CAPÍTULO IV
ESTRUTURAS ATÔMICAS
Estrutura e Propriedades de Materiais Cerâmicos
Capítulo IV: Estruturas Atômicas
Prof. Angelus G. P. da Silva
ESTRUTURAS ATÔMICAS
4.1. Introdução
Através de ligações atômicas, os átomos podem formar compostos com propriedades bem
distintas das propriedades de seus constituintes individuais. Estes compostos também variam
bastante em tamanho, podendo consistir de um mero par de átomos a sólidos com uma enorme
quantidade de átomos. O tamanho e a forma destes compostos são fatores diretamente determinados
pela natureza das ligações entre os átomos do composto. Por exemplo, os metais tendem a formar
compostos de muitos átomos organizados espacialmente em um arranjo atômico que se repete
(cristais). Devido à natureza da ligação metálica, os núcleos atômicos podem se mover
comparativamente mais fácil que no caso de materiais com outro tipo de ligação atômica.
Adicionalmente, os elétrons livres conferem aos materiais metálicos altas condutividades térmica e
elétrica.
Átomos ligados ionicamente também tendem a formar arranjos organizados de átomos
(cristais), porém estes arranjos são fortemente influenciados pelas relações entre as cargas elétricas
dos íons e pelos seus tamanhos relativos. Os materiais ligados covalentemente, ao contrário,
raramente formam cristais devido à natureza altamente impositiva da direcionalidade das ligações.
A probabilidade maior é que os compostos covalentes formem cadeias, como nos polímeros ou
pequenas moléculas discretas, como nos líquidos ou gases. O diamante e a sílica são dois exemplos
de materiais covalentes cristalinos, pois coincidentemente, as direções das ligações entre os átomos
são tais que permitem a formações de um arranjo do tipo cristalino. Como a ligação covalente
possui alta energia, os cristais covalentes cristalinos possuem em geral alto ponto de fusão e alta
dureza.
As forças de Van der Waals só se fazem notar quando as demais ligações não existem ou em
processos secundários. Por exemplo, é do tipo Van der Waals a ligação entre diferentes moléculas
poliméricas e entre gases e líquidos cujas moléculas são ligadas covalentemente. Fenômenos de
adsorção de líquido e gases são também desta natureza, bem como as ligações existentes entre as
camadas de materiais de estrutura folheada.
A seguir vamos estudar o caso em que átomos se ligam de modo a formarem um arranjo
espacialmente organizado e repetido, formando as chamadas estruturas cristalinas. Primeiramente
veremos algumas características das estruturas cristalinas e apresentaremos as estruturas cristalinas
de modo geral. Em seguida, entraremos no caso especial das estruturas cristalinas dos materiais
cerâmicos. Finalizaremos vendo o caso de materiais vítreos, caso em que inexiste a ordem
cristalina. É o caso do vidro, considerado uma cerâmica.
4.2. Estrutura Cristalina
Uma estrutura cristalina é um arranjo coordenado de átomos que se repete espacialmente.
Sendo assim, é possível selecionar um conjunto mínimo de átomos que, se repetidos um ao lado do
outro, reproduz toda a estrutura do material. O arranjo mínimo de átomos forma um volume mínimo
que reproduz a rede cristalina completa caso colocado um ao lado do outro. Este volume mínimo é
chamado célula unitária da rede cristalina. Em muitas ocasiões, é preferível não trabalhar com nem
com o arranjo mínimo nem com o volume mínimo, para que se ganhe em simetria espacial. Assim,
a visualização da rede a partir de uns poucos átomos fica mais fácil.
Uma vez selecionada a célula unitária, é recomendável escolher um sistema de eixos
coordenados que possibilitará a determinação de posições dos átomos e de direções na rede
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cristalina. Cada célula unitária terá assim tamanhos de arestas e ângulos entre arestas específicos. A
figura 4.1 exibe as geometrias das células unitárias dos sete sistemas cristalinos com suas
dimensões e angulações. A figura 4.2 exibe os 14 retículos cristalinos que são desdobramentos
daqueles gerais mostrados na figura 4.1.
cúbico
a=b=c
α=β=γ=90°
hexagonal
a=b≠c
α=β=90°, γ=120°
tetragonal
a=b≠c
α=β=γ=90°
romboédrico
a=b=c
α=β=γ≠90°
ortorrômbico
a≠b≠c
α=β=γ=90°
monoclínico
a≠b≠c
α=γ=90°≠β
triclínico
a≠b≠c
α≠β≠γ≠90°
Figura 4.1: células unitárias dos sistemas cristalinos e suas relações de parâmetros. .
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Cúbica de corpo centrado
cúbica simples
Tetragonal simples
Ortorrômbica simples
Cúbica de face centrada
Tetragonal de corpo centrado
Ortorrômbica de
Ortorrômbica de faces
Ortorrômbica de corpo
extremidades centradas
centradas
centrado
Monoclínica simples
Monoclínica de extremidades centradas
Hexagonal
Triclínica
Romboédrica
Figura 4.2: Redes cristalinas resultantes dos desdobramentos dos 7 sistemas cristalinos
fundamentais.
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Os eixos coordenados são escolhidos de modo a seguir a simetria espacial da célula unitária.
Eles são utilizados para localizar posições, direções e planos cristalinos na rede cristalina. A figura
4.3(a) exibe uma rede cúbica simples com um sistema de coordenadas. O átomo em vermelho
ocupa a posição (1,1,0).
4.2.1. Direções cristalinas
As direções cristalinas consistem de um linha de átomos como aquela mostrada em vermelho
na figura 4.3(b), porém com direção. Ou seja, a linha de átomos exibida, para ser uma direção tem
que ter um sentido, o qual poderia ser da esquerda para a direita ou o inverso. As direções na rede
cristalina são determinadas através de um vetor. O vetor é representado por suas coordenadas em
relação ao sistema de eixos coordenados escolhidos. Estas coordenadas são medidas em relação às
dimensões da célula cristalina. Peguemos um exemplo. Estamos querendo determinar a direção
cristalina do átomo identificado por um ponto escuro, na célula cristalina cúbica exibida na figura
4.3(c). As dimensões cristalinas são iguais. O sistema de eixos coordenados está também mostrado.
A direção é dada com relação ao ponto escolhido e à origem do sistema.
Figura 4.3: a) átomo em posição (1,1,0); b) linha de átomos sinalizando duas direções cristalinas; c?
vetor indicando direção cristalina [111].
A determinação da direção cristalina é simples e pode ser determinada em etapas.
Primeiramente pegamos a coordenada do átomo em questão. No caso, devido à simetria da célula
cúbica, as coordenadas são (a, a, a). Pegamos apenas os múltiplos de cada coordenada. No caso,
temos (1, 1, 1). A seguir, dividimos ou multiplicamos estes múltiplos por um fator comum, de modo
que estes se transformem no menor conjunto de inteiros possível. No caso particular, o conjunto
(1,1,1) já é o menor grupo possível de inteiros. Por fim, colocamos este grupo entre colchetes. O
resultado é [111]. Outro exemplo é o do ponto de coordenadas (a/2,b,0) em uma rede ortorrômbica.
Primeiramente pegamos os inteiros que são (1/2,1,0). Depois multiplicamos por 2 e ficamos com
(1,2,0). O resultado é [120]. A coordenada que for negativa recebe um traço horizontal sobre o
respectivo índice, como em 1 0 2 .
Quando invertemos os sinais do terno de índices a direção cristalina é também invertida. Ex.:
[1 23] → [ 1 2 3] . Existem certas direções cristalinas que são completamente equivalentes, ou seja, se
caminharmos ao longo destas direções, encontraremos a mesma quantidade de átomos, nas mesmas
distâncias. Por exemplo, no sistema cúbico, as seguintes direções são equivalentes: [100], [010],
[001], [ 1 00], [0 1 0], [00 1 ] . Direções equivalentes podem ser representadas como 〈100〉. No sistema
cúbico, para um determinado terno de índices, todas as direções originadas da troca de posição e de
sinal destes índices são equivalentes. Entretanto, cada sistema cristalino possui seu conjunto
[ ]
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específico de direções equivalentes. As direções [100] e [010] são equivalentes no sistema
tetragonal, mas as direções [100] e [001] não são.
Para o sistema hexagonal, devido à simetria particular, quatro eixos coordenados, ao invés de
três, são comumente utilizados. Embora 3 eixos sejam suficientes para descrever tudo no espaço
tridimensional, o uso de um quarto eixo facilita a visualização de eixos e direções. Por exemplo,
com o uso de 3 índices, direções equivalentes não terão mais os mesmos índices. Três eixos estão
no mesmo plano, o plano basal, separados entre si de 120°. O quarto eixo é perpendicular. Uma
determinada direção [uvw] no sistema hexagonal representada por 3 eixos pode ser convertida para
a representação de 4 eixos [u’v’tw’] através de
n
n
u ' = (2u − v) , v' = (2v − u ) , t = −(u '+v' ) , w' = nw
3
3
onde n é um inteiro que pode ser necessário para fazer de u’, v’, t e w’ os menores inteiros
possíveis. A figura 4.4 mostra uma célula unitária hexagonal que mostra como estão dispostos os
quatro eixos.
Figura 4.4: Sistema de 4 eixos alternativos usado para a rede hexagonal. Fonte: W. Callister.
4.2.2. Número de coordenação
Em uma rede cristalina, os átomos que rodeiam um determinado átomo estão dispostos a
distâncias determinadas e fixas, de acordo com as direções cristalinas. O número de átomos mais
próximos de um certo átomo é denominado número de coordenação. Para uma rede cúbica
simples, o número de coordenação é 6. Para a rede cúbica de corpo centrado (ccc) este número é 8.
Para as redes hexagonal e cúbica de face centrada, o número de coordenação é 12. Isto pode ser
visto na figura 4.5. Estas redes são formadas pelo empilhamento de planos compactos de átomos.
Cada átomo de um plano é rodeado por outros seis de seu próprio plano, por três de um plano
superior e mais três de um plano inferior, totalizando 12 átomos mais próximos.
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Figura 4.5: empilhamento compacto de esferas no arranjo cfc. O número de coordenação é 12.
4.2.3. Fator de empacotamento
O fator de empacotamento mede a fração de espaço da rede que é efetivamente ocupado pelos
átomos. Isto porque a forma como os átomos estão arranjados (o tipo de estrutura cristalina) pode
ocupar mais eficientemente ou não o espaço. Este fator é definido como a razão entre o espaço
ocupado pelos átomos em uma célula unitária e o volume da célula cristalina. Neste caso, os átomos
são representados por esferas sólidas que se tocam para construir a rede. Veja como exemplo a
célula de uma rede cúbica de corpo centrado (ccc). A figura 4.6 mostra uma célula unitária
preenchida com as esferas rígidas, representando os átomos. Existem 2 átomos ocupando a célula.
3
a . O volume da célula é
A relação entre a constante de rede e o raio da esfera é dada por R =
4
4
8
V=a3 e o volume das três esferas é Vesf = 2 πR 3 = πR 3 . Deste modo, o fator de empacotamento é
3
3
fe=0,68. Para a cfc o fator de empacotamento é 0,74, que é o mesmo valor deste para a rede
hexagonal compacta (hcp).
Figura 4.6: Célula unitária da rede cúbica de corpo centrado no modelo de esferas rígidas.
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4.2.4. Densidade de materiais cristalinos
A partir do número de átomos que ocupam a célula unitária e do volume desta célula é
nA
onde n é o número de átomos na
possível calcular a densidade do material pela relação ρ =
VC N A
célula, A é o peso atômico do material, VC é o volume da célula unitária e NA é o número de
Avogrado. Obviamente, esta relação á válida somente para materiais cristalinos de um só elemento.
4.2.5. Planos cristalinos e índices de Miller
O ordenamento de átomos da rede cristalina produz também planos atômicos, que são planos
ocupados pelos átomos da rede, como aquele constituído pelos átomos vermelhos indicados na
figura 4.7.
Figura 4.7: Plano de átomos (100) em rede cúbica simples.
Cada rede possui seu conjunto específico de planos, os quais são identificados por índices, a
exemplo das direções cristalinas. Os índices que identificam planos são denominados índices de
Miller. Um plano atômico, assim como um plano qualquer, é perfeitamente determinado por três
pontos. Tomamos, por simplicidade, os pontos onde o plano corta os três eixos coordenados.
Pegamos as coordenadas destes pontos, tendo como referência os parâmetros de rede. Em seguida,
fazemos o inverso de cada coordenada e multiplicamos todas por um mesmo inteiro, de modo a
termos o menor terno de inteiros possível. Por exemplo, suponha que um determinado plano corte o
eixo x nas coordenadas (2a,0,0), corte o eixo y em (0,b,0) e o eixo z em (0,0,3c). Pegamos apenas o
terno (2,1,3) e fazemos os inversos (1/2,1,1/3). A seguir multiplicamos por 6 e ficamos com (3,6,2).
O plano em questão será representado como (362). Quando o plano é paralelo a um eixo, tomamos
o índice do plano com referência aquele plano como sendo zero. Um índice negativo é apresentado
com um traço sobre o índice, como no caso das direções cristalinas. Revertendo o sinal de todos os
índices de um terno, nós obtemos um plano paralelo, como uma imagem deste plano refletida em
um espelho localizado na origem. Quando um plano passar pela origem, a determinação dos índices
de Miller é feita deslocando-se a origem do sistema de eixos ou criando um plano equivalente,
paralelo que não passa pela origem. A figura 4.8 mostra exemplo de alguns planos cristalinos na
rede cúbica.
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Figura 4.8: Conjuntos de planos cristalinos equivalentes. Fonte: W. Callister.
O arranjo atômico de cada plano cristalino é determinado pelas características da rede, de
modo que, planos cristalinos de mesmos índices, mas pertencentes a diferentes estruturas possuem
geralmente arranjos atômicos diferentes. A figura 4.9 exibe planos de mesmo índice nas estruturas
cfc e ccc, respectivamente. O arranjo dos átomos é claramente diferente em cada plano. Por outro
lado, existem planos cristalinos de índices diferentes que possuem o mesmo arranjo atômico. Estes
planos são chamados equivalentes e formam uma família. Uma família de planos é representada
pelos índices de Miller de um dos planos da família entre chaves. Por exemplo, para a rede cúbica,
todos os planos cujos índices tenham o mesmo módulo, não importando a ordem nem o sinal, são
equivalentes e compõem uma família. Assim (123), (231), (132) são equivalentes e fazem parte da
família {123}.
Existem planos que são mais ocupados que outros. Estes têm maior densidade atômica.
Logicamente, os planos que são paralelos a estes são equivalentes. Os planos paralelos mais
densamente ocupados são mais distantes uns dos outros que os planos paralelos menos densos. Isto
ocorre para manter a densidade do cristal constante.
No sistema hexagonal, o sistema de quatro eixos (e quatro índices) também pode ser usado
para representar planos atômicos. O motivo novamente é a facilidade de se visualizar os planos
nessa representação. Se no sistema de três índices, um certo plano é representado como (hkl) sua
representação no sistema de quatro índices é (hkil), onde hkl são exatamente os mesmos e i=-(h+k).
A figura 4.10 exibe planos na rede hexagonal e seus respectivos índices.
Figura 4.9: Planos cristalinos de mesmos índices para as redes cfc (a) e ccc (b). A disposição dos
átomos varia. Fonte: W. Callister.
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Figura 4.10: Planos cristalinos e seus índices na rede hexagonal. Fonte: W. Callister.
4.2.6. Empacotamento cristalino denso
A forma com que os átomos se agrupam determina a eficiência do empacotamento da
estrutura. No modelo de esferas rígidas, é possível determinar o fator de empacotamento. Ele é
máximo para as estruturas cúbica de face centrada e hexagonal compacta. Estas estruturas são
bastante parecidas. Para construí-las basta que façamos uma camada plana de esferas de mesmo
tamanho que se tocam, chamada camada A. Vemos que há espaços vazios entre as esferas. Cada
esfera toca seis vizinhas e existem seis espaços entre elas. Cada grupo de três esferas forma um
espaço entre elas. Podemos dividir estes espaços vazios em dois grupos, denominando-os B e C,
como mostra a figura 4.11(a). Em seguida, colocamos uma outra camada de esferas similar à
camada A, mas nas posições dos espaços B. Vemos que as esferas se tocam e são igualmente
rodeadas por seis esferas cada. Existem também espaços vazios entre as esferas da camada B. Veja
a figura 4.11(b). Podemos colocar uma terceira camada de esferas iguais sobre a camada B de duas
maneiras diferentes.
(a)
(c)
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(b)
(d)
(e)
Figura 4.11: Empacotamento de
esferas para formação das redes
compactas cfc e hcp. Fonte: W.
Callister.
Na primeira, colocamos as esferas da terceira camada exatamente sobre os espaços ocupados
pelas esferas da camada A. Formamos assim uma estrutura de três camadas de seqüência ABA.
Podemos continuar a colocar camadas sobre camadas, formando a estrutura ABABABAB, como
mostrado na figura 4.11(c). Ao fazermos isto, criamos a estrutura hexagonal compacta, onde a
camada A forma a base e a camada B o plano atômico intermediário.
A segunda maneira de colocar a terceira camada é colocar as esferas sobre os espaços
denominados C. Deste modo fazemos uma estrutura do tipo do tipo ABC. Ao continuarmos o
empilhamento, formamos a seqüência ABCABCABC. Esta estrutura é a cúbica de face centrada,
vista do plano (111). Veja as figuras 4.11(d,e).
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Estas estruturas possuem o melhor empacotamento porque a ocupação dos interstícios produz
a maior proximidade possível entre as esferas. Em muitas ocasiões, a seqüência de empilhamento
das esferas não é perfeita, podendo conter falhas do tipo ABABCABAB ou ABCABABC. Estas são
as chamadas falhas de empilhamento ou stacking faults.
4.2.7. Materiais policristalinos e anisotropia.
A presença de defeitos da rede cristalina é energeticamente favorável, isto é, decresce a
energia livre do material através do aumento de sua entropia. Por esta razão, não existem cristais
perfeitos, por mais cuidadosamente que se tente obtê-los. Um dos defeitos mais freqüentes é a
existência de muitos cristais em materiais. Isto significa que os materiais em seu formato
macroscópico são formados pela coleção de um grande número de monocristais. Um monocristal é
uma parte do material que possui uma única ordem cristalina e é denominada de grão. Nos
policristais, a ordem cristalina muda. As regiões de contorno entre os monocristais são chamadas de
contornos de grão. A formação de materiais policristalinos a partir da solidificação é um processo
natural, pois a fase sólida começa a se formar (nuclear) em diferentes lugares do material líquido.
Este pequenos núcleos formam os monocristais e vão crescendo, até que todo o líquido seja
solidificado e os monocristais toquem uns aos outros. A figura 4.12 ilustra o processo.
Em um monocristal, os diferentes planos e direções cristalinas possuem normalmente
diferentes arranjos atômicos, isto é, densidade atômica. A densidade atômica de direções e planos
muitas vezes determinam as propriedades do material. Portanto, se as densidades mudam de acordo
com as direções, então mudam também as propriedades. Na maioria das estruturas cristalinas
sempre existem assimetrias que causam bastante mudança das densidades atômicas. Ao fato da
mudança das propriedades com a direção cristalina, damos o nome de anisotropia.
Nos materiais policristalinos, os grãos estão orientados em todas as direções, de modo que a
anisotropia dos grãos individuais é anulada pelos demais grãos da estrutura macroscópica. Assim,
os materiais policristalinos são, em geral, isotrópicos.
→
→
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Figura 4.12: processo de solidificação com formação de material policristalino. Fonte: W. Callister.
4.3. Cerâmicas Cristalinas
O nome cerâmica é derivado do grego keramikos que significa material queimado. Isto porque
as propriedades que se queria obter de certos materiais eram obtidas através da queima deles. Por
muito tempo, o termo foi aplicado a materiais usados em louça, porcelana, tijolos, telhas, etc.
Posteriormente, o vidro e outros materiais usados em altas temperaturas passaram a ser tratados por
este nome também. Atualmente, os materiais mais rústicos como porcelana e tijolos são tratados
como cerâmica tradicional ou estrutural e uma categoria nova de materiais cerâmicos foi
desenvolvida com alta tecnologia, envolvendo extremo controle das etapas de síntese da matéria
prima e seu processamento. Enquanto as matérias primas dos produtos cerâmicos estruturais são
encontradas e coletadas na natureza sem preocupação com a pureza, os materiais cerâmicos de alta
tecnologia são em geral sintetizados industrialmente com rigoroso controle de composição.
Enquanto as cerâmicas tradicionais são processadas por métodos rústicos, as cerâmicas avançadas
exigem equipamentos sofisticados e condições bem controladas. Em compensação, as aplicações
das cerâmicas avançadas são muito mais sofisticadas. Elas exibem uma larga variedade de
propriedades e são usadas em condições muito mais rigorosas que as cerâmicas tradicionais.
Em termos químicos, os materiais cerâmicos são formados por elementos não metálicos,
ligados ionicamente ou covalentemente. Assim, hidróxidos, óxidos, nitretos, boretos, hidretos e
carbetos são considerados cerâmicos. As ligações covalentes envolvem geralmente elementos com
tendência de ceder elétrons e com eletronegatividades próximas. As ligações iônicas envolvem
elementos eletropositivos e eletronegativos, ou seja, de eletronegatividades bem diferentes. Deste
modo, um dos elementos tende a ceder e o outro a receber elétrons. Entretanto, não se pode falar
que uma ligação é completamente iônica ou completamente covalente, pois os átomos mais
eletronegativos sempre tendem a puxar mais para si os elétrons, o que caracterizaria uma ionização
parcial dos átomos. Um exemplo disso é o SiO2. Este material é ora tratado como covalente ora
tratado como iônico. Raramente um material covalente é cristalino, o SiO2 é. Os tetraedros
conseguem se unir, formando uma cadeia tridimensional. Porém, o oxigênio é ligeiramente mais
eletronegativo que o silício, por isso tende a atrair mais os elétrons para si. Daí o caráter iônico da
ligação. Além disso, como veremos adiante, a forma tetraédrica em que os átomos de Si e O estão
dispostos é também uma característica das ligações iônicas.
Os carbetos são geralmente iônicos ou covalentes, havendo um caráter de ambos os tipos.
Porém alguns carbetos de metais de transição conduzem carga elétrica. Diz-se então que eles têm
também um caráter metálico em suas ligações. Portanto, os materiais raramente exibem um caráter
puro de suas ligações.
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Como já mencionado, a ligação covalente é fortemente direcional. Esta é uma das razões para
os materiais covalentes raramente exibirem estrutura cristalina. Exceções foram mencionadas. As
ligações iônicas, por outro lado, não são direcionais. Os materiais iônicos comumente possuem
ordem cristalina. Quanto maior o número de íons ligados menor será a energia do conjunto. Por isso
a tendência a formar cristais grandes. Portanto, nos dedicaremos a examinar com mais ênfase os
materiais cerâmicos cristalinos ligados ionicamente.
Uma ligação iônica envolve átomos eletropositivo e eletronegativo. O eletropositivo perde
elétrons e se torna um cátion. O outro ganha elétrons, tornando-se ânion. Os últimos são
normalmente maiores que os primeiros. Os materiais iônicos ao formarem estruturas cristalinas
sofrem bastante influência das cargas elétricas e dos tamanhos relativos dos íons.
Os íons de cargas opostas se atraem e de cargas iguais se repelem. Portanto a estabilidade da
estrutura requer que os íons de um tipo sejam cercados por íons de carga oposta. O tamanho relativo
destes íons determina as posições e o número de íons que podem rodear os íons de carga oposta.
Quanto maior o número de íons rodeando outro mais estável será a estrutura.
Para examinar as estruturas cristalinas iônicas, devemos usar os ânions como referência. Por
serem maiores que os cátions, em geral, eles determinam o tipo de estrutura. O ânion deve ter
cátions como seus primeiros vizinhos para dar estabilidade à estrutura. Do mesmo modo, os
primeiros vizinhos dos cátions são ânions.
Como os ânions determinam a estrutura, os cátions devem ocupar os espaços vazios deixados
pelo agrupamento dos ânions. Os principais tipos de agrupamento ânion/cátion serão vistos a seguir.
Por simplicidade, os íons serão tratados como esferas rígidas. Os cátions têm raio menor, mas
os ânions são os principais elementos estruturais. Considerando estas condições, a estrutura mais
estável que se pode formar é a de cátions e ânions que se tocam, sendo os cátions rodeados pelo
maior número possível de ânions, e vice-versa. Deste modo, os cátions devem preencher o espaço
intersticial deixado pelos ânions como nas figuras 4.13(a,b). Caso o cátion não ocupe todo o volume
disponível, ele ficará “folgado” e a estrutura será instável, fig. 4.13(c). Assim, existe um valor
mínimo de raio de cátion para dar estabilidade. Este valor depende do volume do espaço intersticial,
que por sua vez depende do raio do ânion e de como eles se agrupam. O cátion pode ter raio
superior ao valor mínimo. Neste caso, ele aumenta a distância entre os ânions. Este afastamento tem
um limite. A partir daí, uma estrutura que possua mais ânions em contato com os cátions será mais
estável.
Como mencionado, o número de primeiros vizinhos é denominado número de coordenação.
Não obrigatoriamente, o número de coordenação de cátions é o mesmo deste para os ânions, como
veremos.
Figura 4.13: arranjos estáveis (a,b) e instável (c) de íons.
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Dependendo dos raios relativos de cátion e ânion, diversos números de coordenação (NC)
podem ser encontrados, dando origem a diferentes arranjos geométricos, como mostrado na tabela
4.1.
Tabela 4.1: Relação entre raios, número de coordenação e arranjo geométrico entre os íons.
Relação de raios r+/rNúmero de coordenação
Arranjo geométrico
< 0,155
2
Linear
3
Trigonal
planar
0,155 → 0,225
4
Tetraédrica
0,225 → 0,414
4
Quadrada planar
0,414 → 0,732
6
Octaédrica
0,414 → 0,732
8
Cúbica de corpo centrado
0,732 → 0,999
A figura 4.14 mostra o exemplo de um arranjo quadrático planar, podendo ser também
octaédrico, com o cátion ocupando o interstício dos três ânions em contato. Com este arranjo é
possível calcular o valor crítico para o raio do cátion, abaixo do qual este arranjo se torna
eletrostaticamente instável.
Figura 4.14: Relação de raios entre ânion e o cátion para o valor limite em que todos se tocam em
arranjos quadrático planar e octaédrico.
Deste modo, por simples considerações geométricas, é possível prever o tipo de arranjo
cristalino iônico formado conhecendo-se os raios iônicos dos constituintes. Entretanto este modelo
possui falhas. Existem alguns casos em que a rede que se forma na realidade não corresponde
àquela prevista pela relação de raios. Diversas são as razões para isto. Inicialmente, o modelo supõe
íons esféricos rígidos. A forma esférica nem sempre é seguida e os íons são na verdade
deformáveis. O valor do raio iônico deve ser o mais precisamente conhecido quanto possível, porém
o valor dos raios dos íons depende da rede cristalina em que o raio é medido e até do valor do spin
do elétron mais externo. Outra dificuldade é o caráter covalente da ligação que faz com que o
modelo baseado em uma ligação puramente iônica não seja precisamente aplicado. Em diversos
casos, a previsão é correta, mas deformações na rede cristalina são verificadas.
A tabela 4.2 exibe o arranjo geométrico correspondente aos números de coordenação
mencionados na tabela 4.1.
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Tabela 4.2: Arranjos geométricos de íons segundo a razão entre seus raios. Fonte: W. Callister.
Número de
2
3
4
6
8
coordenação
r+/r<0,155
0,155 – 0,225 0,225 – 0,414
0,414 – 0,732
0,732 – 1,0
Arranjo
geométrico
4.3.1. Empacotamentos densos
Em muitas ocasiões, os ânions estão arranjados como em um empacotamento denso, ou seja,
hcp ou cfc. Os cátions, que devem obrigatoriamente ocupar os interstícios deixados, têm duas
opções para se acomodarem: os interstícios tetraédricos e os octaédricos. As figuras 4.15 (a,b,c)
mostram a formação de sítios tetraédricos e octaédricos em empacotamentos densos. No caso de
empacotamentos densos, estamos lidando apenas com os casos de números de coordenação 4 ou 6,
dependendo da composição do composto.
Figura 4.15: formação de sítios tetraédricos e octaédricos em um empacotamento denso de ânions.
(a) localização dos sítios no arranjo de esferas; (b) detalhe do sítio tetraédrico; (c) detalhe do sítio
octaédrico.
Para cada ânion, ou esfera, no empacotamento denso, existe um sítio octaédrico e dois sítios
tetraédricos que podem ser ocupados por cátions. Todavia, os sítios octaédricos são maiores que os
tetraédricos. A figura 4.16 mostra isto. As esferas azuis formam a camada inferior. As esferas
amareladas formam a camada superior. Entre estas camadas são formados os interstícios. Os sítios
octaédricos só se formam com três átomos da camada de cima e três da camada de baixo. Os sítios
tetraédricos podem ser formados com um átomo da camada de cima e três da de baixo ou com um
átomo da camada de baixo e três da de cima. As pequenas esferas azuis escuras e vermelhas
ocupam sítios tetraédricos e as pequenas esferas amarelas ocupam os sítios octaédricos.
54
Estrutura e Propriedades de Materiais Cerâmicos
Capítulo IV: Estruturas Atômicas
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Figura 4.16: Contagem de sítios tetraédricos e octaédricos em um arranjo atômico denso. Sítios
vermelhos são tetraédricos e os sítios azuis são octaédricos. Existem dois tetraédricos para cada
ânion e um octaédrico para cada ânion.
4.3.2. Estruturas binárias
Veremos agora alguns casos de estruturas cerâmicas iônicas formadas por apenas dois
elementos distintos. Usaremos a notação seguinte para designar compostos: A[m]pX[n]q. Neste tipo de
notação, o X representa o ânion, o A representa o cátion e os índices entre colchetes representam o
número de coordenação de cada íon. Os índices q e p representam o número de íons da fórmula
básica do composto. A tabela 4.4 relaciona diversas estruturas binárias e dá informações adicionais
sobre elas.
• Estrutura do cloreto de sódio. A[6]X[6].
A relação entre os raios é de 0,52. Isto sugere um arranjo do tipo octaédrico. Cada cátion Na
está rodeado por seis ânions Cl e vice versa. A figura 4.17 mostra a célula unitária da rede
cristalina. Ela pode ser entendida como duas redes do tipo cfc interpenetrantes. Uma formada pelos
cátions e a outra pelos ânions.
•
Estrutura do arseneto de níquel. A[6]X[6].
Esta é mais uma estrutura de empacotamento denso. Os ânions selênio se agrupam em um
arranjo hcp e todos os cátions níquel ocupam posições octaédricas, conforme mostra a figura 4.18.
Temos então uma estrutura em camadas seqüenciais de arsênio e de níquel.
•
Estrutura do cloreto de césio. A[8]X[8].
A relação de raios é de 0,93, indicando um arranjo do tipo cúbico de corpo centrado (ccc).
Neste caso, o número de coordenação é 8 para ambos os íons. O cátion, que é bem grande
comparativamente ao ânion, ocupa o centro de um cubo, tendo os ânions em seus vértices, e vice
versa. A figura 4.19 mostra a célula unitária deste composto. Rigorosamente, esta estrutura não
pode ser considerada ccc porque o íon central não é do mesmo tipo que os íons dos vértices.
55
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(b)
(a)
Figura 4.17: Estrutura do cloreto de sódio. A[6]X[6]. Sódio: amarelo em (a), verde em (b)..
(b)
(a)
[6] [6]
Figura 4.18: Estrutura do arseneto de níquel. A X . Níquel: azul em (a), verde em (b).
56
Estrutura e Propriedades de Materiais Cerâmicos
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(b)
(a)
[8] [8]
Figura 4.19: Estrutura do cloreto de césio. A X . Césio: verde em ambas figuras.
•
Estruturas do sulfeto de zinco (ZnS). A[4]X[4].
O ZnS apresenta duas formas polifórmicas (a polimorfia será tratada adiante), a blenda e a
wurtzita. A relação de raio é 0,40. Isto sugere um arranjo de número de coordenação 4, que é
tetraédrico. A blenda possui estrutura cfc (fig. 4.20 (a,b)), enquanto que a wurtzita é hcp (fig.
4.21(a,b)). Como o número de sítios tetraédricos é o dobro do número de sítios aniônicos, deduz-se
que somente metade dos tetraedros estão ocupados para que se mantenha a relação 1:1 entre cátions
e ânions. Esta ocupação é alternada.
(b)
(a)
[4] [4]
Figura 4.20: Estrutura da blenda de zinco (ZnS). A X . Zinco: amarelo em ambas as figuras.
57
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(b)
(a)
Figura 4.21: Estrutura da wurtzita (ZnS). A[4]X[4]. Zinco: azul em (a) e cinza em (b).
•
Estruturas da fluorita e da antifluorita. A[8]X[4]2 e A[4]2X[8].
Para a fluorita, ou fluoreto de cálcio (CaF2), cada íon de cálcio é rodeado por 8 íons de flúor,
como mostra a figura 4.22. Seu NC é portanto 8. O cálcio está no centro de um cubo cujos vértices
são ocupados por íons de flúor. Cada íon flúor, por sua vez, está cercado tetraedricamente por 4 íons
de cálcio. Seu NC é 4. Os cátions Ca formam uma estrutura cfc. Eles geralmente são bastante
grandes. A relação de raios para que se forme a estrutura da fluorita é maior ou igual a 0,73.
A antifluorita é o nome dado à estrutura similar a da fluorita, porém com os ânions ocupam as
posições ocupadas pelas cátions na fluorita e os cátions ocupando as posições aniônicas da fluorita.
Temos, portanto, uma inversão das posições iônicas. A estrutura, porém, é a mesma.
(a)
(b)
Figura 4.22: Estrutura da fluorita. A[8]X[4]2. Cálcio: azul.
58
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(a)
(b)
[6] [3]
Figura 4.23: Estrutura do rutilo (TiO2). A X . Vista da célula unitária (a) e da estrutura de
octaedros (b). Oxigênio: vermelho em ambas as figuras.
•
Estrutura do rutilo (TiO2). A[6]X[3].
O TiO2 possui três estruturas cristalinas distintas: o anatásio, a brookita e o rutilo. A estrutura
do rutilo é mostrada na figura 4.23 (a,b). A relação de raios para os materiais que apresentam esta
estrutura varia entre 0,41 e 0,73. Isto sugere um número de coordenação de 6 para um dos íons. Pela
composição podemos deduzir que 6 é o NC para o Ti e 3 para o oxigênio. Os cátions Ti são
octaedricamente coordenados. Estes octaedros podem combinar vértices e arestas para formar uma
estrutura tridimensional. Esta forma de ver a rede é mostrada na figura 4.23(b). A célula unitária
pode ser vista como um arranjo ccc distorcido dos cátions Ti. A distorção é causada pelos diferentes
comprimentos das ligações entre Ti e O nas direções horizontal e vertical. Por isso, os octaedros são
também distorcidos. Os ânions são coordenados a três cátions Ti dispostos nos vértices de um
triângulo eqüilátero, formando um arranjo trigonal plano.
•
Estrutura do corundum (Al2O3). A[6]2X[4]3.
O Al2O3 possui diversas formas cristalinas. Uma delas é o corundum. Os ânions oxigênio
estão dispostos em um arranjo hexagonal um pouco distorcido. Os cátions localizam-se nos sítios
octaédricos, mas apenas 2/3 destes estão ocupados. A figura 4.24 mostra a célula unitária da
estrutura.
(a)
(b)
Figura 4.24: Estrutura do corundum (Al2O3). A[6]2X[4]3. Oxigênio: vermelho.
59
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•
Estruturas da sílica (SiO2). A[4]X[2].
A sílica possui seis formas cristalinas que são a tridimita, a cristobalita e o quartzo, cada uma
destas possuindo formas de baixa e alta temperaturas. As formas de alta e baixa temperaturas são
semelhantes, só que as de baixa temperatura são formas distorcidas das formas de alta temperatura.
A unidade básica estrutural da sílica é o tetraedro SiO4-4. Quando estes tetraedros conseguem se
orientar, dividindo vértices, redes tridimensionais podem se formar.
A cristobalita β, de alta temperatura, tem rede semelhante a do ZnS blenda, conforme figura
4.25(a). A estrutura da tridimita de alta temperatura é mostrada na figura 4.25(b). Veja que cada
ânion dos tetraedros é comum a tetraedros vizinhos.
Figura 4.25: Estruturas da cristobalita e tridimita de altas temperaturas. Duas fases do SiO2. Fonte:
D. Richerson.
As figuras 4.26(a,b) mostram as formas de alta e baixa temperaturas do quartzo,
respectivamente. Os círculos em branco são os cátions. Os pares cinza e preto formam o tetraedro
de oxigênio.
Figura 4.26: Formas de alta (a) e baixa (b) temperatura do quartzo. Fonte: D. Richerson.
60
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Capítulo IV: Estruturas Atômicas
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A coordenação dos tetraedros SiO4-4 de diferentes modos pode dar origem a uma enormidade
de estruturas cristalinas. A figura 4.27 mostra diversas possibilidades, entre as quais anéis, cadeias e
camadas, formadas pelo compartilhamento de mais íons em cada tetraedro.
Tabela 4.4: estruturas de compostos binários, incluindo fórmula de coordenação, tipo de
empacotamento aniônico, ocupação dos interstícios e exemplos de compostos de cada estrutura.
Nome da
Fórmula de Empacotamento Fração dos
Exemplos
Estrutura
Coordenação
de ânions
sítios
ocupados por
cátions
[6] [6]
Sal de rocha
A X
cfc
Todos os
NaCl, KCl, LiF, MgO, VO,
octaedros
NiO
[8] [8]
Cloreto de
A X
Cúbica simples
Todos os
CsCl, CsBr, CsI
césio
cúbicos
Blenda de
A[4]X[4]
cfc
½ dos
ZnS, BeO, β-SiC
zinco
tetraedros
Wurtzita
A[4]X[4]
hcp
½ dps
ZnS, ZnO, α-SiC, BeO, CdS
tetraedros
Arseneto de
A[6]X[6]
hcp
Todos os
NiAs, FeS, FeSe, CoSe
níquel
octaedros
Fluorita
A[8]X[4]2
Cúbica simples
½ cúbico
CaF2, ThO2, CeO2, UO2, ZrO2,
HfO2
[6] [3]
Rutilo
A X 2
Empac. Denso
½ octaedros
TiO2, GeO2, SnO2, PbO2,
distorcido
VO2, NbO2
[4] [2]
Diversas
A X 2
Tetraedros
--SiO2, GeO2
sílicas
conectados
Antifluorita
A[4]2X[8]
cfc
Todos
Li2O, Na2O, sulfetos
tetraedros
Corundum
A[6]2X[4]3
hcp
2/3 octaedros
Al2O3, Fe2O3, Cr2O3, V2O3,
Ga2O3, Rh2O3
Figura 4.27: Estruturas que podem ser formadas através de diferentes coordenações dos tetraedros
SiO4-4. Fonte: W. Callister.
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Capítulo IV: Estruturas Atômicas
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4.3.3. Estruturas ternárias.
São estruturas compostas por três elementos distintos, sendo dois deles cátions de tamanhos
e/ou cargas diferentes. Existem muitas estruturas ternárias de grande importância tecnológica.
Veremos apenas algumas delas. Cada cátion se encaixa em um tipo de interstício, dependendo do
tamanho. A construção destas estruturas obedece ao mesmo raciocínio usado para a construção das
estruturas binárias, ou seja, balanço de carga e arranjo geométrico estável, formado por ânions
como determinantes principais da superestrutura e cátions que se encaixam em interstícios, segundo
seus tamanhos. Existem muitas estruturas com mais de três elementos, porém como mais de um
destes elementos possuem tamanhos e cargas comparáveis eles podem ocupar o mesmo tipo de
posição no cristal. Portanto a estrutura pode ser tratada como ternária.
(a)
Figura 4.28: Estrutura do espinélio.
A[4]B[6]2X[4]4.
(b)
Fonte: D. Richerson, fig.(a).
•
Estrutura do espinélio. A[4]B[6]2X[4]4.
Muitas diferentes composições podem assumir a estrutura do espinélio. Os casos mais comuns
são quando o oxigênio é o ânion, chamados de espinélios óxidos. Outros elementos podem assumir
o lugar do oxigênio, tais como F-, S-2, Se-2, e Te-2. Os cátions podem apresentar várias combinações
de tamanhos e cargas, para os espinélios óxidos, como A+4B+22O4, A+2B+32O4 e A+6B+2O4.
As estruturas do espinélio são cúbicas. Contêm 32 ânions, 16 cátions octaédricos (B) e 8
cátions tetraédricos (A). Portanto apenas metade dos sítios octaédricos e um oitavo dos tetraédricos
são ocupados. A figura 4.28 mostra como estão dispostos os íons na rede e a configuração
tetraédrica e octaédrica dos cátions.
•
Estrutura da olivina. A[6]2B[4]X[4]4.
Este nome tem origem no mineral olivina, (Mg,Fe)2SiO4, que é uma solução sólida dos
minerais forsterita (Mg2SiO4) e fayalita (Fe2SiO4). A estrutura da olivina é mostrada na figura 4.29.
Trata-se de uma rede hexagonal ligeiramente deformada dos ânions. Os cátions B ocupam um
oitavo das posições tetraédricas. Os cátions A ocupam metade das posições octaédricas. Na figura
4.29, os cátions do tipo Me ocupam as posições octaédricas (denotados por A na fórmula de
coordenação) e o Si ocupa as posições dos cátions tetraédricos (denotados por B). Vê-se que os
tetraedros e octaedros formados pelos Si e Me, respectivamente, são independentes, mas
62
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compartilham arestas e vértices. A distorções são causadas por ligações de comprimentos diferentes
entre os cátions e os ânions.
O cátion das olivinas é geralmente o oxigênio, porém F, S ou Se podem ser substitutos dele.
Assim como para os espinélios, diferentes combinações e tamanhos e cargas dos cátions são
possíveis, tais quais A+22B+4X4, A+32B+2X4, A+2A+3B+3X4 entre outras. Cátions A+2 podem ser Ca,
Mn, Mg, Fe, Co, Ni ou Cd. A+ pode ser Li or Na. A+3 pode ser Al, Y, Ho, Er. A+4 pode ser Si, Ge
ou Sn. B+2 pode ser Be. B+3 pode ser B. B+5 pode ser F. O ânion pode ser o mono ou bivalente,
conforme já mencionado. Materiais com as estruturas da olivina e do espinélio compõem a maior
parte do manto terrestre. São, portanto, muito freqüentes.
Figura 4.29: Estrutura da olivina. A[6]2B[4]X[4]4. Fonte: D. Richerson
•
Estrutura da calcita. A[6]B[3]X[3]3.
A figura 4.30 mostra a célula unitária da calcita (CaCO3), que é o mineral que dá o nome a
este tipo de estrutura. A célula unitária é romboédrica muito mais longa em uma direção que nas
outras. A estrutura é formada por um tipo de cátion bastante grande, ocupando as posições A e
outro bem pequeno, ocupando as posições B. No caso da calcita, carbono é o cátion B, pequeno. Ele
é arrodeado por três íons oxigênio, compondo um arranjo trigonal plano. Acima e abaixo deste
arranjo trigonal, existe um arranjo também trigonal de cátions maiores, o cálcio, como mostrado na
figura. Devido à enorme deformação da estrutura, o cristal apresenta grande anisotropia. O
coeficiente de expansão térmica e o índice de refração na direção c da célula unitária são bastante
diferentes comparativamente às outras direções.
63
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Oxigênio: verde
Carbono: azul
Cálcio: vermelho
Figura 4.30: Estrutura da calcita. A[6]B[3]X[3]3.
•
Estrutura da perovskita. A[12]B[6]X[6]3.
Muitos materiais de alto valor tecnológico apresentam a estrutura da perovskita. Muitas das
perovskitas são cúbicas. Estas são denominadas perovskita ideal. Outras são estruturas deformadas
ou distorcidas desta, apresentando formas tetragonal, ortorrômbica ou romboédrica.
A estrutura ideal da perovskita possui um cátion grande, comparável ao tamanho do ânion, e
um cátion menor. O titanato de cálcio (CaTiO3) é um exemplo de estrutura tipo perovskita. O
cátion pequeno, o titânio, situa-se no centro de um cubo, cujos vértices são ocupados pelos cátions
maiores e cujos centros das faces são ocupados pelos ânions, como mostra a figura 4.28(b). Outra
visão da rede é mostrada na figura 4.31(a). Neste caso temos o titanato de estrôncio (SrTiO3). O
cátion grande é o estrôncio. Os cátions menores são octaedricamente coordenados aos ânions,
ocupando um quarto dos sítios octaédricos existentes. O arranjo destes octaedros, postos lado a
lado, compartilhando um vértice e um cátion maior entre cada quatro octaedros, forma a rede
tridimensional. O cátion maior é coordenado a 12 ânions, formando com eles um arranjo cúbico
compacto.
Vários compostos com estrutura da perovskita apresentam importantes propriedades
dielétricas. O titatanato de bário é um exemplo. Entretanto, as atraentes propriedades dielétricas só
existem na versão distorcida da rede, que é estável apenas abaixo de 120°C. A estrutura ideal é
estável somente acima desta temperatura. No caso distorcido, o cátion titânio está ligeiramente
deslocado em relação ao centro do cubo (figura 4.31(b)), formando um octaedro excêntrico. Isto
quebra a simetria da distribuição das cargas elétricas, originando um momento e de dipolo elétrico
intenso.
64
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Figura 4.31: Estrutura da perovskita. A[12]B[6]X[6]3.
A tabela 4.5 traz exemplos de compostos que possuem estruturas tipo espinélio, olivina,
calcita e perovskita.
Tabela 4.5: compostos que possuem estruturas ternárias.
Nome da estrutura
Exemplos
Espinélio
FeAl2O4, ZnAl2O4, MgAl2O4
Olivina
Mg2SiO4, Fe2SiO4, Al2BeO4, Mg2SnSe4
Calcita
CaCO3, MgCO3, FeCO3, MnCO3
Perovskita
BaTiO3, CaTiO3, SrTiO3, SrZnO3, SrSnO3, SrHfO3
4.3.4. Os silicatos
Os silicatos são os mais freqüentes compostos encontrados na crosta terrestre. Sua base
estrutural é constituída por silício e oxigênio. Estes átomos se ligam, formando um tetraedro, como
já mencionado nas seções 3.2.1 e 4.3.2. A ligação química entre eles é covalente, mas existe um
forte caráter iônico. Esta característica diferencia bastante os compostos formados por Si e O
daqueles formados por C e O, embora hibridações formarem tetraedros envolvendo o carbono,
assim como os tetraedros Si-O.
O tetraedro SiO-44 é a unidade básica dos silicatos. Cada átomo de oxigênio do tetraedro
aceita ainda um elétron para se tornar estável. A ligação destes átomos de oxigênio pode se dar com
um oxigênio pertencente a outro tetraedro SiO-44 ou com outro átomo. Em ambos os casos,
estruturas cristalinas bastante complexas podem ocorrer. Na seção 4.3.2 foram vistos alguns casos
de como os tetraedros se combinavam para formar estruturas do tipo SiO2 e subestruturas ainda
mais complexas, como as dos tipos mostrados na figura 4.27. Estas estruturas são estritamente
iônicas, na grande maioria dos casos, apresentando alto ponto de fusão, como é o caso da forsterita
(Mg2SiO4 – estrutura da olivina). Neste mineral, cada oxigênio do tetraedro se liga ao divalente
magnésio. Este se liga a outro oxigênio, pertencente a outro tetraedro. Assim, os tetraedros são
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ligados através do magnésio. Veremos a seguir alguns casos em que os tetraedros se ligam para
formarem estruturas ainda mais complexas. Existe uma enorme variedade de silicatos encontrados
na natureza devido ao fato de que a substituição por outros íons de mesmo tamanho é sempre
possível, desde que o balanço de cargas seja observado. Por exemplo, Na pode substituir o Ca ou o
Mg. O Al pode substituir o Si, mas um K deve ser incorporado à rede para haver balanceamento de
carga.
•
Estruturas em cadeia
Os tetraedros SiO-44 podem se ligar a outros, formando uma cadeia, como visto na figura 4.27,
a exemplo do processo de polimerização de estruturas de carbono. A diferença é que nos polímeros
orgânicos, a cadeia é formada por um esqueleto de carbono, enquanto que no presente caso, a
cadeia é formada por átomos de Si e O, alternando-se. A unidade básica de tais cadeias é o (SiO3)-2.
A ligação de outros cátions aos íons oxigênio ainda instáveis forma uma classe de compostos
chamados piroxênios. Um exemplo são os géis de sílica, formados quando as cadeias de (SiO3)-2 são
postas em soluções de sais de sódio.
Duas desta cadeias podem se unir, formando uma dupla cadeia. Neste caso, estruturas fibrosas
são formadas, cuja unidade estrutural é o (Si4O11)-6. O amianto é um exemplo desta estrutura. O
plano de clivagem é paralelo ao eixo da cadeia, porém elas são unidas entre si através de ligações
iônicas, ao invés de por forças de van der Waals, como nas cadeias poliméricas de carbono.
• Estruturas em camadas
Quando os tetraedros SiO-44 se ligam a outros três tetraedros, tem-se uma estrutura cuja unidade é o
(Si3O5)-2. Forma-se então uma folha composta por três planos atômicos, como mostra a última
imagem da direita na figura 4.27. Um dos planos (no caso o de baixo) é formado pelos três átomos
de oxigênio de cada tetraedro, compartilhados pelos tetraedros. O plano do meio é formado pelos
átomos de silício e o plano superior é formado pelos átomos de oxigênios não ligados. Estes últimos
podem se ligar a outra camada, por exemplo, formando uma estrutura de camadas, como é o caso
dos argilo-minerais. Os tetraedros que formam a folha arranjam-se hexagonalmente.
Figura 4.32: Arranjo de tetraedros Si-O para formar uma folha tetraédrica. Fontes: Pérsio S. Santos.
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A estrutura de muitos argilominerais é formada pela sobreposição de folhas como a descrita
no parágrafo anterior e outras que serão descritas adiante. As folhas formadas por tetraedros SiO-44
são denominadas folhas tetraédricas, mas o cátion Si pode ser substituído por Al+3 e ocasionalmente
Fe+2 e Fe+3. Folhas também podem se formar como resultado do agrupamento de octaedros. Estas
são ditas folhas octaédricas. Neste caso, os cátions podem ser Al+3, Mg+2, Fe+2, Fe+3, Ti+4 e
ocasionalmente Cr+3, Mn+2, Zn+2 e Li+. Os octaedros também se ligam, formando hexágonos. Os
ânions, neste caso, são de hidroxila. A figura 4.32 mostra o tetraedro SiO-44, seu ajuntamento para
formar a folha tetraédrica e a vista de topo desta folha. A figura 4.33 mostra o mesmo para a folha
octaédrica. Estas folhas tetraédricas e octaédricas podem se sobrepor e formar uma camada,
denominada 1:1, isto é uma camada tetraédrica e uma octaédrica. Entretanto, as dimensões destas
camadas, quando isoladas, não permitem o encaixe direto entre elas, ou seja, as posições dos
átomos nestas camadas não permitem uma ligação perfeita entre elas. Assim, a ligação entre elas é
sempre acompanhada de tensões. Quando uma camada é comprimida, a outra é tracionada.
Figura 4.33: Junção de octaedros formando uma folha octaédrica. Gibsita. Fonte: Pérsio S. Santos.
Figura 4.34 a: Sobreposição das folhas tetraédrica e octaédrica formando uma camada da caulinita.
Vermelho: oxigênio; azul escuro: silício; azul claro: alumínio; branco: hidrogênio.
67
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Figura 4.34 b: Vista da camada 1:1 ao longo do eixo b. Fonte: Pérsio S. Santos.
Figura 4.34 c: representação gráfica de uma camada de caulinita. Fonte: Pérsio S. Santos.
Os diversos tipos de argilominerais são derivados da sobreposição de folhas deste tipo em
diversas seqüências, existindo ou não cátions intercalados entre as folhas. Um exemplo é o da
caulinita. Ela é formada pela ligação de uma folha de tetraedros SiO-44 e de uma folha de octaedros
Al2(OH)6, a gipsita. Estas folhas são ligadas através de um íon oxigênio comum. A figura 4.34(a)
mostra a sobreposição das folhas para formar uma camada 1:1 da caulinita. Os cátions alumínio
ocupam 2/3 dos sítios octaédricos para manter a neutralidade elétrica da estrutura. A estrutura vista
ao longo do eixo b (fig. 4.34(b)) sugere a forma de representar graficamente as estruturas dos
argilominerais. A folha tetraédrica possui uma abertura no plano dos íons oxigênio compartilhados,
enquanto que a folha octaédrica é regular. Deste modo, as folhas tetraédrica e octaédrica são
graficamente representadas com na figura 4.34(c).
Os cristais de caulinita apresentam-se na natureza como placas de formato hexagonal. Veja
figura 4.35. Isto se deve aos planos de clivagem. A clivagem no plano basal dá ao cristal a forma de
placa. O plano de clivagem basal situa-se entre os planos que separam as camadas. A ligação entre
camadas sucessivas é feita por pontes de hidrogênio entre o plano de oxigênio e o plano de
hidroxilas. Esta ligação é relativamente forte. O perfil hexagonal dos cristais é dado pela clivagem
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nas direções perpendiculares ao plano basal, em que os tetraedros e octaedros se agrupam formando
hexágonos.
Figura 4.35: Formato comum dos cristais de caulinita. A forma de palqueta com perfil hexagonal
está relacionada à estrutura e os planos de clivagem.
Outro exemplo é a montmorilonita. Cada camada é formada por um sanduíche de duas folhas
tetraédricas e uma octaédrica no meio. As posições do silício podem ser razoavelmente substituídas
por alumínio e as do alumínio da folha octaédrica podem ser substituídas por diversos outros
cátions. As posições octaédricas podem estar parcial ou completamente ocupadas. Esta variedade de
opções cria um desbalanceamento elétrico das cargas catiônicas octaédricas. Devido a isto cátions
hidratados podem ocupar posições entre as camadas para garantir o balanceamento elétrico. A
figura 4.36 mostra uma série de estruturas de camadas, ligadas a diferentes argilominerais, em que
as camadas são diferentemente intercaladas. A alternância na ocupação do espaço entre as camadas
por diferentes cátions cria as estruturas mistas.
4.3.5. Estrutura unária
Estruturas cerâmicas de um elemento é rara. Um exemplo do tipo são as formas polimórficas
do carbono: o diamante e o grafite. Pode-se ainda acrescentar a estes o fulereno, somente
descoberto em 1985.
O diamante é o mais duro composto conhecido. É transparente ao visível e ao infravermelho,
isolante elétrico e apresenta elevada condutividade térmica. A elevada dureza e baixíssima
condutividade elétrica são produzidas pelo fato de o material ser covalentemente ligado. A alta
condutividade térmica é explicada pela vibração da rede (fônons). Sua estrutura é igual a da blenda
de zinco, porém todos os átomos são de carbono. Veja figura 4.37. Os átomos de carbono formam
híbridos tetraédricos. O silício e o germânio também têm este tipo de estrutura em baixas
temperaturas. Esta estrutura para o diamante é instável em condições de temperatura ambiente e
pressão atmosférica. Ele é naturalmente sintetizado em altas temperatura e pressão nas profundezas
da terra, porém condições equivalentes podem ser produzidas e o diamante pode ser produzido
artificialmente por meio de prensas e fornos. Outro modo de produzir diamante artificialmente é
pela deposição química de vapores. Neste caso, consegue-se produzir filmes de diamante com uma
espessura de até 1μm.
Em condições ambientais de temperatura e pressão, o grafite é a forma cristalina estável do
carbono. Nesta estrutura, os átomos de carbono estão ligados em um arranjo hexagonal, onde cada
átomo está covalentemente ligado a três outros átomos de carbono. A ligação entre estes planos é do
tipo Van der Waals. Assim, as ligações entre os átomos do plano é muito forte, mas a ligação entre
diferentes planos é fraca e a clivagem é fácil. É por esta razão que o grafite é um ótimo lubrificante.
A figura 4.38 exibe a estrutura cristalina do grafite.
69
Estrutura e Propriedades de Materiais Cerâmicos
Capítulo IV: Estruturas Atômicas
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O fulereno é uma curiosa estrutura parecida com uma bola de futebol, onde um átomo de
carbono reside em cada vértice. A estrutura é na verdade uma molécula isolada, mas que pode se
unir a outras semelhantes, formando uma estrutura cristalina, em que cada molécula se comporta
como um átomo. Cada molécula contém 60 átomos de carbono. A figura 4.39 mostra a estrutura de
tal molécula.
Figura 4.36: Diversas estruturas, formadas por diferentes superposição das folhas e interposição de
cátions entre as camadas. Fonte: Pérsio S. Santos.
Figura 4.37: Estrutura do diamante. Fonte: W. Callister.
70
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Capítulo IV: Estruturas Atômicas
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Figura 4.38: Estrutura do grafite. Fonte: W. Callister.
Figura 4.39: Estrutura do fulereno C60. Fonte: W. Callister.
4.4. Defeitos em Cristais
As estruturas cristalinas sempre possuem imperfeições. Cristais com um mínimo de defeitos
só são possíveis com enorme controle no processo de crescimento. A presença de imperfeições é
energeticamente favorável, pois minimiza a energia livre através do aumento da entropia do cristal.
Diversos são os tipos de imperfeição. As imperfeições na rede cristalina de uma cerâmica trazem
mais implicações que em um metal, devido ao balanceamento de carga na rede. Os defeitos nas
estruturas cristalinas podem ser classificados como defeitos de ponto, de linha e de superfície.
71
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Capítulo IV: Estruturas Atômicas
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Os defeitos de superfície são considerados as fronteiras de grão e as falhas de empilhamento.
Estes últimos são interrupções da seqüência normal de empilhamento dos átomos nas estruturas
compactas. Vimos que uma estrutura cfc pode ser entendida como uma seqüência de dois tipos de
camadas, como por exemplo ABCABC. Uma falha seria a modificação da seqüência para ABABC.
Um segundo tipo de defeito do tipo é a chamada inversão da seqüência, como no caso
ABCABCBACBA. Este tipo de defeito altera ligeiramente a energia da estrutura, porque os planos
atômicos são normais, apenas a seqüência é modificada.
Os defeitos de linha são as discordâncias. Existem as discordâncias em linha, ou cunha, e as
discordâncias em hélice. O primeiro tipo é nada mais que um semiplano de átomos que é colocado
entre dois planos da estrutura. O segundo tipo é um deslocamento entre planos atômicos adjacentes.
Sua ocorrência nos materiais cerâmicos é muito mais difícil que nos materiais metálicos, devido às
implicações de equilíbrio de carga elétrica e de empilhamento iônico. Como as discordâncias são
responsáveis pela plasticidade dos metais, tem-se o porquê das cerâmicas apresentarem
propriedades plásticas tão pobres, comparativamente.
Os defeitos mais importantes e freqüentes são os do tipo pontual. É sempre válido informar
que os defeitos em estruturas cristalinas sempre produzem deformações na rede, aumentando assim
sua energia, porém, no caso das cerâmicas iônicas, existe uma preocupação a mais, que é o
balanceamento elétrico da estrutura. Os defeitos pontuais aqui expostos irão expressar esta
condição.
•
Defeito de Frenkel
Tanto vacâncias quanto posições intersticiais ocupadas podem ocorrer nas cerâmicas, a
exemplo dos metais, tanto para os ânions quanto para os cátions. Entretanto, uma vez que os ânions
são muitas vezes bem maiores que os cátions, um ânion intersticial produziria muita deformação da
rede. Por isso, este tipo de defeito não é comum. O defeito de Frenkel é aquele em que existe um
interstício catiônico e, para compensar eletricamente, existe uma vacância catiônica. A figura 4.40
mostra o defeito de Frenkel.
Figura 4.40: Defeitos dos tipos Frenkel e Schottky. Fonte: W. Callister.
•
Defeito de Schottky
Neste caso, há uma vacância de ânion. Para compensar eletricamente, há também uma
vacância de cátion. Deste modo, assim como no defeito de Frenkel, o número relativo de ânions e
cátions não se altera. A figura 4.40 também mostra um defeito de Schottky.
72
Estrutura e Propriedades de Materiais Cerâmicos
Capítulo IV: Estruturas Atômicas
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Defeitos tais como interstícios e vacâncias estão também associados a estruturas não
estequiométricas. A estequiometria de uma estrutura pode ser quebrada com a existência de íons de
mais de uma valência. Como exemplo, tome-se a wustita (FeO). O Fe pode apresentar duas
valências: +2 e +3. A concentração de íons dessas valências depende da temperatura e da pressão
parcial de oxigênio no ambiente. O oxigênio é sempre –2. Isto significa que para cada cátion Fe+3
na estrutura, ela fica carregada com uma carga positiva em excesso. Para compensar isso, uma
vacância de cátion Fe+2 é criada para cada dois cátions Fe+3 presentes na estrutura. A figura 4.41
mostra isso. Note que agora, o número relativo de ânions e cátions é modificado. A composição
agora é outra, não estequiométrica. Muitas vezes, a composição da wustita é escrita como Fe1-xO.
Há também a possibilidade de átomos de outros elementos que não aqueles da rede
hospedeira estejam presentes na estrutura, ocupando posições substitucionais ou intersticiais. Estes
átomos são considerados impurezas. As condições que determinam se um determinado átomo pode
ou não ser impureza em certa rede são de tamanho e de carga. Caso seja substitucional, a impureza
não pode ser muito maior ou menor que o íon que substitui. Caso seja intersticial, seu tamanho deve
ser bem menor que o tamanho do ânion, para que caiba no espaço disponível. Caso a carga do íon
impureza seja diferente daquela do íon que ele substitui, ouro evento deverá ocorrer para que o
equilíbrio elétrico seja conservado. Uma possibilidade é a criação de defeitos tais como vacâncias e
interstícios. A figura 4.42 esquematiza os defeitos do tipo impureza intersticial e substitucional.
Figura 4.41: A ocorrência de íons de diferentes valências introduz defeitos na rede e leva a uma
composição não estequiométrica. Fonte: W. Callister.
Figura 4.42: Impurezas substitucionais e intersticiais. Fonte: W. Callister.
73
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•
As discordâncias
Quando uma rede cristalina é submetida a tensões externas, ela se deforma. Esta deformação
pode ser permanente, denominada plástica. Este tipo de deformação decorre do deslocamento
relativo não reversível dos átomos. A primeira explicação para este fenômeno foi formulada por J.
Frenkel, em 1920. Ele defendia que a deformação consistia do deslizamento de um plano cristalino
em relação a outro. Assim, todos os átomos pertencentes a um dado plano, se deslocariam em
conjunto da mesma quantidade, na mesma direção e sentido. A figura 4.43 ilustra o processo.
Ele calculou a tensão necessária para que isto ocorresse e o resultado é um valor bem superior
aos valores determinados experimentalmente. Em 1934, Orowan, Polanyi e Taylor propuseram
independentemente a existência de um mecanismo de deformação que explicava melhor os valores
de tensões de deformação experimentalmente medidos. Este mecanismo de baseia em um tipo de
defeito cristalino, denominado defeito de linha, a discordância. A existência deste defeito foi
somente comprovada em 1949, com o uso de microscopia eletrônica de transmissão. Até esta data,
toda a teoria de discordância e deformação baseada no movimento destas discordâncias havia sido
construída.
Figura 4.43: O modelo de Frenkel para explicar a plasticidade: o deslizamento simultâneo de todos
os átomos de planos adjacentes. Fonte: A.F. Padilha.
Existem dois tipos de discordâncias: a discordância em cunha e a discordância em hélice. A
discordância em cunha consiste de um plano atômico que se interpõe entre dois planos atômicos
regulares. Veja figura 4.44. A discordância em hélice consiste de um deslocamento de poucos
átomos de um plano com respeito aos átomos do plano adjacente. Veja figura 4.45.
74
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Figura 4.44: a discordância em cunha formada pelo plano extra de átomos. O vetor de Burgers que
mede a deformação causada na rede (direita) e a linha de discordância (esquerda), que marca o local
onde está o plano extra. Fonte: A.F. Padilha.
Discordâncias puras de cunha ou de hélice são raras. O mais comum é encontrar discordâncias
mistas, que são compostas por uma combinação de discordância em cunha e em hélice. A figura
4.46 ilustra uma discordância mista.
Figura 4.45: Discordância em hélice. Vetor de Burgers (esquerda) e linha de discordância (direita).
Fonte: D. Richerson e A.F. Padilha.
75
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Figura 4.46: Discordância mista. Vetor de Burgers e linha de discordância. Fonte: W. Callister.
Na descrição de uma discordância, dois parâmetros são importantes: a linha de discordância e
o vetor de Burgers. A linha de discordância marca o término do plano atômico extra na discordância
em cunha. Na discordância em hélice, ela acompanha a região onde há o deslocamento dos átomos.
O vetor de Burgers mede a deformação da rede, dimensionando o deslocamento atômico sofrido
devido á discordância. Na discordância em cunha, o vetor de Burgers é perpendicular à linha de
discordância. Na discordância em hélice, o vetor de Burgers é paralelo à linha de discordância.
•
Contornos de macla
Este tipo de defeito pode ser causado por deformações ou por recozimento (tratamentos de
recristalização). Pode ainda surgir durante o crescimento do grão, na solidificação. Trata-se de uma
deformação especular da rede. Determinada região fica deformada em relação à outra. As estruturas
são idênticas, mas parecem deslocadas em relação à outra, como se olhadas em um espelho. A
figura 4.47 ilustra um caso. As maclas de deformação possuem contornos curvilíneos e as de
recozimento ou crescimento possuem os contornos retilíneos. Estes contornos podem ser coerentes
ou incoerentes, dependendo do grau de coincidência entre os átomos.
A maclação é mais freqüente em sistemas cristalinos que não possuem muitos planos de
deslizamento. A maclação envolve o movimento de muitos átomos, embora seja um pequeno
deslocamento. A energia para este deslocamento é, em geral, maior que a energia para o movimento
de discordâncias. A maclação ocorre, portanto, quando o sistema não pode se deformar pelo
movimento de discordâncias.
•
Interfaces
Os materiais polifásicos são aqueles cujas estruturas apresentam mais de uma fase. Neste caso,
conforme a coerência existente entre as estruturas de grãos adjacentes de fases diferentes, podemos
classificar estas interfaces em coerentes, semicoerente e incoerentes. No primeiro caso, as fases
devem ter estruturas cristalinas semelhante e parâmetros de rede aproximados. Uma das fases deve
estar presente como precipitações menores que 0,1μm. No segundo caso, é possível encontrar
algum grau de coerência entre as fases, mesmo tendo elas diferentes estruturas, quando
discordâncias no contorno aumentam o nível de coincidência entre as posições das redes. O último
caso é mais comum. Neste caso, há um completo desacordo entre as posições atômicas das fases
adjacentes. A figura 4.48 ilustra os três casos.
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Figura 4.47: Maclação: deslocamento atômico, contornos de macla devido à deformação e à
recozimento, contornos coerentes e incoerentes. Fonte: A.F. Padilha.
Figura 4.48: Interfaces coerente, semicoerente e incoerente, respectivamente, entre fases distintas.
Fonte: A.F.Padilha.
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4.5. A Estrutura do Vidro
O vidro possui diversas definições, variando conforme o enfoque que se quer dar pelos
autores. A ASTM define o vidro como sendo “um produto inorgânico de fusão que foi resfriado até
atingir condições de rigidez, sem sofrer cristalização”. Entretanto, muitos autores apenas associam
ao vidro a idéia de uma estrutura não cristalina, rígida, sendo originada do resfriamento de um
líquido viscoso. Sob este aspecto, alguns compostos orgânicos e semiorgânicos se encaixam
também na definição de vidro.
As estruturas vítreas não possuem completa desordem atômica. Elas se caracterizam por: a)
ordem de pequena distância e desordem de longa distância e; b) uma estrutura contínua de ligações
primárias fortes. A figura 4.49 exibe a estrutura de um vidro de B2O3 em contraste a uma estrutura
cristalina do mesmo material. Note que os cátions se ligam aos ânions sempre formando uma
estrutura triangular. Entretanto, estes triângulos se ligam a outros, compartilhando o ânion oxigênio,
de forma desordenada, ao contrário da estrutura cristalina, que possui um arranjo ordenado de
triângulos. O vidro de sílica, o mais comum dos vidros, freqüentemente erradamente citado como
quartzo (quartzo é uma estrutura cristalina do SiO2), tem estrutura vítrea semelhante, com a
diferença que existe mais um ânion ligado ao cátion, da direção perpendicular ao plano da página,
formando assim um tetraedro. Uma difração de raio x do vidro de sílica mostra uma banda de
difração relativamente larga, denotando justamente a ordem de curto alcance dos tetraedros e
apontando 1,62Å como a distância média da ligação Si-O. Esta distância varia mais nos vidros que
nos cristais de sílica por causa das maiores tensões exercidas pela estrutura vítrea sobre os
tetraedros, em comparação as tensões da estrutura cristalina.
Outros cátions podem ser adicionados à estrutura vítrea, pois não havendo ordem geométrica,
implicações de tamanho não são mais tão importantes. Deve-se continuar observando a neutralidade
elétrica da estrutura, no entanto. A troca iônica é possível nas estruturas vítreas, assim como era nas
estruturas cristalinas. Os cátions podem se difundir até a superfície e lá serem trocados por outros
cátions externos, que se difundem para o interior. Por exemplo, a vibra de vidro, bastante utilizada
como isolante elétrica, deve ter baixo teor de Na2O, senão ocorre a troca do Na+ pelo H+ da
umidade atmosférica ou de soluções aquosas em contato com a fibra e as propriedades dielétricas da
fibra são modificadas.
A introdução de outros cátions, adicionados na forma óxida, é feita com o objetivo bem
definido, pois cada óxido distinto altera de modo específico as propriedades do vidro. Zachariasen
[J. Amer. Chem. Soc. 54, 3941 (1932)] elaborou algumas regras sobre as diferentes tendências que
tinham os óxidos de formarem vidros. Elas dizem respeito, de certo modo, à conveniência de se
introduzir certos óxidos nos vidros. As regras foram fruto de muitas observações. Basicamente, o
vidro é considerado uma cadeia polimérica tridimensional, ou seja, os íons que constituem a
estrutura estão interligados, mas não tão organizados quanto em uma rede cristalina. Para que isto
aconteça, cadeias lineares devem ser formadas que possuam ligações entre si, de modo a formar um
esqueleto tridimensional. Deduz-se então que os íons não podem ter alto número de coordenação,
pois isto é característica de estruturas cristalinas, nem número de coordenação muito baixo, pois
apenas cadeias lineares não conectadas iriam se formar. A regras são as seguintes:
1cada átomo de oxigênio não pode coordenar-se com mais de dois átomos metálicos
(justamente para que números de coordenação elevados significam formação de uma
arranjo ordenado).
2os átomos metálicos devem ter um baixo número de coordenação (esta regra está ligada à
mesma razão).
3Os poliedros de oxigênio (tetraedros ou octaedros) ligam-se somente através dos vértices e
não das faces ou arestas (isto limita a ordenação dos poliedros).
78
Estrutura e Propriedades de Materiais Cerâmicos
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4-
Três ou mais vértices de cada coordenação poliédrica precisam ser compartilhados
(assegura a polimerização da estrutura de modo tridimensional por causa do número de
coordenações. A coordenação dupla geraria uma cadeia linear, por exemplo).
Poucos óxidos reúnem as condições explicitadas no conjunto de regras. Os óxidos de metais
mono ou bivalentes, por exemplo, não se ligam a tantos oxigênios assim para formar uma rede
tridimensional. Poderiam apenas formar cadeias lineares. Os átomos dos grupos IV, V, VI e VII
possuem elevados números de coordenação e/ou tendem a formar íons poliatômicos que não se
polimerizam, como SO4-2. Os óxidos de fórmulas RO2 e R2O5 são os mais suscetíveis à formação de
vidro. Óxidos de fórmula R2O3 formam vidro apenas se o cátion for suficientemente pequeno para
se coordenar a três átomos de oxigênio, formando um arranjo triangular. Somente o boro tem esta
capacidade, com o óxido B2O3. Este óxido e ainda SiO2, GeO2, P2O5, e As2O5 tendem a formar
vidros e são denominados formadores de rede. Existem ainda outros óxidos cujos cátions são
pequenos o suficiente para substituírem os cátions dos formadores de rede, podendo assim também
serem, até certo ponto, considerados formadores de rede. Entretanto, existem outros óxidos não
formadores de rede que quando adicionados ao vidro alteram as características mecânicas,
dielétricas e óticas do material, além de alterarem sua trabalhabilidade. Aliás, estas são as razões de
seu uso. Os óxidos Na2O, K2O, CaO, BaO, MgO, PbO entre outros, quando adicionados ao vidro, se
decompõem e quebram as ligações existentes na rede vítrea. Estes óxidos são então denominados
modificadores de rede.
A figura 4.50 exemplifica o que acontece à estrutura quando o cátion de um óxido
modificador de rede, no caso o Na2O, é adicionado ao vidro. O óxido se decompõe e ligações
existentes na rede são desfeitas, ou seja, ocorre uma despolimerização da rede. Esta
despolimerização é justamente responsável pelo aumento da fluidez do vidro, aumentando sua
trabalhabilidade. Os cátions adicionados devem ocupar interstícios separados, por se repelirem e o
oxigênio fica ionizado. A tabela 4.6 mostra a composição de muitos vidros comerciais e suas
propriedades, em grande medida influenciadas pelos aditivos. Os vidros com alto teor de sílica são
mais refratários, isto é, possuem viscosidade mais elevada. Isto permite seu uso em temperaturas
mais elevadas, exatamente devido à maior polimerização de sua rede.
Figura 4.49: Fases vítrea e cristalina do B2O3. O arranjo triangulares B-O no vidro não estão
arranjados de acordo com uma ordem de longo alcance, a exemplo da estrutura cristalina. Fonte:
Van Vlack.
O fato de uma estrutura vítrea não ter ordem cristalina, assemelhando-se a um líquido rígido, faz
com que a transformação líquido-sólido, ou seja a fusão, não seja comparável ao caso da fusão de
materiais cristalinos. Neste último caso, a fusão é caracterizada pela total perda de ordem estrutural.
No caso do vidro, a ordem inexiste. Assim, outra propriedade do material é usada para definir a
fusão: a densidade do material. Um material cristalino, quando resfriado abaixo do ponto de fusão,
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solidifica-se e sofre um aumento brusco de densidade. Um material vítreo, estando inicialmente
líquido e sendo resfriado, tem sua densidade aumentada continuamente, ao invés de bruscamente,
significando que a rede vítrea está sendo formada e os átomos buscam posições que proporcionem
maior empacotamento.
Figura 4.50: A introdução de Na2O ao vidro de sílica despolimeriza a estrutura. Fonte: Van Vlack.
Tabela 4.6: composição de diversos tipos de vidros comerciais e suas propriedades principais.
Principais componentes %
Tipo
Observações
SiO2 Al2O3 CaO Na2O B2O3 MgO PbO outros
Sílica
99
Dilatação térmica muito
fundida
baixa, viscosidade muito
alta
vycor
96
4
Dilatação térmica muito
baixa, viscosidade alta
pyrex
81
2
4
12
Dilatação térmica muito
baixa, baixa troca iônica
garrafas 74
1
5
15
4
Fácil trabalhabilidade,
grande durabilidade
pratos
73
1
13
13
Alta durabilidade
Vidro
72
1
10
14
2
2
Alta durabilidade
de
janela
Bulbo
74
1
5
16
4
Fácil trabalhabilidade
de
lâmpad
as
fibras
54
14
16
10
4
Baixo teor de álcalis
Vidro
50
1
19 BaO(13) Índice de refração específico
ótico
K2O(8)
flint
ZnO(8)
Vidro
70
8
10
BaO(2) Índice de refração específico
ótico
K2O(8)
crown
80
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A partir de determinado ponto, a curva de densidade muda de inclinação. Este ponto significa
que a rede vítrea está suficientemente extensa e a temperatura suficientemente baixa para
impedirem o movimento dos átomos na busca por um empacotamento maior. Este é o ponto em que
o vidro muda de um estado líquido super resfriado para um estado rígido. Entretanto, este ponto de
transição muda conforme a taxa de resfriamento empregada. Para resfriamentos mais rápidos, a
temperatura de transição é mais alta porque os átomos não têm muito tempo para buscar posições de
maior empacotamento, como em casos de resfriamento lento. Em temperaturas inferiores a de
transição, o posterior aumento da densidade deve-se à diminuição do espaçamento médio entre os
átomos e não mais ao reposicionamento deles. Portanto, a temperatura de transição vítrea não é bem
definida, mas varia em uma faixa. A figura 4.51 mostra o comportamento típico da densidade de um
vítreo, em comparação ao de um material cristalino.
densidade
TF
TV
TV
Temperaturaa
Figura 4.51: comportamento da densidade de um material cristalino (tracejado) e de um material
vítreo (cheio) resfriado lenta e rapidamente. O cristalino possui ponto de fusão (TF), o vítreo possui
temperatura de transição vítrea (TV).
A viscosidade é outra propriedade que tem comportamento distinto daquele dos materiais
cristalinos. Nestes, quando o material solidifica, a viscosidade aumenta bruscamente. No caso dos
vidros, a viscosidade aumenta continuamente à medida que se resfria o material. Dependendo do
valor da viscosidade, diversos pontos e regiões podem ser definidos. O material é considerado
líquido quando possui densidade da ordem de 10Pa.s. Em 103Pa.s há o ponto de trabalho, onde o
vidro pode ser facilmente trabalhado. Por volta de 4x107Pa.s há o ponto de amolecimento, abaixo
desta temperatura o vidro não pode ser trabalhado sem haver dificuldade de conformação. Em torno
de 1012Pa.s existe ainda difusão atômica suficiente para garantir o relaxamento de quaisquer tensões
residuais no material em cerca de 15 minutos. A figura 4.52 mostra o gráfico da viscosidade em
função da temperatura para várias composições vítreas.
81
Estrutura e Propriedades de Materiais Cerâmicos
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Figura 4.52: Temperaturas importantes de diversas composições de vidro estabelecidas pela
viscosidade. Fonte: W. Callister.
A estrutura vítrea pode se transformar em cristalina. A este processo dá-se o nome de
devitrificação. Nem todos os materiais que possuem ordem cristalina podem exibir também uma
estrutura vítrea, mas os materiais vítreos podem se mostrar cristalinos também porque a energia
livre de uma estrutura vítrea é superior aquela da estrutura cristalina. A devitrificação depende de
vários fatores: a) tempo, b) temperatura, c) nucleação e d) estrutura interna. O tempo refere-se ao
fato que a devitrificação exige a movimentação dos átomos na estrutura para assumirem novas
posições coerentes com uma estrutura ordenada. Isto requer tempo. Entretanto, em muitos casos,
um tempo tão longo quanto séculos ou milhares de anos. O aumento da temperatura aumenta a
difusividade do material, portanto permite que os átomos se movam mais rapidamente.
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4.6. Exercícios
1- As células unitárias de três redes cristalinas possuem os seguintes parâmetros. Identifique a que
tipo de estrutura cristalina elas pertencem.
a) a=b=4,59Å, c=6,00 Å, α=β=90°, γ=120°
b) a=2,56 Å, b=3,08 Å, c=2,80 Å, α=β=γ=90°
c) a=2,70 Å, b=2,95 Å, c=3,58 Å, α=93°, β=82°, γ=95°
2- Em uma rede cúbica de corpo centrado (ccc), determine a densidade atômica da direção
cristalina [111], sendo a=4,0 Å o parâmetro de rede.
3- Demonstre que o fator de empacotamento da rede cfc é 0,74. Considere o modelo de esferas
rígidas e a como sendo o parâmetro de rede.
4- Determine o fator de empacotamento da estrutura cúbica de corpo centrado
5- Prove que no arranjo geométrico tetraédrico, a razão entre os raios do cátion e do ânion deve ser
0,225 para que o cátion caiba exatamente no interstício tetraédrico.
6- Observe a estrutura do arseneto de níquel. Responda:
a) qual o número de coordenação do níquel?
b) Qual o número de coordenação do arsênio?
c) Que tipo de interstício o Ni ocupa?
7- Nas estruturas vítreas, certos elementos desempenham o papel de formadores de rede e outros
de modificadores de rede. O que significam estes termos? Que efeito possui cada um destes
elementos sobre a viscosidade e a temperatura de fusão do vidro?
8- A figura 4.49 exibe o comportamento da viscosidade em função da temperatura para vidros de
diversas composições. Responda as seguintes questões:
a) Se você estiver interessado em um vidro para ser usado em alta temperatura, que tipo de
vidro você escolheria? Por que?
b) Se você deseja um vidro com alta trabalhabilidade em baixa temperatura, que tipo de vidro
você escolheria? Por que?
c) Como você descreveria o comportamento do vidro (densidade e viscosidade), quando sua
temperatura é aumentada?
9- Com base nas estruturas da wurtzita e da blenda que são as poliformas do ZnS. Responda:
a) Qual a rede cristalina da blenda (olhe somente para os ânions)?
b) Qual a rede cristalina da wurtzita (olhe somente para os ânions)?
c) Que tipo de interstício ocupam os cátions nas estruturas mostradas?
10- Uma cerâmica hipotética de composição AB4X3 tem o ânion X com valência –2 e raio iônico de
1,4Å. O cátion B tem raio iônico de 0,7 Å e o cátion B possui raio iônico 0,56 Å. Sabendo que a
valência do cátion A é –1, responda:
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Capítulo IV: Estruturas Atômicas
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Relação de raios r+/rNúmero de coordenação
< 0,155
2
3
0,155 → 0,225
4
0,225 → 0,414
6
0,414 → 0,732
8
0,732 → 0,999
a) Que tipo de interstício estes cátions ocupam?
b) Qual a valência do cátion B?
c) Qual a fração dos sítios tetraédricos e octaédricos ocupados?
Arranjo geométrico
Linear
Trigonal planar
Tetraédrica
Octaédrica
Cúbica de corpo centrado
11- Como você descreveria a estrutura do vidro e o que acontece quando um vidro fundido é
resfriado?
12- A formação de um cristal iônico obedece a critérios tais como o tamanho relativo entre cátions e
ânions e a neutralidade elétrica. Se os ânions formam uma estrutura compacta, existem
interstícios octaédricos e tetraédricos que podem acomodar os cátions.
Se temos um ânion X de valência –2 e um conjunto de cátions cujos raios em relação ao raio do
ânion e valências estão mostrados na tabela abaixo, responda as questões abaixo. Considere que
para cada ânion há um sítio octaédrico e dois sítios tetraédricos.
Cátion
A
B
C
D
E
+ + + + + R /R valência R /R valência R /R valência R /R valência R /R valência
0,236
+4
0,350
+2
0,400
+2
0,420
+4
0,555
+2
a) em um composto binário, formando os ânions X um arranjo compacto, como estariam
coordenados os cátions B?
b) poderiam estes cátions ocupar todos os sítios disponíveis de sua categoria de tamanho?
Justifique sua resposta.
c) Em um composto ternário, onde tanto os sítios octaédricos quanto os sítios tetraédricos
estivessem ocupados, quais os cátions que poderiam ocupar cada tipo de sítio?
d) A célula unitária de uma cerâmica iônica ternária hipotética possui 24 ânions, 12 cátions
maiores e 6 cátions menores. Que cátions formariam o composto?
e) Qual seria o número de cada íon na fórmula do composto e qual a fração dos sítios
octaédricos e tetraédricos estaria de fato ocupada?
13- Para a estrutura cristalina HC, mostre que a razão c/a ideal é de 1,633.
14- Dentro de uma célula unitária cúbica, esboce as seguintes direções: (W. Callister)
a) 1 10
b) 1 21
c) 0 1 2
d) 1 3 3
f) 1 22
g) 12 3
h) 1 03
e) 1 1 1
[ ]
[ ]
[ ]
[ ]
[
]
[ ]
[ ]
[ ]
15- Determine os índices para as direções mostradas na seguinte célula unitária cúbica: (W.
Callister)
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16- Determine os índices de Miller para os planos mostrados na seguinte célula unitária: (W.
callister)
17- Determine os índices de Miller para os planos mostrados na seguinte célula unitária:
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18- Determine os índices de Miller para os planos mostrados na seguinte célula unitária: (W.
Callister).
19- Esboce dentro de uma célula unitária cúbica os seguintes planos: (W. Callister)
a) (0 1 1 )
b) (11 2 )
c) (10 2 )
d) (1 3 1)
e) (1 1 1 )
f) (12 2 )
g) (1 2 3 )
h) (0 1 3 )
20- Abaixo estão mostrados três planos cristalográficos diferentes para uma célula unitária de um
metal hipotético; os círculos representam átomos: (W. Callister)
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a) A qual sistema cristalino pertence a célula unitária?
b) Como seria chamada essa estrutura cristalina?
c) Se a densidade desse metal é de 8,95g/cm3, determine seu peso atômico.
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4.7. Referências
W.D. CALLISTER Jr., Materials Science & Engineering. An Introduction. Third Edition. Editora
John Wiley & Sons, 1994.
L.H. VAN VLACK, Propriedades dos Materiais Cerâmicos. Editora da Universidade de São
Paulo, 1973.
D.W. RICHERSON, Modern Ceramic Engineering. Properties, Processing and Use in Design.
Segunda Edição. Editora Marcel Dekker. 1992.
P.S. SANTOS, Ciência e Tecnologia de Argilas. Volune 1. Segunda Edição Editora Edgard
Blücher. 1989.
W. ACCHAR, Materiais Cerâmicos: Ciência e Tecnologia. Editora da UFRN. 2000
A.F. PADILHA, Materiais de Engenharia. Microestrutura e Propriedades, Editora Hemus, 1997.
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CAPÍTULO IV ESTRUTURAS ATÔMICAS