PALAVRA DO PRESIDENTE Heróis ou vilões? (as lições do dia-a-dia) U m cidadão comum, desesperançado da vida, resolve cometer suicídio. Procura o prédio mais alto da cidade e do ponto máximo salta para a morte. Um cidadão nada comum vê o corpo caindo em direção à morte certa e se lança no espaço e consegue agarrar o suicida. Ambos atravessam uma janela envidraçada e conseguem sobreviver. O herói nem suja a roupa. O outro reclama de dores e da insólita ação do seu salvador. E procura um advogado. E ingressa com uma ação de indenização contra o Sr. Incrível, pois afirma, em síntese, que, além de não haver solicitado qualquer ajuda, o dito cujo interferiu no seu livre-arbítrio e lhe causou algumas lesões corporais. Uma composição ferroviária corre em alta velocidade em direção ao abismo, pois a ponte foi destruída. Atento e destemido, o candidato a herói utiliza todos os poderes e a sua força extraordinária para frear o trem. Os passageiros são surpreendidos com a parada súbita e vários sofrem escoriações e fraturas. E procuram um advogado. E ingressam com ações de reparação com base nos danos que sofreram. “Se todos são especiais, então ninguém é especial...” Essa conduta se repete em vários cantos do mundo. E os portadores de “habilidades especiais” ficam peremptoriamente proibidos de usarem os seus poderes... Injustiça? Ingratidão? Absurdo? Diante desses exemplos, fico pensando nos japoneses reclamando indenização do National Kid, pois na luta contra os monstros a cidade é quase sempre destruída. E nos X-Men, que são perseguidos apenas porque têm certas habilidades. E ouço e escuto as oportunas palavras do filho do Mr. Incrível: Se todos são especiais, então ninguém é especial... Pensando bem, o que acontece nas telas, acontece na vida real. Há muitos anos, o povo foi chamado a escolher entre Barrabás e Cristo. E Cristo, que era o mocinho, que tinha poderes especiais e veio para salvar o mundo, perdeu. Mais tarde, a explicação foi dada pelo Padre Antonio Vieira: “Quis Deus salvar o gênero humano naquele dia fatal em que deu a vida por ele; e de que ministros se serviu sua Providência? Caso estupendo! Serviu-se de Judas, de Anás, de Caifás, de Pilatos, de Herodes; e por meio da injustiça e impiedade dos homens tão abomináveis, se conseguiu a salvação de todos os predestinados. Se esperai ser um deles, não vos queixeis. E se me dizeis que foram injustos os ministros convosco, também vo-lo concedo, posto que o não creio. Mas que importa que neste conselho fosse Judas, ou naquele Anases e Caifases, ou noutro Herodes e Pilatos, se por meio da sua injustiça tinha Deus predestinado a vossa salvação? Eles irão ao inferno pela injustiça que “E os portadores de “habilidades especiais” ficam peremptoriamente proibidos de usarem os seus poderes...”, Valter Xavier, presidente do Imag-DF vos fizeram, e vós por ocasião da mesma injustiça ireis ao Céu.” (1) E fica o registro final: “Aristóteles disse que entre todas as coisas terríveis, a mais terrível é a morte. Disse bem; mas não entendeu o que disse. Não é terrível a morte pela vida que acaba, senão pela eternidade que começa. Não é terrível a porta por onde se sai; a terrível é a porta por onde se entra. Se olhais para cima, uma escada que chega até o Céu; se olhais para baixo, um precipício que vai parar no Inferno. E isto incerto”.(2) Valter Xavier Presidente do IMAG-DF 1 - Sermão da Terceira Quarta-Feira da Quaresma, Capítulo VI, Pregado na Capela Real (1669) – cf. Antonio Vieira, Sermões, Tomo I (organização Alcir Pécora), Editora Hedra, São Paulo, 2000, p. 115) 2 - Sermão da Quarta Feira de Cinzas, Capítulo VII, Pregado em Roma, na Igreja de Santo Antonio dos Portugueses (1672), op. cit., p. 68. O Magistrado 3 Í N D I C E Capa 3 Palavra do Presidente Heróis ou Vilões? (as lições do dia-a-dia) 32 Habemus Crucificação Aspectos jurídicos do Julgamento de Cristo 6 Radar Um giro pelas notícias que marcaram o último mês 8 Carta dos Editores Procurando respostas... 9 Cartas A serviço dos leitores 10 Eventos Operadores do Direito do Brasil e da Inglaterra fazem parcerias em evento realizado em São Paulo Direito do Consumidor 12 Comissão da Câmara aprova fim de prazos nos Créditos de celulares pré-pagos 14 Direito do Consumidor Vagas de garagem 20 Tecnologia A tecnologia pode ser uma alternativa ao desperdício de papel e assim, contribuir para a preservação das florestas 22 Serviço Precatório: saiba o que é e como fazer para recebê-lo 24 Direto ao ponto Entrevista Giovanni Ettore Nanni discute o enriquecimento sem causa Liberdade de imprensa ameaçada 26 Iniciativas 4 O Magistrado Divulgação STJ e os portadores de necessidades especiais 16 Í 28 A arte secreta de Michelângelo N D I C Cidadania 41 Realizada em Brasília a I Conferência Distrital de Políticas de Promoção da Igualdade Racial Dúvidas nunca mais Idéias E 42 Vínculo trabalhista: ele existe entre franqueador, franqueado e seus empregados? Espaço Universitário 46 Conheça o que pensam os futuros operadores do Direito Polêmica 50 Abuso de poder: Decisão inédita do TJDFT censura publicamente promotores do Distrito Federal Direito nas ruas 56 Ação de hackers: bancos devem indenizar cliente Português jurídico 58 Sem dramas na hora de escrever Saúde 61 Rinite alérgica pode interferir no desempenho escolar de crianças Livros 65 As novidades do mundo da leitura 62 Saúde Postura dos pais é vital no combate à obesidade infantil Cultura 66 Vivo Open Air: do entretenimento à experimentação Ponto de Vista 68 Os traseiros, os juros e a igreja Segredo de Justiça 70 A veia poética dos magistrados guardada a sete chaves O Magistrado 5 R A D A R Delegados e IMAG-DF Mauro Cezar Lima e Valter Xavier assinaram convênio que prevê descontos nas mensalidades do Imag-DF. O Instituto dos Magistrados do Distrito Federal (Imag-DF) e Sindicato dos Delegados de Polícia do Distrito Federal (Sindepo-DF) firmaram parceria no dia 5 de abril. “Pelo convênio firmado serão oferecidos descontos diferenciados nas mensalidades e demais encargos dos cursos, abertos ao público, oferecidos pelo nosso Centro de Estudos Superiores aos associados e servidores do Sindepo-DF”, explica Valter Xavier, presidente do Imag-DF. “É bom ressaltar que os descontos também serão extensivos aos dependentes legais e diretos de nossos associados e servidores’, finalizou Mauro Cezar Lima, presidente do Sindepo-DF. Ganhador da Promoção Valdson Gonçalves de Amorim recebeu do Diretor de redação de “O magistrado em revista”, Marcos Linhares, o livro “Código da Vinci”. O Procurador do Distrito Federal Valdson Gonçalves de Amorim, de Brasília-DF, foi ao IMAG-DF receber seu prêmio: um exemplar do livro “Código Da Vinci”. Valdson mandou um correio eletrônico comentando um dos textos da revista. No caso, escrito por Renan Paes Félix, intitulado “Aspectos da Política Criminal Brasileira” (fls. 48/49). Parabéns ao procurador. 6 O Magistrado E se você também quiser um dos cinco exemplares da primeira ficção jurídica nacional – o livro GUARDIÃO, faça como Valdson e mande seu comentário a qualquer um dos textos desta edição de maio para o correio eletrônico: [email protected] Os cinco primeiros comentários embasados receberão a obra. Resultados na próxima edição. Condenada por violentar homem. Se a moda pega... De acordo com informações da agência Reuters, “Uma corte norueguesa sentenciou uma mulher a nove meses de prisão por violentar um homem, na primeira condenação do tipo no país escandinavo, que se orgulha pelo seu igualitarismo. O homem, de 31 anos, dormia em um sofá durante uma festa em janeiro do ano passado e disse no tribunal da cidade de Bergen que acordou com uma jovem de 23 anos fazendo sexo oral com ele. Sob a lei norueguesa, quaisquer atos sexuais com alguém que esteja “inconsciente ou que por outras razões não pode se opor ao ato” são considerados violação. A corte sentenciou a mulher nesta quarta-feira a nove meses de prisão e ordenou a ela que pague 6.355 dólares em recompensa. IV Encontro dos Povos da Chapada dos Veadeiros Foi realizado nos dias 6, 7 e 8 de maio na cidade de Alto Paraíso/GO, que fica a 230Km de Brasília, o IV Encontro dos Povos da Chapada dos Veadeiros, organizado pela Fundação Pró-Natureza (Funatura), teve como objetivo resgatar a cultura local, principalmente musical. O evento teve música, culinária, teatro, artesanato, terapias, poesia, palestras, oficinas e danças. Os principais patrocinadores do encontro foram o SEBRAE-GO, a Funatura e a Prefeitura de Alto Paraíso. O jovem prefeito de Alto Paraíso, Uiter Gomes de Araújo, de 31 anos, disse que suas expectativas sobre o evento se superaram. “Em um fim de semana comum a cidade ficou completamente lotada, mais de 2 mil pessoas passaram pela festa por noite. O que mais me deixou feliz no Encontro foi o depoimento das pessoas que não tinham mais oportunidades de mostrarem seu valor cultural, de povos esquecidos como os Kalungas”, declarou o prefeito. Uiter declarou ainda que em Julho será realizado na Vila de São Jorge um Festival de Cultura e também uma EcoMaratona (Jonathan Pinato Luasses) R A D A R O ministro Gilson Langaro Dipp, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), encerrou o VII Congresso Internacional de Direito Ambiental, realizado em Foz do Iguaçu (PR) com palestrando sobre “A visão do STJ em matéria ambiental”. A vice-presidente do Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região, desembargadora federal Marga Inge Barth Tessler, presidiu a mesa. Ao abrir os trabalhos, Marga fez uma rápida introdução sobre o tema. Ela falou sobre a criação das unidades de conservação, especialmente protegidas pelo artigo 225 da Constituição Federal (CF), que são “instrumentos da tutela ambiental”. Essa norma, explicou a magistrada, é inspirada no princípio da salubridade ambiental como direito de todos e no da natureza pública e compulsória da proteção ambiental. Marga citou os dois tipos de categorias das unidades de conservação: as integrais (como os parques nacionais e os refúgios ambientais) e as de uso sustentável (áreas de proteção ambiental – APA – e florestas nacionais, por exemplo). Não fazem parte do Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC), salientou a desembargadora, as áreas de proteção permanente e as reservas legais, indígenas e biológicas, entre outras. A seguir, o ministro Dipp iniciou sua conferência. Ele destacou que a lei que criou o SNUC foi um passo fundamental na legislação ambiental brasileira. Segundo o conferencista, o artigo 225 da CF refletiu “toda a legislação ambiental brasileira até então existente”. O ministro do STJ ressaltou que o Brasil tem “uma longa história predatória, que vem desde o período colonial”. O ministro lembrou de atividades que disputam espaço com a preservação do meio ambiente: a pecuária, a extração de madeira, o garimpo e a plantação de soja. “Não se pode tolher o desenvolvimento”, afirmou o magistrado, “mas também não se pode esquecer da proteção ambiental”. O ministro saudou a recente criação de uma unidade de conservação no município de Sinimbu (RS). A iniciativa, segundo Dipp, foi possível a partir de uma parceria entre a Souza Cruz e a Universidade de Santa Cruz do Sul, onde pela primeira vez, numa universidade, proprietária de uma unidade de conservação, poderão ser realizados estudos universitários, escolares e dirigidos à comunidade. Dipp também falou de casos negativos como a tentativa de redução drástica da APA da Ilha do Bananal, em Tocantins. Essa reserva de mais de um milhão de hectares, “é quase um escudo para a proteção ambiental da região, pois está no ponto em que se encontram o Cerrado e a Floresta Amazônica”. Conforme o conferencista, pressionado pelo agronegócio, “o governo está diminuindo a área em 89%”. O Ministério Público Federal no Estado, afirmou, entrou com uma ação contra o ato na Justiça Federal. Segundo Dipp, muitas ques- Ascom/TRF4 Dipp & o Direito Ambiental A desembargadora federal Marga Inge Barth Tessler, presidindo a mesa do evento ao lado do ministro Gilson Langaro Dipp, do STJ tões ambientais não chegam ao STJ, “pois o sistema processual brasileiro tem mecanismos que obstruem a chegada dessas ações aos tribunais superiores”. A missão do tribunal superior, lembrou o ministro, é fazer com que a lei seja corretamente aplicada e uniformizar as decisões tomadas pela Justiça em todo o país. Assim, o STJ não pode reapreciar fatos e provas, salientou Dipp, “e o Direito Ambiental está exatamente baseado nesses aspectos”. (Ascom/TRF4) CNI instala Conselho de Responsabilidade Social Com a presença da presidente do Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM) e do Instituto Itaú Cultural, Milu Villela, e do representante da Unesco no Brasil, Jorge Werthein, o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Armando Monteiro Neto, instalou em maio, em Brasília, o Conselho Temático Permanente de Responsabilidade Social da entidade. Na oportunidade, deu posse ao presidente do Conselho, Jorge Parente Frota Júnior, e outros 16 conselheiros. Um dos principais focos de atuação do novo Conselho será sensibilizar o maior número possível de industriais, para que exerçam ações de responsabilidade social no País. Jorge Parente Frota Junior, que também preside a Federação das Indústrias do Estado do Ceará (FIEC), mostra o exemplo do seu Estado nessa área de atuação. “No Ceará, desenvolvemos o Projeto de Formação Cidadã, da qual participam 14 unidades de ensino superior do Estado, que implantaram disciplinas de Responsabilidade Social em seus cursos, sendo que uma delas até criou um curso de pós-graduação nesse ramo”, afirmou. Festival de cursos Continua o festival de criação de faculdades pelo país afora. De janeiro a março deste ano foram reconhecidos e autorizados a funcionar 523 novos cursos superiores no país. A média é de quase 10 cursos por dia. O Magistrado 7 CARTA DOS EDITORES Procurando respostas... EXPEDIENTE IMAG-DF Instituto dos Magistrados do Distrito Federal Maio. Mês das mães e de receber um novo papa. De repensar valores familiares, sociais, políticos, religiosos. Nós, como sempre, tentamos ficar antenados com o mundo ao redor. Em nossa capa, o julgamento de Cristo, analisado sob o ponto de vista jurídico. É fácil perceber como em todos os tempos e lugares sempre houve e haverá armações para “derrubar” quem incomoda os ditos poderosos. Em nossa seção polêmica, um caso emblemático que aborda, segundo a decisão da justiça, um exemplo de abuso do Ministério Público. E fica uma pergunta que ouvimos certa vez num corredor: O Ministério Público protege a sociedade. Mas quem protege a sociedade do Ministério Público? O caso também nos faz recordar de uma piada antiga: E Jesus perguntou à multidão: - Quem não tiver errado que atire a primeira pedra. Eis que o gajo mirou e acertou bem na testa de Maria Madalena. Jesus, surpreso perguntou: - Você nunca errou?! Ao que o gajo respondeu: - Não dessa distância. E como estamos discutindo mandos e desmandos, o Dr. Giovanni Ettore Nanni nos concedeu uma preciosa entrevista sobre o enriquecimento ilícito. Em nossa seção de saúde o problema abordado é a rinite alérgica. Quem diria? Ela afeta seriamente a vida escolar de nossas crianças. Com o frio chegando, todo cuidado é pouco. Eventos, iniciativas, cultura, direito do consumidor, enfim, a revista foi feita pensando em você, que nos prestigia todo mês. Em nossos encontros mensais, essa relação se fortifica. Que venha junho! Até a próxima edição! Marcos Linhares e Ednardo Viana 8 O Magistrado DIRETORIA Presidente: Desembargador Valter Ferreira Xavier Filho (TJDF) Vice-Presidente: Juiz de Direito Mário Motoyama (TJDF) Diretor Cultural: Desembargador Pedro Aurélio Rosa de Farias (TJDF) Tesoureiro: Juiz de Direito Irineu de Oliveira Filho (TJDF) Secretário Geral: Desembargador José Wellington Medeiros de Araújo (TJDF) ASSESSORIA DA PRESIDÊNCIA Juiz de Direito Agnaldo Siqueira Lima (TRF), Juiz de Direito Antoninho Lopes (TJDF), Juiz de Direito Carlos Bismark Piske de Azevedo Barbosa (TJDF), Juiz de Direito Clóvis Moura de Souza (TJDF), Juiz de Direito Gilberto de Souza Sá (TJDF), Juiz de Direito Irineu de Oliveira Filho (TJDF), Desembargador José Wellington de Medeiros Araújo (TJDF), Juiz de Direito Leandro Borges Figueiredo (TJDF), Juiz de Direito Manoel Franklin Fonseca Carneiro (TJDF), Juíza de Direito Maria Leonor Leiko Aguena (TJDF), Delegado Mauro Cezar Lima, Juiz de Direito Ronan Acácio Jacó INSTITUTO DOS MAGISTRADOS DO DISTRITO FEDERAL - IMAG-DF SHCGNCR 716 Bloco C Loja 12 - CEP 70770-630 - Brasília - DF TELEFONES: (61) 274-3110 ou 3037-3110 O Magistrado O Matistrado em Revista é uma publicação do IMAG-DF. As opiniões emitidas em artigos assinados são de inteira responsabilidade de seus autores e não refletem, necessariamente, a posição da revista. É permitida a reprodução das matérias desde que seja citada a fonte. CONSELHO EDITORIAL Toda a diretoria do IMAG-DF DIRETOR-GERAL Desembargador Valter Ferreira Xavier Filho COORDENADORA ADMINISTRATIVA Neide de Castro DIRETOR DE REDAÇÃO E EDITOR RESPONSÁVEL Marcos Linhares [email protected] EDITOR EXECUTIVO Ednardo Viana [email protected] COLUNISTAS Luiz Gustavo Leão e Marcelo Paiva REVISÃO Renan Walker REPORTAGEM Jonathan Pinato Luasses SUCURSAIS E CORRESPONDENTES Rio - Chefe: Denise Assis (21) 9606-3100 / [email protected] Paraná - Chefe: Ana Navarro (41) 353-3166 / [email protected] COLABORADOR ESPECIAL José Washington dos Santos JORNALISTAS RESPONSÁVEIS Marcos Linhares - Mtb 5017-DF Ednardo Viana - DF 2924 JP FOTOGRAFIA Carlos Tiburcio / (61) 9969-7838 AGÊNCIAS NOTICIOSAS Assessorias de Imprensa do STF, STJ, TJDF, Agência Brasil (Abr), Agência Câmara, Agência Senado PROJETO GRÁFICO E DIAGRAMAÇÃO Cláudia Capella e Paulo Pedersolli ARTE E CAPA Cláudia Capella IMPRESSÃO Gráfica Terra TIRAGEM 30.000 exemplares REDAÇÃO SHCGNCR 716 Bloco C Loja 12 - CEP 70770-630 Telefone: (61) 3037-3110 Brasília - DF C alta Corte Jurídica do país é o eminente Ministro do STF Nelson Jobim” RENAN PAES FELIX, João PessoaPB, por correio eletrônico Nota da redação: Parabéns, Renan. Mandaremos o livro do Dr. Lair Ribeiro, sobre câncer de mama, pelo correio. ESPAÇO UNIVERSITÁRIO Textos com maior repercussão - Um tapa na Constituição - Porte de armas por autoridades - Neuza Maria, a primeira desembargadora negra do país - Empréstimos ao servidor sem consultar SERASA e SPC 42% 21% 19% 11% Edição XXIII Edição de abril de 2005 GANHADOR DA PROMOÇÃO “CÂNCER DE MAMA” “Não sei se já mandaram algum e-mail, mas o membro do Imag-DF que atualmente ocupa a presidência da mais “Primeiramente, venho parabenizar a todos os que fazem parte da redação, pela qualidade da revista, pois consiste em intensa contribuição para os que militam na seara jurídica e também em áreas diversas. Sou acadêmica de Direito da Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP) e curso atualmente o 9º (nono) período nesta Instituição. Sabedora da oportunidade que vocês dão, reservando um espaço para artigos de estudantes universitários, estou enviando um, de minha autoria, para tentar publicação. Se esta for possível ou não, gostaria de receber uma resposta”. JANAÍNA DE LIMA VEIGA, Acadêmica de Direito, Unicap-Recife-PE Nota da redação: Janaina, seu texto é muito bom e está nesta edição. C A R TA S PA R A A R E D A Ç Ã O As cartas para a redação de O Magistrado em Revista devem ser endereçadas para: Editor-chefe, O Magistrado em Revista SHCGNCR 716 Bloco C Loja 12 CEP: 70770-630 - Brasília - DF Fax: (61) 3037-3110 Correio eletrônico: [email protected] As cartas devem ser encaminhadas com assinatura, identificação, endereço e telefone do remetente. O Magistrado em Revista reserva o direito de selecioná-las e resumi-las para publicação. Mensagens pela internet sem identificação completa não serão levadas a sério. Só podem ser incluídas na edição do mês as cartas que chegarem à redação até as 17 horas do dia 14 do mês anterior. A R T A S DO ESPIRÍTO SANTO A referida revista é, sem qualquer dúvida, um excelente suporte para discussões dos mais modernos e atuais temas jurídicos, servindo de objeto facilitador da compreensão dos mesmos. Solicito a continuidade do envio dos exemplares para que eu continue sendo agraciada com tão incomum obra jurídica. LUCIENE TREVIZANI GONÇALVES , Linhares-ES , Bacharel em Direito Nota da redação: Luciene, o departamento responsável já foi avisado. A SERVIÇO DOS LEITORES Nossos telefones Central de Atendimento ao Anunciante Diariamente de segunda a sexta-feira, das 8h às 18h. Assinaturas Estamos em processo de instalação de sistema de assinaturas. Muito em breve, avisaremos o início do oferecimento de mais esse serviço. Central de atendimento às faculdades e projetos educacionais Também estamos em processo de instalação desse sistema. Muito em breve, avisaremos o início do oferecimento de mais esse serviço. Internet: www.imag-df.org.br Distrito Federal (Brasília): (61) 274-3110 São Paulo e Rio de Janeiro: Em breve Demais localidades: em análise e sob consulta Aviso Ao fornecer seus dados cadastrais para qualquer fim junto ao IMAG-DF, seu nome será incluído em lista específica de clientes preferenciais para envio de material de divulgação e promoções do Instituto ou de terceiros, parceiros da instituição. Caso não concorde, escreva para as centrais de atendimento ao anunciante e/ou assinaturas: SHCGNCR 716 Bloco C Loja 12 - CEP 70770-630 - Brasília - DF. Nossos endereços Redação e correspondência Brasília (sede): SHCGNCR 716 Bloco C Loja 12 CEP 70770-630 - Brasília - DF Tel. (61) 274-3110 ou 3037-3110 Fax: (61) 3037-3110 Correio eletrônico: [email protected] Rio - Chefe: Denise Assis / (21) 9606-3100 [email protected] Paraná - Chefe: Ana Navarro / (41) 353-3166 [email protected] O Magistrado 9 E V E N T O S The “LEI” is on the table Brasil e Grã Bretanha realizaram um seminário com uma visão comparada de tópicos emergentes da advocacia internacional Fotos:Divulgação O Presidente em Exercício do Conselho Federal da OAB, Aristóteles Atheniense, esteve presente na abertura do seminário O Presidente em Exercício do Conselho Federal da OAB, Aristóteles Atheniense, esteve presente na abertura do seminário e agradeceu a colaboração da OAB de São Paulo, do embaixador e do cônsul da GrãBretanha e ressaltou a importância da troca de experiências no intercâmbio de advogados do Brasil e da Inglaterra. O embaixador da Grã Bretanha no Brasil, Peter Collecott, também esteve presente e comentou sobre as idas e vindas dos jovens advogados de ambos os países. “As interações de leis entre os países são muito importantes para a relação política”, explicou o embaixador. Além de ter ressaltado a importância da idealização do seminário. Quatro temas foram abordados em painéis pelos palestrantes. O primeiro painel falava da Visão Comparativa dos Sistemas e Estruturas Legais Inglesa e Brasileira (Common Law e Direito Codificado), os palestrantes foram o Desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, Ricardo Lewandowski, o advogado britânico Dominic Minett, além do sócio-titular da Advocacia Rodrigues do Amaral em São Paulo e coordenador científico do seminário, Antônio Carlos Rodrigues do Amaral. No segundo painel, o tema era Transações – Oportunidades na Inglaterra e no Brasil: Tópicos Atuais que teve como palestrantes a membro integrante do Conselho de Relações Internacionais do Conselho Fe- Por Jonathan Pinato Luasses O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Law Society of England & Wales, realizaram no último dia 08 de abril, no Centro Brasileiro Britânico em São Paulo, um seminário sobre a comparação dos modelos jurídicos do Brasil e da Grã-Bretanha. As palestras realizadas no evento fazem parte do Acordo de Amizade assinado entre as entidades que realizaram o seminário em setembro do ano passado a fim de estimular o intercâmbio de profissionais de Direito dos dois países. 10 O Magistrado Os advogados Horácio Bernardes Neto e Alberto Zacharias Toron, além da sócia do escritório de advocacia inglês Collyer Bristow, Silvia Fazio apresentaram o painel “As Especializações Jurídicas no Brasil e na Inglaterra” E V E N T O S Definição de Common Law O coordenador científico do seminário, Antônio Carlos Rodrigues do Amaral., participou do ´painel que abordava a Visão Comparativa dos Sistemas e Estruturas Legais Inglesa e Brasileira (Common Law e Direito Codificado) deral da OAB, Isabel Franco, o advogado Mário Sérgio Garcia e do especialista britânico em capital markets e sócio da Clifford Chance, Charles Johnson. No terceiro painel as Especializações Jurídicas no Brasil e na Inglaterra foi o tema abordado. A mesa contou com o advogado Alberto Zacharias Toron, a sócia do escritório de advocacia inglês Collyer Bristow, Silvia Fazio, além do também advogado, Horácio Bernardes Neto. Detalhes de como investir no Reino Unido, as diferenças do Código Civil Brasileiro e da Common Law, foram alguns dos assuntos abordados no painel. Fechando o seminário o tema era Resolvendo Problemas - Solução de Controvérsias na Inglaterra e no Brasil teve como palestrantes os advogados Rubens Aprobatto e Gilberto Giusti que também é árbitro inscrito na Corte Brasileira de Mediação e Arbitragem Empresarial (CBMAE), além de mais dois advogados britânicos especialistas em lití- Termo utilizado para referir-se a nor mas e reg ras de caráter jurídico não escritas, porém sancionadas pelo costume ou pela jurisprudência. O nome vem da concepção do direito medieval inglês que, ao ser ministrado pelos tribunais do reino, refletia os costumes comuns dos que nele viviam. Este sistema legal vigora na Inglaterra e em todos os países originalmente colonizados pelos ingleses. Parte do princípio de que as questões devem ser resolvidas tomando-se como base sentenças judiciais anteriores, e não preceitos legais fixados antecipadamente. Este princípio é o que o distingue do sistema do direito continental europeu e dos demais países. A reunião de sentenças judiciais sobre várias situações semelhantes permitem extrair regras gerais que geram precedentes e que se convertem em orientações para o julgamento futuro dos juízes, em casos análogos. gios e arbitragem, o representante da Clyde & Co em Londres, e do sócio da DLA Piper Rudnick Gray Car y, Jonathan Bruce. Os tipos e pesos dos poderes judicários do Brasil e da Inglaterra, cortes e arbitragens e a importância das conciliações e mediações foram os principais assuntos abordados. A advogada Ângela Saade esteve presente no seminário e falou que o evento trouxe considerações bem esclarecedoras sobre a diferença entre o common law e o direito codificado, bem como demonstrou que a troca de experiências e interesses entre brasileiros e estrangeiros é essencial para a atuação do profissional de direito, principalmente devido às atuais circuns tâncias da circulação de pessoas, bens e ser viços no mundo. “Achei o Seminário de grande importância, pois os profissionais de certas áreas devem manter-se atualizados e estar atentos às tendências do direito em âmbito internacional”, declarou Ângela. O presidente da OAB-SP,. Luis Flávio Borges D´urso foi um dos apoiadores do seminário O Magistrado 11 DIREITO DO CONSUMIDOR A farra está prestes a acabar Comissão da Câmara aprova fim de prazos nos créditos de celulares pré-pagos Fotos:Divulgação Por Regina Vendeiro, advogada da área cível da Advocacia Innocenti e Associados A Comissão de Defesa do Consumidor (CDC) da Câmara dos Deputados aprovou nesta quartafeira, por unanimidade, parecer sobre o Projeto de Lei nº 7.415/02, de autoria do deputado Pompeo de Matos (PDT/RS), que proíbe as operadoras de telefonia móvel de imporem limite de tempo para utilização de créditos ativados dos celulares pré-pagos. Hoje, como regra geral, as operadoras determinam um período de três meses para que o usuário consuma em ligações valores na faixa dos R$ 50, ou de um mês para valores inferiores. As operadoras determinam um período de três meses para que o usuário consuma em ligações valores O projeto assegura aos consumidores o direito de utilização de seus créditos ou reembolso das quantias pagas, independentemente do prazo de validade, afirma a advogada Regina Vendeiro. 12 O Magistrado na faixa dos R$ 50 DIREITO DO CONSUMIDOR A medida se aprovada pode beneficiar cerca de 54 milhões de usuários de aparelhos pré-pagos. “O teor do projeto está em consonância com o Código de Defesa do Consumidor e o voto dos deputados corrobora decisões já proferidas pelo Judiciário brasileiro, que vem assegurando aos consumidores o direito de utilização de seus créditos ou reembolso das quantias pagas, independentemente do prazo de validade”, afir ma a advogada Regina Vendeiro, da área cível da Advocacia Innocenti e Associados. Ela lembra recente decisão do desembargador João Egmont, da O deputado Celso Russomano, relator do parecer, propôs o prazo mínimo de um ano para a validade dos créditos. 1ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, que determinou que as operadoras de telefonia não podem estabelecer prazo de validade para a utilização dos créditos, sendo fixada multa diária de R$ 50 mil em caso de descumprimento. “Tal iniciativa visa evitar o enriquecimento ilícito das operadoras que se beneficiam dos valores pagos, sem que tenham prestado os respectivos serviços, em detrimento do consumidor que vê, abusivamente, subtraída a opção de reembolso das quantias pagas pelos créditos, que nunca poderão ser utilizados em virtude da expiração do prazo”, destaca. A especialista enfatiza outros pontos positivos na votação realizada na Comissão. O deputado Celso Russomano, relator do parecer, propôs o prazo mínimo de um ano para a validade dos créditos. Outro item beneficia também os usuários de celulares pós-pagos. Nesse caso, as ligações franqueadas todo mês pela assinatura básica, que não sejam realizadas, devem ser acumuladas para os próximos meses. Regina observa que “o consumidor só deve pagar pelo serviço efetivamente prestado. Assim, não é razoável que perca o direito à utilização de pulsos ou minutos que não utilizou durante o mês. Caso o projeto seja aprovado, as operadoras terão que se adequar, visto que o descumprimento acarretará aplicação de várias sanções previstas no art. 173 da Lei 9472/97”, alerta a advogada. Ao projeto de lei 7.415/02, cujo substitutivo segue agora para apreciação da Comissão de Tecnologia da Câmara, foram anexados outros dois projetos de lei a respeito do mesmo assunto que já tramitavam na Câmara. O de nº 4.441/04, da deputada Teté Bezerra (PMDB-MT) e o 4.182/04, apresentado pelo deputado Carlos Nader (PL-RJ). Regina Vendeiro ressalta que “a aprovação do projeto reforçará os direitos do consumidor perante as empresas de telefonia”, conclui. O Magistrado 13 DIREITO DO CONSUMIDOR Vagas de garagens lideram conflitos em condomínios Especialista levanta problemas comuns e aponta possíveis soluções sempre objeto de assembléias de moradores, pautadas pelo bom senso. Outra saída é estabelecer regras específicas na Convenção do Condomínio para uso e proveito das vagas por todos os moradores de forma igualitária. 2. Vagas indeterminadas U m dos problemas mais discutidos hoje em assembléias condominiais é a quest ã o d a s g a r a g e n s. Do aluguel a terceiros, passando pelo número de vagas disponíveis e destinação dos espaços, até as formas e prazos para realização de rodízios – todos os pontos são objeto de discussões acaloradas. Juliana Mensitieri Baldocchi, da área cível da Innocenti Advogados Associados destaca os problemas comuns e as possíveis soluções. 14 O Magistrado 1. Garagens adquiridas juntamente com as unidades e que não são entregues exatamente com as metragens prometidas. A legislação de condomínio não traz disposição legal que possa ser aplicada. Mas, com base na responsabilidade civil (Código Civil), pode-se recorrer à Justiça contra a construtora ou incorporadora, obtendo-se assim um abatimento do preço ou não sendo mais possível, uma indenização pelo prejuízo. Nas relações com os condôminos, a solução efetiva do problema deve ser Quando se trata de vagas indeterminadas, a forma de distribuição é mais justa quando se utiliza o rodízio por sorteio, porque ele garante a igualdade de direito que deve existir entre os moradores. Assim, a sugestão é que seja feito um novo sorteio a cada gestão do síndico, que não poderá ser superior a dois anos. O rodízio deve constar da Convenção ou do Regulamento Interno, incluindo-se aí o período de tempo da utilização da vaga. As vagas indeterminadas serão sempre uti- Outra questão levantada é sobre a responsabilidade por danos causados aos veículos como avarias, furtos e roubos Divulgação lizadas na forma prevista na convenção, ou, na omissão desta, de acordo com deliberação da assembléia de condônimos. Definido na convenção o critério a ser observado, somente a unanimidade dos condôminos poderá alterá-lo, já que se cuida de mudança da destinação da coisa comum com prejuízo a direitos adquiridos. 3. Aluguel e venda de garagens O Novo Código Civil trouxe, em seu artigo 1.338, determinação expressa acerca da preferência, em condições iguais, entre os condôminos, deixando estranhos ao condomínio como última hipótese, até mesmo por questão de segurança. O aluguel e venda das garagens devem ser regulados na Convenção, mas, em caso de omissão, a aprovação e deliberação em assembléia dependerão de quórum de 2/3 dos condôminos, tendo em vista as implicações de risco que poderão ser ocasionadas pelo negócio. 4. Alienação de vagas de garagens a terceiros, estranhos ao condomínio Não há previsão legal específica para alienação de vagas de garagens a terceiros estranhos ao condomínio, devendo essa questão ser dirimida pela Convenção Condominial e Assembléias convocadas para tanto. Vagas indeterminadas são consideradas partes acessórias às unidades condominiais, podendo, segundo disposição do art. 1.339, § 2º, CC, ser alienadas a outros condôminos. A alienação a terceiro só pode ocorrer, se houver expressa previsão na convenção. 5. Mais apartamentos do que garagens Se a oferta era de uma garagem por apartamento, a questão deverá ser O aluguel e venda das garagens devem ser regulados na Convenção, afirma Juliana Mensieteri Baldocchi tratada fora do Condomínio, buscando-se as vias judiciais adequadas, acionando-se a incorporadora ou construtora responsável pela obra e comercialização das unidades. Juliana lembra ainda que a utilização das garagens para outros fins, que não seja a guarda de veículos, também é ponto de atrito nos condomínios. “Essa matéria também deve vir expressa na Convenção e, em caso de estar definido o uso específico para guarda de veículos terrestres, ou seja, carros e motos, estará vedada a sua utilização para guardar objetos, bicicletas, colocar entulhos, entre outros itens”, destaca. Outra questão levantada pela especialista é sobre a responsabilidade por danos causados aos veículos como avarias, furtos e roubos. Nesses casos, conforme orientação jurisprudencial, o condomínio só é responsável por furtos e danos aos veículos estacionados nas garagens se estas dispuserem de vigilantes específicos para este fim e/ou manobristas. “Em qualquer dos casos, vale acrescentar na Convenção quais são as responsabilidades do condomínio, ou ainda, incluir um item que deixe claro que o condomínio não se responsabiliza por roubos de veículos ou por furtos de objetos deixados em seu interior e outro que decida pela contratação de um seguro para esses fins”, propõe. Juliana Baldocchi sugere também que, “para o caso de omissão na Convenção Condominial ou Regulamento Interno, a orientação mais adequada é a deliberação em assembléia, inclusive no tocante às sanções e ao valor de multas para o caso de descumprimento das regras”, conclui. O Magistrado 15 E N T R E V I S T A Giovanni Ettore Nanni Discutindo o enriquecimento sem causa Enriquecimento sem causa. Tema inquietante num país onde não é difícil achar alguém que se encaixe no perfil. O dr. Giovanni Ettore Nanni, que recentemente lançou um livro sobre o assunto, nos brinca com uma verdadeira aula sobre o assunto. Divulgação Qual a origem do enriquecimento sem causa? Caracterizam o enriquecimento sem causa: o enriquecimento, o empobrecimento, o nexo de causalidade, a ausência de justa causa e a subsidiariedade da ação de enriquecimento, afirma Giovanni Ettore Nanni 16 O Magistrado Giovanni Ettore Nanni - O tema tem origem no Direito Romano. No entanto, há muita controvérsia se este teria sofrido influência grega. Segundo um autor francês, o enriquecimento sem causa desenvolveu-se no Direito Romano sob influência da filosofia grega, com base no velho dogma que explica o mito de Nêmesis, personificação da justiça na mitologia: é necessário que o equilíbrio entre os E N T R E V I S T A homens não seja mero compromisso.De qualquer forma, não obstante essa divergência, aponta-se, com base em duas passagens do Digesto, de Pompônio, quais sejam, jure naturae aequum est neminem cum alterius detrimento et injuria fieri locupletiorem (D. 50. 17. 206) e nam hoc natura aequum est neminem cum alterius detrimento fieri locupletiorem (D. 12. 6. 14), que no Direito Romano antigo esboçou-se um princípio do enriquecimento sem causa, aplicado a casos particulares. Ainda Direito Romano, a concepção das condictiones sine causa, da actio de in rem verso e da actio negotiorum gestorum contraria foram as grandes propulsoras do instituto. Como é tratado o instituto do enriquecimento sem causa pelo direito brasileiro? Giovanni Ettore Nanni - O enriquecimento sem causa é inserido entre os atos unilaterais no Código Civil de 2002, nos arts. 884 a 886. Em minha opinião, a despeito de inúmeras teses existentes, estas não consolidam nem esgotam a aplicabilidade do instituto. Sustento que o enriquecimento sem causa possui um caráter dúplice, como fonte obrigacional, quando dá ensejo à interposição da ação de enriquecimento, e como princípio corretivo, para purgar os desequilíbrios e as desproporcionalidades, de forma ilimitada, desde que não contrarie a lei, nas situações em que não se apresente como fonte obrigacional. Entendo a previsão do art. 884 do Código Civil como uma cláusula geral da vedação do enriquecimento sem causa, pois, pelo fato de a ação de enriquecimento impossibilitar uma fórmula única para sua utilização, a melhor estrutura é baseada em um sistema móvel de cláusula geral e aberta, que concilia as diferentes situa- ções que ensejam o exercício da ação, não engessando o quadro de hipóteses. E também porque sendo o enriquecimento sem causa um princípio informador de todo o direito brasileiro, ele espraia os seus efeitos a qualquer relação obrigacional. Por ser uma cláusula geral, atua mesmo que a hipótese sob apreciação não permita o exercício da ação de enriquecimento, consubstanciando-se em ferramenta muito útil para corrigir situações de desproporção patrimonial que evidencie a violação ao espírito emanado do preceito. Em sua obra, o Sr. afirma que, apesar de ser considerado na doutrina, na jurisprudência e entre os operadores do direito em geral como sinônimo, o enriquecimento sem causa e o enriquecimento ilícito são figuras distintas, jungidas a situações jurídicas específicas e diferenciadas. Como podem ser distinguidos estes dois institutos? Giovanni Ettore Nanni - O enriquecimento sem causa é um remédio geral obrigacional previsto no Código Civil de 2002, que possui uma natureza dúplice como fonte obrigacional e como princípio, cuja aplicabilidade pode ocorrer no âmbito do direito privado e do direito público. Além disso, o enriquecimento sem causa prescinde “O enriquecimento sem causa é inserido entre os atos unilaterais no Código Civil de 2002, nos arts. 884 a 886” do ilícito para sua configuração, pois o ilícito é pressuposto para a responsabilidade civil e não para o enriquecimento sem causa. O enriquecimento ilícito é um desígnio típico do direito administrativo, estando ligado aos atos de improbidade administrativa, tipificado em lei especial, Lei n. 8.429, de 2 de junho de 1992. Logo, são assuntos autônomos, submetidos a diferenciadas leis, com requisitos tipificadores diversos. Quais os pressupostos para caracterização do enriquecimento sem causa? Giovanni Ettore Nanni - Em geral, são indicados cinco pressupostos para a caracterização do enriquecimento sem causa: o enriquecimento, o empobrecimento, o nexo de causalidade, a ausência de justa causa e a subsidiariedade da ação de enriquecimento. Em resumo, o primeiro requisito (o enriquecimento) significa a ocorrência de uma vantagem indevidamente auferida pelo enriquecido. Esse enriquecimento pode apresentar o mais amplo aspecto, em qualquer circunstância objetiva de aumento patrimonial, diminuição do passivo ou vantagem não patrimonial. O segundo requisito (o empobrecimento) pode consistir numa diminuição efetiva do patrimônio ou no fato de ter impedido o seu aumento. No entanto, uma vez que em variadas vicissitudes, inclusive de vantagem não patrimonial, o empobrecimento pode não ser configurável de forma concreta no patrimônio do empobrecido, tal requisito pode ser dispensado. O terceiro requisito (o nexo de causalidade) impõe a necessidade que exista um liame causal entre aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem e o fato que ocasionou esse enriquecimento. A ausência de justa causa é o quarto requisito do tema, li- O Magistrado 17 E N T R E V I S T A gado à falta de fundamento no enriquecimento proporcionado ao enriquecido, por decorrência de um negócio inexistente, ilegal, nulo, anulável etc., não sendo possível estabelecer a priori, dada a conotação de cláusula geral, quais as hipóteses em que se configura, o qual inclusive pode ocorrer de forma superveniente, nos termos do art. 885 do Código Civil de 2002. A subsidiariedade da ação de enriquecimento é o último requisito para a configuração do enriquecimento sem causa, a qual decorre do art. 886 do novo Código Civil. A despeito das variadas maneiras de interpretação do dispositivo, não deve preponderar a forma abstrata, em que a mera exis- tência de uma outra ação no plano teórico impediria o exercício da ação de enriquecimento, mas sim a forma concreta. O correto enfoque da subsidiariedade não é a concorrência com outra ação - o que pode ocorrer dependendo do preenchimento dos requisitos específicos -, mas é o impedimento de obter-se a violação ou fraude da lei. Nessa linha de raciocínio, não pode a ação de enriquecimento, por exemplo, suplantar uma situação fulminada pela prescrição ou pela decadência, visto que violaria a lei. Ocorre o instituto do enriquecimento sem causa no âmbito do direito administrativo? Giovanni Ettore Nanni - No âmbito do direito administrativo o preceito que veda o enriquecimento sem causa também encontra acolhida, especialmente nos contratos firmados pela Administração Pública, em caso de anulação, quando as prestações eventualmente desempenhadas em favor do Poder Público não encontrarem contraprestação. A mesma situação deflui da revogação ou invalidação do procedimento de licitação, em que verbas despendidas poderão eventualmente ser reavidas, conforme disposição da Lei n. 8.666/93. A justificativa de tais dispositivos é a atuação marcante da norma que impede o locupletamento injustificado. Fonte: Saraijur Enriquecimento Sem Causa - Col. Prof. Agostinho Alvim, de Giovanni Ettore Nanni, Editora Saraiva, R$ 84,00, 437 páginas. Esta obra trata com a devida abrangência do enriquecimento sem causa, suprindo carência da literatura jurídica. Para dissecar o tema, o Capítulo I faz uma ampla retrospectiva dos antecedentes históricos do enriquecimento sem causa. O Capítulo II destina-se à análise do enriquecimento sem causa no direito estrangeiro. O Capítulo III e os seguintes estudam o tema no direito brasileiro, comparando o CC/1916 com o CC/2002 e discorrendo sobre as teorias do enriquecimento sem causa e outros aspectos teóricos. Nas palavras do autor, a previsão expressa desse instituto no CC/2002 “simboliza um avanço na salvaguarda da retidão e equilíbrio nas relações jurídicas, em atendimento aos parâmetros da socialidade que timbram o novo Código”. A obra propicia, portanto, a ideal compreensão da concepção inovadora adotada pelo CC/2002 18 O Magistrado T E C N O L O G I A Do papiro ao software ecológico Quem diria? A tecnologia pode ser uma alternativa ao desperdício de papel e assim, contribuir para a preservação das florestas Por Rubens Manino é sócio fundador da BCS Informática, especializada em soluções para escritórios de advocacia. E-mail: [email protected] O mais antigo papiro que se tem notícia data de 2200 a.C. De lá para cá, o ser humano consagrou o papel e lhe deu as mais diversas utilizações. Entretanto, seu uso exacerbado e crescente, aliado a outras utilizações da madeira, também fez crescer os desmatamentos. Para se ter uma idéia, a taxa anual de desmatamento da Amazônia Legal para o período de agosto/2001 a agosto/2002 - chegou a 25.500 km2 , o que equivale a 5,1 milhões de campos de futebol, um aumento de 40% em relação ao ano anterior. É válido, portanto, buscar alternativas viáveis para reduzir seu uso. É o setor corpo- rativo que mais utiliza papel e, infelizmente, há desperdício. Imprimem-se documentos, arquivos, rascunhos, emails e tantos mais, para ler, fazer anotações e, depois, jogar no lixo. E, dependendo do ramo de atividade, o uso e o descarte de papel é ainda maior. É o caso da área jurídica. As advocacias e fóruns estão abarrotados de processos, despachos, petições de todos os tipos, em papel. E os rascunhos que foram para o lixo antes disso são incontáveis. Mas, já se nota a substituição do papel, senão definitiva, pelo menos de forma significativa. E, quem diria? É a tecnologia que vem fornecendo paulatinamente recursos para isto, e assim, contribuído para diminuir o uso desmedido e, por conseguinte, o desmatamento das florestas. A ajuda vem dos, por assim dizer, softwares ecológicos que compartilham informações, digitalmente, e fazem circular documentos e conhecimentos para os profissionais envolvidos darem seu parecer, eliminando sucessivas cópias em papel durante o processo. Existem também programas que gerenciam o fluxo e padronizam os processos de trabalho e reduzem em mais de 30% o volume de papel. Escritórios de advocacia que automatizaram também os processos administrativos conseguiram atingir uma redução ainda maior, chegando a 35%. Por sua vez, as publicações no Diário Oficial que, antigamente, seguiam para os advogados em papel, hoje chegam por e-mail; a certificação digital, além de toda comodidade e avanço que representa, é também um aliado ecológico, uma vez que elimina o uso desnecessário. O e-mail também reduziu consideravelmente o uso do fax e os “Existem também programas que gerenciam o fluxo e padronizam os processos de trabalho e reduzem em mais de 30% o volume de papel.” 20 O Magistrado scanners de mão eliminaram a necessidade de cópias em papel de andamentos e peças processuais nos fóruns. Parece pouco, mas se trata de um grande alento para a natureza. Gradativamente, mais e mais corporações aderem aos meios eletrônicos e às soluções que, além de imprimir eficiência aos processos de trabalho, reduzem o gasto excessivo do papel. Sabemos que é impossível abolir o seu uso, mas é viável implantar processos que garantam o uso consciente. Em última instância, trata-se de uma nova conformação em que as maiores mudanças ainda estão por vir. É bem verdade que nos últimos anos, com o crescimento do número de madeiras de reflorestamento e com a reciclagem do papel e do papelão, houve redução nos desmatamentos predatórios para retirada da celulose. Entretanto, ainda é pouco. Segundo o fundo Mundial para a Natureza (WWF), o Brasil tem a maior taxa de desmatamento do mundo. A mata Atlântica, por sua vez, é uma das áreas mais atingidas pelo desmatamento no País. Já a Mata de Araucária, encontrada na região Sul e parte do estado de São Paulo e cuja espécie dominante é a Araucária Angustifólia, ou Pinheiro do Paraná, tem uma variada utilização na indústria de móveis, construção civil, e fábricas de papel e celulose. Por ser a principal fonte produtora de madeira do País, essa mata quase foi completamente ! extinta. (Fonte: Almanaque Abril -1999 e 2000) E, apesar da conscientização das pessoas sobre os danos causados pelo desperdício de papel, não é nem de longe suficiente. O desmatamento é tão grave que coloca em risco a biodiversidade e fontes vitais como o ar e o solo além de desequilibrar o ecossistema. É por isto que a tecnologia coloca-se como uma alternativa. Não única, mas importante na preservação das florestas. Divulgação T E C N O L O G I A “As advocacias e fóruns estão abarrotados de processos, despachos, petições de todos os tipos, em papel”, Rubens Manino De fato, a preocupação com a natureza parece ser recorrente em nossos dias. Há um sentimento generalizado e uma unanimidade sobre as conseqüências que a destruição dos recursos naturais acarreta para a vida no planeta. A necessidade de preservação dos recursos naturais é evidente. Todos sabem (embora nem sempre pratiquem) que o desmazelo e o prolongado pouco caso com a natureza levaram muitos animais à extinção; que a água po- tável é um recurso esgotável; que a poluição dos rios e do ar e a contaminação do solo e dos oceanos com produtos tóxicos trazem danos irreparáveis para a saúde. Neste contexto, cabe a cada um, principalmente as corporações, fazer sua parte. O desperdício de papel colabora para a destruição das florestas, o que pode varrer do planeta muitas espécies da flora e da fauna. O Magistrado 21 S E R V I Ç O Precatório: saiba o que é e como fazer para recebê-lo Tribunal de Justiça do Distrito Federal lança serviço de tira-dúvidas, que funciona, inclusive, pela internet Se você já ouviu falar de precatório, mas não entende bem do que se trata, não precisa se preocupar: o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) está com o serviço para atender ajudá-lo a ficar por dentro do assunto. A primeira informação que você deve saber é que o precatório é uma ordem judicial para pagamento de débitos dos órgãos públicos federais, estaduais, municipais ou distritais. Tais débitos recaem sobre esses órgãos públicos por terem sido condenados a indenizar o cidadão. Em segundo lugar, é preciso esclarecer que o precatório só pode ser iniciado quando a ação judicial não comporta mais qualquer tipo de recurso. Além disso, o pagamento desse tipo de dívida depende de depósito pela esfera de governo condenada a indenizar o cidadão – União, Estados, Municípios ou Distrito Federal. Cada um desses níveis de governos deve fazer constar de seus orçamentos anuais a previsão de pagamento de seus precatórios. Atualmente, cerca de dois mil precatórios no Distrito Federal aguardam quitação por parte do governo local. Diversos desses processos envolvem mais de um credor e, infelizmente, muitos dos atuais beneficiários estão aguardando pagamento há anos, alguns até mesmo há décadas. Algumas dessas pessoas estão 22 O Magistrado S acometidas de doenças cardiovasculares, câncer, entre outras graves doenças, e morrem sem receber o dinheiro que o Estado lhes deve. COMO É FORMADO UM PRECATÓRIO? Depois que a Justiça der ganho de causa definitivo ao cidadão, condenando o ente federativo a indenizá-lo, o Juiz expede um documento, nos moldes de ofício, endereçado ao Presidente do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, no caso de Brasília, a quem cabe, por força constitucional, adotar as providências necessárias para que o pagamento se concretize. Após o recebimento do pedido, o Presidente do TJDFT autoriza o início do processo de precatório, que é formado a partir de documentos enviados pela Vara, e que passa a ter andamento no Serviço de Precatórios da Secretaria Judiciária. DE ONDE VEM O DINHEIRO PARA PAGAMENTO DOS PRECATÓRIOS? O dinheiro vem sempre das entidades devedoras. Nesse caso, todos os valores para pagamento dos precatórios são depositados em uma conta única. O TJDFT está concluindo um estudo para alterar o sistema atual desses depósitos para garantir que esses recursos tenham rendimento. Essas novas regras constarão de uma Portaria do Presidente do TJDFT que será publicada em breve. A idéia é criar contas individuais para esses depósitos, que deverão ser vinculadas aos Cartórios das Varas. Mas é bom lembrar que o pagamento dos precatórios depende de previsão orçamentária. Por exemplo, se o DF tem R$ 1 milhão em precatórios a desembolsar no ano de 2006, o mon- tante deve constar do Orçamento aprovado no exercício de 2005 pela Câmara Legislativa. O PAGAMENTO DO PRECATÓRIO TEM DE OBSERVAR UMA ORDEM? Sim. Nenhum precatório pode ser pago em desacordo com a ordem cronológica de registro (autuação) dos processos. Isso significa que a quitação de cada precatório tem, obrigatoriamente, que seguir a ordem numérica das autuações. A determinação está expressa na Constituição Federal, em seu artigo 100. Apesar dessa exigência, a própria Constituição autorizou, no ano de 2002, o pagamento dos precatórios de pequeno valor, ou seja, aqueles de até 40 salários mínimos (R$ 10,4 mil), no prazo de até 60 dias (Emenda Constitucional nº 37). Antes dessa Emenda, o Governo do Distrito Federal e os demais entes federados não tinham prazo fixado para pagar essas pequenas quantias. Hoje, há duas listas de precatórios, sendo que aqueles precatórios de pequeno valor não entram mais na mesma lista dos inúmeros precatórios de grande valor pendentes de pagamento. NÚMEROS TJDF O Tribunal vem cumprindo, rigorosamente, a ordem cronológica de autuação, inclusive no que se refere aos créditos de até 40 salários mínimos. Os créditos de natureza alimentícia, aos quais é dado um tratamento diferenciado pela Constituição, também seguem entre si uma ordem cronológica. Quantas pessoas foram contempladas com o pagamento de precatórios em 2004? Entre abril e dezembro do ano passado, cerca de 80 credores antigos foram beneficiados com o pagamento dos precatórios. Alguns dos que receberam tinham E R V I Ç O precatórios com processos iniciados há 30 anos. A demora ocorreu pelo fato de os devedores não terem efetuado o depósito anteriormente. AINDA EXISTEM PRECATÓRIOS PENDENTES DE PAGAMENTO? Sim. De um universo de 2 mil processos, um percentual de 90% ainda se encontra pendente de pagamento. Esses precatórios correspondem ao período de 1996 a 2004. Em obediência à Constituição Federal, o TJDFT, por meio do Serviço de Precatórios da Secretaria Judiciária (Serpre), não pode autorizar o pagamento de novos precatórios sem que antes os mais antigos sejam pagos. Dos devedores, apenas o INSS tem depositado em dia os valores por ele devidos. COMO O TRIBUNAL DISCIPLINA O PAGAMENTO DOS PRECATÓRIOS? Em geral, isso é feito por meio de portarias que regulamentam o trâmite e a quitação dos precatórios. Contudo, uma Comissão formada por Desembargador e servidores da Casa está elaborando normas regimentais necessárias a melhor satisfação desses créditos. EM CASO DE DÚVIDAS SOBRE PRECATÓRIOS, A QUEM PROCURAR EM BRASÍLIA? Em caso de dúvidas, em Brasília, as pessoas devem procurar o Serviço de Precatórios da Secretaria Judiciária/ TJDFT. O Serpre funciona no Palácio da Justiça, sala 242. Atende pelo telefone 343-6669. Nos outros estados procurar os respectivos tribunais. Fonte: Ascom/TJDF O Magistrado 23 D I R E T O A O P O N T O Assédio judicial Jornalistas querem separar o joio do trigo para evitar excesso de processos contra a categoria Réu em múltiplos processos por crimes contra a honra, o comentarista esportivo Jorge Kajuru foi condenado, em março, por difamação, a 18 meses de detenção, em regime aberto, na Casa do Albergado de Goiânia. O processo foi aberto pela filial da Rede Globo em Goiás, onde a emissora é tocada pela Organização Jayme Câmara. Kajuru, cujo nome é Jorge Reis da Costa, responde por, pelo menos, mais 108 processos por dano moral. Por ser definitiva, na área criminal, a decisão é incomum. Por ter sido movida por empresa jornalística, é emblemática. A condenação acontece em um contexto pouco favorável para a imprensa em geral e especialmente ruim para os jornalistas. Levantamento feito por este site, há pouco mais de 1 ano, mostra que para um universo de 2.783 jornalistas de 5 grupos jornalísticos havia 3.342 ações judiciais por dano moral. O estudo mostra que a imprensa foi engolfada pelo alto grau de litigiosidade que atinge todos os seto- 24 O Magistrado res do país. Esse fenômeno se constata pelo entupimento do sistema judicial. Mas mostra também as outras vertentes, típicas do setor. Uma é o assédio judicial movido por políticos, empresários, juízes e outros segmentos que pedem a ajuda do Judiciário para que suas mazelas fiquem em segredo. É neste capítulo que se encontra o maior volume de processos. Não são poucos também os casos de erros, que mostram a precariedade da formação de jornalistas e que, mesmo depois de apontados, são arrogantemente encarados: não são corrigidos nem se pede desculpas ao ofendido injustamente. O quarto lote é o do abuso puro e simples. Fala-se da honra alheia como quem amaldiçoa o clima. Neste endereço residem os mais de cem processos contra Kajuru, que até hoje nunca teve a suspeita da venalidade levantada contra ele. O vetor mais pernicioso vem agora: é o segmento de empresas e pro- fissionais que usam o jornalismo para fazer negócios: suprimem ou dão notícias em troca de dinheiro, publicidade ou favores. É esse setor que contamina a imagem de toda a imprensa, contribuindo para o seu descrédito e para a multiplicação de processos e condenações. Em geral, usamse acusações de supostos crimes imputadas a uma empresa ou empresário para enfraquecê-lo numa disputa de negócios. O patrono da notícia falsificada ou turbinada costuma ser a parte favorecida. E há também a velha extorsão. PROJETO DOWN Um caso acabado de extorsão é descrito em detalhes nos autos de processo (000.02.226954-1), julgado pela 2ª Vara Cível Central de São Paulo. Enquanto um empresário e sua empresa eram alvejados por sucessivas notas consideradas mentirosas e ofensivas de um colunista, as vítimas foram procu- D I R E T O radas por uma ONG do próprio jornalista para comparecer com uma “doação” de 30 mil reais. Como a doação não foi feita, os ataques recrudesceram. A ONG em questão é uma entidade assistencial chamada Projeto Down, alegadamente voltada para o apoio a crianças acometidas da síndrome de Down. A entidade tem o mesmo endereço da empresa jornalística e o site do colunista direciona os leitores para o endereço da ONG. Gilberto Luiz di Pierro, que atende pelo pseudônimo de “Giba Um”, e sua empresa, a Manager Comunicação, flagrados, foram condenados pelo juiz José Tadeu Picolo Zanoni a pagar 1.000 salários mínimos como reparação. Em sua sentença, o juiz anota que o pedido de dinheiro “foi claramente confessado”. A coincidência de o endereço do recibo da ONG ser o mesmo da Manager, afirma Picolo Zanoni “derruba toda a argumentação dos requeridos em prol do trabalho social que eles acreditam desenvolver”. O colunista Giba Um, em primeira instância, já foi condenado e recorre contra outras decisões que lhe impuseram as penas de três meses de detenção, uma reparação de 20 salários mínimos e outra de 500 salários. Outros processos estão em curso, como o da filha do presidente Lula, Lurian, e do prefeito Blumenau. Ambos pedem reparação de 1.000 salários mínimos. Todos os casos envolvem crime contra a honra. (Um leitor catarinense corrige a informação a respeito do prefeito de Blumenau, que moveu a ação no cargo, mas já não o ocupa). revalorização profissional. O vice-presidente da Federação, Fred Ghedini, que também dirige o Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, concorda que para recuperar o respeito da sociedade e do Judiciário a corporação deve reagir contra quem usa o jornalismo para atos de banditismo. “Por isso vamos retomar a luta pela criação do Conselho Federal dos Jornalistas”, afirma Ghedini. O Conselho teria instrumentos disciplinares mais efetivos que as comissões de ética da Fenaj e dos sindicatos. Segundo o dirigente, “uma ação mais firme no âmbito profissional traria um ganho de qualidade nessas questões”, que hoje são arbitradas de forma descompensada pela magistratura. CHOQUE DE CORPORAÇÕES A O P O N T O bou — o que é bom para o país. Mas ao abrir-se a panela de pressão, o conteúdo espirrou longe. E o equilíbrio nesse relacionamento ainda não se estabeleceu. O CFJ foi repelido no ano passado pelas empresas jornalísticas por ser visto como um possível órgão de cerceamento da liberdade de imprensa. Suas características de autarquia, que passaria a cobrar contribuições compulsórias da categoria, dona da licenciatura para o exercício da profissão, provocaram a repulsa também, da maior parte dos profissionais do ramo. A sua rejeição, contudo, não resolve o drama da falta de um órgão disciplinar. Sem um tribunal de ética, empresas e jornalistas ficam à mercê dos 15 mil juízes brasileiros, um colegiado majoritariamente resistente ao jornalismo que se pratica no país. Os juízes, é preciso que se diga, entendem tanto dos mecanismos da imprensa, quanto os jornalistas entendem do sistema judicial. Durante décadas, os dois setores mantiveramse em respeitosa distância. Ultimamente, mais precisamente a partir da segunda metade da década de 90, a cumplicidade aca- REAÇÃO DE CLASSE A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) reuniu-se recentemente para discutir suas diretrizes para 2005. Na pauta, uma campanha de 25 O Magistrado I N I C I A T I V A S STJ lança projeto pioneiro em Tribunais Jorge Campos/ACS/STJ Medidas de inclusão social e digital para portadores de necessidades especiais serão implantadas com objetivo de melhorar o acesso dessas pessoas à Corte 26 O Magistrado “ O homem é a medida de todas as coisas”, acreditava o pensador grego Protágoras. E foi com o painel e a frase emoldurando o Salão Nobre que o Superior Tribunal de Justiça lançou o Projeto Inclusão - “Acessibilidade e Inclusão de Pessoas com Deficiência”, com a presença de ministros e do ministrochefe da Secretaria Especial de Direitos Humanos, Nilmário Miranda. Um acordo de cooperação técnica foi assinado entre o STJ e a Secretaria. O acordo pretende desenvolver mecanismos e criar condições que permitam aos portadores de necessidades especiais, não só no STJ, pioneiro na adequação física do Tribunal, mas em todo o Brasil, um melhor acesso aos órgãos públicos. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), são aproximadamente 26 milhões em todo o País, sendo 270 mil no Distrito Federal. O Projeto Inclusão, lançado hoje, pretende desenvolver a sensibilidade física, digital e social dos portadores de deficiência física. Após cumprimentar as autoridades, os servidores e os portadores de deficiência presentes ao lançamento do projeto, o ministro Barros Monteiro, diretor da Revista do Tribunal, revelou que já estão em andamento providências para tornar disponíveis textos dos acórdãos em braille. Ele lembrou as medidas já adotadas pelo Tribunal para reduzir os obstáculos, como a adequação física, a reserva de um por cento das vagas para estagiários aos portadores de deficiência e a prioridade nos julgamentos de processos. Afirmou, ainda, que o número de estagiários vai aumentar de nove para 32. O ministro-chefe da Secretaria Especial de Direitos Humanos, Nilmário Miranda, elogiou a iniciativa do Tribunal, que, mesmo antes do Decreto 5.296/04 assinado pelo presidente da República, já tomava medidas a fim de garantir e proteger o direito dos portadores de deficiência. “O decreto significou uma verdadeira Lei Áurea para essas pessoas. Mas não haverá direito integral se não for garantida a acessibilidade, que é o ponto de partida para todos os outros”, afirmou. Ele enalteceu todas as medidas já tomadas pelo STJ. “Todos os tribunais se espelharão neste exemplo para fazer as mudanças e cumprir os compromissos com os direitos de uma parcela enorme da população brasileira”, acrescentou. Para aqueles que tinham dificuldades até para garantir o direito de ir e vir, previstos na Constituição, por causa da altura do botão do elevador ou falta de alguém para “guiar” pelos caminhos, o decreto, que prevê a adequação física de todos os órgãos em até 48 meses, é um presente. “As medidas vão diminuir nossa dependência de outras pessoas”, co- I N I C I A T I V A S memora o servidor Luís Lopes Batista. Formado em Direito e servidor do STJ desde 1990, Luís é deficiente visual. Lembrada por todos como uma espécie de “guardiã e protetora” dos direitos dos deficientes, não só no STJ, como em todo o Brasil, a ministra Nancy Andrighi comemorou o lançamento do projeto. “Essas pessoas já têm muitos sofrimentos. Vamos trabalhar cada vez mais para, pelo menos, diminuir os obstáculos.” O presidente da Associação Brasileira de Desportos com Cadeiras de Rodas, Paulo Becker, também festejou. “Todos nós somos diferentes um dos outros. Mas, acima de tudo, somos todos seres humanos. Queremos respeito”, disse. Em seguida, o presidente do Instituto Cultural - Superando Limites, Construindo Cidadania, Sueid Miranda, entregou uma placa de agradecimento ao ministro Barros Monteiro. O cadeirante Cícero Sales afirmou que a instituição fez toda a diferença em sua vida e elogiou o projeto lançado pelo STJ. Cearense, foi vítima de erro médico e está na cadeira desde 1998. Mas leva uma vida normal: é casado, tem dois filhos, faz cursos profissionalizantes e joga tênis no Instituto. A entidade dirige, ainda, uma fábrica de cadeiras de rodas e um restaurante comunitário, onde trabalham pessoas portadoras de deficiência. O lançamento do projeto foi encerrado com a apresentação da banda de música Zactar, da Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae), que cantou, entre outras, as músicas “Espanhola” e “Noites com Sol”, causando emoção entre os presentes. Fonte: Ascom/STJ “O acordo pretende desenvolver mecanismos e criar condições que permitam aos portadores de necessidades especiais um melhor acesso aos órgãos públicos” O Magistrado 27 I D É I A S A arte secreta de Michelangelo Uma Lição de Anatomia na Capela Sistina Por Gilson Barreto, médico, coordenador do Serviço de Cirurgia do Hospital Municipal de Paulínia, no Estado de São Paulo, e Marcelo Ganzarolli. de Oliveira, Mestre em Química e Doutor em Ciências pela Unicamp, onde é professor livre-docente do Instituto de Química “...não há nenhum animal cuja anatomia ele não dissecasse, e ele trabalhou em tantas anatomias humanas, que aqueles que haviam passado suas vidas nisso e feito disso sua profissão dificilmente saberiam tanto quanto ele.” A. Condivi (1527-1574), A vida de Michelangelo O trecho acima, de Condivi, revela uma faceta de Michelangelo Buonarroti (1475-1564) que normalmente é negligenciada pelos historiadores e estudiosos de sua obra. As biografias de Michelangelo o descrevem como um dos maiores escultores de todos os tempos, cuja fama incomparável adquirida durante a Renascença, se deve também à sua pintura, arquitetura, desenhos e obra poética. Na verdade, a influência de Michelangelo sobre a história da arte foi tão extraordinária, que a própria palavra Renascença (do italiano rinascita) foi cunhada (por seu biógrafo Vasari, para descrever o salto das artes sob as influências de Michelangelo e Rafael. Mas Michelangelo foi muito mais do que um artista da Renascença; seus estudos minuciosos sobre a forma hu- 28 O Magistrado mana, o tornam também um dos maiores anatomistas deste período. É esta faceta que revelamos em nosso livro “A Arte Secreta de Michelangelo – Uma lição de Anatomia na Capela Sistina” (ARX, 2003, 229 p.), através da descoberta de um segredo que permaneceu oculto por quase 500 anos. A célebre Capela Sistina, onde são realizados os conclaves para escolha dos novos papas, é hoje visitada por hordas de turistas que passam pelo Vaticano todos os anos. Além dos impressionantes museus do Vaticano, a Capela deixa sua marca indelével nos visitantes que, observam maravilhados o afresco riquíssimo e complexo que Michelangelo pintou, cobrindo todo o teto, entre 1508 e 1512. A iconografia das cenas, com mais de 300 figuras humanas, coloca em destaque a anatomia dos nus; um reflexo da filosofia humanista da renascença e de sua busca pelos ideais clássicos de beleza. Em abril de 2003, nós começamos a descobrir que o teto da Sistina estampa uma lição camuflada de anatomia humana que vai muito alem da anatomia de superfície que até então se conhecia. Esta descoberta foi motivada em parte por um artigo científico publicado em 1990 pelo médico americano Frank Lynn Meshberger no “Jornal of the American Medical Association” onde ele apresentou uma interpretação para a cena da Criação de Adão de Michelangelo, baseada em neuroanatomia. Meshberger argumenta de forma convincente que esta cena (a mais famosa da capela), possui uma característica que ainda não havia sido reconhecida. Ele compara a cena onde o criador se encontra dentro de um manto I cercado de querubins, com várias figuras anatômicas que mostram esquemas do corte sagital do crânio humano, contendo o cérebro, para mostrar uma impressionante semelhança entre a figura pictórica e as figuras anatômicas. Meshberger identifica várias estruturas incluindo a artéria vertebral, o cordão espinal, a hipófise, o nervo óptico e o quiasma óptico e conclui que a intenção de Michelangelo pode ter sido a de representar Deus fornecendo a Adão o intelecto. Gilson tomou conhecimento deste artigo na década de 90 e a analogia entre a pintura desta cena e o corte sagital do cérebro me pareceu fazer sentido, a ponto de eu ter preparado um slide desta comparação para usar em minhas aulas de cirurgia de cabeça e pescoço no hospital onde D É I A S trabalho –”Em abril de 2003, quando procurava este slide, tive um “insight”: se na cena da criação de Adão, Michelangelo fez uma representação de um corte sagital do crânio, não teria ele também representado outras estruturas anatômicas em outras cenas”? Ao abrir seu livro da Capela Sistina na página da cena do profeta Jeremias, Gilson viu nas vestes sobre os joelhos do profeta uma estrutura anatômica que ele vê com muita freqüência em suas cirurgias: ali estava o ouvido interno dissecado, com a membrana do tímpano e o ossículo do martelo! Esta descoberta precipitou outras três ou quatro identificações de outras estruturas anatômicas em outras cenas do teto nesta mesma noite atormentada. Na manhã seguinte, nós dois, Gilson e Marcelo, iniciamos o que classificamos como “um mergulho em um abismo de quase 500 anos de história, onde um grande enigma havia sido selado por um dos maiores artistas que a humanidade já conheceu”. Sentindo como se tivéssemos aberto uma espécie de cápsula do tempo, começamos a ler a aula de anatomia camuflada que Michelangelo havia deixado no teto da Sistina. No trabalho que se seguiu, descobrimos que não só todas as cenas do teto possuem estruturas anatômicas ocultas, mas que todas elas são acompanhadas de um impressionante código que Michelangelo usou para indicar onde as peças estão. Após muitos meses de trabalho, a idéia inicial de divulgar a descoberta na forma de artigos científicos, teve que ser abandonada frente à dimensão das correlações encontradas, que superavam em muito o espaço que qualquer jornal ou revista científica poderiam nos conceder. Foi então com o apoio do amigo Heródoto Barbeiro que conseguimos apresentar a descoberta à Editora ARX, que os incentivou a organizar todo o material na forma de um livro. A investigação para a montagem do livro exigiu que fizéssemos um mergulho também na história do Renascimento onde descobrimos o Michelangelo anatomista. Esta história, que raramente se encontra nos livros de arte, compõe uma parte importante do livro A Arte secreta de Michelangelo. Nele o leitor descobrirá que o profundo interesse que Michelangelo teve por anatomia ao longo de sua vida foi um reflexo da cultura de seu tempo; que em sua determina- O Magistrado 29 I D É I A S quisa, descobrimos que o ambiente no qual a personalidade de Michelangelo se formou, o expôs à dissecação, permitiu que ele a praticasse e o colocou em contato com pessoas familiarizadas com o estudo da anatomia e com os textos médicos. A pesquisa revelou também que o profundo interesse pela anatomia de Michelangelo se estendeu por toda a sua longa vida a ponto de ele ter planejado publicar um tratado de anatomia para artistas e colaborar em um texto de anatomia para estudantes de medicina. Projetos que infelizmente ele não conseguiu concretizar. No livro colocamos uma apresentação muito diferente do teto da Sistina. Em trinta e três cenas do teto, com suas centenas de figuras contorcidas e espiraladas, os Ignuds, Profetas, Sibilas, Escravos de Bronze e Querubins, participam de um código orquestrado que visa conduzir o apreciador da arte a uma estrutura anatômica camuflada. Como são poucos os leitores que podem reconhecer estas estruturas, elas estão todas comparadas com fotos ou desenhos anatômicos. Por fim, o leitor verá que o gênio também ocultou estruturas anatômicas em duas de suas mais famosas esculturas. O Moises e a Pietá. Michelangelo pode não ter editado em papel seu tratado de anatomia. Mas ele, conscientemente, o deixou registrado de uma forma muito mais perene. Quinhentos anos e muitos Papas se passaram, para se descobrir que ele o deixou no teto da Sistina. ção em compreender os movimentos do corpo humano, os artistas dos séculos XV e XVI passaram a estudar a sua estrutura interna. Michelangelo começou a participar das seções de dissecações públicas já em sua adolescência, conduzido por Elia Del Medigo, um médico-filósofo, membro do círculo de Lorenzo de Médici, que incluía muitos outros pensadores como Giovan Francesco Rustici (1474-1554), que se dedicava ao estudo da “necromancia” e Marsílio Ficino (1433-1499), um dos humanistas de maior destaque desta época, filho de um cirurgião e que tinha também estudado medicina. Aos dezoito anos, Michelangelo já dominava a arte da dissecação e fazia suas próprias dissecações e demonstrações. Ele não foi, é claro, o único anatomista obsessivamente minucioso desta época. Outros contemporâneos seus, grandes figuras como Leonardo da Vinci (1452-1519), Berengario da Capri (1470-1550), Niccolo Massa (14891569), Andréas Vesalius (1514-1564) e Realdo Colombo (1516-1559) romperam com a subserviência aos medievalistas e re-exploraram o corpo humano. Leonardo produziu cerca de 750 desenhos anatômicos, sendo considerado o fundador da anatomia fisiológica e iconográfica. Em nossa pes- 30 O Magistrado NOTA DA REDAÇÃO: O primeiro leitor de “O Magistrado em Revista” que mandar um correio eletrônico com um comentário sobre qualquer um dos textos publicados nesta edição, ganhará um exemplar do livro “ A Arte Secreta de Michelangelo” C A P A Habemus Crucificação Aspectos jurídicos do julgamento de Cristo Por Rubens Tavares, advogado militante há mais de 25 anos, além de ter ocupado os cargos de procurador de justiça, promotor e defensor público. Na área eclesiástica é formado em Teologia, onde atua como professor de Hermenêutica Sagrada (rubenstavares.uol.com.br) Antes de tudo quero que os leitores me perdoem por uma introdução um pouco longa que darei, todavia é necessário que se entendam as circunstâncias que cercaram o julgamento de Cristo, tendo em vista a precariedade de fontes. Em razão disto, sem esquecer os Evangelhos, é bom trazer à tona a cultura judaica para que possamos com 32 O Magistrado maior segurança, traçar o perfil jurídico do Julgamento de Cristo. Outrossim, no que for necessário, procuraremos como fonte, o direito judaico e o romano. Israel foi a primeira nação monoteísta 1, cuja origem remonta a Abraão, cerca de 2.000 a.C. Figura de destaque, também, foi Moisés, o libertador, que teria recebido dire- tamente de Deus as leis que regeria a nação, motivo pelo qual Israel não desassociava a administração política da religião. Na verdade, nas diversas fases de sua história, embora governado por sacerdotes, profetas, juizes e reis, tratava-se de uma Teocracia. Tudo era em nome de Jeová, o Deus único. O Templo 2 era o local onde se venerava a Jeová, e se praticavam os cerimoniais religiosos, tinha dois compartimentos, o primeiro o Lugar Santo, e o segundo o Lugar Santo dos Santos, onde estava a Arca da Aliança, e, segundo acreditavam os judeus, havia ali presença literal de Jeová. C Nesse lugar, Santo dos Santos, só quem tinha acesso, e assim mesmo uma vez por ano, era o Sumo Sacerdote, figura máxima da religião judaica, para sacrificar pelo povo um novilho3, quando então Jeová se manifestava para perdoar o pecado de todos. Após Abraão e Moisés, a figura de maior destaque em Israel fora o rei Davi, que unificou o Estado, construiu a capital Jerusalém e alargou grandemente as fronteiras do reino, pois era um grande homem de guerra. Nunca mais em Israel surgiu uma figura tão carismática quanto ao rei Davi. Após seu reinado e de seu A P A “No que tange à ordem de prisão, com certeza foi emitida pelo Sinédrio na pessoa do Sumo Sacerdote, pois tinha autoridade sobre os de cidadania judia”, Rubens Tavares O Magistrado 33 C filho Salomão, Israel sucessivamente, séculos após séculos, passou a ser presa de conquistas de várias nações. Nesse período, todos os profetas apontavam o nascimento de um messias que resgataria Israel e voltaria a ter o mesmo resplendor dos tempos do inigualável rei Davi. Todos aguardavam ansiosos. Por volta do ano 64 a.C, Pompeu 4, em seu empreendimento conquistador, subjugou várias nações, dentre as quais a Judéia, impondo o domínio do Império Romano, o qual, apesar da riqueza de sua mitologia que mesclara-se à grega, respeitava as culturas e religiões dos conquistados, desde que não conflitasse com os interesses do Império. Nesse clima – os judeus dominados pelos romanos, – nasceu Jesus Cristo: pessoa carismática, excelente oratória e sabia falar diretamente aos corações. Conquistar a simpatia do povo. Era comum reunir 3, 4, 5 mil pessoas para ouvi-lo. Segundo ainda consta nos Evangelhos, fez dezenas de milagres. Ressuscitou mortos, curou aleijados, restituiu vistas a cegos. Tinha contra si, porém, ter nascido na pobre e discriminada região da Galiléia, ao norte da Judéia. Por dois motivos, Jesus Cristo conquistou a antipatia e temor de grande parte da classe dominante judia: sacerdotes, escribas, fariseus, saduceus e os componentes do Sinédrio5. Primeiro, por ciúme6, já que o povo passara a segui-lo. Segundo, porque temiam que Jesus provocasse alguma rebelião, atraindo a ira romana, no que poderiam ser esmagados7, pois o povo poderia aceitá-lo como o messias prometido que restituiria à Judéia a glória que tivera com o rei Davi. Por isso, reuniu-se o Sinédrio, sob a presidência do Sumo Sacerdote Caifás e chegou-se a conclusão que a solução era matar Jesus8. “O iter na formação da culpa de Jesus foi ilegal, mesmo considerando as leis da época” A P A A situação alarmou-se mais ainda, quando, dias depois, num domingo, seis dias antes da Páscoa, Jesus Cristo foi aclamado pelo povo como novo rei ao entrar em Jerusalém, que estendia casacos, xales e ramos de árvores9, à sua passagem. Não tinha saída, a única solução era matá-lo. Mas como prendê-lo sem culpa, e mais ainda, se o povo o admirava. Poderia acontecer uma revolta popular. A solução era prendê-lo em lugar ermo, à noite, longe do povo e formalizar a culpa. Seria um fato consumado. Judas Iscariotes, que era ganancioso por dinheiro10, sabendo que os principais sacerdotes procuravam uma oportunidade para prender Cristo sem causar tumulto, foi procurá-los. Prometeu indicá-lo em um lugar ermo, à noite, que não houvesse o povo. Trinta moedas foi o preço. Antes de prosseguirmos é bom esclarecer que a então Judéia, que era considerada pelo Império Romano um legado da Síria11, também dominada, dividia-se em reino do norte e do sul. Por ocasião do Ministério de Cristo, Roma, que tinha como imperador Tibério, indicara para governar o norte O Magistrado 35 C A P A “Creio que embora o Sinédrio tivesse o poder de condenar o cidadão judeu à pena capital, não poderia executá-lo. Necessitava da chancela romana”, Rubens Tavares Herodes Antipas, região pobre e discriminada pelos do sul. Ao sul havia a capital Jerusalém onde situava-se o Templo e o Sinédrio e a sede do governo religioso da Judéia. Tinha como governador Pôncio Pilatos. Jesus Cristo era do Norte, Galiéia, apenas nascera no sul quando sua mãe fora recensear-se em Belém. O sumo sacerdote de Israel era Caifás que sucedera seu sogro Anás. Ambos pertenciam ao Conselho Superior (Sinédrio), presidido por aquele. Pois bem, como prometido, Judas Iscariotes deixara as autoridades 36 O Magistrado judaicas de plantão, pois a qualquer momento os levariam a prender a Cristo. Quinta-feira à noite, cumprindo cerimonial judaico, Jesus estava em Jerusalém participando da Páscoa com os discípulos. Após, nos últimos minutos de quinta-feira ou nos primeiros minutos da madrugada de sextafeira, retirou-se para orar e meditar. Judas sabia que Jesus iria para fora dos muros de Jerusalém a um local denominado Jardim Getsêmani. Local ermo. Além do mais, era madrugada. Assim, correu e foi avisar às autorida- des religiosas da Judéia. Em seguida, como é de conhecimento de todos, Jesus foi preso após receber um beijo do traidor Judas Iscariotes, pois, por ser noite, precisava que alguém o identificasse. Foi identificado com um beijo. Temos agora as primeiras questões jurídicas: A prisão à noite era legal? Havia uma ordem de prisão? Quem deu a ordem de prisão? Jesus foi preso pela guarda romana ou judia? O decreto de prisão da cruz foi judeu ou romano?. Vamos às respostas. À época, em que pese o senso de direito que tinha a cultura romana, não se alcançara, evidentemente o patamar que temos hoje. Portanto, a prisão à noite não era ilegal quer para os judeus12. No que tange à ordem de prisão, com certeza foi emitida pelo Sinédrio na pessoa do Sumo Sacerdote, pois tinha autoridade sobre os de cidadania judia. Em Atos dos Apóstolos encontramos Saulo de Tarso, depois chamado Paulo, com ordem de prisão emitida pelo Sumo Sacerdote13 contra os primeiros cristãos judeus para levá-los presos a Jerusalém. Temos, portanto que a ordem de prisão foi expedida pelo Sumo Sacerdote. Ocorre que o Evangelho de João cita que houve participação romana14. Se houve participação da guarda romana, é porque havia alguma acusação por parte dos Sacerdotes, junto a Pôncio Pilatos, o governador, de que Jesus teria cometido algum ato que afrontasse Roma. Haim Cohn15 levanta várias hipóteses, dentre as quais de que a prisão de Jesus fora ordenada por Pilatos, pressionado pelas autoridades judaicas, tanto é que ao amanhe- C cer do dia estava esperando para julgá-lo. Na verdade, como já fundamentado acima, entendo que a ordem de prisão foi expedida pelo Sinédrio que tinha jurisdição sobre os judeus. Todavia por ter a presença de soldados romanos, é certo que teria o Sumo Sacerdote Caifás pedido o concurso romano, demonstrando que Jesus oferecia perigo a Roma, pois pregava ao povo subversão contra o Império: “Enviou-me a pregar liberdade aos cativos”16. Assim, em que pese a guarda romana ter colaborado, a ordem de prisão foi expedida pelo Sumo Sacerdote Caifás. Tanto é certo que o preso foi levado à sua casa, onde o aguardavam as demais autoridades judias, sendo primeiramente interrogado por Anás, ex-Sumo Sacerdote, que em seguida o encaminhou ao seu genro, o Sumo Sacerdote Caifás. Os membros do Sinédrio (sacerdotes, escribas e anciãos17 e 18) estavam reunidos na casa de Caifás, onde de maneira informal fizeram toda a instrução do processo, interrogando, humilhando e torturando Jesus Cristo. Ao amanhecer do dia, antes da cidade acordar, sexta-feira, Jesus foi A P A Embora alguns digam tenha sido o Egito, cerca de 14 Séculos a.C., no reinado do Faraó Amenofis IV, que quis instituir um deus único, entendo, ao contrário de muitos, que este Faraó, execrado pelos seus sucessores por tal atitude, tenha se inspirado na doutrina dos descendentes de Abraão. Ver História de Israel de J. Bright, páginas 139/140, Ed. Paulinas; e Introdução do Antigo Testamento de Willian S. LaSor e outrospágina57, Ed, Vida Nova. 2 Lugar sagrado de adoração dos judeus, onde se praticavam cerimoniais religiosos, contendo em seu interior vários utensílios, cada um com seu significado. Êxodo 25.8-40. 3 Levítico 16. 4 O Judaísmo Tardio. André Paul. Ed. Paulinas. 5 O Sinédrio era o Supremo Tribunal dos antigos judeus.Consistia de 71 membros, tendo como presidente o Sumo Sacerdote. Cf. Orlando S. Boyer, Pequena Enciclopédia Bíblica. Instituto Bíblico das Assembléias de Deus. 6 Evangelho de João12.19 7 Evangelho de João 11.48 8 Evangelho de João 11.47-53. 9 Nasceu daí a tradição do Domingos de Ramos. João 12. 42 e Mateus21.8. 10 Evangelho de João 12.4-6. 11 André Paul, obra citada. 12 A Vida de Cristo. Severino Pedro da Silva. Ed. CPAD. 13 Atos 9.1-2. 14 Evangelho de João 18.3 e 12. 15 Autor do livro O Julgamento de Jesus,o Nazareno, Ed. Imago. 16 Lucas 4.18-19. 17 Mateus 26.57 e Marcos 14.53. 18 Anciãos, ou seja, os demais membros do Sinédrio. 19 Severino Pedro da Silva, em sua citada obra A Vida de Cristo, a partir da página 96, confronta as diversas fases e o modo como foi efetuado o Julgamento de Cristo com o direito hebraico e conclui ter havido ilegalidades. 20 Lucas 23.2. 21 Orlando S. Boyer, obra citada. 1 O Magistrado 37 C A P A levado ao Sinédrio, apenas para validar os atos praticados na casa do Sumo Sacerdote. Em poucos minutos, o Conselho do Sinédrio concluiu pela culpa de Jesus Cristo. Crime: Blasfêmia por ter-se auto-proclamado filho de Jeová. Pena: Morte. O iter na formação da culpa de Jesus foi ilegal, mesmo considerando as leis da época19. Destaque-se também, que, segundo os evangelhos, a crucificação de Jesus Cristo se deu às nove horas da manhã de sexta-feira. Portanto, o julgamento do Conselho do Sinédrio deve ter terminado no máximo às seis horas da manhã, haja vista que levaramno a Pilatos, onde obedeceu todo o ritual do pretório romano. Em que pese a formação da culpa ter se dado no Sinédrio, o foi apenas por formalidade, pois que os próprios que o prenderam, julgaramno, e além do mais, o julgamento se deu à noite na casa do Sumo Sacerdote. Todos os detalhes foram planejados pelas autoridades judias para que tivesse um único resultado: condenação. Ao amanhecer do dia, o povo que admirava e seguia a Cristo ao vêlo preso, portanto derrotado, com as mãos amarradas, sendo motivo de zombaria por parte dos que o escoltavam rumo ao Palácio de Pôncio Pilatos, não teve nenhum ânimo para defendêlo. Alguns por temor, outros pelo descrédito que foram assaltados. Jesus, naquelas condições, não dava segurança a ninguém, não traduzia nenhuma simpatia. Mas se Sinédrio já havia sentenciado Jesus à pena capital, por que o levavam ao Palácio de Pôncio Pilatos? Creio que embora o Sinédrio tivesse o poder de condenar o cidadão judeu à pena capital, não poderia executá-lo. Necessitava da chan- 38 O Magistrado cela romana. É defeso ou impróprio citar aqui o acontecido com Estevão que foi apedrejado quando levado ao Sinédrio também sob a acusação de blasfemo. Neste caso, a lapidação ou apedrejamento de Estevão se deu por linchamento do povo com vistas complacente dos membros do Sinédrio. Por esta razão, Cristo após receber a condenação do Sinédrio foi levado ao Governador Pôncio Pilatos. Todavia, Pilatos não faria nenhum referendo a morte de Cristo, apenas por blasfêmia. Isto nada importava a Roma. Por este motivo, os interessados na morte de Cristo levaram-no a Pilatos, sob a acusação de que estaria sublevando o povo contra Roma proibindo dar o tributo a César, e dizendo que Ele Cristo, é o rei20. Pilatos ao receber Cristo e conhecedor da inveja que as autoridades judaicas tinham dEle, procurou fugir do litígio, enviando-o a Herodes, alegando ser da jurisdição deste. Herodes, não conseguindo inter rog ar a Cristo, devolveu-o a Pilatos. Restava agora Pilatos enfrentar a pressão das autoridades judaicas interessadas na morte de Jesus. Pilatos o interrogou. Não se convenceu de nada. Prometeu açoitá-lo. Depois propôs a liberdade de um preso: Jesus ou Barrabás. Contudo, os promotores da morte de Cristo continuavam irredutíveis. Finalmente, Pilatos, de maneira literal lavou as mãos, não no sentido de deixar a situação desenrolar para ver no que dava. Mas no sentido de que lavaria as mãos quanto ao resultado. Não se convencera de que Jesus estava sublevando o povo, porém lavrou a condenação por pressão, aceitando formalmente a acusação. O Governador romano lavrou a condenação à morte, e morte de cruz porque Jesus rejeitava o domínio romano e se auto proclamava rei dos judeus, segundo a acusação. Tanto é que, zombando dos judeus, de modo irônico transcreveu a acusação acima na cruz. Outrossim, a pena à cruz não constava no direito hebreu. A condenação à pena capital na cruz, era uma prática romana21. Conclui-se, portanto, sem a menor sombra de dúvida, que no aspecto estritamente jurídico, a condenação de Jesus Cristo à morte, e morte na cruz, foi da lavra romana. Pilatos poderia evitar, porém preferiu lavar as mãos e curvar-se ante a pressão dos membros do Sinédrio Judeu. Bibliografia: 1. Bíblia de Jerusalém. Ed. Paulus. 2. O Julgamento de Jesus, o Nazareno. Haim Cohn. Ed. Imago. 3. O Romance da Crucificação. Rubens Tavares autor deste artigo. Ed. Vida Plena. 4. O Judaísmo Tardio. André Paul. Ed. Paulinas. 5. Introdução ao Antigo Testamento. Willian S. Lar e outros. Ed. Vida Nova. 6. Pequena Enciclopédia Bíblia. Orlando S. Boyer. Instituto Bíblico das Assembléias de Deus. 7. História de Israel. J. Bright. Ed. Paulinas. 8. A Vida de Cristo. Severino Pedro da Silva. Ed. CPAD. C I D A D A N I A Igualdade racial em debate Realizada em Brasília a I Conferência Distrital de Políticas de Promoção da Igualdade Racial Por Jonathan Pinato Luasses Foi realizada em Brasília, nos últimos dias 02 e 03 de maio no Centro Cultural Rubem Valentim, a I Conferência Distrital de Políticas de Promoção da Igualdade Racial. O objetivo foi de debater diante da sociedade a igualdade étnica racial. A conferência teve uma ampla discussão de temas que visam uma estabilidade de políticas públicas para os diversos segmentos e etnias como os índios, brancos, negros, ciganos entre outros. Mais de 130 pessoas estiveram presentes na conferência. “Há uma atenção maior para os negros e índios que representam 50% da população do Brasil” afirmou o coordenador geral da Conferência Distrital e Sub Secretário de Direitos Humanos e Cidadania, Antônio Barbosa. “Essas etnias foram as mais dizimadas e esquecidas de nossa história. Havia uma grande expectativa para a Conferência do Distrito Federal, já que até então na existia qualquer articulação política com esses grupos étnicos”, complementou o coordenador do evento. Os grupos presentes tiveram não só a chance de discutir e aprofundar os assuntos ligados a igualdade racial, mas de esco- lher os delegados de cada etnia que representarão o Distrito Federal na Conferência Nacional que ocorrerá do dia 30 de junho até 02 de julho também em Brasília. Documentos foram extraídos após as discussões e reflexões dos grupos. Uma das pessoas presentes na Conferência foi a presidente do Conselho de Defesa dos Direitos dos Negros do Distrito Federal (CDDN-DF), Teresa Ferreira da Silva, explicou que a função principal do conselho é representar dentro do governo do Distrito Federal o negro e também os ciganos, índios, judeus e israelitas, já que esses quatro últimos grupos não têm nenhum conselho representativo com força política. “Além de darmos assessoria jurídica para as pessoas que sofrem algum tipo de preconceito ou racismo, damos também atendimento psicológico para essas vítimas e até para seus familiares devido a fragilidade dessas pessoas devido com a descriminação. Nem todo mundo tem estrutura psicológica para suportar o racismo”, explicou Teresa. Já o professor de Filosofia da Fundação Escolar do Distrito Federal e também aluno universitário do curso de História, Gilson Marcos, explicou que trabalha muito em defesa da igualdade racial dentro das salas de aula. “A educação é o principal meio para retrabalhar o preconceito que existe den- tro das pessoas, mesmo que inconsciente”, declarou o professor. A aluna do curso de Relações Internacionais da UNIEURO, Luciana Abreu, revelou que o evento foi um “divisor de água em sua percepção do racismo”. Luciana, antes do evento, acreditava que havia muito exagero no trato à questão. “Após a Conferência, consegui vislumbrar que o racismo realmente existe e temos que nos engajar nessa luta contra esse grave problema social”, finalizou a estudante. “Eu já conheço a maioria das pessoas presentes na Conferência desde a minha época de militante”. Ministra da SEPPIR, Matilde Ribeiro. O Magistrado 41 DÚVIDAS NUNCA MAIS Vínculo trabalhista: ele existe entre franqueador, franqueado e seus empregados? Melitha Novoa Prado, consultora jurídica especializada em relacionamento de redes, esclarece a questão O artigo 2º da lei de franquia (lei nº 8.955/94) dispõe que franquia empresarial é o sistema pelo qual um franqueador cede ao franqueado o direito de uso de marca ou patente, associado ao direito de distribuição exclusiva ou semi-exclusiva de produtos ou serviços e, eventualmente, também ao direito de uso de tecnologia de implantação e administração de negócio ou sistema operacional desenvolvidos ou detidos pelo franqueador, mediante remuneração direta ou indireta, sem que, no 42 O Magistrado entanto, fique caracterizado vínculo empregatício. Apesar do conceito trazido pela própria lei de franquia deixar explícito que não há vínculo empregatício entre as partes, a proximidade da parceira entre franqueador e franqueado e a estreiteza dos laços entre estes, com subordinação a manuais de operação e a diretrizes pré-traçadas, muitas vezes era entendida na Justiça do Trabalho como relação de emprego. “Os processos podem acontecer de duas maneiras: o potencial fran- queado passa por treinamento e não é aprovado pelo franqueador, então pede à Justiça remuneração pelo período de treinamento. Como alguns treinamentos são longos, como no caso do McDonald´s, que leva um ano para se realizar, alguns investidores se sentem no direito de pedir isso à Justiça. Outro caso é do franqueado que tem o contrato rompido e quer ser remunerado como funcionário. Dois casos completamente absurdos”, diz Melitha Novoa Prado, advogada especializada em relacionamento de redes. DÚVIDAS NUNCA MAIS Divulgação Em eventuais casos desta natureza levados aos Tribunais do Trabalho, caberá aos julgadores uma investigação aprofundada do sistema de franquia em operação para detectar se houve alguma situação de fraude ou ilícito que possa possibilitar a eventual transferência de responsabilidade ao franqueador, dentro de princípios que direcionam o direito do trabalho no que tange à agremiação de empresas com objetivo comum. Assim, características inerentes ao Contrato de Franquia só podem ser derrubadas quando firmadas em fraude, com o intuito único e exclusivo de burlar as leis trabalhistas e previdenciárias. “Isso pode ocorrer ou não, não podendo ser tomado como regra. Seria até um absurdo admitir que todos os contratos de franquia são firmados com esse fim”, diz Melitha. FUNCIONÁRIOS DO FRANQUEADO NÃO SÃO EMPREGADOS DO FRANQUEADOR Uma vez que há autonomia e independência entre as partes, não fica configurado o vínculo empregatício entre franqueador e franqueado. Portanto, os funcionários do franqueado não são empregados do franqueador. Alguns julgadores, ao arrepio da evolução do Franchising, que salta aos olhos, entendem que franqueador e seus franqueados formam um grupo econômico, daí a responsabilidade do franqueador face às verbas trabalhistas e previdenciárias dos funcionários de seu franqueado. Outros julgadores entendem, acertadamente, que quando há um contrato de franquia firmado e quando o franqueador apenas cumpre seu papel de supervisionar e treinar a rede para manter os padrões, não há responsabilidade do franqueador nos encargos trabalhistas da franqueada. Um caso absurdo é o do franqueado que tem o contrato rompido e quer ser remunerado como funcionário, explica Melitha Novoa Prado, advogada especializada em relacionamento de redes. Muitos julgados têm entendido, corretamente, que não fica configurada a responsabilidade solidária do franqueador pelo cumprimento das obrigações da franqueada: • Primeiro, porque a solidariedade somente decorre de lei ou de contrato entre as partes, hipóteses não verificadas nos contratos de franquia; • Segundo, pelo fato de que nos contratos de franquia há duas empresas autônomas e independentes; • Terceiro, porque na própria Lei 8.955/94, que dispõe sobre o contrato de franquia, ao estabelecer na parte final do seu artigo 2º a inexistência de vínculo empregatício entre franqueador e franqueado, torna-se inequívoco o seu espírito de traçar uma fronteira marcante entre as duas empresas, com uma linha divisória acentuada entre as obrigações assumidas pela franqueada contra terceiros e as obrigações contraídas pela franqueadora que são totalmente diversas. O Magistrado 43 ESPAÇO UNIVERSITÁRIO Transação Penal Da política criminal do art. 76, § 2º, II, da Lei 9.099/95. Por Janaína de Lima Veiga – 9º período – Direito/UNICAP – bolsista PIBIC/ UNICAP/2005 – Recife Previsto pela Lei Maior (art. 98, inciso I) e regulado pela lei 9.099/95, que também dispõe sobre os juizados cíveis, o Juizado Especial Estadual Criminal constitui passo de inegável importância ao tão aclamado movimento de acesso à justiça e para a Criminologia Moderna. Buscam-se a reparação dos danos sofridos pela vítima (considerado objetivo principal); a desburocratização da “Justiça”; a despenalização; a atenção aos crimes considerados de menor potencial ofensivo etc, calcando-se nos princípios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual, celeridade e respectivos corolários. Os institutos da conciliação, através de um acordo ou de uma composição civil feita entre as próprias partes, resolvendo sua controvérsia; através da intervenção do Ministério Público, na aplicação de penas não privativas de liberdade, a chamada transação penal, e o da suspensão condicional do processo, conduzem à concretização dos fins dos juizados especiais criminais. O art. 76, § 2º, II, da Lei 9.099/95. A questão suscitada, aqui, é se, a transação penal, benefício concedido nos Juizados Especiais Criminais, direito subjetivo previsto na respectiva lei, evitando o surgimento de um processo, a imputação de culpa ao supos- 46 O Magistrado to réu, ensejando a aplicação de penas alternativas à privativa de liberdade, tais como restritivas de direitos ou pena de multa, ao ter como uma de suas causas impeditivas sua possível aplicação a cada cinco anos, chega a ter seus objetivos, obstruídos. Instituto, este, lembra L. Flávio Gomes, que faz parte do modelo consensual de Justiça Criminal instituído pela Lei 9.099/95, sendo uma das vias ressocializadoras da Criminologia Moderna. São apontadas como fontes de inspiração, o plea bargaining, o guilty plea, ambos do Direito anglo-saxão, o patteggiamento, do Direito italiano. O suposto autor do fato, acompanhado do seu advogado/defensor, o qual se manifestará sobre a aceitação ou não, pode aceitar o beneficio/direito da transação penal se, dentre outros requisitos dispostos no artigo 76, parágrafos e incisos, da Lei dos Juizados, nos últimos cinco anos, não o utilizou, constituindo, pois, uma das causas impeditivas para a sua utilização. O suposto autor do fato pode evitar o iní- “(...) o artigo da transação penal, ao limitar o período de cinco anos, aplica outra pena e deveria ser estudado” cio de um processo, como aceita a maioria doutrinária, como uma tática de defesa, não discutindo a questão, se aceitar a proposta, sem ser imputada, teoricamente, culpa. Em aceitando, renunciará a garantias constitucionais, como o contraditório, a ampla defesa, o recurso etc. Somos da opinião de que o artigo da transação penal, ao limitar o período de cinco anos, aplica outra pena e deveria ser estudado. Se o objetivo é evitar a sensação impunidade, cabe ao Ministério Público avaliar se, realmente, de acordo com o artigo 76, o autor do fato faz jus e se faz, propor uma pena alternativa que, da melhor forma, corresponda ao fato imputado. Diz – se serem as penas alternativas uma medida, mas logo se vê a “pena” de 05 (cinco) anos sem direito ao beneficio. Não é obrigatória a sua aceitação, o que poderá ensejar a denúncia pelo Ministério Público e o início do processo, partindo-se para a audiência de instrução e julgamento, tendo o juiz que decidir o caso. Audiência esta, em que o suposto autor do fato poderá provar sua inocência. Em comentários ao art. 76, § 2º, II, da supracitada lei, o saudoso Julio Fabbrini Mirabete defende: “Evita-se que a mesma pessoa seja beneficiada duas vezes nesse lapso temporal para não incentivar a sensação de impunidade”. Ada Pellegrini Grinover, Antonio Magalhães Gomes Filho, Antonio Scarance Fernandes, Luiz Flávio Go- ESPAÇO UNIVERSITÁRIO mes, comentando o referido artigo: “A lei quer beneficiar o autor de fatos enquadráveis nas infrações penais de menor potencial ofensivo, mas não incentivar sua impunidade. Por isso, o “agente” (rectius, o autor do fato: v. observação supra, no comentário n. 11) que já tiver se beneficiado da aplicação consensual de pena não privativa de liberdade, nos termos da Lei 9.099/95, não poderá gozar de novo benefício, pelo prazo de cinco anos”. Ainda se posicionando a respeito: “O único feito penal da transação é impedir novo benefício pelo prazo de cinco anos, o que também é razoável”. Continuam: “A estipulação do referido prazo encontra paralelo na prescrição da reincidência previsto no inc. I do art. 64, CP”. Se um dos efeitos da sentença homologatória da transação penal é a não reincidência, o paralelo feito com o seu prazo, na causa impeditiva em estudo, não deixa de fazer as suas vezes, impedindo benesses. Argumentam os juristas Joel Dias Figueira Jr. e Maurício Antônio Ribeiro Lopes: “Objetiva-se, a exemplo da suspensão condicional da pena, da suspensão condicional do processo e de outros institutos genéricos que estabelecem algumas garantias pessoais específicas no curso do processo ou logo após a aplicação da pena, estimular o sentimento de responsabilidade pessoal do agente. Prova disso pode ser extraída da proibição de repetição do benefício dentro do período de cinco anos (art. 76, § 2º, II)”. O Anteprojeto de Lei para a conciliação, julgamento e execução das infrações penais de menor potencial ofensivo, que deu origem, sucessivamente, ao Projeto de Lei nº 1.480/89 e à Lei 9.099/95, não dispunha sobre o fundamento do prazo, causa impeditiva, da transação penal. Ao tratar dos efeitos da imediata aplicação da pena alternativa, trazia: “(...) c.2) A sanção tem natureza “(...) o Juizado Especial Estadual Criminal constitui passo de inegável importância ao tão aclamado movimento de acesso à justiça e para a Criminologia Moderna”, Janaina de Lima Veiga penal, mas sem reflexo na reincidência, sendo registrada para o fim único de impedir novamente o mesmo benefício, pelo prazo de cinco anos, e não devendo constar de certidões (...)”. Como se falar em impunidade se o suposto autor do fato já cumprirá pena alternativa? De todo jeito, se o mesmo fizer jus à transação penal e se aceita, deverá cumprir uma pena que ficará a cargo de proposta do Ministério Público, o qual avaliará a intensidade da medida cabível àquela situação. Em virtude de política legislativa tem- se essa causa impeditiva com fundamento na prevenção à impunidade. Duas considerações devem ser feitas ao ser trabalhado tal tema. Vejamos. Opina o jurista Alexandre Wunderlich com o qual concordamos: “§ 2.º O processo de seletividade exercido pela vítima e o seu “poder denunciante”: a facilidade do registro do termo circunstanciado e a obrigatoriedade do encaminhamento aos Juizados. É fato notório que com o advento dos Juizados basta uma diligência na delegacia de polícia para que o autor do O Magistrado 47 ESPAÇO UNIVERSITÁRIO fato seja chamado ao Poder Judiciário. Isso, a meu ver, ocasionou uma hipervalorização do termo circunstanciado e da palavra da vítima. A vítima é ciente de que com a sua narrativa colocará o autor do fato à frente do juiz. Muitas vezes este instrumento é utilizado de forma abusiva e com intuito vingativo. Em alguns casos, o autor é obrigado a constituir defensor e comparecer ao judiciário, mas na verdade houve um registro de ocorrência que narra um fato inexistente ou que não retrata a verdade. Isto porque não há qualquer investigação sobre aquilo que foi narrado. Além disso, o autor da suposta infração acaba por aceitar qualquer benefício que lhe seja formulado em audiência a fim de evitar um eventual processo”. Um dos argumentos que poderia ser levado em conta, quando se faz uma análise crítica da causa impeditiva do art. 76, § 2º, II, da supracitada lei, é esse maior poder atribuído à suposta vítima. Simples intrigas entre vizinhos, discussões banais, etc, fatos, muitas vezes, atípicos, inexistentes levados a delegacia, devido a intenções meramente vingativas, acabam por fazer com que o suposto autor do fato aceite a transação penal, evitando os custos e as delongas de um processo, além de outros prejuízos que possam vir a ter no meio social por estar respondendo a um processo. Aceitando a pena restritiva, ficará 05 (cinco) anos privado do benefício, vindo a se sujeitar ao processo, caso seja vítima de uma atitude meramente de índole vingativa. Ainda, é opinião de Alexandre Wunderlich: “ O autor do conflito consente com a imposição de pena justamente para se livrar do eventual risco de responder a um processo criminal. Soma-se ao risco do processo o fato de o autor ter que se submeter ao chamamento de testemunhas para demonstrar sua inocência, de ser constrangido a participar de audiências na condição de réu, de que outras pessoas de sua família 48 O Magistrado percebam que está sendo processado criminalmente, de ter que comunicar seu endereço em caso de alteração e, ainda, de ter que custear os honorários de advogado (já que a defensoria pública, em muitos Estados, ainda está longe do ideal). Assim, o autor do fato aceita uma pena restritiva de direitos que para ele, em que pese a ausência de demonstração de sua culpa no conflito ou sua inocência, é menos gravoso que o custo do processo.” Por essas razões explicitadas na opinião do referido jurista, pode-se considerar o espaço de tempo de 05 (cinco) anos, para impedir transações penais consecutivas, muito longo e, até mesmo, carecedor de fundamento. Não se pensou na possibilidade do uso inadequado dos procedimentos e processo do Juizado, ao se estabelecer esse prazo. O suposto autor do fato, atendendo a todos os outros requisitos da transação penal, mas em virtude de ter aceitado há menos de cinco anos, vindo a ser vítima de um termo circunstanciado de ocorrência e da palavra do suposto ofendido, ficará tolhido do benefício e terá que arcar, se não houver interesse de acordo por parte da suposta vítima, com o processo e seus procedimentos. É certo que o suposto autor do fato, acompanhado do seu defensor, não é obrigado a aceitar a proposta e pode provar sua inocência em um processo, mas se um dos principais objetivos dos Juizados Especiais é evitar as delongas do processo e despenalizar, seria de encontro a tais escopos, esse impedimento. O ideal seria apreciar apenas os incisos I e III, § 2º, do art. 76, da Lei estudada, os quais tratam, respectivamente, da condenação, “pela prática de crime, à pena privativa de liberdade, por sentença definitiva” e da não indicação pelos antecedentes, conduta social e personalidade do agente, “bem como os motivos e as circunstancias”, da necessidade e da suficiência de tal medida. Somos da opinião de que tal espaço de tempo deveria ser suprimido, mantendo-se as outras causas impeditivas, visto já ser dada muita importância à palavra da suposta vítima e ao termo circunstanciado de ocorrência. 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SILVA, Luiz Cláudio. Juizado Especial Criminal. Pratica e Teoria do Processo. Rio de Janeiro: Forense, 1.997. WUNDERLICH, Alexandre. A vítima no processo penal: impressões sobre o fracasso da Lei 9.099/95. Revista Brasileira de Ciências Criminais. Editora Revista dos Tribunais, nº 47, março – abril, 2.004, pp. 253, 259 e 260. P O L Ê M I C A Abuso de poder Decisão inédita do TJDFT censura publicamente promotores do Distrito Federal 50 O Magistrado ção preliminar a respeito da petição de Túlio Arantes, com vistas a apurar se o subprocurador tinha atuado indevidamente. Em seguida, requisitou na Delegacia Especial de Ordem Tributária, a instauração de inquérito policial contra Túlio Arantes, pelo crime de patrocínio infiel. O presidente da Associação dos Procuradores do DF, Marcos Vinícius Witczak, garante que o promotor Mustafá não poderia ter adotado tal procedimento, por ser matéria fora de seu campo de atuação e que invadia a competência privativa de outra promotoria. Por fim, o promotor Zacharias Mustafá acionou a Promotoria do Patrimônio Público e Social, com o objetivo de apurar suposto ato de improbidade decorrente mesma petição. Divulgação Recentemente, por unanimidade, o Conselho Especial do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) anulou procedimento administrativo instaurado pelo Ministério Público do DF contra o Subprocurador do Distrito Federal, Túlio Márcio e Cruz Arantes. Isso devido a um caso ocorrido em agosto de 2003. O subprocurador Túlio Arantes, atuando como advogado (os procuradores do Distrito Federal podem também advogar, desde que não atuem contra o DF - art. 30, I, do Estatuto) e não como procurador, em petição única, requereu ao juiz da 8a Vara Criminal que extinguisse a punibilidade de um réu num processo criminal tributário, alegando que o mesmo já tinha quitado a dívida com a fazenda pública. No caso, Túlio Arantes limitouse a juntar o comprovante do pagamento do tributo, parte em espécie e outra em precatórios, em face do que pedia o fim do processo movido contra o devedor em questão. Pelo fato, o promotor do DF, Zacharias Mustafá Neto, afirmou que o subprocurador não poderia ter atuado no processo, já que o Distrito Federal era “vítima no feito”. Requereu, então ao juiz responsável pelo caso que informasse à OAB/DF e à ControladoriaGeral do DF do ocorrido. Porém, antes mesmo do juiz decidir algo a respeito do pedido, Mustafá procurou outros meios para levar adiante o caso. Primeiramente, instaurou, em sua própria promotoria, um procedimento administrativo de investiga- “A instauração dessa investigação, com a fundamentação apresentada, nos parece frágil e desmerecedora de um Ministério Público sério”, desembargador Nívio Gonçalves P Todos esses atos no primeiro dia de setembro de 2003 e antes do juiz da 8a Vara Criminal decidisse sobre a questão. Quando decidiu sobre o caso, o magistrado César Laboissiére Loyola, deu ganho de causa ao subprocurador Túlio Arantes, alegando que não havia sido “deduzida qualquer pretensão contra a Fazenda Pública”, uma vez que ele se “limitara meramente a requerer a extinção de punibilidade”. Por causa das ações de Mustafá, Túlio Arantes teve que ingressar com um habeas corpus para trancar o inquérito policial indevidamente instaurado, no qual o TJDFT reconheceu que o fato não configurava crime. Teve, também, que impetrar um mandado de segurança, perante o Conselho Especial do TJDFT, para trancar o inquérito administrativo instaurado a pedido de Mustafá Neto na Procuradoria de Defesa do Patrimônio Público e O L Ê M I C A Social. Além de Mustafá, outros quatro promotores se envolveram no caso. São eles, Libânio Alves Rodrigues, Eduardo Gazzinelli Veloso, Fábio Barros Matos e Ivaldo Lemos Júnior. Com isso, vale ressaltar um fato curioso: como a Corte evoluiu em pouco mais de oito meses.Já que no ano passado, até mesmo desembargador podia ser investigado pelo Ministério Público do Distrito Federal. O caso no Conselho Especial do TJDFT Os desembargadores do Tribunal de Justiça do Distrito Federal entenderam, no início de maio deste ano, que não há justa causa para abertura do processo. Foram juntadas ao processo, duas consultas a respeito do tema. Em parecer, o Conselho Superior da Procuradoria Geral do DF afirmou não haver prática de “nenhum ato que importe violação a dever funcional”. No mesmo sentido, a Ordem dos Advogados do Brasil, seccional DF, se posicionou no sentido da inexistência de impedimento para Procurador do Distrito Federal atuar como advogado. Segundo a OAB/DF, a vedação restringe-se ao exercício da profissão contra a Fazenda Pública que o remunere. Os desembargadores entenderam que a investigação interna era desprovida de sentido, já que os mesmos fatos do mandado de segurança já haviam sido apurados em inquérito policial, instaurado por iniciativa de promotores, e pouco antes trancado por força de habeas corpus concedido à unanimidade pela 1ª Turma Criminal do TJDF, por ausência de justa causa. Ao dar provimento a esse mandado de segurança, o TJDF considerou ilegal e abusiva a instauração de um procedimento de investigação preliminar no MP contra o advogado Túlio Arantes, efetuado por cinco promotores (Zacharias Mustafa Neto, Libânio Alves Rodrigues, Eduardo Gazzinelli Veloso, Fábio Barros Matos e Ivaldo Lemos Júnior), com a chancela do exprocurador geral de Justiça José Eduardo Sabo Paes, atos que foram endossados, ainda, pelo atual Vice-Procurador-Geral José Firmo Reis. Houve manifestações contundentes dos desembargadores quanto ao abuso praticado pelo Ministério Público. “A instauração dessa investigação, com a fundamentação apresentada, nos parece frágil e desmerecedora de um Ministério Público sério. É bastante grave, pois sem dúvida já é suficiente para macular a imagem da autoridade impetrada. Sem causa, sem nenhum motivo justo e grave, não é possível uma investigação como a noticiada nos autos. Isso marca a vida profissional do investigado, traz-lhe sofrimento, compartilhado por toda sua família. O procurador-geral do Ministério Público atual me parece uma pessoa honesta, e por isso mesmo, acredito firmemente que porá um fim em tudo isso que está acontecendo em nome da dignidade e em nome da justiça. Concedo a segurança sabendo que, na tarde de hoje, pratiquei um ato de justiça”, declarou, em seu voto, o desembargador Nívio Gonçalves. No julgamento, os desembargadores formularam ainda outras duras críticas ao MP, em especial ao exprocurador-geral Eduardo Sabo, repreendendo-o por ter chancelado o ato ilegal de seus subordinados, e ao atual Vice-Procurador-Geral do PDFT, José Firmo Reis, por ter promovido uma troca de pareceres no processo. O parecer original havia sido favorável ao advogado, o que ensejou a elaboração de um novo parecer, do atual vice-procurador-geral, em sentido totalmente contrário. “Como parece que o primeiro não agradou, a cúpula do MP decidiu trocá-lo”, foi o comentário cáustico a respeito feito pelo desembargador Lécio Resende em seu voto. Criticou, ainda, duramente, esse tipo de investigação interna, ao afirmar, que o mau uso dos poderes do MP “chegou a um tamanho descontrole que o órgão poderá vir a instaurar procedimentos inominados, não previstos em lei, com caráter meramente persecutório”. Por seu turno, a OAB/DF saudou a decisão como histórica. Segundo a presidente Estefânia Viveiros, o entendimento do Tribunal nesse caso significa “a vitória da justiça e do bom O Magistrado 51 P O L Ê M I C A senso, porque ela põe um freio nos excessos que o MPDF vem ultimamente cometendo e assegura maiores garantias aos advogados do Distrito Federal”. Estefânia lembrou ainda que o promotor de Justiça Zacharias Mustafá Neto, de quem partiu a seqüência de atos abusivos, está denunciado criminalmente perante o Tribunal Regional Federal da 1ª Região por abuso de autoridade. Trata-se de uma decisão inédita e que está tendo intensa repercussão nos meios jurídicos porque, pela primeira vez e por unanimidade, o Judiciário local não só censurou explicitamente o Ministério Público por abuso de poder, por se utilizar desse polêmico procedimento investigativo preliminar, como questionou a legalidade do MP para promover investigações por conta própria. Essa decisão torna incômoda a posição do Ministério Público na discussão que vem se desenvolvendo, nos meios jurídicos, no sentido de se saber se os promotores podem ou não, legalmente, proceder a investigações criminais por conta própria, questão que está tendo sua constitucionalidade questionada no Supremo Tribunal Federal (STF). Fonte: Infojur OAB quer investigação contra os promotores O incidente que envolveu cinco promotores de Justiça, a cúpula do Ministério Público do Distrito Federal e o advogado e procurador Túlio Arantes pode ganhar novos desdobramentos. Membros do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil querem que a entidade encaminhe ao procurador-geral da República, Cláudio Fontelles, um pedido de investigação interna contra os promotores, para apurar eventual prevaricação e abuso de autoridade. Os advogados afirmam que, na condição exclusiva de advogado, Túlio atuou uma única vez numa ação penal em que o Distrito Federal não era parte, quando comunicou ao juiz que o réu na causa havia pago o tributo que era acusado de sonegar. Assim, ele requereu a extinção da punibilidade. A petição rendeu dois inquéritos, instaurados pelos promotores, um penal e outro de natureza administrativa, pela prática de ato de improbidade. O inquérito penal foi trancado no ano passado, por decisão unânime da 1ª Turma Criminal do Tribunal de Justiça, com parecer favorável do atual procurador-geral de Justiça do DF, Rogério Schietti. O procedimento administrativo foi declarado abusivo pela corte especial do Tribunal. 52 O Magistrado Túlio solicitou pronunciamento do Conselho Superior da Procuradoria-Geral do DF e da seccional da OAB acerca do caso. Os dois órgãos se posicionaram a favor de Túlio Arantes. Ainda assim, foi processado administrativamente por cinco promotores: Zacharias Mustafa Neto, Libânio Alves Rodrigues, Eduardo Guazzinelli, Fábio Barros Matos e Ivaldo Lemos Júnior. Os atos dos promotores foram ratificados pelo ex-procurador geral do MP do Distrito Federal, José Eduardo Sabo Paes. O conselheiro federal da OAB, Rossini Corrêa, afirmou que os fatos “são bem mais graves do que à primeira vista poderia parecer, pois representam a comprovação de que o MP, em certos casos, pode empregar meios ilegais para agir”. Por conta disso, acrescentou, pretende propor ao Conselho Federal da OAB que esse episó- No ano passado, até mesmo desembargador podia ser investigado pelo Ministério Público do Distrito Federal. dio seja levado ao conhecimento da Procuradoria-Geral da República. “Esse caso envolve abusos tão injustificáveis e uma violação de prerrogativa tão acintosa e grosseira que as autoridades que a perpetraram é que deveriam, agora, ser investigadas no âmbito do Ministério Público Federal, por ato de improbidade”, afirmou. Ele lembrou que o abuso de autoridade reconhecido pelos desembargadores já havia sido apontado pelo próprio Ministério Público Federal, quando denunciou um dos promotores envolvidos (Zacharias Mustafá Neto), que já está respondendo a processo penal perante o Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Na mesma linha, o conselheiro federal Marcelo Galvão considerou inaceitável a conduta dos referidos promotores. “É de se louvar a decisão corajosa e inédita da corte local. Os desembargadores, sensíveis ao caso, colocaram um basta a uma situação ilegal e altamente constrangedora a um advogado respeitado e conhecido nesta cidade, que nada fez a não ser exercer legalmente sua profissão. Essa decisão, ademais, traz mais garantias ao exercício da advocacia. Está de parabéns o Tribunal”, afirmou o conselheiro. Fonte: Consultor Jurídico P O L Ê M I C A Repercussão Entrevista com Marcos Vinícius Witczak – presidente da Associação dos Procuradores do Distrito Federal A Associação dos Procuradores do Distrito Federal comemorou a decisão recente do Tribunal de Justiça do DF sobre o caso do subprocurador Túlio Arantes. O presidente da entidade, Marcos Vinícius Witczak, acredita que a partir de agora o MP agirá com mais responsabilidade diante de casos parecidos. Para ele, a desavença entre alguns promotores e procuradores começou em 2001, quando Mustafá Neto promoveu uma ação de improbidade contra alguns procuradores do DF, dentre os quais, Luciano Arantes, irmão de Túlio Arantes, à época procurador-geral adjunto do Distrito Federal. Mais à frente, os procuradores do DF seriam inocentados no caso. Ficou, no entanto, o mal-estar da história. Em uma entrevista exclusiva, Witczac dá seu posicionamento sobre tudo que ocorreu de 2001 até a recente decisão do TJDF para o caso do subprocurador Túlio Arantes. O Magistrado - O senhor acha que esse caso ilustra o problema que existiria, eventualmente, entre procuradores do Distrito Federal e promotores? Marcos Witczak - Eu não quero crer que exista uma posição institucional do Ministério Público contra a procuradoria do DF. O que me parece que ocorre é que há promoto- “O que me parece que ocorre é que há promotores de justiça que atuam, por vezes, sem respeitar o trabalho dos procuradores”, Marcos Witczak. O Magistrado 53 P O L Ê M I C A res de justiça que atuam, por vezes, sem respeitar o trabalho dos procuradores. Um trabalho que é feito, principalmente, na área da consultoria jurídica, e que merece o devido respeito, porque afinal de contas nós somos procuradores de DF e atuamos com independência técnica. Nós somos técnicos e nós emitimos manifestações jurídicas em processos administrativos. O Magistrado - O senhor considera que investigações como essas que foram abertas contra o subprocurador Túlio Arantes são abusivas por parte do Ministério Público do DF? Marcos Witczak - Eu digo que são abusivas porque temos agora a chancela do Poder Judiciário. No caso do Túlio, havia uma insistência do Ministério Público em desprezar a manifestação da OAB e do Conselho Superior da Procuradoria de que ele não havia infringido o Estatuto dos Advogados e nem seus deveres funcionais como Procurador. Espero que agora o MP respeite a decisão do Tribunal de Justiça. Mas o caso do Túlio infelizmente não é isolado. Existem outros casos onde também houve abusos cometidos contra procuradores. E o que é interessante nesses outros casos é que em todos eles houve um entendimento do Ministério Público de que procuradores ao emitirem pareceres estariam cometendo equívocos nas suas conclusões jurídicas. Que estariam opinando de forma incorreta. Jamais o Ministério público nos acusou de termos recebido alguma vantagem ilícita para favorecer algum interesse particular. Nunca fomos acusados disso. Mas, já fomos acusados de emitir pareceres que o Ministério público entendeu incorretos juridicamente, e isso é inadmissível. 54 O Magistrado O Magistrado - O senhor atribui esse fato do subprocurador Túlio Arantes a outros episódios? Marcos Witczak - O primeiro episódio que ocorreu e que procuradores foram acusados da prática de atos de improbidade pela simples emissão de pareceres foi no notório caso Martins. Na ocasião, procuradores foram acusados por terem elaborado ou aprovado pareceres favoráveis à alteração de uma cláusula num termo de regime especial de pagamento de tributos. Essa opinião jurídica, para o Ministério Público, estaria equivocada e causaria prejuízos ao DF. Ora, o parecer é uma peça técnica e que tem fundamentos jurídicos. Se aqueles fundamentos jurídicos não estão corretos não é o Ministério Público que pode julgar esse aspecto, até porque o parecer não vincula a Administração. O parecer é uma peça de consultoria, como o próprio nome já diz, então, isso é para nós muito claro: é nossa independência técnica. O procurador quando emite um parecer se vale dos elementos fáticos que estão nos processos e da convicção jurídica que ele tem sobre determinado assunto. Como o Poder Judiciário excluiu os procuradores da ação de improbidade do caso Martins, caso de grande repercussão, eu creio, então, que esse fato acirrou os ânimos dos promotores e começaram a surgir outros casos e chegamos a ter procuradores denunciados criminalmente pela emissão de pareceres em um caso de dispensa de licitação, mas a ação penal foi trancada pelo Tribunal de Justiça por manifesta falta de justa causa. Isso pelo mesmo motivo de sempre, porque um procurador de estado, no caso do DF, não pode ser responsabilizado por ter emitido uma opinião jurídica sobre determinado assunto. Claro que se há má fé, se há uma conduta viciada aí é outra questão. Jamais eu defenderia uma imu- nidade absoluta para o procurador. Não é isso. É que o procurador deve responder se há prova verdadeira da prática de um ato ilícito, de uma conduta criminosa, que seria emitir um parecer com vistas a obter uma vantagem indevida ou um parecer que não reflita a verdade do processo. O Magistrado - O senhor acha que faltam critérios de alguns integrantes do Ministério Pública na hora de denunciar? Marcos Witczak - Eu creio que em alguns casos sim, porque promotores por vezes não têm a percepção de que o procurador não executa políticas públicas, o procurador não administra o DF. O ato administrativo não é do procurador. O procurador é um consultor jurídico e se o Ministério Público julga que atos praticados pelos administradores do DF são incorretos e ilegais, então, deve buscar o Judiciário para obter a correção destes atos, mas jamais responsabilizar o advogado público por uma opinião técnico-jurídica que emitiu num processo. O Magistrado - O que esse tipo de processo de investigação tem causado na vida desses procuradores? Marcos Witczak - É profundamente constrangedor ter o nome no jornal acusado da prática de improbidade, porque, infelizmente, muitas vezes, a pessoa leiga lê o jornal e já toma os fatos como verdadeiros. Então, um procurador que tem o nome exposto no jornal como alguém que tenha participado da prática de um ato irregular ou ilegal é muito agredido moralmente. Aquilo é profundamente constrangedor e desagradável, faz com que a pessoa P padeça de um sofrimento devastador. Imagine, um profissional que sempre zelou por sua reputação, tem uma história como procurador, tem uma biografia como profissional exemplar, como é o caso do Túlio Arantes, que tem um nome conhecido na comunidade jurídica, entre seus amigos, e de repente as pessoas passam a têlo como alguém que praticou um ato criminoso e essa pessoa é questionada a respeito disto. Isso causa um dissabor que é irreparável. O Magistrado - O senhor acha que essa última decisão do TJDF marca uma nova era? Marcos Witczak - A nossa vontade é que o Tribunal tenha mostrado ao Ministério Público que é necessário um maior cuidado na análise destas denúncias, destes fatos e que o Ministério Público passe a ver a Procuradoria com outros olhos, porque nós somos advogados do DF, dos interesses do Distrito Federal. Nós temos a coragem de dizer O L Ê M I C A no processo se o interesse do administrador do momento contraria o interesse público. Nós temos essa coragem porque nos é garantida por Lei a independência técnica e parece que é isso que o Ministério Público não quer enxergar. Não quer ver no Procurador um advogado público que tem o dever constitucional de fazer o controle prévio da legalidade. Espero que isso demonstre que o Judiciário está atento, que o Judiciário não deixará prevalecer injustiças contra os advogados públicos. Leia alguns trechos importantes, de forma intercalada, isto é, não contínua, dos votos de cada desembargador, que demonstram o reconhecimento do abuso de autoridade do Ministério Público no caso de Túlio Arantes. Fotos: Divulgação DES. EDSON ALFREDO MARTINS SMANIOTTO (SOBRE A FALTA DE JUSTA CAUSA E SOBRE ADVERTÊNCIA EXPRESSA AO MP): “Não vejo justa causa para permitir essa investigação, ainda que preparatória, ainda que preliminar” A iniciativa do Ministério Público fere direito líquido e certo do Impetrante” E ainda faria uma ponderação: é hora de o MP deixar de tomar outras providências (no caso referindo-se à eventual continuidade do PIP)” DES. LÉCIO RESENDE DA SILVA (SOBRE A QUESTÃO BIZARRA DOS DOIS PARECERES DO MP NOS AUTOS) “A presença de pareceres contraditórios evidencia apenas uma coisa: a de que a unidade e a indivisibilidade do MP não passa do plano meramente formal”. “Mantenho ambos os pareceres nos autos porque a existência deles apenas demons- tra a ilegalidade e o abuso de poder com que houve as autoridades impetradas” “É importante lembrar que em todos esses anos de magistratura, jamais vi presentes nos mesmos autos 02 pareceres, 01 a favor e outro contra”. Sobre a ilegalidade e abusividade do PIP (procedimento de investigação preliminar): “Este tema se torna ainda mais grave quando se observa que o Procedimento de Investigação Preliminar instaurado - e que eu espero que não tenha prosseguimento - trata da mesma questão que já havia sido examinada no âmbito do habeas corpus julgado pela 1ª Turma Criminal deste Tribunal, ordem concedida à unanimidade. E aqui o que se tem é violação da coisa julgada. E isto é intolerável, isto é inadmissível.” DESEMBARGADOR EDUARDO ALBERTO DE MORAES OLIVEIRA (SOBRE OS DOIS PARECERES NOS AUTOS) “A presença de parecer ‘retificatório’ so se justificaria se houvesse fato novo, processual, capaz de ensejar e existência de parecer modificativo, porque, do contrário, penso eu, é situação que compromete a seriedade da Instituição”. O Magistrado 55 D I R E I T O N A S R U A S Ação de hackers Bancos devem indenizar clientes Por Daniella Augusto Montagnolli Thomaz, advogada da Trevisioli Advogados Associados Com o advento do Código de Defesa do Consumidor, em setembro de 1990, os consumidores finalmente ficaram assegurados diante dos fornecedores de serviços ou produtos que contratam ou adquirem. Tal segurança faz-se pertinente num momento em que, entre outras relações, ganha importância aquela existente entre os consumidores (correntistas) e os bancos (fornecedores de serviços e produtos). Os fatos mostram que esta sempre foi uma relação desigual, refletindo desvantagem ao consumidor. Até agosto de 2004, ainda se discutia a aplicabilidade do código às instituições financeiras. Porém, em 9 de setembro passado, com a Súmula 297 do Superior Tribunal de Justiça, qualquer dúvida caiu por terra. As instituições financeiras sempre se portaram como gigantes quando confrontadas com os seus correntistas. Estes, em quase todos os serviços contratados, nunca puderam negociar condições, cláusulas, prazos etc. nos “contratos de adesão”. Ora, se os bancos nunca mudaram a postura adotada, mostrando-se mais maleáveis, nada mais justo que respondam pelos atos praticados. E assim vem acontecendo. Buscando acompanhar as tendências mundiais no que se refere às transações eletrônicas, os bancos dis- 56 O Magistrado ponibilizaram aos consumidores serviços “virtuais” para facilitar o dia-a-dia destes na execução de transferências, pagamentos e demais operações on-line. Todavia, ao oferecer esses serviços, não fornecem a segurança que o consumidor precisa. É nessa dualidade que reside a atual polêmica jurídica. O Código de Defesa do Consumidor determina que o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação de serviços... Assim, se o banco fornece a opção para seus clientes movimentarem suas contas via internet, deve garantir a total segurança do sistema. D I R E I T O N A S R U A S Divulgação Inúmeras são as conseqüências e os prejuízos que a ação dos hackers pode causar. Além de verem suas contas “varridas”, os correntistas podem assistir, impotentes, ao uso do seu “limite” no cartão ou cheque especial, sem ter autorizado tais operações. Como decorrência, podem ser compelidos ao pagamento de juros e encargos referentes à utilização indevida e podem ter seus nomes lançados no rol de devedores da Serasa ou SPC. É preciso agir. Hoje, os consumidores não estão mais dispostos a amargar prejuízos e buscam assessoria jurídica para serem ressarcidos pelos danos. O dano material, em geral, é indenizado na proporção da sua extensão e acrescido de juros e correção, ou seja, há restituição do valor retirado pelos hackers, e, quando for o caso, da soma dos encargos pela utilização indevida do limite e/ou cheque especial. Já o dano moral é mensurado caso a caso e pode variar de acordo com a extensão do dano sofrido pelo correntista, conforme o entendimento dos juízes, que podem divergir. Mas, quase sempre, os tribunais vêm fixando a indenização num patamar entre 10 a 20 vezes o valor pelo qual o consumidor foi inscrito nos órgãos de proteção ao crédito. “(...) se os bancos nunca mudaram a postura adotada, (...) nada mais justo que respondam pelos atos praticados” “ (...) há restituição do valor retirado pelos hackers, e, quando for o caso, da soma dos encargos pela utilização indevida do limite e/ou cheque especial”, Daniella Augusto Montagnolli Thomaz Importante ainda é frisar que, nessas situações, nos termos do que ensina o Código de Defesa do Consumidor, o ônus da prova cabe sempre aos bancos, cabendo ao consumidor demonstrar o fato ocorrido e sua conseqüência (prejuízo). Porém, os bancos devem compro- var que procederam com a segurança que lhes cabia. E é justamente neste ponto que, infelizmente, as instituições financeiras estão deixando a desejar, fazendo-nos concluir que a tecnologia empregada na internet, pelos hackers, está muito mais avançada do que a delas próprias. O Magistrado 57 PORTUGUÊS JURÍDICO A redação como parte da advocacia – Final Por Marcelo Paiva, professor do Imag-DF EM QUE PESE A – EM QUE PESE(M) Em que pese a (com o som fechado = pêse) tem o sentido de “ainda que contrarie a opinião de”, “ainda que”. O verbo fica sempre no singular. Falhou neste ponto, em que pese à sua forma atraentíssima, a teoria planeada (Euclides da Cunha). Em que pese aos argumentos apresentados contra o acusado, ele será absolvido. Em que pese(m) (com o som aberto = pése) tem o sentido de “ainda que se leve em consideração”, “embora”. O verbo concordará com o termo seguinte, que será sujeito da construção. Em que pesem as opiniões do ministro, ninguém aceitou a explicação. INOBSTANTE O vocabulário ortográfico não registra a palavra “inobstante”. Por vários anos, tentei persuadir meus alunos a não empregarem o termo. Desisti. A expressão é plenamente consagrada no meio jurídico. Peço agora aos dicionários que passem a incorporá-la. Ela é empregada no sentido de “não obstante” ou “nada obstante”. ISSO POSTO – ISTO POSTO Como deve ser do conhecimento de todos, o pronome “isso” retoma idéia já apresentada (termo anafórico), enquanto o pronome “isto” antecipa idéia a ser apresentada ou retoma apenas a última idéia apresentada. Sendo assim, a expressão adequada para o emprego seria “isso posto”, pois se está retomando idéia já mencionada. Não se deve, entretanto, empregar com a ordem trocada dos elementos – “posto isso” -, pois o particípio não deve iniciar a expressão. PONTUAÇÃO COM ELEMENTOS NORMATIVOS HÁ QUE + INFINITIVO Expressão típica de textos jurídicos, a expressão “há que + verbo no infinitivo” tem o sentido de “é necessário”, “deve-se fazer”. Há que examinar com detalhes os argumentos apresentados. 58 O Magistrado Ao citar referências de elementos articulados, geralmente surgem algumas dúvidas se há necessidade ou não do uso de vírgulas. Vamos esclarecer: a) seqüência em ordem direta crescente, ligada pela preposição “de”, não recebe vírgula. PORTUGUÊS JURÍDICO “O vocabulário ortográfico não registra a palavra “inobstante”. Por vários anos, tentei persuadir meus alunos a não empregarem o termo. Desisti”, professor Marcelo Paiva. O processo está baseado nos incisos I e II do artigo 226 do Código Penal. O advogado recorreu com base na al. d do inc. III do art. 593 do Código de Processo Penal. A autorização está fundamentada corretamente com base na al. b do inc. II do art. 10 da Lei n.º 8.666, de 21 de junho de 1993. Observe que, no último exemplo, a vírgula aparece somente por causa da data. b) seqüência em ordem indireta, mesmo com a preposição “d”, é separada por vírgula. Tal situação é regulada no art. 302, inc. III, do Código de Processo Penal. O art. 5.º, inc. XXXVI, da Constituição de 1988 repete a regra do art.º 153, § 3.º, da Constituição de 1967. QUE ESTA SUBSCREVE OU QUE A ESTA SUBSCREVE? O verbo subscrever pode ser transitivo direto no sentido de “aprovar”. Sendo assim, a preposição se torna inadequada. O desembargador que esta subscreve. SE POR AL Al é abreviação de aliud, que significa “coisa diversa”. A expressão se por al, empregada por alguns juristas, tem o sentido de “se por outros motivos”. O Magistrado 59 Suplemento de Saúde Saiba mais sobre a rinite alérgica O papel dos pais em relação à obesidade infantil S A Ú D E Rinite alérgica pode interferir no desempenho escolar de crianças Inflamação na mucosa nasal que afeta 25% das crianças em idade escolar pode trazer conseqüências físicas, intelectuais e emocionais Nariz entupido, gripes de repetição ou sinusite. É muito comum a rinite alérgica ser assim “diagnosticada” e, pior, tratada desnecessariamente com antibióticos. É aí que mora o perigo. Essa doença, se não tratada em tempo e adequadamente, pode trazer conseqüências desagradáveis. Uma delas é o baixo rendimento escolar. “A rinite traz diversos incômodos, além de seus próprios sintomas. Isso leva a criança a ficar irritadiça e fatigada, interferindo no seu dia-a-dia, principalmente na escola”, explica a Dra. Maria Candida Rizzo, doutora em Medicina pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e preceptora de Residência Médica do Hospital Menino Jesus/PMSP. A rinite alérgica é uma inflamação na mucosa nasal que desencadeia uma série de sintomas nasais, como nariz entupido, coriza e coceira no nariz. Atinge cerca de 25% das crianças em idade escolar e é causada pela exposição aos chamados alérgenos, como ácaros, mofo e pêlos de animais. Substâncias irritantes, como gases poluentes e perfumes, contribuem para agravar o quadro. Os alérgenos ligam-se a anticorpos presentes no organismo dos indivíduos predispostos, levando à liberação de ‘substâncias’ das células capazes de produzir espirros, coceira no nariz e na garganta, coriza e obstrução nasal. “O resultado final se traduz em um nítido comprometimento emocional”, afirma a Dra. Renata Cocco, médica alergologista do Hospital Albert Einstein. O Magistrado 61 S A Ú D E Junto com a rinite alérgica infantil, é muito comum ocorrerem doenças associadas, as chamadas comorbidades, cujos sintomas podem levar a dificuldades de concentração e perda cognitiva, afetando o rendimento escolar. Conforme esclarece Dra. Candida, nas crianças, a doença não se limita à irritação no nariz, mas caracteriza-se por ser uma inflamação sistêmica. “Quando a mucosa nasal está inflamada, pode ocorrer a alteração das condições normais de outros órgãos com os quais o nariz se comunica, como o pulmão, a faringe, os seios da face, os olhos e ouvidos. Se não tratada, a rinite pode levar localmente a um acúmulo de secreção com maior probabilidade de proliferação bacteriana”. Nesses casos, a criança apresenta além dos incômodos da própria rinite – prurido nasal, coriza, obstrução e espirros – sintomas de asma, otite, sinusite, faringite e conjuntivite. “Além disso, essas comorbidades mascaram o diagnóstico da própria rinite, levando, não raro, a tratamentos errôneos”, completa Dra. Cândida. Outra característica da rinite não tratada ou mal conduzida é a respira- 62 O Magistrado ção oral, por causa da obstrução do nariz. Isso leva à fragmentação do sono e, ao longo do dia, cansaço, irritabilidade e dificuldades de concentração. “Crianças tratadas inadequadamente respiram inadequadamente. Conseqüentemente, apresentam prejuízo na oxigenação cerebral e distúrbios de sono. A criança tem a sensação de não ter descansado adequadamente e isso se reflete na falta de concentração nas atividades escolares. O resultado final se traduz em um nítido comprometimento emocional”, afirma a Dra. Renata Cocco, médica alergologista do Hospital Albert Einstein. Além disso, segundo a Dra. Ana Paula Castro, médica assistente da Unidade de Alergia e Imunologia do Departamento de Pediatria do Hospital das Clínicas – FMUSP, “o aprendizado também pode ficar prejudicado pelo comprometimento da função auditiva, relacionado ao acúmulo de secreção na tuba auditiva, como complicação de rinite alérgica”. Respirar pela boca também causa má oclusão dentária, alterações na posição da mandíbula e da língua – o que pode levar a problemas de fala – vulnerabilidade às cáries e halitose. “Todo o conjunto de alterações leva, a longo prazo, a distúrbios de postura não apenas em nível físico mas também intelectual e emocional”, alerta Dra. Candida. A obstrução nasal prejudica, ainda, o olfato, havendo perda de apetite e, em última instância, perda de peso Substâncias irritantes, como gases poluentes e perfumes, contribuem para agravar o quadro e altura. Além disso, ao respirar pela boca, a criança anula a função nasal de filtrar, umidificar e aquecer o ar, o que a expõe às outras comorbidades. Dra. Maria Candida ressalta a importância de se ter em mente o conceito de rinite alérgica como doença sistêmica, sendo recomendado o tratamento multidisciplinar com outros especialistas além do alergista/pneumologista ou do pediatra, como fonoaudiólogos, dentistas, ortodontistas e otorrinos. “A principal forma de prevenir as comorbidades é o seu reconhecimento adequado. É muito importante que o médico possa identificar a rinite alérgica como causa de complicação”, explica Dra. Ana Paula. A Dra. Renata alerta que “o tratamento deve ser sempre individualizado, cada paciente deve ser abordado de forma específica quanto à identificação dos desencadeantes e medicação apropriada. Consensos internacionais apontam os corticóides nasais como uma importante opção terapêutica para as rinites que requerem tratamento farmacológico”. O Plurair, solução aquosa com fluticasona comercializado pela Libbs Farmacêutica, não agride a mucosa nasal por não conter conservantes. Além disso, seu frasco possui um sistema de aplicação a vácuo que previne a entrada de microorganismos e impede a contaminação do produto. O medicamento também não apresenta efeitos adversos sistêmicos, quando utilizado corretamente e sob supervisão médica. Porém, para um bom resultado do tratamento, é fundamental o afastamento dos desencadeantes e irritantes, para qualquer tipo de rinite. Dra. Renata Cocco recomenda, ainda, a limpeza nasal com solução aquosa de cloreto de sódio (soro fisiológico) como primeiro passo para a manutenção das vias nasais permeáveis e para a remoção dos alérgenos e irritantes. S A Ú D E Exemplo Postura dos pais é vital no combate à obesidade infantil Por Nataniel Viuniski, pediatra e nutrólogo, é supervisor da clínica Espaço Leve - Núcleo de Prevenção e Tratamento da Obesidade Infanto-Juvenil, de São Paulo. Autor do livro “Obesidade Infantil - Um Guia Prático”. Viuniski também é coordenador do departamento de obesidade infantil da Abeso (Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade) A obesidade infantil atinge no Brasil entre 7% e 15 % das crianças, dependendo da região e da classe social. Nos Estados Unidos, o número dobrou na última década e cerca de 30% das crianças apresentam algum grau de sobrepeso. Diante das inúmeras doenças decorrentes do excesso de peso, a Academia Americana do Coração (American Heart Association) declarou que prevenir a obesidade infantil é uma das formas mais eficientes de diminuir os problemas cardiovasculares entre adultos. O estilo de vida atual faz com que os pais, oprimidos pelos compromissos do dia-a-dia, mudem os hábitos alimentares da família. Substituem pratos balanceados e comidas “As brincadeiras de rua foram substituídas por até cinco horas diárias na frente de algum tipo de tela” Dr. Nataniel Viuniski explica que os pais substituem pratos balanceados e comidas caseiras por pizzas, massas prontas, biscoitos e refrigerantes. O Magistrado 63 S A Ú D E caseiras por pizzas, massas prontas, biscoitos e refrigerantes. Recente pesquisa do IBGE revela que, em geral, os brasileiros consomem muitos alimentos com alto teor de açúcar, frutas e hortaliças em quantidade insuficiente. Portanto, as crianças aprendem a comer cada vez mais gordura e menos fibras, aderindo ao que se convencionou chamar de geração coca-cola ou geração fast food. A mudança comportamental já é velha conhecida, mas só agora, com o “surto” da obesidade, percebe-se o impacto que ela pode causar na saúde. A baixa incidência de aleitamento materno e o sedentarismo também são grandes aliados para a epidemia de obesidade infantil. As brincadeiras de rua foram substituídas por até cinco horas diárias na frente de algum tipo de tela (TV, videogame, compu64 O Magistrado tador). Reservando oito horas do dia para o sono e quatro para a escola, sobra pouco tempo para gastar a energia da garotada. O problema cresce ainda mais rápido nas camadas mais humildes da população, em que a oferta de bolachas e refrigerantes, por exemplo, é mais freqüente. Em contrapartida, é menor o acesso à educação nutricional ou a informações sobre estilo de vida saudável. Como a obesidade infantil é um desafio mundial, alguns países já começam a preparar contra-ofensivas. No Canadá, por exemplo, o programa de atendimento pré-natal informa a gestante sobre alimentação saudável, para ela e para o seu bebê. A vedete do programa é o aleitamento materno, único alimento recomendado até os seis meses de vida, uma medida eficiente para evi- tar o excesso de leite em pó nas refeições e proteger o nenê contra a obesidade no futuro. Entre os adultos brasileiros, o índice de obesidade atinge 40%, ou 38,8 milhões de pessoas. Se queremos reverter essa tendência para a próxima geração, precisamos prestar atenção no que nossas crianças estão ingerindo hoje. É preciso conscientizar crianças e adolescentes sobre a importância de uma alimentação completa, variada e colorida - portanto, rica em nutrientes. Não há alimentos proibidos, e sim pratos que devem ser consumidos com moderação. E vale lembrar aos pais e mães: não adianta ensinar as crianças a comer corretamente se não respeitarem as próprias ordens. A melhor maneira de educar e colocar limites é com o próprio exemplo! L I V R O S NÃO FICÇÃO AO SABOR DE CLÁSSICOS MEMORÁVEIS Coleção Clássicos IPRI. O IPRI (O Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais, da Fundação Alexandre de Gusmão, instituição de direito público, vinculada ao Ministério das Relações Exteriores –www.funag.gov.br), e a Editora Universidade de Brasília estabeleceram parceria para viabilizar a edição sistemática, sob a forma de coleção, de obras básicas para o estudo das relações internacionais. Algumas obras publicadas: Paz e Guerra entre as Nações, de Raymond Aron, Tradução de Sérgio Bath, Prefácio de Antonio Paim, R$ 69,00, 934 págs. O autor acredita que a paz é o objetivo de todas as sociedades. Mas, iniciou o seu estudo pela guerra, porque, “a conduta estratégico-diplomática refere-se à eventualidade do conflito armado”. Rousseau e as Relações Internacionais, de Jean-Jacques Rousseau, Tradução de Sérgio Bath, Prefácio de Gelson Fonseca, R$48,00, 320 págs. Alguns textos jamais haviam sido publicados em língua portuguesa. Como é o caso de seus comentários sobre o projeto de paz perpétua de Abbé de Saint-Pierre, enquanto outras reflexões importantes muitas vezes se perdem em meio a considerações mais gerais. A política do poder , de Martin Wight, Tradução de Carlos Sérgio Duarte, Prefácio de Henrique Altemani, R$39,00, 330 págs. O autor foi um dos mais importantes teóricos da Escola Inglesa. Para ele, guerras são deflagradas por desejo de conquista territorial, por impulso doutrinário ou por medo. Quando se combinam as duas últimas causas, tem-se o pior tipo de conflito. C U L T U R A ASCOM/Vivo Vivo Open Air: do entretenimento à experimentação Evento vai ocupar o Pontão do Lago Sul até 29 de maio A mega-tela suíça vai exibir clássicos, cult movies, infantis e blockbusters, além de pré-estréias nacionais e internacionais P rimeiro, São Paulo. Depois, Rio de :Janeiro. Nessas cidades o público chegou a 100.000 pessoas. Agora, a VIVO, maior operadora de telefonia móvel do hemisfério sul, lançará em 12 de maio, a primeira edição do VIVO Open Air em Brasília. O evento, que possibilita ao público assistir a grandes produções cinematográficas num mega-telão de 282 metros quadrados, localizado a céu aberto, acontece no Pontão do Lago Sul até o dia 29 de maio. Tendo a sinestesia como palavra de ordem, o VIVO Open Air mistura cinema, música, cenografia, gastronomia e jogos. Mais do que divertir, a proposta é levar o público a uma experiência multisensorial. Por isso, as imag ens projetadas no mega-telão suíço – equivalente a um pré- 66 O Magistrado dio de seis andares e com um sistema hidráulico capaz de levantá-la em três minutos – serão o ponto de partida para um festival que vai extrapolar os limites do entretenimento. “Patrocinar o VIVO Open Air é reafirmar nosso apoio à cultura e à inovação, que são conceitos intimamente conectados aos valores da VIVO. E é por conta disso que em 2005 o cinema será um dos segmentos estratégicos para o nosso posicionamento de marca”, afirma o Vice-Presidente Executivo de Marketing e Inovação da VIVO, Luís Avelar. “Além ser expandido para Brasília, o evento foi totalmente redesenhado, com a criação de curadorias específicas para o evento, para o cinema e para o palco musical. O objetivo é oferecer às famílias de nossos C clientes e ao público em geral uma experiência ainda mais completa, com inúmeras novidades e uma fortíssima experiência com a marca”, explica o Diretor de Marketing Promocional e Eventos da VIVO, Felipe Barahona. Como nas outras edições do evento, que aconteceram em São Paulo e no Rio de Janeiro em 2004, em 2005 os filmes estarão no centro das atenções – a curadoria está pela primeira vez a cargo do Grupo Estação. A diferença é que, agora, o cinema funcionará como elo entre todas as outras atrações. Da sala de games on line às inovadoras propostas vídeocenográficas de Marcello Dantas. Das atrações musicais nacionais e internacionais selecionadas pela produtora Predileta às imagens eletrônicas dos VJs dos grupos Bijari, Embolex e Apavoramento. A idéia, segundo os curadores Carlos Nader e Rafael Dragaud, é fazer o público transitar entre diferentes formas de arte, num verdadeiro cruzamento de sensações e sentidos que têm como motivo central o cinema. Pura sinestesia. “O sucesso do Vivo Open Air como evento de cinema nos deu a oportunidade de ampliar as áreas de interesse e ousar em segmentos como a música. As pessoas vão trocar um simples programa por uma experiência única”, afirma Dragaud. “Patrocinar novamente o Vivo Open Air, que pode ser considerado um ícone no cenário cultural brasileiro, só vem reforçar nosso posicionamento de investir em música para nós”, diz Loredana Mariotto, diretora de marketing da Motorola. Tradição na Europa, onde acontece em países como Suíça, Alemanha e França, o evento foi trazido para o Brasil pela produtora D+3 em 2002. O cinema ao ar livre terá capacidade para 1.500 pessoas. “Nossa expectativa é reunir um público de 35.000 pessoas em Brasilia”, diz a produtora Joana Braga, da D+3. Desde a bilheteria, o público será impactado por uma cenografia composta por uma série de tubos e imagens projetadas em fumaça, árvores e na própria arquitetura do local. “Os tubos serão o elemento de transitoriedade, o caminho obrigatório para se chegar a qualquer outro lugar dentro do evento”, conta o cenógrafo Marcello Dantas. A mega-tela suíça vai exibir clássicos, cult movies, infantis e blockbusters, além de pré-estréias nacionais e internacionais. Dentre os filmes confirmados na programação de Brasília estão a sessão dupla de “Kill Bill: Volumes 1 e 2”, de Quentin Tarantino; os inéditos “Riding Giants – Adrenalina Pura”, do americano Stacy Peralta, e “Team America – D e t o n a n d o o M u n d o ” , d e Tr e y Pa r ke r ; o c u l t “Polyester”, de John Waters; o infantil “Os Incríveis”, U L T U R A de Brad Bird; e o mega-sucesso “Senhor dos Anéis – A Sociedade do Anel”, de Peter Jackson. Já na tenda dedicada à música, o lema é apostar na novidade e na afinidade com o conceito de sinestesia e com o mundo do audiovisual. Por isso, passará por lá o que há de mais hype na cena nacional: jovens apostas, nomes conhecidos e seus novos projetos e atrações internacionais de vanguarda. Muitos deles com o propósito de apresentar um show único criado exclusivamente para o evento. Entre as atrações estão nomes como o da banda Los Sebozos Postizos (projeto paralelo dos integrantes do Nação Zumbi) com o show “Uma noite do Ben”, só com músicas de Jorge Benjor dos anos 60 e 70; o grupo carioca Lafayette e os Tremendões, que revisitam clássicos da Jovem Guarda; o DJ Dolores e seu novo trabalho, “Aparelhagem”; e os locais Nego Moçambique, Sapatos Bicolores e Bois de Gerião. A tenda também contará com uma programação para a família, sempre nas tardes de sábado: uma edição especial da peça “Eu e Meu Guarda-chuva”, do titã Branco Mello, está confirmada para 14 de maio. Completando a programação, o Vivo Open Air 2005 terá ainda uma sala de jogos on line, além de bares e restaurantes. SERVIÇO Informações: (61) 364-2418 Ingressos: de domingo a terça-feira: R$ 26 e R$ 13 (meia entrada para estudantes e maiores de 65 anos). De quarta-feira a sábado: R$ 30 e R$15 (meia entrada para estudantes e maiores de 60 anos). Serviço médico: Uma ambulância UTI com médico e um posto médico com enfermeiros Site: www.vivo.com.br/vivoopenair. O Magistrado 67 P O N T O D E V I S T A Os traseiros, os juros e a Igreja Por Luiz Gustavo Leão Ribeiro, Registrador Imobiliário A eleição previsível e ensaiada do novo Papa, e um discurso improvisado do Presidente da República renderam farta repercussão na imprensa. Os noticiários das últimas semanas estiveram recheados de matérias a respeito da Igreja Católica, dos traseiros preguiçosos dos brasileiros e das taxas de juros. Fé, juros e nádegas. Pelo menos nos últimos 2.000 mil anos estes temas estiveram intimamente ligados. Estes três temas de grande interesse público têm um elo de ligação: o pecado. A Fé ao centro, controlando tudo – leia-se o Papa, a Igreja. Em sua órbita, as ações pontifícias contra os traseiros e os juros, instrumentalizadas, principalmente, pela Congregação pela Doutrina da Fé, que atendia pelo nome de Tribunal do Santo Ofício da Inquisição. As nádegas sempre foram atacadas pela Igreja em duas frentes. Sob o ponto de vista, digamos, mais pragmático, a Igreja sempre condenou, e com fervor – literalmente -, a prática “As nádegas sempre foram atacadas pela Igreja em duas frentes.” 68 O Magistrado da sodomia. Símbolo da bela mulher brasileira, os traseiros podem também servir de símbolo da perseguição histérica e histórica da Igreja contra as mulheres. Recentemente, o tema das nádegas mais uma vez bate à porta da Igreja. De maneira mais sórdida, e cheirando tão mal quanto a fumaça das “fogueiras de purificação”, as nádegas voltam a incomodar a Igreja, sob a forma lamentável e intolerável da pedofilia. Por outro lado, os juros também sempre foram condenados pelas bulas pontifícias. A justificativa, neste caso, é menos teológica e mais mercadológica. A Igreja, que sempre controlou as terras, grande fonte de riqueza, tinha como grande rival os judeus, que controlavam as finanças. A proibição da cobrança de juros e a possibilidade ardente da ação do Santo Ofício dificultava a atuação dos grandes rivais e matinha-os, de certa forma, sempre à mercê dos atos expiatórios. Isto, no entanto, nunca impediu que a Igreja fosse uma grande cliente dos financistas judeus. Nunca se impor- P O N T O tou de pagar os juros dos empréstimos necessários para financiar principalmente as inúmeras campanhas bélicas do Pontífice. Como ponto de interseção, o pecado, e sua conseqüência, o medo e a culpa, as molas mestras da teologia católica. No centro do pecado, o maior de todos, o primitivo, que nos acompanha antes mesmo do primeiro sopro de respiração: o pecado original. Todos nascemos pecadores, herdeiros e sucessores do pecado cometido pelos habitantes do paraíso. Não se deixe enganar pelo sorriso angelical de um recém nascido: é um pecador! A doutrina do pecado original, além de muito original, é bastante intrigante. Suscita-nos, pelo menos, duas grandes questões teológicas. Todos viemos ao mundo já pecadores e, para salvação da alma que se gera condenada, necessitamos da Igreja, a porta de salvação que nos apresentará o paraíso. É ela quem nos batiza, livrando-nos do pecado original, e nos acolhendo no caminho que Ele desenhou para os justos. Se é assim, para onde foram os milhões de habitantes da terra, que, originalmente pecadores, morreram antes de Pedro erguer a pedra fundamental? Foram condenados, sem sequer a chance de salvação? Outra questão diz respeito à vinda do Salvador e de sua paixão para redimir os pecados da humanidade. Se Jesus se sacrificou por nós, pela salvação de nossa alma, pela redenção dos pecados, porque continuamos, após sua morte e ressurreição, a nascermos originalmente pecadores? A morte de Jesus seria como uma grande anistia aos pecados da humanidade, que àquela altura praticamente a levavam à total insolvência perante Deus. Mas, se mesmo assim continuamos, após a anistia, a portarmos o pecado original quando nascemos, é de se concluir que a Igreja anistiou apenas os juros e a multa, mas não abriu mão de nos cobrar o principal. Talvez um ato falho, deixando entrever suas origens judaicas. Aplicando estas questões teológicas à política, somos obrigados a reconhecer que a política de juros sustentada pelo Governo Federal é um pecado contra o povo brasileiro. Aliás, é um pecado original, uma vez que contraria os fundamentos originais do partido que o sustenta. Não bastassem os juros, aplicase ainda uma política fiscal de brutal violência e incoerência econômica. Como lembrou o jornalista Jorge Kajuru, Tiradentes foi enforcado pela Coroa por ter liderado uma rebelião que, entre outras coisas, protestava con- D E V I S T A tra a cobrança de impostos da ordem de 20% (conhecido como “os quintos dos infernos”). Se vivesse hoje, com a carga tributária ultrapassando 40% do PIB, Tiradentes se enforcaria... Os questionamentos práticos contra os dogmas e a teologia da Igreja são apenas questões mundanas que não abalam a fé. Por outro lado, as críticas às políticas monetária e fiscal do Governo são sérias questões que abalam a fé nas grandes mudanças sociais prometidas e esperadas e imprescindíveis e inadiáveis. Pelo menos, a Igreja nos oferece o caminho da salvação, com o batismo. Necessitamos, urgentemente, encontrar a pia batismal onde afogaremos os pecados do Governo Federal, antes da condenação final do povo brasileiro. “A Igreja, que sempre controlou as terras, grande fonte de riqueza, tinha como grande rival os judeus, que controlavam as finanças”, Luis Gustavo Leão Ribeiro O Magistrado 69 SEGREDO DE JUSTIÇA Minha Mãe Beijo-te a mão, que sobre mim se espalma Para me abençoar e proteger, Teu puro amor o coração me acalma; Provo a doçura do teu bem-querer. Porque a mão te beijei, a minha palma Olho, analiso, linha a linha, a ver Se em mim descubro um traço de tua alma, Se existe em mim a graça do teu ser. E o M, gravado sobre a mão aberta, Pela sua clareza, me desperta Um grato enlevo, que jamais senti: Quer dizer - Mãe! este M tão perfeito, E, com certeza, em minha mão foi feito Para, quando eu for bom, pensar em ti. A primeira pessoa que mandar um correio eletrônico ([email protected]) e conseguir acertar o nome do famoso poeta brasileiro que escreveu o soneto acima, ganhará um exemplar do livro “Guardião”, a primeira ficcção jurídica nacional. 70 O Magistrado