Ministério da Justiça
Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE
ATO DE CONCENTRAÇÃO nº 08012.007603/2003-66
Requerentes: AGCO Corporation (“AGCO”) e Kone Corporation (“Kone”)
Advogados: José Augusto Regazzini, Marcelo Caliari, Rogério Domene e Bruno Lembi
Relator:
Conselheiro Ricardo Villas Bôas Cueva
RELATÓRIO
I – DA OPERAÇÃO
Tratam os autos de operação de aquisição, em âmbito mundial, pela AGCO
Corporation (“AGCO”) de todos os ativos (bens, imóveis, ações e outros ativos) e subsidiárias
do negócio de produção, importação, distribuição, comercialização e manutenção de tratores e
motores agrícolas da Kone Corporation (“Kone”). No Brasil, a empresa objeto é a Valtra do
Brasil Ltda. (“Valtra”).
As Requerentes justificam a operação informando que a Kone já havia divulgado
a sua decisão de se concentrar no negócio de elevadores, escadas rolantes, manutenção de portas
automáticas e manuseio de contêineres e cargas, decidindo, portanto, vender o negócio de
tratores e máquinas florestais. Com isso, a AGCO verificou uma importante oportunidade para
aumentar seu portfólio de produção, a fim de competir com seus maiores concorrentes, entre eles
a John Deere e CNH.
II – DAS REQUERENTES
A AGCO é uma sociedade americana, que atua no desenvolvimento, fabricação e
distribuição, em âmbito mundial, de equipamentos agrícolas, tais como tratores, ceifeirasdebulhadoras, ferramentas para manuseio de feno, pulverizadores, forragem, equipamentos para
cultivo de terra e peças de reposição congêneres.
A Kone é uma sociedade finlandesa, que desenvolve as seguintes atividades: (i)
elevadores e escadas rolantes, responsável pela venda, fabricação, instalação, manutenção e
modernização de elevadores e escadas rolantes, bem como pela manutenção de portas
automáticas de prédios; e (ii) manuseio de materiais, envolvendo manuseio de contêineres,
manuseio de cargas, máquinas florestais e tratores.
As Requerentes obtiveram faturamento superior a R$ 400.000.000,00 no mercado
brasileiro em 2002.
III – DA APRESENTAÇÃO DO ATO DE CONCENTRAÇÃO
De acordo com as Requerentes, o “Master Agreement on Purchase of Assets and
Business” (tradução juntada às fls 40 e segs.), firmado em 10 de setembro de 2003, foi o
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primeiro documento vinculativo da operação. O presente ato foi, por sua vez, apresentado aos
órgãos brasileiros de defesa da concorrência em 01 de outubro de 2003.
IV – DA TAXA PROCESSUAL
As Requerentes apresentaram, a fl. 38 dos autos, cópias autenticadas dos
comprovantes de recolhimento das taxas processuais relativas ao CADE, SEAE e SDE.
V – DA IMPUGNAÇÃO À OPERAÇÃO
Em 15 de outubro de 2003, a empresa CNH Americana Ltda (“CNH”), concorrente
das Requerentes, apresentou impugnação à operação destacando os seguintes aspectos:
(i)
As Requerentes terão um market share conjunto de 49,2% no mercado nacional de
tratores padrão, sendo que, no segmento de tratores de 165 CV será de 84,6% (dados
de 2002), o que demonstra a condição de monopolista das Requerentes;
(ii)
As importações são pouco significativas por diversas razões;
(iii)
A entrada no mercado de tratores não poderia ocorrer em um prazo inferior a 2 anos e
o investimentos mínimos iniciais são da ordem de R$ 1,5 bilhão; e
(iv)
A rivalidade não é suficiente para coibir um eventual exercício de posição dominante.
Na mesma data, a CNH requereu ao CADE concessão de medida cautelar a fim de
evitar práticas de quaisquer atos que modificassem a estrutura, as condições ou as características
do mercado.
Através do Despacho Gab. FOM 22/2003, referendado pelo Plenário do CADE em
05 de novembro de 2003 (Sessão Ordinária nº 304), o então Conselheiro Fernando de Oliveira
Marques concedeu a medida cautelar requerida, a fim de ordenar às Requerentes a
reversibilidade do ato de concentração ora em análise, solicitando manifestações da SEAE/MF,
SDE/MJ, da Procuradoria do CADE e do Ministério Público Federal.
Em 28 de junho de 2004, as Requerentes protocolaram petição, solicitando a
revogação da Medida Cautelar nº 08700.004932/2003-05. Por ocasião da 27ª Sessão de
Distribuição Extraordinária, realizada em 11 de agosto de 2004, o presente feito foi redistribuído
à minha relatoria. Na condição de relator, submeti o despacho Gab. RVBC 01/2004, no qual
decide pela manutenção da medida cautelar, ao plenário do CADE, sendo referendado por
unanimidade na 329ª Sessão Ordinária, em 01 de setembro de 2004.
Em 27 de janeiro de 2005 as Requerentes protocolaram petição (fls. 632/639)
requerendo a revogação da Medida Cautelar, tendo em vista o advento dos pareceres da
SEAE/MF e SDE/MJ.
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VI – DOS PARECERES
VI.1 – Secretaria de Acompanhamento Econômico – SEAE/MF
A SEAE/MF, em seu parecer de fls. 547/601, adotou dois cenários para a
definição o mercado relevante sob dimensão produto: (i) o de tratores agrícolas de rodas tomados
como um todo e (ii) o de tratores agrícolas de rodas segmentados por faixa de potência, ambos
na dimensão geográfica nacional. Entretanto, independente do cenário, verificou que a
participação de mercado das Requerentes é superior a 50%.
Após extensa análise, a SEAE/MF concluiu pela aprovação da operação sem
restrições. A análise se baseou, em suma, nos seguintes quesitos:
1) Das condições de entrada – não se verifica no presente caso condições
favoráveis de entrada, tendo em vista que o investimento necessário é elevado (cerca de US$ 114
milhões); o tempo necessário para entrada efetiva ultrapassa 2 anos, há dificuldades de montar
uma rede de distribuição eficiente e necessidade de investimentos elevados em marketing. Além
disso, as principais montadoras mundiais de tratores agrícolas já se encontram instaladas no
Brasil. Logo, as condições de entrada não se mostram suficientes para evitar um eventual
exercício de poder de mercado.
2) Da rivalidade – verificou que existe significativa concorrência no mercado
nacional de tratores, pois, entre os concorrentes das Requerentes, encontram-se grandes
empresas transnacionais, como a CNH e a John Deere, esta última está construindo uma nova
fábrica no sul do país1, o que demonstra aspectos positivos sobre a concorrência no setor.
Entretanto, a SEAE afirma que não há certeza de que essa rivalidade é suficiente para combater
um possível exercício de poder de mercado via aumento de preços.
3) Da possibilidade de aumento de preços – a SDE, em instrução conjunta com a
SEAE, elaborou estudo econométrico, no qual procurou estimar a demanda por tratores, bem
como as elasticidades cruzadas, isto é, a possibilidade de substituição entre os tratores (inclusive
de faixas diferentes). Tal estudo concluiu que “há elasticidades cruzadas positivas e
estatisticamente significativas entre os diversos modelos de tratores ofertados pelas diferentes
empresas participantes do mercado. Além disso, observou-se que há algum grau de substituição
entre modelos alocados em diferentes faixas de potência. Esses dois fatores, em conjunto,
sinalizam a existência de um certo grau de rivalidade entre as empresas atuantes no mercado, o
que reduziria a probabilidade das requerentes elevarem seus preços de forma unilateral”.
Além disso, consignou que: o cenário para o mercado de tratores não se mostra
muito otimista, tendo em vista que não há no momento nenhuma grande linha de crédito aberta
para esse segmento, cujas vendas dependem em grande escala de financiamentos e leasing; as
vendas de tratores apresentaram uma retração de 10% de 2002 para 2003; e historicamente a vida
útil dos tratores no Brasil é consideravelmente maior do que no exterior, o que significa que um
aumento de significativo de preços poderia levar o agricultor ampliar ainda mais essa vida útil.
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Embora a SEAE informe que não se sabe ainda se a capacidade produtiva dessa nova unidade estará voltada para o
mercado interno ou externo, não podendo, portanto, afirmar qual o real impacto desse investimento no mercado
nacional de tratores.
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Por fim, outra questão levantada pela SEAE diz respeito às conseqüências de uma
reprovação da operação e a respectiva determinação de alienação da marca Valtra. Nesse caso, a
SEAE, atentou para a extinção da marca, uma vez que o Grupo Kone (detentor da marca antes da
operação) já se retirou do negócio mundialmente e que, até o momento, não é de conhecimento
dos órgãos de Defesa da Concorrência que haja algum investidor interessado em adquirir essa
empresa. Com isso, a Valtra sairia do mercado, reduzindo em até 15.000 unidades a quantidade
de tratores no mercado nacional.
Com base nesses argumentos, a SEAE opinou pela aprovação da operação sem
restrições e pela revogação da medida cautelar em vigor, tendo em vista o desaparecimento de
seus requisitos.
VI.2 – Secretaria de Direito Econômico – SDE/MJ
A SDE/MJ, em nota técnica de fls. 606/607, opinou pela aprovação da operação sem
restrição, reiterando o teor do parecer da SEAE/MF, tendo em vista a instrução em conjunto. A
SDE considerou a apresentação tempestiva.
VI.3 – Procuradoria do CADE - ProCADE
A ProCADE opina pela aprovação da operação sem restrições corroborando os
pareceres da SEAE/MF e SDE/MJ e revogação da medida cautelar imposta, por ausência de
fumus boni iuris. A ProCADE considerou a apresentação tempestiva.
VII – DA RETIRADA DE PAUTA
A pedido da impugnante, o processo foi retirado da pauta da 341ª sessão ordinária de
julgamento, para que esta se manifestasse acerca do parecer da SEAE e do estudo econométrico
elaborado pela SDE (fls. 641/675). Observo que o estudo econométrico foi juntado aos autos
somente em 22 de fevereiro, portanto, a impugnante não teve acesso a tal documento
anteriormente.
Em 04 de março de 2005, a Impugnante apresentou as críticas ao parecer da SEAE
(fls. 690/740) e parecer econômico (fls. 741/762) comentando o estudo econométrico da SDE.
Em 16 de março de 2005, as Requerentes apresentaram suas manifestações (fls.
772/801) referentes ao parecer da impugnante.
É o relatório.
Brasília, 29 de março de 2005.
RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
Conselheiro
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