II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte Manipulação da Fermentação microbiana ruminal para máxima eficiência animal Hilário Cuquetto Mantovani1 e Cláudia Braga Pereira Bento2 1 Professor Associado DMB/UFV; 2 Pós-Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Microbiologia Agrícola - UFV Afiliação: Universidade Federal de Viçosa, Departamento de Microbiologia, Viçosa, MG, 36570-000 Estrutura e função do Ecossistema Ruminal O ecossistema ruminal é descrito como um ambiente filogeneticamente complexo e funcionalmente redundante, colonizado por grupos diversos de espécies microbianas que conferem aos animais ruminantes a capacidade de digerir material vegetal rico em fibras (Flint et al., 2008). Embora os ruminantes não secretem enzimas digestivas no rúmen (o maior compartimento do estômago multicavitário), bactérias, fungos e protozoários anaeróbios que vivem em simbiose com o hospedeiro são capazes de hidrolisar carboidratos solúveis, insolúveis, proteínas e lipídios da dieta (Nafikov e Beitz, 2007). A fermentação ruminal resulta de relações ecológicas complexas entre as diferentes espécies de micro-organismos ruminais e a estrutura da comunidade microbiana pode ser afetada pelas características do hospedeiro e dos alimentos que compõem a dieta (Weimer, 2009, 2010, 2011; Yokoyama et al., 1993). Diferentes espécies e grupos microbianos são encontrados livres na fração líquida ou aderidos aos alimentos e na parede do rúmen (McAllister et al. 1994; Lukáš et al., 2010). Os produtos principais da fermentação ruminal incluem ácidos orgânicos voláteis (AOV), proteína microbiana, amônia, e os gases CO2, H2 e metano (Van Soest, 1994). Alguns desses produtos constituem a principal fonte de energia e nitrogênio para o hospedeiro, enquanto outros representam perdas dietéticas indesejáveis, além de estarem associados com problemas ambientais como contaminação de aquíferos e liberação de gases de efeito estufa. As populações bacterianas do rúmen são tipicamente classificadas em grupos nutricionais, considerando o tipo e a especificidade do(s) substrato(s) 1 II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte sobre o qual atuam, sendo agrupadas em bactérias fermentadoras de carboidratos estruturais (celulose e hemicelulose), fermentadoras de carboidratos não estruturais, amilolíticas, pectinolíticas, lipolíticas, proteolíticas, arqueas metanogênicas e bactérias láticas (Orskov, 1988; Beloqui et al., 2006). A Tabela 1 relaciona as principais espécies de bactérias e arqueas tradicionalmente isoladas do ecossistema ruminal. Várias das espécies descritas foram isoladas por métodos tradicionais de cultivo entre as décadas de 1960 e 1980, por pesquisadores da área de microbiologia do rúmen. No entanto, com o advento de técnicas de biologia molecular e a disponibilização de informação genômica em bancos de dados públicos, a utilização de métodos independentes de cultivo para avaliar a diversidade genética e a atividade metabólica no rúmen têm sido cada vez mais frequentes e rotineiros (Head e Bailey, 2003; Deng et al., 2008). A análise da sequência de ácidos nucléicos dos micro-organismos encontrados no rúmen indica que a composição da comunidade microbiana ruminal é mais complexa do que foi inicialmente predito, podendo variar entre indivíduos e em função da idade do animal, composição química e física da ração, estação do ano, localização geográfica e condições de manejo (Purushe et al., 2010). A diversidade genética e a composição da comunidade microbiana do rúmen tem sido avaliada por técnicas de amplificação e sequenciamento do gene que codifica o RNA ribossômico 16S (Edwads et al., 2004; Wright, 2004), além de eletroforese em gel de gradiente desnaturante (DGGE) (Shinkai et al., 2010), hibridação substrativa supressiva (SSH) (Galbraith et al., 2004), hibridização in situ com sondas fluorescentes (FISH) (Shinkai e Kobayashi, 2007) e quantificação por PCR quantitativo (qPCR) (Stevenson e Weimer, 2007). Adicionalmente, o sequenciamento de genomas inteiros de espécies que colonizam o rúmen tem possibilitado inferências diretas sobre as características fisiológicas e genéticas desses microrganismos (Suen et al., 2011). Alguns fatores interferem com a análise da diversidade microbiana, incluindo os métodos de extração de DNA e a distribuição dos microorganismos em nichos ecológicos distintos (p. ex. fração sólida e líquida do rúmen). A reação em cadeia da polimerase (PCR) permite o estudo dos genes 2 II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte microbianos diretamente amplificados a partir de amostras do ambiente (García-Martínez et al., 1999). A região do DNA a ser amplificada é determinada pelos oligonucleotídeos iniciadores, que são pequenas sequências de DNA construídas artificialmente, complementares e específicas às regiões distintas do gene de interesse (Walker et al., 1999; Powledge, 2004). Tabela 1 – Caracterização de bactérias cultiváveis descritas como predominantes no ecossistema ruminal. CU – celulose, HC – hemicelulose, DX – dextrinas, SU – açúcares, ST – amido, PC – pectina, XY – xilanas, L – lactato, S – succinato, GL – glicerol, AA – aminoácidos, AO – ácidos orgânicos, H2 – hidrogênio, F – formato, CO2 – Dióxido de carbono, A – acetato, E – etanol, B – butirato, P – propionato, Br – ácidos graxos voláteis de cadeia ramificada e CH 4 – metano ((Russell e Rychlik, 2001). Bactérias Principais Substratos Produtos da utilizados Fermentação Fibrobacter succinogenes CU S, F, A Ruminococcus albus CU, HC A, F, E, H2 Ruminococcus flavefaciens CU, HC S, F, A, H2 Eubacterium ruminantium HC, DX, SU A, F, B, L Ruminococcus amylophilus ST S, F, A, E Streptococcus bovis ST, SU L, A, F, E Succinomonas amylolytica ST S, A, P Prevotella spp. ST, PC, XY, SU S, A, F, P Butyrivibrio fibrisolvens ST, CU, HC, PC, SU B, F, A, H2 Selenomonas ruminantium ST, DX, SU, L, S L, A, P, B, F, H2 Megasphaera elsdenii L, SU P, A, B, Br, H2 Lachnospira multiparus PC, SU L, A, F, H2 Succinivibrio dextrinosolvens PC, DX, SU S, A, F, L Anaerovibrio lipolytica GL, SU A, S, P Peptostreptococcus anaerobius AA Br, A Clostridium aminophilum AA A, B Clostridium sticklandii AA A, Br, B, P Wolinella succinogenes OA, H2, F S Methanobrevibacter ruminantium H2,CO2,F CH4 Manipulação da fermentação ruminal Os avanços nos estudos de ecologia microbiana do rúmen e a caracterização de interações sinergísticas entre a microbiota do trato gastrointestinal do ruminante e o hospedeiro são fundamentais para o desenvolvimento de estratégias de manipulação da fermentação ruminal que possibilitem aumentar a eficiência da produção animal, uma vez que a microbiota ruminal desempenha papel central na digestão dos componentes da 3 II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte dieta e no fornecimento de energia e nitrogênio para o animal (HernandezSanabria et al., 2010). A manipulação da fermentação ruminal visa tipicamente aumentar a eficiência alimentar e a produtividade animal, reduzir as perdas durante a fermentação ruminal e amenizar o impacto ambiental da atividade agropecuária (Nagaraja, 2003). Em termos práticos, os estudos com o objetivo de melhorar a eficiência da fermentação ruminal almejam desenvolver estratégias para manter o pH ruminal estável e próximo da neutralidade, direcionar as coenzimas reduzidas durante a fermentação ruminal para a síntese de ácido propiônico, aumentar a digestibilidade de alimentos ricos em fibra, balancear a atividade proteolítica no rúmen e a taxa de desaminação de aminoácidos da dieta com o consumo de carboidratos pela microbiota ruminal e diminuir a emissão de gases de efeito estufa, como o metano (Nagaraja et a., 1997; Russell, 2000; Russell e Houlihan, 2003). As estratégias propostas para atingir esses objetivos são diversas e podem envolver desde técnicas de manejo e alimentação dos animais até o uso de substâncias químicas (aditivos) que atuam sobre a microbiota do rúmen e modificam os produtos da fermentação ruminal. Dentre as técnicas de manejo e alimentação destacam-se o fornecimento de dietas completas, a alteração da frequência de alimentação, o fornecimento de fibra fisicamente efetiva e a utilização de lipídios na dieta. Outro aspecto importante, porém geralmente negligenciado, relaciona-se ao manejo de bezerros durante as primeiras semanas de vida, período em que o desenvolvimento anatômico e funcional do rúmen coincide com a colonização microbiana do ecossistema ruminal e com alterações na absorção de nutrientes e resposta imunológica dos animais. Estudos demonstram que a sucessão de micro-organismos que se estabelecem no trato gastrointestinal determina a estrutura da comunidade microbiana do indivíduo adulto e afeta a nutrição e saúde geral do hospedeiro. Nesse contexto, a expressão plena do potencial genético do ruminante depende da eficiência da microbiota ruminal selecionada durante o processo de colonização e das relações simbióticas específicas estabelecidas entre a comunidade microbiana intestinal e o hospedeiro. O estudo e a elucidação dessas relações podem representar uma nova janela de 4 II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte oportunidade para a manipulação da fermentação ruminal visando a máxima eficiência animal. Estratégias nutricionais para a manipulação da fermentação ruminal Neste tópico serão considerados alguns aspectos da dieta fornecida ao ruminante que afetam a fermentação ruminal e que podem servir como alternativas aos agentes modificadores da microbiota ruminal. A composição química, a quantidade e a taxa de fermentação dos carboidratos da dieta influenciam diretamente a concentração e a proporção de AOV totais resultantes da fermentação ruminal e, consequentemente, afetam a quantidade de CH4 (metano) produzido pelo animal. Quando os ruminantes são alimentados com dietas ricas em amido a recuperação de coenzimas reduzidas na via do acrilato é favorecida resultando na produção de propionato. Por outro lado, dietas ricas em volumosos ou em componentes que favorecem a síntese de acetato geram H2 e CO2 como coprodutos, com consequente aumento da produção de CH4 (Johnson e Johnson, 1995; Boadi et al., 2004). McAllister et al., (1996) reportaram que o aumento na ingestão de concentrado de 40 para 68 g MS Kg-0,75 diminuiu a produção de CH4 de 9,2 % para 5,3 %. Dietas ricas em grãos (≥ 90 % com base na MS), como as comumente consumidas pelos bovinos em confinamento nos EUA, tendem a reduzir a emissão de CH4 a valores próximos a 2-3 % (Johnson e Johnson, 1995). O líquido ruminal de animais alimentados com dietas contendo 90 % de concentrado apresentam menores valores de pH ruminal (6,22 vs 6,86), maiores concentrações de AOV total (85 vs 68 mM) e menor relação acetato:propionato (2,24 vs 4,12) quando comparados a animais alimentados com 100 % de alimentos volumosos (Russell, 1998). O aumento do nível de consumo de matéria seca por animais ruminantes eleva a quantidade de AOV totais, a concentração de amônia e a concentração de CH4 independente do tipo de dieta fornecida ao animal (Benchaar et al., 2001). A produção de CH4 tende a aumentar quando a dieta contém forrageiras de maior maturidade e a fermentação de leguminosas geralmente resulta em 5 II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte menor quantidade de CH4 entérico quando comparado à fermentação de gramíneas (McAllister et al, 1996; Moss et al, 2000). A frequência de alimentação também apresenta efeito direto sobre a fermentação ruminal. Sutton et al. (1986) reportaram que altas frequências de alimentação tendem a aumentar produção de propionato e reduzir a produção de ácido acético e CH4 em vacas leiteiras. Segundo os autores, a baixa frequência de alimentação aumenta as flutuações diurnas do pH inibindo a população de arqueas metanogênicas (Sutton et al. 1986,. Shabi et al. 1999). French e Kennelly (1990) demonstraram que uma maior frequência de alimentação durante o dia aumenta a relação acetato:propionato. Esses autores observaram que vacas da raça Holandesa alimentadas com 12 porções iguais de concentrado distribuídas em intervalos de 2 h apresentaram maior pH ruminal, maior relação acetato:propionato e maior porcentagem de gordura do leite quando comparado com os animais que receberam a ração dividida em apenas duas porções iguais durante o dia. Alguns autores afirmam que a manipulação da relação volumoso:concentrado possibilita aumentar a síntese de proteína microbiana no rúmen e tornar mais eficiente a utilização dos nutrientes dietéticos (Russell et al.,1992). O crescimento microbiano depende da utilização de energia e poder redutor resultante da fermentação de substratos para a polimerização de monômeros e montagem das estruturas celulares, sendo a síntese de proteína o processo biossintético mais oneroso para a célula. Fisiologicamente, o catabolismo de substratos em condições de ausência de oxigênio (por exemplo, fermentação de carboidratos) encontra-se vinculado ao processo anabólico (síntese microbiana) via produção e utilização de adenosina trifosfato (ATP). Se a taxa de produção de ATP excede a taxa de utilização, ocorre desacoplamento energético, e a energia do ATP é dissipada como calor através de ciclos fúteis de íons através da membrana celular (Energy spilling). O desacoplamento é favorecido em condições de limitação de nitrogênio, quando altos níveis de substratos energéticos (concentrado) estão disponíveis, ou quando dietas deficientes em minerais como enxofre (S) e fósforo (P) são fornecidas aos animais (Nocek e Russell, 1988). Geralmente, quando carboidratos são limitantes, os aminoácidos dietéticos são usados como fonte 6 II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte de energia, ocorrendo acúmulo de amônia (Russell et al., 1992). Portanto, a adição de carboidratos de forma balanceada, além de estimular a síntese de proteína microbiana, previne a degradação desnecessária de aminoácidos (Nocek e Russell, 1988). A sincronização da oferta de proteína e carboidratos dietéticos no rúmen reduz a perda de nitrogênio dietético e aumenta a produção de biomassa microbiana, com efeitos positivos na eficiência alimentar (Nocek e Russell, 1988). Considerando o exposto, verifica-se que alterações na nutrição e no manejo dos animais tem efeitos diretos na fermentação ruminal, resultando em maior estabilidade do pH ruminal e redução da relação acetato:propionato. Além disso, essas estratégias contribuem para diminuir a emissão de metano, reduzir a proteólise e a degradação de aminoácidos, com consequente redução do impacto ambiental e aumento da eficiência alimentar e produtividade. Uso de aditivos para manipulação da fermentação ruminal Lipídeos na dieta Considerando que a síntese ruminal e a passagem de ácidos linoléicos conjugados (CLA) para o duodeno é função da concentração de lipídeos poliinsaturados e das alterações ocorridas no ambiente ruminal devido às manipulações dietéticas, a suplementação de bovinos com lipídeos é uma alternativa viável para aumentar a produção de CLA no rúmen e estimular sua concentração nos tecidos e leite dos ruminantes (Millen et al., 2007). A adição de lipídeos na dieta de ruminantes tem sido uma estratégia importante para a manipulação da fermentação ruminal, tendo como objetivo aumentar a densidade energética da dieta, sem que ocorram riscos de distúrbios nutricionais, decorrentes do aumento da proporção de concentrados. A utilização de lipídeos tem sido bem aceita pelo fato de aumentar a eficiência energética da dieta causando redução da metanogênese e do incremento calórico. Entretanto, por interferir negativamente na digestão da fibra, a adição de lipídeos tem sido limitada a valores 5 % da matéria seca total da dieta (Kozloski, 2009; Lourenço et al., 2010). 7 II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte Outros benefícios da suplementação lipídica seriam a potencialização da utilização do nitrogênio pelas bactérias ruminais, o aumento da eficiência de deposição de gordura nos produtos de origem animal, a maior capacidade de absorção de vitaminas lipossolúveis e o aumento do fornecimento de ácidos graxos essenciais para as membranas de tecidos. Além disso, o aumento da eficiência metabólica das reações de anabolismo no tecido adiposo também tem sido relatado, o que parece estar relacionado ao fato dos ácidos graxos estarem prontamente disponíveis para a deposição (Palmquist e Mattos, 2006; Souza et al., 2009). Beauchemin et al. (2007) trabalhando com fontes lipídicas (sebo, óleo de girassol e sementes de girassol) observaram que, comparadas a dieta controle, as dietas contendo óleo de girassol e sebo reduziram aproximadamente 14 % a emissão de metano, enquanto que a dieta contendo semente de girassol reduziu 33 % a emissão do gás. MORAIS et al. (2006), concluíram que a redução na metanogênese é devida aos seguintes fatores: 1) efeito tóxico dos ácidos graxos livres sobre arqueas metanogênicas e protozoários; 2) diminuição do consumo, em função da maior densidade energética; 3) redução da fermentação ruminal da matéria orgânica e da fibra da dieta; 4) aumento da concentração de ácido propiônico; e 5) transferência de hidrogênio livre para a rota da biohidrogenação, diminuindo a disponibilidade de hidrogênio para síntese de metano. A suplementação lipídica mostra-se uma boa alternativa para a manipulação da fermentação ruminal e melhoria na eficiência de produção de ruminantes. Porém, mais estudos relacionados às alterações ocorridas no ecossistema ruminal, ao desempenho de bovinos e ao perfil de ácidos graxos são necessários. Alterações na dieta e no manejo de alimentação tendem a aumentar a eficiência produtiva dos animais. Portanto, o balanceamento de dietas utilizando modelos matemáticos, a utilização de diferentes frequências de fornecimento de alimentos e a introdução de lipídeos na dieta têm sido utilizadas com sucesso para aumentar a eficiência de síntese de proteína microbiana no rúmen, manter a estabilidade do pH ruminal, diminuir a produção de metano e a concentração de amônia (Benchaar et al., 2001). No entanto, 8 II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte diferentes aditivos alimentares tem sido propostos para a alimentação de ruminantes, podendo satisfazer alguns ou vários dos objetivos preconizados para a melhoria da eficiência produtiva dos animais (Bergen e Bates, 1984; Rangel et al., 2008). Antibióticos ionóforos e não-ionofóros Os ionóforos utilizados na alimentação de bovinos representam um caso bem sucedido de aditivo utilizado para a manipulação da fermentação ruminal que contribui para o aumento do desempenho animal. A monensina sódica é amplamente utilizada comercialmente na produção de ruminantes há cerca de quatro décadas. A monensina é um antibiótico ionóforo poliéter produzido por Streptomyces cinnamonensis capaz de formar complexos com cátions monovalentes (por exempolo, Na+ e K+) transportando-os através da membrana por sistema de antiporte com prótons. A monensina, dentre outros efeitos, melhora a eficiência alimentar, diminui a produção de metano (CH 4) e minimiza os riscos de ocorrência de distúrbios metabólicos (Russell e Strobel, 1989). Geralmente, os ionóforos são altamente efetivos contra bactérias grampositivas, e possuem pouca ou nenhuma atividade contra bactérias gramnegativas. As bactérias gram-negativas possuem uma camada externa de natureza lipopolissacarídica, e complexos proteicos (porinas) que excluem moléculas com massa molecular maior do que 600-700 Da (Russell e Strobel, 1988, 1989). A maioria dos ionóforos é incapaz de atravessar a membrana externa. Portanto, as bactérias gram-negativas são intrinsicamente mais resistentes a esses antimicrobianos (Russell e Mantovani, 2002). No entanto, bactérias gram-positivas associadas a processos indesejáveis no rúmen (por exemplo, desaminação de aminoácidos, produção de ácido láctico) são desprovidas de membrana externa e são mais susceptíveis à ação dos antibióticos ionóforos, a exemplo da monensina (Nagajara et al., 1997). O mecanismo de ação dos ionóforos está relacionado com a capacidade dessas moléculas de transportar íons através da bicamada lipídica e de dissipar o gradiente eletroquímico gerado pelo acúmulo de prótons na face 9 II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte externa da membrana plasmática. A monensina realiza o antiporte de sódio/potássio, causando efluxo de potássio intracelular e influxo de prótons, o que resulta no abaixamento do pH intracelular. Na tentativa de restabelecer a homeostasia do citoplasma, a célula hidrolisa ATP intracelular e, eventualmente, perde viabilidade (Russell, 1987; Chen e Russell, 1989; Russell e Strobel, 1989). Bergen e Bates (1984) avaliaram vários trabalhos relacionados com o uso monensina como aditivo alimentar e observaram que nos animais tratados com monensina houve aumento do escape de proteína verdadeira do rúmen, variando de 22 a 55 % da degradação ruminal. Estudos realizados com gado de corte demonstraram que os antibióticos inibidores de bactérias grampositivas (monensina, lasalocida) diminuem a produção de metano e de amônia no rúmen (Kobayashi, 2010). A redução da desaminação resultou em menor perda de amônia por excreção urinária, aumento da retenção de nitrogênio e melhoria na eficiência de utilização do nitrogênio (Russell e Strobel, 1989). Russell et al. (1988) concluíram que a atividade específica de produção de amônia in vivo de Peptostreptococcus spp. e Clostridium spp. foi de 10 a 39 vezes maior do que a obtida com outras bactérias produtoras de amônia sensíveis à monensina. Krause e Russell (1996) relataram que a monensina (5 M) diminuiu a produção de amônia por bactérias ruminais in vitro e este decréscimo foi correlacionado com a redução na quantidade de rRNA 16S que hibridizou com sondas de ácidos nucléicos específicas para P. anaerobius e C. sticklandii. Estudos subsequentes demonstraram que a monensina reduziu a produção ruminal de amônia devido à inibição de populações específicas de bactérias gram-positivas, fermentadoras obrigatórias de aminoácidos, a exemplo das espécies Peptostreptococcus anaerobius C, Clostridium sticklandii SR e Clostridium aminophilum F (Russell et al., 1988; Chen e Russell, 1989; Paster et al., 1993). Em bovinos de leite, a utilização de monensina na concentração de 150 mg a 450 mg/dia ou do ionóforo lasalocida na concentração de 360 mg/dia reduz a produção de metano e de ácido láctico e diminui a ocorrência de desordens metabólicas, tais como acidose e timpanismo. Animais que apresentam menos desordens metabólicas e são mais saudáveis geralmente 10 II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte consomem mais matéria seca e produzem mais leite, com melhoria na eficiência reprodutiva (Rangel et al., 2008). Em gado de corte, Nagaraja et al., (1997) relataram aumento de 4 % de consumo de matéria seca, de 5 % no ganho de peso e de 9 % na conversão alimentar em animais recebendo dieta a base de feno e concentrado adicionado de monensina sódica. Apesar dos vários efeitos positivos descritos para os antibióticos ionóforos utilizados na atividade pecuária, alguns efeitos negativos também têm sido relatados (Pressman, 1976; Bergen e Bates, 1984). Uma das principais críticas ao uso de antibióticos na alimentação animal se deve à possível seleção de micro-organismos resistentes entre bactérias comensais e patógenos transientes do trato gastrintestinal do animal (Van Houweling e Gainer, 1978; Hays, 1986; Salyers e Whitt, 2005). Para minimizar esse problema tem sido recomendado que os antibióticos utilizados na terapêutica humana não sejam fornecidos aos animais como promotores de crescimento (Witte, 2000). Essa prática, aliada à aplicação de doses terapêuticas incorretas ou a realização de tratamentos incompletos, pode representar problemas potenciais para a saúde pública (Russell e Houlihan, 2003). A preocupação com a seleção de microrganismos resistentes deve-se ao fato dos ruminantes serem considerados reservatórios de várias bactérias potencialmente patogênicas, incluindo Escherichia coli, Salmonella spp., Listeria monocytogenes, Campylobacter spp. e Mycobacterium paratuberculosis (Wiedemann et al., 1996; Bean et al., 1997). Algumas estirpes bacterianas isoladas de bovinos apresentam resistência múltipla a antibióticos e representam perigo potencial para a saúde humana (Evans et al., 2005). Vários surtos causados pela ingestão de alimentos contaminados com bactérias têm sido associados com produtos de origem animal, especialmente carne e leite. Além disso, a disseminação de patógenos e de genes de resistência pode ocorrer pelas fezes do animal, contaminando o solo e aquíferos (Pell, 1997). Na década de 60, surgiram as primeiras críticas dos profissionais da área de produção animal e de saúde humana relacionadas com o uso dos antibióticos na alimentação animal (Ghadban, 2002). Na Europa, foram proibidos o uso dos antibióticos penicilina, tetraciclina, cloritetraciclina, 11 II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte oxitetraciclina, estreptomicina, neomicina, higromicina e bacitracina de magnésio (Utiyama, 2004). Em 1999, a indicação dos antibióticos bacitracina de zinco, espiramicina, virginiamicina e tilosina como promotores de crescimento foi suspensa (Peres e Simas, 2006). Até dezembro de 2005, a União Européia ainda permitia a utilização de flavomicina, avilamicina, salinomicina e monensina sódica. A partir de 2006, o uso de antibióticos como promotores de crescimento passou a ser proibido nos países da União Europeia (Palermo, 2006). Em 2004, o FDA concluiu um estudo detalhado de avaliação da segurança ao consumidor sobre uso da virginiamicina (FDA, 2004). Os resultados obtidos naquele estudo permitiram liberar a utilização deste antibiótico nos Estados Unidos (EUA), maior mercado importador de carne do mundo (Rangel et al., 2008). A virginiamicina é um antibiótico não-ionóforo da classe das estreptograminas produzidas por uma estirpe mutante de Streptomyces virginae, originalmente encontrada em solos belgas, composta de dois peptídeos denominados fator M (C28H35N3O) de massa molecular de 525 dáltons e fator S (C43H49N7O7) de massa molecular de 823 dáltons. Estudos anteriores indicaram que a atividade antibacteriana da virginiamicina depende da interação sinérgica de seus dois componentes combinados à razão de 4:1, respectivamente, M:S (Page, 2003), os quais atuam bloqueando a síntese de proteínas nas células alvo (Aarestrup et al., 1998; Coe et al., 1999). Embora cada fator individualmente possua atividade antibacteriana, o efeito combinado dos fatores M e S é mais evidente (Phibro, 2008). A virginiamicina tem sido descrita como um potente inibidor de bactérias produtoras de ácido láctico, sendo potencialmente útil na prevenção de acidoses ruminais e facilitando uma transição mais rápida entre dietas com altos níveis de forragem para dietas ricas em concentrados (Coe et al., 1999). Quanto à fermentação ruminal, este antibiótico promove aumento nas concentrações de ácido propiônico e butírico, com redução nas concentrações de ácido acético e láctico, mantendo o pH próximo à neutralidade mesmo quando o animal é alimentado com dietas ricas em concentrado (Coe et al., 1999). 12 II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte O uso virginiamicina tem apresentado efeitos positivos sobre o ganho de peso e a eficiência alimentar de animais monogástricos e ruminantes. Em ruminantes, este antibiótico apresenta maior inibição da produção de ácido láctico em relação aos ionóforos (Lanna e Medeiros, 2007). Andrighetto et al. (1997) em trabalho com bovinos recebendo dieta com alta proporção de amido e proteína, reportaram que os animais tratados com virginiamicina apresentaram aumento de 7,8 % no ganho de peso e de 7,3 % na conversão alimentar. Outro antibiótico não-ionóforo que tem sido utilizado para a manipulação da fermentação ruminal é a flavomicina, um antibiótico fosfoglicolipídico que tem sido usado exclusivamente como promotor de crescimento (Fébel et al., 1988; Butaye et al., 2003). A flavomicina atua inibindo o crescimento bacteriano, por meio da inibição competitiva da enzima que cataliza a reação de transglicosilação durante a síntese da camada de peptideoglicano, principal constituinte da parede celular bacteriana (Van Heijenoort, 2001). Esta inibição ocorre principalmente em bactérias gram-positivas, as quais possuem camada mais espessa de peptideoglicano. Porém, a flavomicina também parece atuar sobre algumas espécies de bactérias gram-negativas que possuem envelope celular similar às bactérias gram-positivas (Butaye et al., 2003). A flavomicina inibe principalmente o grupo das bactérias ruminais que apresentam alta atividade específica de desaminação (HPA) e fusobactérias gram-negativas (Edwards et al., 2005). As HPAs são bactérias com pouca atividade proteolítica, mas que tipicamente realizam o catabolismo de aminoácidos como principal estratégia para obtenção de energia e promovem intensa desaminação do substrato, podendo causar perdas de nitrogênio dietético (Russell et al., 1991; Russell, 2005). Fébel et al. (2001), relataram que a flavomicina tendeu a aumentar a proteólise no rúmen e não inibiu a síntese de proteína microbiana. No entanto, Poppe et al. (1993), ao realizarem experimento com touros holandeses, observaram que a síntese de proteína microbiana no rúmen, após a adição de flavomicina, foi levemente reduzida, bem como a taxa de degradação da proteína dietética. 13 II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte Edwards et al. (2002) estudando o modo de ação da flavomicina na dieta de ovinos recebendo trigo e concentrado, verificaram diminuição de 14 % na concentração ruminal de nitrogênio amoniacal. Edwards et al. (2005) relataram que, em experimento com carneiros que receberam dieta mista de volumoso/concentrado, com inclusão de 20 mg de flavomicina/dia, a proporção molar dos diferentes AOV não foi alterada, bem como a proporção acetato:propionato, embora tenha ocorrido diminuição significativa na concentração total de AOVs. Este resultado concorda parcialmente com o experimento realizado por Alert et al. (1993), no qual foi adicionado 50 mg/animal/dia de flavomicina na dieta de touros holandeses. Esses autores observaram que a flavomicina não alterou a proporção de acetato:propionato, porém foi observada tendência de aumento da concentração total dos AOVs no rúmen. Apesar dos resultados positivos obtidos tanto com antibióticos ionóforos como com antibióticos não-ionóforos, as pesquisas recentes têm concentrado esforços no estudo de alternativas que possibilitem minimizar a dependência de antibióticos na produção animal. Nesse contexto, os peptídeos antimicrobianos, os probióticos, ácidos orgânicos e extratos de plantas têm sido propostos como alternativas ao uso de antibióticos na produção de ruminantes. Potencial para utilização de peptídeos antimicrobianos, probióticos e outros produtos naturais As bacteriocinas são peptídeos antimicrobianos produzidos por bactérias e algumas espécies do domínio Archaea e diferem entre si quanto às características bioquímicas, massa molecular, sequência de aminoácidos e mecanismo de ação. As bacteriocinas possuem atividade bactericida ou bacteriostática e atuam induzindo a formação de poros na membrana citoplasmática de células sensíveis ou inibindo a síntese de macromoléculas, tais como peptidioglicano, ácidos nucléicos e proteínas (Cleveland et al, 2001, Cotter et al., 2005, Drosinos et al, 2006). As bacteriocinas de bactérias lácticas são as mais estudadas e a nisina produzida, por Lactococcus lactis subsp. 14 II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte lactis, é aprovada para uso em alimentos em mais de 50 países incluindo EUA, União Européia, Austrália e Brasil (Delves-Broughton, 2005). As bacteriocinas de bactérias lácticas atuam inicialmente sobre a membrana citoplasmática formando poros que causam o efluxo de componentes intracelulares (Moll et al., 1999). A nisina se liga com alta afinidade à molécula de lípidio II, um carreador hidrofóbico de monômeros de peptidoglicano, que serve como receptor específico para a bacteriocina. A interação nisina e lipídio II compromete a incorporação das unidades do precursor de peptideoglicano, bloqueando a biossíntese de parede celular bacteriana. A perda da integridade da membrana causada pela capacidade de nisina em formar poros induz o efluxo passivo de metabólitos intracelulares através da bicamada lipídica. Devido a perda de íons (potássio, fosfato), aminoácidos e ATP, a força próton motora é reduzida ou dissipada e a célula perde viabilidade (Breukink et al., 1999; Wiedemann et al., 2001). O efeito inibitório de nisina contra micro-organimos anaeróbios do rúmen já foram demonstrados (Mantovani e Russell, 2001; Kišidayová et al., 2003) e experimentos in vitro indicaram que nisina afeta a fermentação ruminal de forma semelhante à monensina (Callaway et al., 1997). A nisina também foi capaz de reduzir a produção de metano (14 a 40 %) in vitro em ovinos quando associada a diferentes concentrações de nitrato (Sar et al., 2005) Experimentos nos quais a nisina foi adicionada (2 mg ou 6 mg/Kg PV/dia) em um sistema de rúmen artificial demonstraram mudanças nos parâmetros de fermentação ruminal, tendo sido observado aumento na degradação da hemicelulose e na produção de acetato e propionato. Quando a nisina foi adicionada juntamente com outros aditivos, modificações em vários parâmetros da fermentação ruminal foram observados (Jalc e Laukove, 2002; Takahashi et al., 2005; Sar et al., 2005; Santoso et al., 2006). Kišidayová et al. (2009) avaliaram a influência da nisina e da monensina contra a prevalência de lactobacilos, enterococos, estreptococos amilolíticos e Escherichia coli em sistema de rúmen artificial, não sendo observado efeito sobre a população de enterococos e o crescimento de estreptococos amilolíticos. Entrentanto, a nisina tendeu a diminuir as populações de 15 II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte lactobacilos e de E. coli, enquanto monensina aumentou a população de E. coli. Poucos trabalhos, no entanto, tem abordado a identificação, caracterização e utilização de peptídeos antimicrobianos produzidos por bactérias ruminais. A bactéria Streptococcus bovis HC5 isolada do rúmen de bovinos produz uma bacteriocina denominada bovicina HC5. A bacteriocina é estável em altas temperaturas e baixo pH e possui amplo espectro de ação, inibindo micro-organismos patogênicos como a Listeria monocytogenes ou deterioradores de alimentos, a exemplo do Clostridium tyrobutyricum (Mantovani et al, 2001; Mantovani e Russell, 2003; Carvalho et al., 2007). Por serem substâncias mais efetivas contra bactérias gram-positivas, os efeitos das bacteriocinas na fermentação ruminal assemelham-se aos antibióticos ionóforos utilizados na produção animal (Callaway et al., 1997; Russell e Mantovani, 2002). A bovicina HC5 inibe a produção de metano in vitro, reduzindo a emissão do gás em até 50 % (Lee et al., 2002). Mantovani e Russell (2002) também demonstraram que bovicina HC5 inibe a atividade de desaminação de culturas puras de bactérias ruminais hiperprodutoras de amônia. Mais recentemente, Lima et al. (2009) estudou o efeito de extratos de bovicina HC5 (50 AU ml-1) sobre a produção de amônia por culturas mistas de micro-organismos ruminais evidenciando a redução da produção de amônia, sugerindo o potencial dos peptídeos antimicrobianos para proteger a proteína dietética que passa pelo rúmen. Outras alternativas de aditivos alimentares tem sido avaliadas quanto ao uso na manipulação da fermentação ruminal, destacando-se os probióticos e DFM, os ácidos orgânicos e os óleos essencias. Os probióticos são culturas vivas de micro-organismos que favorecem o equilíbrio ecológico da microbiota intestinal, promovendo efeitos benéficos para a saúde e o crescimento dos animais (Fuller, 1989). A formulação de muitos probióticos comerciais geralmente contém uma mistura de espécies de lactobacilos e leveduras. Os efeitos probióticos das leveduras parecem depender do fornecimento contínuo de quantidades suficientes de células vivas para o animal. O uso em 16 II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte alimentação de bovinos de corte está ligado ao aumento na digestibilidade da matéria seca, especialmente da fibra, melhorando a eficiência alimentar e ganho de peso (Newbold et al., 1996). No entanto, existem variações na eficiência das diferentes estirpes da levedura Saccharomyces cerevisae em promover melhoria no desempenho dos bovinos (Newbold et al., 1996). Martin e Nisbet (1992) relaram que as leveduras melhoram a atividade metabólica e a viabilidade microbiana, por meio do fornecimento de nutrientes e da liberação de fatores de crescimento, como enzimas essenciais, vitaminas e aminoácidos durante a digestão. Newbold (1997) e Wallace (1994) demonstraram que esses efeitos aumentam a taxa de digestão da celulose e o fluxo de proteína microbiana, o que resulta em maior ingestão de matéria seca e, consequentemente, melhor desempenho do animal. Segundo Chaucheyras et al. (1997), as leveduras estimulam o crescimento das bactérias celulolíticas e das utilizadoras de lactato. Estudos in vitro demonstraram que as leveduras reduzem a produção de ácido acético, favorecendo a síntese de ácido propiônico (Erasmus et al., 2005). Trabalhos realizados in vivo determinaram diferenças significativas na ingestão de alimentos e na produção de leite em vacas holandesas suplementadas com leveduras. No entanto, a menor concentração de ácido láctico no rúmen foi associada ao aumento na atividade da bactéria Selenomonas ruminantium (Erasmus et al., 1992). Diferentes resultados positivos da inclusão de levedura sobre o consumo de matéria seca (Williams et al., 1991; Cole et al., 1992; Wohlt et al., 1991; Erasmus et al., 1992; Adams et al., 1995) e produção de leite (Williams et al., 1991; Wohlt et al., 1991; 1998; Suné e Mühlbac, 1998) foram relatados, mas a resposta de bovinos à suplementação com leveduras é influenciada por uma série de fatores, como tipo de forrageira (Williams et al., 1991; Adams et al., 1995), proporção de concentrado na dieta (Williams et al., 1991; Adams et al.,1995) e o estágio de lactação (Wohlt et al., 1991), bem como por período e nível de suplementação (Strzetelski et al., 1996). Em algumas situações, não houve resposta significativa da suplementação de levedura na dieta (Malc Olm e Kiesling, 1990; Mir e Mir, 1994; Fiems et al., 1995; Kung et 17 II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte al., 1997; Doreau e Jouany, 1998), embora benefício em aspectos sanitários tenha sido observados (Cole et al., 1992; Mir e Mir, 1994). Além das estratégias descritas, vários outros métodos e aditivos têm sido propostos para manipular a fermentação ruminal. Nesse sentido, tem aumentado o interesse por aditivos microbianos de inclusão direta (DFM), que geralmente são compostos pela associação de bactérias produtoras e utilizadoras de ácido láctico (Nocek et al. 2002). Além disso, a utilização de óleos essenciais (Wallace et al., 2002, Calsamiglia et al., 2007; Benchaar et al., 2008, Bodas et al., 2008, Hart et al., 2008) saponinas (Lia et al., 2003; Wina et al., 2005; Goel et al., 2008) e ácidos orgânicos (Martins, 1998; Castilho et al., 2003; Khampa e Wanapat, 2007) têm ganhado destaque na produção agropecuária. Embora alguns estudos ainda sejam incipientes com relação à elucidação do mecanismo de ação desses aditivos, a utilização prática dos mesmos tem revelado efeitos positivos sobre a fermentação ruminal e a eficiência microbiana. Estudos sistemáticos deverão ser realizados considerando as condições de manejo e dietas típicas do Brasil para demonstrar a efetividade de algumas substâncias descritas como modificadores da fermentação ruminal. Além disso, em alguns casos são necessárias estratégias para aumentar a produção e disponibilidade desses aditivos, viabilizando economicamente sua utilização in vivo. Considerações finais e perspectivas Os benefícios decorrentes da manipulação da fermentação ruminal visando aumentar a eficiência alimentar e a produtividade agropecuária são diversos. A percepção dos problemas associados ao uso de antibióticos na produção animal e a demanda cada vez maior por alimentos microbiologicamente seguros, porém minimamente processados e livres de aditivos químicos tem aumentado o interesse por estratégias alternativas para melhorar a saúde animal, aumentar a produtividade dos rebanhos e assegurar a qualidade microbiológica dos alimentos. Nesse sentido, deve ser reconhecido 18 II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte que a utilização de ionóforos na alimentação de bovinos possibilitou aumentos no ganho de peso e na eficiência alimentar dos animais. As estratégias de manipulação da fermentação ruminal devem, portanto, propiciar benefícios semelhantes para o sistema de produção sem implicar em riscos equivalentes ao uso de antibióticos ionóforos. Nesse contexto, a discussão da legislação que regulamenta o registro de novos aditivos precisa ser discutida entre o governo, o setor produtivo e os pesquisadores, visando estabelecer regras claras e adequadas à realidade do país, evitando que o Brasil, continue dependente de tecnologias desenvolvidas no exterior e aplicadas à realidade de países de clima temperado. Embora os estudos de manipulação da fermentação ruminal sejam primariamente focados no animal adulto, o entendimento do estabelecimento da comunidade microbiana no rúmen de bezerros pode representar uma estratégia potencial para modificação do ecossistema ruminal ainda no seu estágio inicial, com efeitos benéficos potenciais para o animal na idade adulta. 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