MEDIDAS CONTRA O ATRASO
Sete passos para desatar o nó das estradas
Para que as estradas gaúchas deixem de ser entraves ao
desenvolvimento e risco iminente aos usuários, como mostrou ontem um
caderno especial de ZH, especialistas em infraestrutura listam uma série de
medidas e sugerem a mudança na forma de tratar o tema. As saídas partem
da retomada do conceito de planejamento de Estado, que seria imune à
troca de governos, e seguem pela necessidade de aperfeiçoar os projetos
básicos de rodovias, ponto de partida para evitar problemas futuros.
Entre as sugestões apresentadas, estão a exigência de que as
empreiteiras assumam a responsabilidade pela manutenção a médio prazo
das rodovias que constroem para o poder público (o que não é praxe) e o
uso de materiais de melhor qualidade. Questões sensíveis, como
licenciamento ambiental e a rediscussão do papel da iniciativa privada nas
tentativas de desatar o nó da malha rodoviária, também são abordadas.
E chega-se até a constatação de que parte da solução nem está nas
rodovias, e sim no incentivo a outros modais – como o ferroviário e o
hidroviário – para desafogar o tráfego.
Planejamento
Um problema apontado de forma unânime é a falta de visão de longo prazo.
Especialistas defendem a necessidade de transformar o planejamento em lei
no Estado, indicando as obras prioritárias. O objetivo é impedir que novos
gestores abandonem projetos iniciados pelo antecessor, evitando o
desperdício do já escasso dinheiro público.
– Precisamos de um planejamento que tenha de ser seguido pelos
governantes – avalia Paulo Menzel, coordenador do Fórum Temático de
Infraestrutura da Agenda 2020.
Dessa forma, seriam evitadas situações como a verificada na ERS129 (foto), entre Vanini e David Canabarro, na Serra. O trecho, quase
concluído no ano passado, está agora esfacelado. Faltava a última camada
de asfalto, um investimento de cerca de R$ 50 mil. Com a falta de recursos e
o tráfego liberado, a estrada está degradada. O custo para o conserto agora
é 10 vezes maior.
Projetos
Outro ponto considerado crucial é o aperfeiçoamento dos projetos
básicos, mais detalhados e com boas estimativas de custos, avalia Juarez
Freitas, professor de Direito Administrativo da PUCRS e da UFRGS e
presidente do Instituto Brasileiro de Altos Estudos de Direito Público. Mais
minuciosos, poderiam prever possibilidade de duplicações, minimizando
riscos de entraves nas fases seguintes, como as licitações e execução de
obras.
Projetos bem feitos também evitam surpresas ao longo da
construção e a necessidade dos famosos aditivos, que deixam a obra mais
cara e geram suspeitas nos órgãos de controle – o que pode levar até
mesmo à paralisação dos empreendimentos.
Ainda na parte de planejamento, o poder público deveria formar uma
espécie de banco de projetos prontos, como se estivessem em uma
prateleira, aptos para serem utilizados quando fosse necessário dar a largada
nas obras.
Hidrovias e ferrovias
Outra forma de contribuir para a qualidade das estradas, diminuindo
o número de caminhões sobre os pavimentos, seria incentivar outros modais
como hidrovias e ferrovias. Hoje, 85% das cargas no Rio Grande do Sul são
transportadas por rodovias, um percentual acima da média nacional de 58%.
Nos Estados Unidos, o índice de transporte por estradas cai para 38%.
Manutenção
No caso de obras contratadas por órgãos públicos, a licitação deveria
prever a obrigação da empreiteira de garantir a manutenção da via no médio
prazo, para evitar a deterioração da estrada pouco depois de sua conclusão.
Assim, evita-se que novos recursos dos contribuintes tenham de ser
direcionados a consertos. Com essa medida, a própria empreiteira teria o
interesse de garantir a qualidade do pavimento.
Fiscalização
Os governos estadual e federal deveriam incrementar o controle do
excesso de peso nas estradas, reativando e construindo balanças. ZH
mostrou que postos de pesagem como em Butiá (foto), estimados em R$ 7
milhões cada, estão abandonados.
O plano do governo federal é instalar, em 2013, sensores eletrônicos
nas rodovias do Estado. Eles vão medir peso e dimensão do caminhão,
mesmo com o veículo em movimento. Mas especialistas sustentam que o
equipamento não substitui as balanças.
Licenciamentos
Há necessidade de definir que tipo de empreendimento será
licenciado pelo Ibama ou órgãos estaduais e evitar conflitos de competência.
O Ibama quer mais obras utilizando o Relatório Ambiental Simplificado. Exige
menos informações e os prazos são inferiores.
– Hoje para cortar uma árvore é preciso planejamento e aprovação.
Se for nativa, é necessário transplantá-la e ter um projeto para o transplante
– exemplifica o ex-deputado e ex-secretário de Estado Luis Roberto Ponte,
um dos proprietários da Construtora Pelotense.
Capital privado
Apesar da polêmica dos pedágios por localização de praças, tarifas e
poucos investimentos, a participação privada é alternativa em outros países e
em São Paulo, dono da melhor malha do país.
Na forma de concessão ou de parceria público-privada (PPP),
compensa a falta de recursos públicos e a lentidão estatal, aponta Luiz
Afonso dos Santos Senna, do Departamento de Engenharia de Produção e
Transportes da UFGRS. O governo gaúcho optou por não renovar as
concessões e criar a Empresa Gaúcha de Rodovias (EGR) para administrar os
trechos, mas há dúvidas sobre o fôlego da empresa pública para investir.
Como funcionam as PPPS
Além da concessão, há dois tipos de parcerias com a iniciativa
privada:
Patrocinada: ocorre quando, além da tarifa cobrada dos usuários, a
empresa ou consórcio também é remunerada pelo parceiro público. São
usadas para estradas.
Administrativa: o cliente do serviço é a administração pública. O
parceiro privado é remunerado apenas pelo poder público. Um exemplo é a
construção e administração de presídios.
Concessão comum: a remuneração do parceiro privado ocorre pela
tarifa cobrada dos usuários finais do serviço (como nos pedágios).
Uma alternativa ao asfalto
Embora mais caro na fase de construção, o concreto de cimento
portland (CCP) é considerado alternativa para elevar a vida útil das rodovias
e, ao longo dos anos, pelo menor custo de manutenção na comparação com
o asfalto. No entanto, devido à visão de curto prazo dos governos e
problemas de caixa, ainda é pouco usado em rodovias no país – são menos
de 5 mil quilômetros.
– O concreto, se bem executado, dura muito e é uma solução para o
tráfego pesado – diz o professor Washington Peres Núñez, pesquisador do
Laboratório de Pavimentos da UFRGS.
Mas o material não é a solução em todos os casos, ressalta o
especialista. O concreto não é recomendado em regiões com solos
considerados moles, próximos da água.
Inaugurada em 1977, a ERS-118, na Região Metropolitana, foi uma
das primeira rodovias do Estado pavimentadas com concreto, utilizado
novamente nas obras de duplicação em andamento na estrada. No sul do
Estado, 27 quilômetros da duplicação da BR-392, entre Pelotas e Rio Grande,
também foram construídos com pavimento rígido. Outro exemplo é um
segmento de 17 quilômetros da freeway, no sentido Litoral-Porto Alegre.
– Era um trecho em que a única solução era a reconstrução.
Optamos pelo concreto porque não haveria a necessidade de intervenções
pesadas a cada oito anos. Então, apesar do custo inicial ser mais alto, no fim
seria mais baixo – explica Thiago Vitorello, diretor de engenharia e operações
da Concepa, lembrando que, à época, no ano 2000, a empresa tinha pela
frente 17 anos de concessão.
Por ser mais rugoso, o concreto conta ainda com a vantagem da
segurança. Proporciona mais aderência, principalmente quando há água na
pista.
Rodovias de Terceiro Mundo
Publicado ontem, um caderno especial de ZH apresentou uma das
mais completas análises já feitas pela imprensa sobre as condições das
estradas gaúchas.
O documento, produzido ao longo de dois meses de apuração,
mostrou como a combinação de baixos investimentos, faltas de fiscalização,
entraves burocráticos e suspeitas de irregularidades em obras resulta em
rodovias esburacadas e perigosas.
Para os gaúchos, uma triste constatação: apenas 7,2% das estradas
do Estado são pavimentadas, o pior índice do Brasil.
Download

Dep. João Fischer