOSOFIA DE