Justiça Federal
Tribunal Regional Federal da 5ª Região
Desembargador Federal Fernando Braga
APELAÇÃO CRIMINAL nº 8812/AL
ADV/PROC
ORIGEM
RELATOR
(0006854-41.2010.4.05.8000)
: FABIANO DE AMORIM JATOBA e outros
: 2ª VARA FEDERAL DE ALAGOAS
: DESEMBARGADOR FEDERAL FERNANDO BRAGA –Segunda
Turma
RELATÓRIO
O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL FERNANDO BRAGA
(RELATOR): O Ministério Público Federal apelou contra sentença que absolveu
sumariamente Paulo Fernando Gomes de Carvalho, pela prática da conduta descrita
no art. 296, § 1o, III c/c o art. 328 do Código Penal, nos termos do art. 397, III, do
Código de Processo Penal (fls. 243/248).
O apelante reeditou os termos da denúncia e defendeu que a
exploração, por meio do sítio eletrônico www.investloto.com.br, de loteria,
caracteriza usurpação de serviço público, concedido exclusivamente à Caixa
Econômica Federal, nos termos do Decreto-lei no 204, de 27/2/1967 (fls. 249/253).
Segundo o MPF, a Caixa informou que não autorizou o acusado a utiliza marca e
nome de suas loterias naquele sítio eletrônico. Desse modo, a conduta configura o
tipo de uso indevido de marca pertencente à órgão ou entidade da Administração
Pública (art. 296, § 1o, III, do CP). Para o recorrente, nesse momento processual
vigora o princípio in dubio pro societate e que "apenas ao final da instrução processual, caso
não existissem elementos comprobatórios da autoria e materialidade delitiva, é que se imporia a
aplicação da presunção do in dubio pro reo."
As contrarrazões de Paulo Fernando Gomes de Carvalho pugnam pela
manutenção do julgado (fls. 259/274).
A Procuradoria Regional da República da 5a Região opinou pelo
improvimento da apelação, em parecer assim ementado (fls. 280/282):
PENAL.
PROCESSO
PENAL.
APELAÇÃO
CRIMINAL.
FALSIFICAÇÃO DE SELO OU SINAL PÚBLICO. USURPAÇÃO DE
FUNÇÃO PÚBLICA. ART. 296, § 1°, III, E ART. 328 AMBOS DO CP.
SÍTIO ELETRÔNICO DE APOSTAS. EFETIVAÇÃO DOS JOGOS E
LOTÉRICAS AUTORIZADAS. ATIPICIDADE DA CONDUTA.
ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA. IMPROVIMENTO DO APELO.
É o relatório. Ao eminente Revisor.
CACC
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APELAÇÃO CRIMINAL nº 8812/AL
ADV/PROC
ORIGEM
RELATOR
(0006854-41.2010.4.05.8000)
: FABIANO DE AMORIM JATOBA e outros
: 2ª VARA FEDERAL DE ALAGOAS
: DESEMBARGADOR
FEDERAL
CESAR
(CONVOCADO) –Segunda Turma
CARVALHO
VOTO
O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL CESAR CARVALHO
(CONVOCADO) (RELATOR):
Para o deslinde da presente contenda, cumpre historiar, ainda que
brevemente, os fatos em apuração:
O MPF ofereceu denúncia em desfavor de PAULO FERNANDO
GOMES DE CARVALHO pelo cometimento, em tese, dos crimes previstos no art.
296, § 1º, III, e art. 328, ambos do CPB.
Para tanto, aduziu o parquet que o acusado, de modo consciente e
voluntário, teria, por intermédio de site, comercializado jogos de loteria e utilizado
marcas registradas pela CAIXA sem autorização, incorrendo, assim, nos crimes de
falsificação de sinal e usurpação de função pública.
O juízo, convencido de indícios de provas da autoria e da
materialidade delitivas, recebeu a denúncia, mediante decisão de fls. 117.
Todavia, após o oferecimento de resposta por parte da defesa,
esclarecida a situação de fato imputada ao acusado e trazido aos autos documentos
hábeis para tanto, o juízo exarou sentença de absolvição sumária.
Na ocasião, observou que, na realidade, as condutas, como narradas
estavam na acusação, eram de atipicidade evidente.
Vejamos o acerto da sentença.
De fato, o MPF imputou ao acusado condutas bastante definidas:
1) o acusado, valendo-se de site especialmente criado para este fim, atuava como
organizador de “bolões”
, angariando, assim, clientes para jogos de natureza
lotérica realizados através da CAIXA, empresa pública federal;
2) no aludido site, ao fazer menção aos “bolões” existentes, o denunciado
estampava na página símbolos referentes a cada um deles, inclusive aqueles
que diziam respeito a Mega-Sena, Loto-Mania, dentre outros, de
responsabilidade da CAIXA.
Pois bem.
CACC
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Foram as condutas acima resumidas que o MPF imputou ao acusado,
ao argumento de que configurariam os crimes previstos no art. 296, § 1º, III, e art.
328, ambos do CPB.
Passemos, adiante, a analisar os tipos penais imputados ao acusado.
O art. 296, § 1º, III, tipifica como crime a seguinte conduta:
Falsificação do Selo ou Sinal Público
Art. 296 - Falsificar, fabricando-os ou alterando-os:
I - selo público destinado a autenticar atos oficiais da União, de
Estado ou de Município;
II - selo ou sinal atribuído por lei a entidade de direito público,
ou a autoridade, ou sinal público de tabelião:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa.
§ 1º - Incorre nas mesmas penas:
(...)
III - quem altera, falsifica ou faz uso indevido de marcas,
logotipos, siglas ou quaisquer outros símbolos utilizados ou
identificadores de órgãos ou entidades da Administração
Pública.
Ao atentar para a redação do art. 296, § 1º, III, claramente se verifica a
intenção do legislador de punir aquele que, “fazendo-se” passar por órgão ou
entidade da Administração Pública, utiliza sinal identificador deste, causando
confusão nos expectadores.
Definitivamente, não foi esta a conduta narrada pela acusação e
imputada ao acusado nesses autos.
Como descrito na denúncia e já resumido neste ato jurisdicional, ao
acusado foi atribuída a prática de colocar em seu site logotipos referentes à CAIXA,
mas sem jamais se fazer passar por “representante”da CAIXA.
Na realidade, os sinais identificadores da CAIXA estavam no site, mas
atrelados a serviços que a aludida empresa pública, de fato, disponibilizava, quais
sejam, apostas de natureza lotérica.
Em outras palavras, o acusado apenas informava aos pretensos clientes
a origem e natureza dos serviços que contratariam, sem intenção de enganá-los,
tampouco de passar-se por representante de órgão ou entidade da Administração
Pública, como exige o tipo.
Exatamente por esses motivos, diante da evidente atipicidade da
primeira conduta narrada, o juízo arrematou pela absolvição sumária.
CACC
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fls. 243/248.
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Nesse sentido, basta rever a fundamentação da sentença que repousa às
E, da mesma forma, era de se pontuar pela atipicidade evidente da
segunda conduta, senão vejamos.
O art. 328 do CPB trata como crime a seguinte prática:
Usurpação de Função Pública
Art. 328 - Usurpar o exercício de função pública:
Pena - detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos, e multa.
Parágrafo único - Se do fato o agente aufere vantagem:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.
A redação do mencionado artigo é de igual clareza, se comparada à do
primeiro. Pune-se aquele que usurpa – apodera-se, desempenhando sem ser
regularmente investido –função a ser desempenhada por agente público em sentido
lato.
Também não foi o caso dos autos.
Como dito, o acusado não foi denunciado por realizar apostas, atuando
como se fosse a CAIXA, empresa pública federal. O que o apelado fazia, isto sim, era
servir como mero intermediador de tais serviços, na medida em que apenas
organizava “bolões”e encaminhava os apostantes aos estabelecimentos devidamente
autorizados.
Portanto, não há que se falar em usurpação de função pública, por ser
evidente que o denunciado não atuou como agente da CAIXA.
E foi justamente com base em tais argumentos que o juízo, novamente
diante da atipicidade evidente da conduta, concluiu pela absolvição sumária.
Enfim, da forma como as condutas foram imputadas ao acusado,
evidente a atipicidade de ambas.
Sobre a absolvição sumária, não custa rememorar que constitui
importante inovação trazida pela Lei n.º 11.719/2008 ao CPP, consubstanciando-se
em autêntico julgamento antecipado da lide com apreciação do mérito.
Com efeito, o juiz absolverá sumariamente o réu apenas quando for
possível reconhecer, de forma patente e imediata, quaisquer das matérias elencadas
no art. 397, a saber: a existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato; a
existência manifesta de causa excludente da culpabilidade do agente, salvo
inimputabilidade; o fato narrado evidentemente não constitua crime; ou estiver
extinta a punibilidade do agente.
CACC
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Pois, no caso dos autos, o juízo estava mesmo diante de fatos que,
evidentemente, não constituíam crimes, sendo, portanto, hipótese, como se viu, de
absolvição sumária.
Assim, mantenho a sentença por seus próprios fundamentos.
Nego provimento ao apelo.
É como voto.
Desembargador Federal Cesar Carvalho (Convocado)
Relator
CACC
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: 2ª VARA FEDERAL DE ALAGOAS
: DESEMBARGADOR
FEDERAL
CESAR
(CONVOCADO) –Segunda Turma
CARVALHO
EMENTA: PENAL. PROCESSUAL PENAL. ABSOLVIÇÃO
SUMÁRIA. CONDUTAS EVIDENTEMENTE ATÍPICAS. RECURSO
IMPROVIDO.
1) O MPF ofereceu denúncia em desfavor de PAULO FERNANDO
GOMES DE CARVALHO pelo cometimento, em tese, dos crimes
previstos no art. 296, § 1º, III, e art. 328, ambos do CPB. Para tanto,
aduziu o parquet que o acusado, de modo consciente e voluntário,
teria, por intermédio de site, comercializado jogos de loteria e
utilizado marcas registradas pela CAIXA sem autorização,
incorrendo, assim, nos crimes de falsificação de sinal e usurpação de
função pública.
2) O juízo, convencido de indícios de provas da autoria e da
materialidade delitivas, recebeu a denúncia. Todavia, após o
oferecimento de resposta por parte da defesa, esclarecida a situação
de fato imputada ao acusado e trazido aos autos documentos hábeis
para tanto, o juízo exarou sentença de absolvição sumária. Na
ocasião, observou que, na realidade, as condutas, como narradas
estavam na acusação, eram de atipicidade evidente.
3) De fato, o MPF imputou ao acusado condutas bastante definidas:
1) o acusado, valendo-se de site especialmente criado para este fim,
atuava como organizador de “bolões”, angariando, assim, clientes
para jogos de natureza lotérica realizados através da CAIXA,
empresa pública federal; 2) no aludido site, ao fazer menção aos
“bolões”existentes, o denunciado estampava na página símbolos
referentes a cada um deles, inclusive aqueles que diziam respeito a
Mega-Sena, Loto-Mania, dentre outros, de responsabilidade da
CAIXA.
4) Ao atentar para a redação do art. 296, § 1º, III, claramente se
verifica a intenção do legislador de punir aquele que, “fazendo-se”
passar por órgão ou entidade da Administração Pública, utiliza
sinal identificador deste, causando confusão nos expectadores.
Definitivamente, não foi esta a conduta narrada pela acusação e
imputada ao acusado nesses autos. Como descrito na denúncia, ao
acusado foi atribuída a prática de colocar em seu site logotipos
referentes à CAIXA, mas sem jamais se fazer passar por
CACC
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APELAÇÃO CRIMINAL nº 8812/AL
(0006854-41.2010.4.05.8000)
“representante”da CAIXA. Na realidade, os sinais identificadores
da CAIXA estavam no site, mas atrelados a serviços que a aludida
empresa pública, de fato, disponibilizava, quais sejam, apostas de
natureza lotérica. Em outras palavras, o acusado apenas informava
aos pretensos clientes a origem e natureza dos serviços que
contratariam, sem intenção de enganá-los, tampouco de passar-se
por representante de órgão ou entidade da Administração Pública,
como exige o tipo.
5) A redação do art. 328 do CPB é de igual clareza e pune aquele
que usurpa –apodera-se, desempenhando sem ser regularmente
investido – função a ser desempenhada por agente público em
sentido lato.Também não foi o caso dos autos. Como dito, o acusado
não foi denunciado por realizar apostas, atuando como se fosse a
CAIXA, empresa pública federal. O que o apelado fazia, isto sim,
era servir como mero intermediador de tais serviços, na medida em
que apenas organizava “bolões”e encaminhava os apostantes aos
estabelecimentos devidamente autorizados. Portanto, não há que se
falar em usurpação de função pública, por ser evidente que o
denunciado não atuou como agente da CAIXA.
6) Apelo improvido.
ACÓRDÃO
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região,
por unanimidade, negar provimento ao apelo, nos termos do voto do Relator, na
forma do relatório e notas taquigráficas que passam a integrar o presente julgado.
Recife, 10 de junho de 2014 (data do julgamento).
Desembargador Federal Cesar Carvalho (Convocado)
Relator
CACC
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