Capı́tulo 6 Termodinâmica Vamos iniciar o estudo de uma nova área da fı́sica, a termodinâmica que lida com fenômenos associados aos conceitos de temperatura e calor. A natureza da termodinâmica é muito diferente da mecânica que estudamos até aqui. Em princı́pio, podemos usar a mecânica tanto a objetos macroscópicos quanto a objetos microscópicos, embora no último caso a mecânica sofra modificações profundas na escala atômica e subatômica. Um gás contido em um recipiente de dimensões macroscópicas tem um número N gigantesco de partı́culas (∼ 1024 ) [moléculas ou átomos]. A descrição microscópica deste sistema como um sistema mecânico é inviável pois terı́amos de escrever no mı́nimo 3N equações para obter a descrição. Desta forma, sistemas com muitas partı́culas, devem ser descritos usando um modelo termodinâmico que corresponde a uma descrição macroscópica do sistema. Neste caso, podemos descrever o sistema com poucos parâmetros. Por exemplo, no caso de uma substância pura como o hidrogênio precisamos apenas da pressão p, o volume V e a temperatura T . Conforme será mostrado em breve, quando discutirmos a teoria cinética dos gases, algumas grandezas macroscópicas como a pressão e temperatura são valores médios de grandezas microscópicas. A pressão está relacionada à transferência média de momento linear do gás para as paredes do recipiente; a temperatura está relacionada à energia cinética média das partı́culas. A descrição termodinâmica é sempre uma descrição macroscópica que se aplica a um sistema com um número muito grande de partı́culas. Valores médios só são significativos quando se calcula sobre um número muito grande de partı́culas. 173 174 CAPÍTULO 6. TERMODINÂMICA 6.1 Equilı́brio Térmico e a Lei Zero da Termodinâmica Um sistema termodinâmico consiste geralmente numa certa quantidade de matéria contida dentro de um recipiente. As paredes do recipiente podem ser fixas ou móveis (através de um pistão, por exemplo). A natureza das paredes afeta de forma fundamental a interação entre o sistema e o meio externo que o cerca. Em geral, consideramos dois tipos de paredes: a parede adiabática, que fornece um isolamento térmico ao material contido no recipiente e, portanto, não é afetado pelo meio externo; a parede diatérmica, que é uma parede não-adiabática e portanto, permite a influência do meio externo sobre o sistema. Como um exemplo de uma parede adiabática temos uma garrafa térmica que é composta por duas paredes de vidro separadas por vácuo; um exemplo comum de parede diatérmica é uma panela de metal. Quando dois sistemas estão em contato térmico, eles estão separados por uma parede diatérmica. Um sistema contido em um recipiente de paredes adiabáticas, chama-se sistema isolado. Um sistema isolado sempre tende a um estado em que nenhuma das variáveis macroscópicas que o caracterizam muda com o tempo. Quando atinge este estado, o sistema está em equilı́brio térmico. O conceito de tempe- Figura 6.1: Os dois tipos de paredes: (a) parede diatérmica que permite o contato térmico entre dois corpos e (b) parede adiabática que não permite trocas de calor e o sistema é dito ser “isolado”. ratura está associado a uma propriedade comum de sistemas em equilı́brio térmico. Precisamos definir a temperatura de maneira objetiva desde que nossa percepção de temperatura não é confiável. Sejam dois sistemas isolados A e B ligados por uma parede adiabática, assim, o estado de equilı́brio térmico de um não é afetado pelo outro. Agora considere que trocamos a parede adiabática por uma parede diatérmica. Neste caso os sistemas A e B estão em contato térmico e as variáveis macroscópicas tanto de A como de B vão mudar no tempo, até que o sistema composto por A e B esteja em equilı́brio 6.2. TEMPERATURA 175 Figura 6.2: Para saber se dois sistemas A e B têm a mesma temperatura não é necessário colocá-los em contato térmico: basta verificar se ambos os corpos estão em equilı́brio com um terceiro corpo C, que é o “termômetro”. A lei zero garante que A e B estarão também em equilı́brio térmico um com o outro. térmico. Dizemos então que A está em equilı́brio térmico com B. Suponha agora que A e B estão em equilı́brio térmico com um terceiro sistema C, mas separados por uma parede adiabática. O que ocorre se trocamos a parede adiabática por uma parede diatérmica? É um fato experimental que, A e B estão também em equilı́brio térmico entre si. Este fato é chamado de lei zero da termodinâmica: Se dois sistemas est~ ao em equilı́brio térmico com um terceiro sistema, ent~ ao estar~ ao em equilı́brio térmico entre si. A noção intuitiva de temperatura leva à idéia de que 2 sistemas em equilı́brio térmico entre si têm a mesma temperatura. É graças à lei zero da termodinâmica podemos medir temperaturas com o auxı́lio de um termômetro (veja Fig. 6.2). Para saber se dois sistemas A e B têm a mesma temperatura não é necessário colocá-los em contato térmico: basta verificar se ambos os corpos estão em equilı́brio com um terceiro corpo C, que é o “termômetro”. A lei zero garante que A e B estarão também em equilı́brio térmico um com o outro. 6.2 Temperatura Um sistema termodinâmico bastante simples é um fluido (gás ou lı́quido). Em equilı́brio térmico, podemos aplicar as equações da estática dos fluidos para calcular a pressão que o fluido exerce sobre as paredes do recipiente. Considere agora um sistema “padrão” C (termômetro) constituı́do por um fluido (substância termométrica) em um recipiente. É um fato experimental que o estado de um fluido em equilı́brio térmico 176 CAPÍTULO 6. TERMODINÂMICA Figura 6.3: No diagrama p − V temos duas isotermas mostradas onde diferentes valores de pressão e volume correspondem à mesma temperatura. fica inteiramente caracterizado pela sua pressão e volume, ou seja, para o fluido C, pelo par de valores (pC , VC ). Assim, se mudamos uma destas variáveis, a outra também deve mudar para outro valor bem definido quando o sistema atinge o equilı́brio térmico. Cada par irá corresponder a uma dada situação de equilı́brio térmico, ou seja, a uma dada temperatura. Seja (pC0 , VC0 ) um dado estado do sistema C, e consideremos outro sistema que chamaremos de A, caracterizado pelo par (pA , VA ). Verifica-se experimentalmente que existe uma série de estados diferentes: ′ ), (p′′ , V ′′ ), etc., do sistema A que estão todos em equilı́brio térmico com (p , V ), (pA0 , VA0 ), (p′A0 , VA0 C0 C0 A0 A0 e que geralmente podem ser representados por uma curva contı́nua numa dada região que se chama isoterma do sistema A (veja Fig. 6.3). Pela lei zero da termodinâmica, se escolhemos um outro sistema padrão C ′ , em equilı́brio térmico com C no estado (pC0 , VC0 ), a isoterma não se altera: ela depende apenas da natureza do sistema A. ′ ), (p′′ , V ′′ ), · · · do Para outro estado (pC1 , VC1 ) de C acha-se outra isoterma (pA1 , VA1 ), (p′A1 , VA1 A1 A1 sistema A. Podemos agora distinguir as diferentes isotermas do sistema A por diferentes números θ1 , θ2 , θ3 , ..., um para cada isoterma, escolhidos de forma arbitrária, mas assumindo um valor constante sobre cada isoterma. A grandeza θ chama-se temperatura empı́rica. 6.2. TEMPERATURA 177 Figura 6.4: Ilustração mostrando um termômetro de mercúrio. Quando imerso em um sistema com temperatura mais elevada, o resultado é uma dilatação do lı́quido e assim a coluna tem sua altura elevada. A famı́lia de isotermas do sistema A pode ser descrita por uma equação da forma: f (pA , VA ) = θ que se chama equação de estado do sistema A. Uma vez definida uma escala de temperatura empı́rica, a lei zero da termodinâmica não deixa mais nenhuma arbitrariedade na definição da temperatura para outros sistemas: uma isoterma para outro sistema B associada a estados em equilı́brio com (pC0 , VC0 ) tem de corresponder a mesma temperatura θ0 e assim por diante. Com a temperatura empı́rica assim definida, os conceitos de sistemas em equilı́brio térmico entre si e sistemas à mesma temperatura são equivalentes. 6.2.1 Termômetros O tipo de termômetro mais familiar é o termômetro de mercúrio (Hg). O volume V é medido pela altura l da coluna lı́quida. Na Fig. 6.7 temos uma ilustração de um termômetro deste tipo. A definição da escala Celsius de temperatura foi associada com dois pontos fixos correspondentes à temperaturas bem definidas: o ponto de gelo da água e o ponto de vapor da água. Assim, atribuı́mos os valores de temperatura: • Ponto de Vapor: T = 100o C • Ponto de gelo: T = 0o C. 178 CAPÍTULO 6. TERMODINÂMICA Para calibrar um termômetro de Hg nesta escala, assumimos que T e l guardam uma relação linear. Assim, se os comprimentos medidos nos pontos de gelo e vapor são l0 e l100 , então o grau Celsius é obtido dividindo-se a escala entre l0 e l100 em 100 partes iguais, cada parte correspondendo a 1 o C. Em geral um termômetro de mercúrio e outro de álcool não apresentam leituras coincidentes e, de fato, apresentam discrepâncias de até décimos de o C. Isto significa que um dos lı́quidos não se dilata de modo uniforme na escala onde consideramos uniformidade da dilatação. Um passo na direção de construir uma escala absoluta de temperatura, que não dependa das propriedades de uma substância em particular, é o uso de gás como substância termométrica. bulbo Figura 6.5: Termômetro de gás com volume constante. O tubo flexı́vel permite ajustar a coluna de mercúrio novamente na posição N quando o volume do gás dentro do bulbo varia e assim, podemos fazer o volume ficar igual ao valor original. O termômetro de gás a volume constante No caso de um gás como substância termométrica, podemos usar o seu volume a pressão constante ou a pressão a volume constante, esta última alternativa é mais simples e é adotada na prática. O termômetro de gás a volume constante é mostrado na Fig. 6.5. O gás enche um bulbo e um tubo capilar ligado a um manômetro de mercúrio de tubo aberto. O tubo flexı́vel permite suspender ou abaixar o nı́vel de mercúrio no ramo da direita de tal forma que o nı́vel da esquerda permaneça em uma marca fixa N , definindo um volume constante ocupado pelo gás. O bulbo é colocado em contato térmico com o sistema cuja temperatura se quer medir, e a seguir, é 6.2. TEMPERATURA 179 Figura 6.6: Variação da razão pv /pg onde notamos que todas as curvas tendem ao mesmo ponto à medida que a concentração do gás é reduzida. medida a pressão do gás, dada por p = p0 + ρgh onde p0 é a pressão atmosférica, suposta conhecida, ρ é a densidade do mercúrio e h é desnı́vel entre o mercúrio contido nos ramos direito e esquerdo. Sejam p0v e p0g os valores de p no ponto de vapor e no ponto de gelo, respectivamente, quando M0 é a massa de gás que ocupa o volume V . Suponhamos que se repitam as medidas nos pontos de vapor e gelo reduzindo-se a massa de gás para M1 < M0 (o volume V permanece constante). As pressões medidas nos pontos de vapor e gelo serão agora p1v < p0v e p1g < p0g . Para uma massa de gás M2 < M1 , os valores caem para p2v < p1v e p2g < p1g . Se fizermos um gráfico da razão (pv /pg )V (o ı́ndice V indica que as medidas são tomadas a volume constante) como função de pg , verificamos que os pontos experimentais caem sobre uma reta como mostrado na Fig. 6.6. Embora gases diferentes resultem em retas com diferentes inclinações, a extrapolação destas retas para o pg → 0 é a mesma para todos os gases e corresponde ao valor 1,3661. Assim, ( lim pg →0 pv pg ) ≡ Tv = 1, 3661 Tg Este limite define a razão Tv /Tg das temperaturas absolutas Tv e Tg correspondentes ao ponto de vapor e ao ponto de gelo, respectivamente. Para completar a definição da escala de temperatura absoluta, também chamada escala Kelvin, impomos a condição de que a diferença entre Tv e Tg corresponda a 180 CAPÍTULO 6. TERMODINÂMICA 100 K, assim, Tv − Tg = 100 K. Agora podemos resolver as duas equações para obter Tv e Tg na escala Kelvin Tv − Tg = (1, 3661 − 1)Tg = 100 K ∴ Tg ≈ 273, 15 K. e para a temperatura de vapor temos, portanto, Tv ≈ 373, 15 K. A relação entre a escala Kelvin e a escala Celsius é dada por, TK = TC + 273, 15. Para medir uma temperatura na escala Kelvin com o auxı́lio do termômetro de gás a volume constante, medimos a pressão p correspondente, extrapolada para o limite pg → 0 como no caso anterior. A temperatura absoluta T é dada por, T = lim pg →0 Tg ( p pg ) atualmente é usado o ponto triplo da água em vez do ponto de gelo para obter a temperatura absoluta. 6.3 Dilatação Térmica A ascensão da coluna de mercúrio em um termômetro exemplifica o fenômeno da dilatação térmica, a alteração de tamanho de um corpo por uma variação de temperatura. A dilatação corresponde a um aumento do espaçamento interatômico médio. Assim, em um corpo sólido, se dois de seus pontos estão inicialmente a uma distância l0 , a variação ∆l desta distância é proporcional a l0 . Para uma variação da temperatura suficientemente pequena, é também proporcional a ∆T , logo: ∆l = αl0 ∆T (6.1) onde a constante de proporcionalidade α chama-se coeficiente de dilatação linear. ∆l/l0 Vemos que α = representa a variação percentual do comprimento por unidade de variação da ∆t temperatura. Embora α possa variar com a temperatura em geral, consideraremos α constante. Assim, 6.3. DILATAÇÃO TÉRMICA 181 se lT é o comprimento a uma temperatura T e l0 o comprimento a uma temperatura T0 , então, podemos escrever lT = l0 [1 + α(T − T0 )] (6.2) α em geral é da ordem de 10−5 /o C, ou seja, 0, 01 mm/o C. Se temos uma barra delgada de lados l1 e l2 a variação percentual da área será ∆A ∆(l1 l2 ) l1 ∆l2 + l2 ∆l1 ∆l1 ∆l2 ≈ = = + A0 l1 l2 l1 l2 l1 l2 e usando a Eq. (6.1) podemos escrever ∆l1 ∆l2 + = 2α∆T l1 l2 assim, chegamos a equação para a dilatação superficial: ∆A = 2αA0 ∆T (6.3) e podemos notar que o coeficiente de dilatação superficial é o dobro do coeficiente de dilatação linear. A variação de um orifı́cio em um placa pode ser modelado através da Eq. (6.3). De maneira análoga, podemos determinar a equação para a dilatação volumétrica de um sólido: ∆V ∆(l1 l2 l3 ) l1 ∆(l2 l3 ) + l2 l3 ∆l1 l2 l3 ∆l1 + l1 l2 ∆l3 + l1 l3 ∆l2 ≈ = = V0 l1 l2 l3 l1 l2 l3 l1 l2 l3 ou seja, ∆V ∆l1 ∆l2 ∆l3 ≈ + + = 3α∆T V0 l1 l2 l3 onde usamos a Eq. (6.1) novamente. Assim, a dilatação volumétrica é dada por: ∆V = βV0 ∆T (6.4) onde definimos coeficiente de dilatação volumétrica β como: β = 3α. (6.5) A Eq. (6.5) é definida apenas para um sólido. No caso de um lı́quido não temos como definir um coeficiente de dilatação linear desde que o fluido não apresenta resistência à tensões de cisalhamento e portanto, assume a forma do recipiente que o contém. Assim, para lı́quidos só interessa o coeficiente de dilatação volumétrica β. 182 CAPÍTULO 6. TERMODINÂMICA Se temos um termômetro de mercúrio em que este enche completamente o bulbo de vidro à tempera- tura de 0o C, então o volume do bulbo será: ∆V = Vbulbo − V0 = V0 β(T − 0) assim, Vbulbo = V0 + 3V0 αT e o volume do mercúrio será dilatado por: VHg = V0 + V0 βT Assim, o volume expelido pelo bulbo será dado por: VHg − Vbulbo = V0 + V0 βT − V0 − 3V0 αT ou ainda: VHg − Vbulbo = V0 (β − 3α)T. Com efeito, o lı́quido será expelido devido a β > 3α. Por exemplo, β = 1, 8×10−4 /o C para o mercúrio. Em geral, o coeficiente β é positivo, no entanto, a água não apresenta um comportamento semelhante ao demais lı́quidos. A água apresenta um coeficiente de dilatação térmica negativo no intervalo de 0o C a 4o C. Acima de 4o C a água volta a se dilatar com o aumento da temperatura. A região de β < 0 nos indica que a densidade da água é máxima em T = 4o C. Esta é a razão do porque o lagos congelam de cima para baixo e não o contrário. Quando a água da superfı́cie é resfriada abaixo de digamos 10o C em direção ao ponto de congelamento, ela fica mais densa (“mais pesada”) e afunda. Abaixo de 4o C, porém, um resfriamento adicional faz com que a água na superfı́cie fique menos densa (“mais leve”) que a água abaixo dela, permanecendo na superfı́cie até congelar. Assim, a água de cima congela mas a água de baixo permanece lı́quida. Exemplo 1. Num relógio de pêndulo, o pêndulo é uma barra metálica, projeta para que seu perı́odo de oscilação seja igual a 1 s. Verifica-se que no inverno, quando a temperatura média é de 10o C, o relógio adianta, em média 55 s por semana; no verão, quando a temperatura média é de 30o C, o relógio atrasa, em média 1 minuto por semana. (a) Calcule o coeficiente de dilatação linear do metal do pêndulo. (b) A que 6.3. DILATAÇÃO TÉRMICA 183 temperatura o relógio funcionaria com precisão? Vamos considerar a variação no perı́odo do relógio. No primeiro caso, temos que o relógio adianta por uma fração de 9, 1 × 10−5 s o que pode ser obtido através da razão: 55 s × 1 s = 9, 1 × 10−5 s 7 × 24 × 3600 s Assim, podemos escrever o perı́odo corrigido na forma: T1 = 1 s − 9, 1 × 10−5 s, θ1 = 10o C onde estamos denotando a temperatura por θ reservando T para denotar o perı́odo das oscilações. No segundo caso em que a temperatura é elevada para θ2 = 30 o C, o relógio atrasa 60 s, o que corresponde a uma correção no perı́odo de 9, 9 × 10−5 s ≈ 10−4 s obtido da razão: 60 s × 1 s = 10−4 s 7 × 24 × 3600 s O perı́odo corrigido será dado por: T2 = 1 s + 10−4 s, θ2 = 30o C O atraso corresponde a um aumento no perı́odo de oscilação do pêndulo. Para uma barra oscilando pendurada pela sua extremidade, o perı́odo é dado por √ T = 2π 2L . 3g O perı́odo de 1 s, corresponde ao comprimento L0 da barra, assim, podemos determiná-lo em termos da gravidade: √ 2L0 3g T = 1 s = 2π ∴ L0 = 3g 8π 2 Para uma temperatura qualquer a equação para o perı́odo deve ser combinada com a equação para a dilatação linear: T 2 = 8π 2 L L0 = 8π 2 (1 + α∆θ) 3g 3g e usando a expressão para L0 , obtemos a relação: T 2 = 1 + α∆θ 184 CAPÍTULO 6. TERMODINÂMICA A relação geral pode ser aplicada para as duas temperaturas que consideramos: T12 = 1 + α(θ1 − θ0 ) T22 = 1 + α(θ2 − θ0 ) e subtraindo uma equação da outra podemos obter uma expressão para o coeficiente de dilatação linear α= T12 − T22 θ1 − θ2 e substituindo-se os valores obtidos acima, segue que α= (1 − 9, 1 × 10−5 )2 − (1 + 10−4 )2 ≈ 1, 91 × 10−5 /o C 10 − 30 A temperatura ideal para que o relógio funcione corretamente, é a temperatura θ0 . Podemos determinar esta temperatura considerando o valor da dilatação linear que acabamos de obter e substituindo em uma das duas relações acima. Assim, temos: T22 = 1 + α(θ2 − θ0 ) ∴ θ0 = θ2 + (1 − T22 ) ≈ 19, 6 o C. α 2. Em um dia quente de verão em Las Vegas um caminhão-tanque foi carregado com 37000L de óleo diesel. Ele encontrou tempo frio ao chegar a Payson, Utah, onde a temperatura estava 23,0 K abaixo da temperatura de Las Vegas, onde ele entregou a carga. Quantos litros foram descarregados? O coeficiente de dilatação volumétrica do diesel é 9, 54 × 10−4 /o C e o coeficiente de dilatação do aço de que é feito o tanque do caminhão é de 11 × 10−6 /o C. O volume do óleo diesel é diretamente proporcional à temperatura. Como a temperatura diminuiu 23 K, então podemos determinar a redução do volume de diesel: ∆V = V0 β∆T = 37000L × 9, 54 × 10−4 /o C × (−23 K) = −808 L. Assim, o volume entregue foi de, Ventregue = V0 + ∆V = 7000L − 808 L = 36190 L. 6.4 Temperatura e Calor Nos parágrafos anteriores, definimos o conceito de temperatura que nos permitiu determinar o equilı́brio térmico entre dois corpos. Caso os dois corpos estejam em contato térmico, seus parâmetros termodinâmicos variam no tempo até que se atinja o estado de equilı́brio caracterizado pelo valor constante dos parâmetros termodinâmicos. 6.4. TEMPERATURA E CALOR (a) 185 (b) ambiente TA ambiente sistema >TA TA (c) ambiente sistema sistema TA TA TA Figura 6.7: Se a temperatura de um sistema é maior que a temperatura ambiente como em (a), uma certa quantidade de calor é perdida pelo sistema para o ambiente para que o equilı́brio térmico (b) seja restabelecido. (c) Se a temperatura do sistema é menor do que a temperatura ambiente, uma certa quantidade de calor é absorvida pelo sistema para que o equilı́brio térmico seja restabelecido. Este tipo de situação é bastante comum em nosso dia-dia. Por exemplo: uma xı́cara de café deixada sobre a mesa tem a sua temperatura reduzida até a temperatura do ambiente; a temperatura de uma lata de refrigerante tirada da geladeira tem sua temperatura elevada até a temperatura do ambiente. Com o objetivo de estudar de maneira sistemática estas situações de maneira geral, vamos considerar que a lata de refrigerante ou a xı́cara de café é um sistema (com temperatura TS ) e as partes relevantes do lugar onde estes objetos se encontram como o ambiente (à temperatura TA ). Quando a temperatura do sistema é diferente da temperatura do ambiente (TA ̸= TS ), então a temperatura do sistema irá variar no tempo (TA pode variar um pouco) até que as duas temperaturas se igualem e o equilı́brio seja estabelecido. Essa variação da temperatura deve-se a uma mudança na energia térmica do sistema por causa da troca de energia entre o sistema e o ambiente. A energia térmica é uma energia interna que consiste nas energias cinética e potencial associadas a movimentos aleatórios dos átomos, moléculas e outros corpos microscópicos que existem no interior do objeto. A energia transferida é chamada calor e é simbolizada pela letra Q. O calor é positivo se a energia é transferida do ambiente para a energia térmica do sistema (dizemos que o calor é absorvido pelo sistema). O calor é negativo quando a energia é transferida da energia térmica do sistema para o ambiente (dizemos que o calor é cedido ou perdido pelo sistema).. Esta transferência de energia é mostrada na Fig. 6.7. Quando TS > TA , a energia térmica é transferida para o ambiente de modo que Q < 0. Na Fig. 6.7b, a energia não é transferida, Q = 0, e portanto não há calor absorvido ou cedido. Na Fig. 6.7c, TS < TA e a transferência ocorre do ambiente para o sistema. 186 CAPÍTULO 6. TERMODINÂMICA Chegamos então à definição do calor: Calor é a energia transferida de um sistema para o ambiente ou vice-versa devido a uma diferença de temperatura. É válido notar que a energia também pode ser transferida de um sistema para o ambiente através de um trabalho W realizado por uma força. Ao contrário da temperatura, pressão e volume, o calor e o trabalho não são propriedades intrı́nsecas de um sistema; têm significado fı́sico apenas quando descrevem a transferência de energia para dentro ou para fora de um sistema. Sendo assim, não faz sentido dizer: “este sistema possui 450 J de calor”. Antes que se percebesse que o calor se trata de uma energia transferida, este era medido em calorias (cal) definida como a quantidade de calor necessária para aumentar a temperatura de 1 g de água de 14,5o C para 15,5o C. Existem ainda o Btu que é a unidade térmica de calor usada pelos britânicos. Em 1948, a comunidade cientı́fica decidiu que uma vez que o calor é uma forma de energia deveria ser medido em joules. 6.4.1 Absorção de Calor por Sólidos e Lı́quidos A absorção de calor não é a mesma para todas as substâncias. De fato, podemos perceber isso quando aquecemos quantidades diferentes de um lı́quido ou ainda, quando notamos a diferença entre aquecer diferentes materiais. De fato, a quantidade de calor para causar uma determinada variação de temperatura nos permite caracterizar a absorção de calor de um material. Capacidade Térmica A capacidade térmica (C) é definida como a razão entre a quantidade de calor pela variação correspondente na temperatura, i.e., Q = C∆T = C(Tf − Ti ). Calor Especı́fico Como mencionado no primeiro parágrafo, duas quantidades diferentes do mesmo material requerem quantidades diferentes de calor para causar a mesma variação da temperatura. Com efeito, as capacidades térmicas destas duas quantidades são proporcionais às suas massas. Assim, é conveniente definir uma “capacidade térmica por unidade de massa”, ou calor especı́fico c que se refere não a um objeto mas a 6.4. TEMPERATURA E CALOR 187 uma massa unitária do material de que é feito o objeto. Neste caso, definimos, Q = mc∆T ou ainda, Q = mc∆(Tf − Ti ). (6.6) Note que de acordo com a Eq. (6.6) o calor especı́fico deve ser expresso em (J/kg.K). Calor Especı́fico Molar Em muitas circunstâncias a unidade mais conveniente para especificar a quantidade de uma substância é o mol definido por: 1 mol = 6, 02 × 1023 unidades elementares. de qualquer substância. Quando a quantidade é expressa em mols, o calor especı́fico também deve ser expresso em mols e o chamamos de calor especı́fico molar. A unidade do calor especı́fico molar é (J/mol.K). Para determinar o calor especı́fico de uma substância, devemos saber as condições em que a transferência de calor ocorreu. No caso de sólidos, em geral supomos que a transferência ocorre à pressão constante. No entanto, podemos imaginar a transferência ocorrendo à volume constante onde aplicamos uma pressão externa para conter a dilatação térmica. Em geral os calores especı́ficos a pressão e volume constantes (denotados cp e cV , respectivamente) não muito diferentes mas no caso de gases a diferença pode ser muito grande. Calores de Transformação Às vezes, o calor transferido para a amostra não é convertido em um aumento da temperatura da amostra. Neste caso, a amostra muda de fase. A fase sólida é caracterizada por átomos ou moléculas formando uma estrutura rı́gida. Na fase lı́quida, os átomos e moléculas apresentam maior mobilidade e energia de modo que as estruturas formadas são transitórias e o lı́quido pode escoar. Na fase gasosa, a energia é ainda maior e os átomos ou moléculas do gás não interagem exceto através de choques de curta duração. O processo de transformação de uma fase sólida para uma fase lı́quida é chamada de fusão. Neste processo o calor fornecido é usado para quebrar as ligações entre as moléculas do sistema. Um exemplo comum deste tipo de transformação é a transformação do gelo em água. O processo de solidificação 188 CAPÍTULO 6. TERMODINÂMICA é o inverso do processo de fusão e exige a retirada de energia do lı́quido na forma de calor para que a estrutura rı́gida volte a se formar. A transformação da fase lı́quida para a fase gasosa é chamada de vaporização. Neste processo, energia é fornecida à fase lı́quida para quebrar os aglomerados moleculares. O processo de condensação é o inverso onde energia é retirada do gás para que este passe para a fase lı́quida. A energia por unidade de massa necessária para que uma substância mude completamente de fase é chamada de calor latente ou calor de transformação (simbolizada pela letra L). Assim, quando uma amostra de massa M muda de fase, a energia total transferida é dada por, Q = LM No caso da água, o valor latente de vaporização LV = 539 cal/g = 2256 kJ/kg e o calor latente de fusão LF = 79, 5 cal/g = 333 kJ/kg. Exemplo 1. (a) Que quantidade de calor deve absorver uma amostra de gelo de massa m = 720 g a −10o C para passar ao estado lı́quido a 15o C? Este processo apresenta três etapas. A primeira em que a temperatura do gelo é elevada de −10o C até 0o C, a segunda em que o gelo sofre fusão à uma temperatura constante de 0o C e a terceira em que o lı́quido é aquecido de 0o C até 15o C. A quantidade de calor absorvida é dada pela soma do calor absorvido em cada uma das etapas. Na primeira etapa, a quantidade de calor absorvida é dada por Q1 = mcgelo ∆T. Usando os dados obtidos no livro do Halliday para o calor especı́fico do gelo cgelo = 2220 J/kg.K e os parâmetros do enunciado do problema, segue que: Q1 = 0, 720 kg × 2220 J/kg.K × [0o C − (−10o C)] ou seja, Q1 = 15, 98 kJ 6.5. CALOR E TRABALHO 189 Para a segunda etapa temos que: Q2 = mLF = 0, 720 kg × 333 kJ/kg ou ainda, Q2 = 239, 8 kJ. que é quantidade necessária para fundir o gelo. Resta ainda determinar a quantidade de calor necessária para aquecer o lı́quido desde a temperatura de 0o C até a temperatura de 15o C, assim, segue que Q3 = mcágua ∆T = 4190 kJ/kg × 0, 720 kg × (15o C − 0o C) ou seja, Q3 = 42, 25 kJ. (b) se fornecemos ao gelo 210 kJ quais são o estado final e a temperatura da amostra? Precisamos de Q1 = 15, 98 kJ para subir de −10o C a 0o C. Assim, os (210 − 15, 98) kJ = 194 kJ restantes vão ser usados para fundir o gelo, assim, m= Qr 194 kJ = = 580 g. LF 333 kJ/kg logo, temos 720 g − 580 g = 140 g de gelo. O estado final é 140 g de gelo e 580 g de água à temperatura de 0o C. 6.5 Calor e Trabalho Vamos examinar de perto como a energia pode ser transferida na forma de calor e trabalho de um sistema para o ambiente e vice-versa. Para isso vamos considerar o nosso sistema sendo um gás confinado em um cilindro com um êmbolo como na Fig. 6.8 abaixo. As paredes do cilindro são feitas de material isolante que não permite a transferência de calor. A base do cilindro repousa sobre uma placa que funciona como um reservatório térmico cuja temperatura (T ) pode ser controlada. O sistema parte de um estado inicial i, descrito por uma pressão pi , um volume Vi e uma temperatura Ti . Desejamos levar o sistema para o estado final f , descrito por uma pressão pf , um volume Vf e a uma temperatura Tf . 190 CAPÍTULO 6. TERMODINÂMICA Isolamento Esferas de chumbo Reservatório térmico controle de temperatura Figura 6.8: Um gás está confinado a um cilindro com um êmbolo móvel. Uma certa quantidade Q de calor pode ser adicionada ou removida do gás regulando a temperatura T do reservatório térmico ajustável . Uma certa quantidade de trabalho W pode ser realizada pelo gás ou sobre o gás levantando ou abaixando o êmbolo. O processo de levar o sistema do estado inicial ao estado final é chamado de processo termodinâmico. Durante este processo energia pode ser transferida do reservatório para o sistema (Q > 0) ou do sistema para o reservatório (Q < 0). Além disso, o sistema pode realizar o trabalho sobre as esferas de chumbo, levantando o êmbolo (W > 0) ou receber trabalho das esferas de chumbo quando o êmbolo é comprimido (W < 0). Vamos considerar que todas estas mudanças ocorrem lentamente, de modo que o sistema está sempre aproximadamente em equilı́brio térmico, ou seja, cada parte do sistema está em equilı́brio térmico com as outras partes. Suponha agora que algumas esferas de chumbo são retiradas do êmbolo permitindo que o gás no interior do cilindro empurre o êmbolo e as esferas restantes para cima com uma força F⃗ , que produz um deslocamento infinitesimal d⃗s. Como o deslocamento é pequeno podemos supor que a força F⃗ é constante durante o deslocamento infinitesimal d⃗s. Neste caso, o módulo de F⃗ é igual a pA onde p é a pressão do gás e A é a área do êmbolo. O trabalho infinitesimal dW realizado pelo gás durante o deslocamento é dado por: dW = F⃗ · d⃗s = (pA)(ds) = p(A ds) 6.5. CALOR E TRABALHO 191 ou seja, dW = p dV. (6.7) onde dV é a variação infinitesimal no volume do gás devido ao movimento do êmbolo. Quando o número de esferas removidas é suficiente para que o volume varie de Vi para Vf , o trabalho realizado pelo gás é ∫ Vf W = p(V ) dV (6.8) Vi onde explicitamos o fato de que a pressão, em geral, depende do volume do gás. Durante a variação de volume, a pressão e a temperatura do gás também podem variar. Para calcular diretamente a integral da Eq. (6.8) precisamos saber como a pressão varia com o volume no processo através do qual o sistema passa do estado i ao estado f . Na prática, existem muitas formas de levar o gás de um estado i para o estado f . Uma delas é mostrada na Fig. 6.9a que é um gráfico da pressão do gás em função do volume, conhecido como diagrama p – V . Na Fig. 6.9a a curva mostra que a pressão diminui com o aumento do volume. A integral da Eq. (6.8) é a área sob a curva entre os pontos i e f . Independentemente do que fizermos exatamente para levar o sistema de i até f o gás só pode aumentar de volume empurrando o êmbolo para cima, ou seja, realizando trabalho sobre as esferas de chumbo. Outra forma de levar o gás do estado i ao estado f é mostrada na Fig. 6.9b. Neste caso, a mudança acontece em duas etapas: do estado i para o estado a e do estado a para o estado f . A etapa ia deste processo ocorre a pressão constante, o que significa que o número de esferas de chumbo sobre o êmbolo da Fig. 6.8 permanece constante. O aumento de volume (de Vi até Vf ) ocorre aumentando lentamente a temperatura do gás até um valor mais elevado Ta . (O aumento de temperatura aumenta a força que o gás exerce sobre o êmbolo, empurrando-o para cima). Durante esta etapa, o gás realiza um trabalho positivo (levantar o êmbolo) e calor é absorvido pelo sistema a partir do reservatório térmico (quando a temperatura do reservatório é aumentada lentamente). Este calor é positivo porque é fornecido ao sistema. A etapa af do processo da Fig. 6.9b acontece a volume constante, de modo que o êmbolo deve ser travado. Em seguida, a temperatura do reservatório térmico é reduzida lentamente o que provoca uma redução da pressão exercida pelo gás de pa para pf . Durante esta etapa o sistema cede calor para o reservatório térmico. Para o processo global iaf , o trabalho W , que é positivo e ocorre apenas durante o processo ia, é representado pela área sob a reta ia. A energia é transferida na forma de calor nas etapas ia e af , com uma transferência de energia lı́quida Q. processo pressão CAPÍTULO 6. TERMODINÂMICA pressão 192 volume pressão pressão volume volume liq volume pressão pressão volume volume Figura 6.9: (a) a área sombreada representa o trabalho W realizado pelo sistema ao passar do estado inicial i ao estado final f . O trabalho é positivo porque o volume do sistema aumenta. (b) O trabalho neste processo continua a ser positivo, mas agora é maior. (c) W continua a ser positivo mas agora é bem menor. (d) W pode ser ainda menor se escolhemos a trajetória icdf ou bem maior se escolhemos a trajetória ighf . (e) Aqui o sistema vai do estado f ao estado i, ou seja, o gás é comprimido por uma força externa e o trabalho é negativo. (f ) O trabalho lı́quido Wliq realizado pelo sistema durante um ciclo completo é representado pela área sombreada. 6.6. A PRIMEIRA LEI DA TERMODINÂMICA 193 Na Fig. 6.9c temos processos que ocorrem na ordem inversa aos que ocorrem na Fig. 6.9b. No caso da Fig. 6.9c, o trabalho realizado neste caso é menor do que na Fig. 6.9b e o mesmo ocorre com o calor transferido (absorvido pelo gás). Na Fig.6.9d notamos que é possı́vel tornar o trabalho tão grande (ighf ) quanto se deseje ou tão pequeno quanto se deseje (icdf ). Em resumo: um sistema pode ser levado de um estado inicial para um estado final através de um número infinito de maneiras e, em geral, o trabalho W e o calor Q têm valores diferentes em diferentes processos. Dizemos que o calor e o trabalho são grandezas dependentes da trajetória. A Fig. 6.9e mostra um exemplo no qual um trabalho negativo é realizado por um sistema quando uma força externa comprime o sistema reduzindo o seu volume. O valor absoluto do trabalho continua a ser igual à área sob a curva, mas como gás foi comprimido, o trabalho é negativo. A Fig. 6.9f mostra um ciclo termodinâmico no qual um sistema é levado de um estado inicial i para um estado final f e depois levado novamente para o estado i. O trabalho lı́quido realizado pelo sistema durante o ciclo é a soma do trabalho positivo realizado durante a expansão com o trabalho negativo realizado durante a compressão. Na Fig. 6.9f o trabalho é positivo porque a área sob a curva de expansão (de i a f ) é menor do que a área sob a curva de compressão (de f a i). 6.6 A primeira lei da termodinâmica Como vimos, quando um sistema muda de um estado inicial para outro final, tanto o trabalho W realizado como o calor Q transferido dependem da natureza do processo. Os experimentos, porém, revelam algo surpreendente. A grandeza Q − W é a mesma para todos os processos. Ela depende apenas dos estados inicial e final, e não depende de maneira alguma da forma como o sistema passou de um para o outro. Todos as outras combinações das grandezas Q e W , como Q apenas, W apenas, Q + 2W , Q + W , etc., são todas dependentes da trajetória; apenas Q − W é independente. Esta propriedade sugere que a grandeza Q − W representa a variação de uma propriedade intrı́nseca do sistema. Chamamos esta propriedade de energia interna Eint , e escrevemos: ∆Eint = Q − W (6.9) onde ∆Eint = Eint,f − Eint,i . Esta é a primeira lei da termodinâmica, se o sistema sofre variações infinitesimais, podemos escrever dEint = dQ − dW (6.10) 194 CAPÍTULO 6. TERMODINÂMICA em alguns livros é usado um sı́mbolo “δ” para expressar as diferenciais do trabalho e do calor para indicar que estas são grandezas dependentes da trajetória. Em palavras, a primeira lei nos diz que a energia interna do sistema tende a aumentar se acrescemos energia na forma de calor e a diminuir, se removemos energia na forma de trabalho realizado pelo sistema. Note que estamos desconsiderando a energia cinética e potencial do sistema. Não estamos considerando variações na altura ou movimentos de translação ou rotação do sistema como um todo. Outro aspecto importante da primeira lei é a natureza do trabalho. Nas Eqs. (6.9) e (6.10) estamos considerando W como sendo o trabalho realizado pelo sistema e, portanto, é positivo. No caso do trabalho realizado sobre o sistema Ws , é o negativo de W , assim a energia interna aumenta com Ws . Logo, se enunciamos a primeira lei em termos do trabalho realizado sobre o sistema, então escrevemos, ∆Eint = Q + Ws ou dEint = dQ + dWs . (6.11) que em palavras quer dizer: a energia interna do sistema aumenta se fornecemos calor ao sistema ou realizamos trabalho sobre ele. 6.6.1 Casos Especiais da primeira lei Vamos examinar quatro processos termodinâmicos diferentes para verificar o que ocorre quando aplicamos a primeira lei da termodinâmica a estes processos. Processo Adiabático É um processo que ocorre tão rapidamente ou em um sistema tão bem isolado que não há trocas de calor entre o sistema e o ambiente. Fazendo Q = 0 na Eq. (6.9), segue que: ∆Eint = −W assim, se o sistema realiza trabalho sua energia interna diminui ou se o trabalho é realizado sobre o sistema então W < 0 e ∆Eint > 0, ou seja, a energia interna aumenta. Na Fig. 6.10 é mostrado um sistema onde é possı́vel realizar um processo adiabático. Processo a volume constante Se o volume de um sistema é mantido constante, o sistema não pode realizar trabalho. Fazendo W = 0 na Eq. (6.9), a primeira lei nos fornece ∆Eint = Q. 6.6. A PRIMEIRA LEI DA TERMODINÂMICA 195 Esferas de chumbo Isolante Figura 6.10: Uma expansão adiabática pode ser realizada removendo lentamente as esferas de chumbo sobre o êmbolo. O processo pode ser invertido a qualquer momento acrescentando novas esferas. Assim, se o sistema recebe calor (ou seja, se Q > 0) a energia interna do sistema aumenta. Se o sistema cede calor então a energia interna diminui. Processo cı́clicos Existem processos nos quais após certas trocas de calor e de trabalho, o sistema volta ao estado inicial. Neste caso, nenhuma propriedade intrı́nseca do sistema pode variar. Fazendo ∆Eint = 0, segue que: Q=W Assim, o trabalho lı́quido realizado durante o processo cı́clico deve ser exatamente igual à quantidade de energia transferida na forma de calor; a energia interna deve permanecer a mesma. Expansões livres São processos adiabáticos nos quais nenhum trabalho é realizado. Assim, Q = W = 0, logo ∆Eint = 0. Conforme mostrado na Fig. 6.11, a válvula é aberta e o gás se expande livremente até ocupar as duas câmaras. Q = 0 porque o sistema está isolado; W = 0 porque a pressão é igual a zero. 196 CAPÍTULO 6. TERMODINÂMICA válvula vácuo isolante Figura 6.11: O estágio inicial de um processo de expansão livre. Após a válvula ser aberta o gás ocupa as duas câmaras e, depois de algum tempo, atinge um estado de equilı́brio. Exemplo 1. Suponha que 1, 00 kg de água a 100o C é convertido em vapor à pressão atmosférica padrão (1, 0 atm = 1, 01 × 105 Pa) no arranjo da Fig. 6.12. O volume da água varia de um valor inicial de 1, 00 × 10−3 m3 do lı́quido para 1, 671 m3 do vapor. (a) Qual é o trabalho realizado pelo sistema durante este processo? O trabalho é dado por: ∫ Vf W = p dV Vi e desde que a pressão é constante, podemos retirá-la para fora da integral, assim, W = p(Vf − Vi ) e substituindo-se os valores correspondentes, segue que: W = 1, 01 × 105 Pa × (1, 671 m3 − 1, 00 × 10−3 m3 ) = 169 kJ. (b) qual foi o calor transferido? O calor transferido é dado por: Q = LV m = 2256 kJ/kg × 1, 00 kg = 2256 kJ 6.7. MECANISMOS DE TRANSFERÊNCIA DE CALOR 197 Esferas de chumbo Vapor Água Isolante Reservatório tèrmico controle da temperatura Figura 6.12: Água fervendo a pressão constante. A energia é transferida do reservatório térmico, em forma de calor, até que toda a água se transforme em vapor. O gás se expande e realiza trabalho ao levantar o êmbolo. (c) Qual foi a variação da energia interna? ∆Eint = Q − W = (2256 − 169) kJ = 2 MJ Este aumento de energia está relacionado com a separação das moléculas uma das outras que estão ligadas em um arranjo periódico no sólido. 6.7 Mecanismos de transferência de calor Até agora consideramos a transferência de calor mas não discutimos os mecanismos envolvidos nesta transferência. Existem três mecanismos de transferência de calor: condução, calor e convecção. 6.7.1 Condução O processo de condução do calor ocorre através de um meio material tanto em fluidos quanto em sólidos. Materiais metálicos são bons condutores de calor e podemos perceber o processo de condução térmica 198 CAPÍTULO 6. TERMODINÂMICA Reservatório quente a TQ Reservatório frio a TF Figura 6.13: Condução de calor. A energia é transferida em forma de calor de um reservatório à temperatura TQ para um reservatório mais frio, à temperatura TF , através de uma placa de espessura L e condutividade térmica k. quando pegamos algum material metálico e notamos que este está quente embora apenas uma parte dele esteja próxima de uma fonte de calor. Uma panela, por exemplo, conduz o calor da chama para toda a sua superfı́cie e, inclusive, se tocamos no cabo da panela vamos perceber que há um aumento da temperatura. Neste processo os elétrons e átomos do material próximos à fonte de calor vibram intensamente por causa da alta temperatura a que estão expostos. Desta forma, estas vibrações mais intensas vão se propagando ao longo do material, e portanto, aumentando a sua temperatura. Sejam dois reservatórios mantidos a temperaturas TQ e TF , com TQ > TF conectados por uma placa de espessura L e área A. Seja Q o calor transferido do reservatório quente (com temperatura TQ ) para o reservatório frio (com temperatura TF ), no tempo t. As experiências mostram que a taxa de condução Pcond de calor é dada por: Pcond Q = = kA t ( TQ − TF L ) (6.12) onde k é a condutividade térmica, uma constante que depende do material de que é feita a placa. Materiais com boa condutividade térmica são aqueles com um alto valor de k. Resistência Térmica A resistência térmica é definida com a razão entre o comprimento da placa e sua condutividade térmica, i.e., R= L . k 6.7. MECANISMOS DE TRANSFERÊNCIA DE CALOR 199 Reservatório a temperatura TF Reservatório a temperatura TQ Figura 6.14: Condução de calor. A energia é transferida em forma de calor de um reservatório à temperatura TQ para um reservatório mais frio, à temperatura TF , através de duas placas de espessuras L1 e L2 e condutividades térmicas k1 e k2 . e vamos que um bom isolante térmico é caracterizado por um valor baixo da condutividade térmica. 6.7.2 Condução através de uma placa composta Vamos considerar agora que os reservatórios com temperaturas TQ e TF estão conectados por uma placa composta, formada por dois materiais de diferentes espessuras L1 e L2 e diferentes condutividades térmicas k1 e k2 (veja Fig. 6.14). Ambas as placas têm área A. Por simplicidade, vamos considerar o caso particular em que a transferência de calor ocorre no regime estacionário, ou seja, que as temperaturas em todos os pontos da placa e a taxa de transferência de energia não variam com o tempo. No regime estacionário, as taxas de condução através dos dois materiais devem ser iguais. Em outras palavras, a energia transferida através de um dos materiais deve ser igual à energia transferida através do outro material no mesmo instante. Seja TX a temperatura na interface entre as placas, então, como as taxas de condução devem ser iguais, escrevemos: ( Pcond = k2 A TQ − TX L2 ) ( = k1 A TX − TF L1 assim, L1 k2 TQ − L1 k2 TX = L2 k1 TX − L2 k1 TF ) 200 CAPÍTULO 6. TERMODINÂMICA de onde obtemos a temperatura da interface: TX = k1 L2 TF + L1 k2 TQ k1 L 2 + L 1 k2 e substituindo na equação para a taxa de condução, obtemos ainda: Pcond = ( k2 ATQ − Pcond = k2 ATQ − k2 ATX L2 k2 k1 L2 ATF + k2 L1 k2 ATQ k1 L 2 + L 1 k2 L2 ) k2 T Q − = A ( k2 k1 L2 TF + k2 L1 k2 TQ k1 L2 + L1 k2 L2 [ Pcond k2 TQ (k1 L2 + L1 k2 ) − (k2 k1 L2 TF + k2 L1 k2 TQ ) =A L2 (k1 L2 + L1 k2 ) ) ] [ Pcond ] [ ] k1 k2 L2 TQ + k22 L1 TQ − k1 k2 L2 TF − k22 L1 TQ k1 k2 L2 TQ − k1 k2 L2 TF =A =A L2 (k1 L2 + L1 k2 ) L2 (k1 L2 + L1 k2 ) [ Pcond ] [ ] (TQ − TF ) k1 k2 L2 (TQ − TF ) k1 k2 (TQ − TF ) =A =A = A k1 L 2 L 1 k2 L2 (k1 L2 + L1 k2 ) k1 L 2 + L 1 k2 + k1 k2 k1 k2 o que pode ser finalmente escrito na forma, Pcond = (TQ − TF )A L1 L2 + k1 k2 (6.13) A Eq. (6.13) pode ser generalizada para o caso de N placas: Pcond = (TQ − TF )A ) N ( ∑ Li i=1 6.7.3 (6.14) ki Convecção Este tipo de transferência de calor ocorre quando um fluido como, ar ou água, entra em contato com um objeto cuja temperatura é maior do que o fluido. A temperatura do fluido em contato com o objeto aumenta e (na maioria dos casos) fica menos densa. Como conseqüência esse fluido expandido é mais leve que o fluido adjacente e assim, a força de empuxo o faz subir. O fluido mais frio escoa para tomar o lugar do fluido mais quente que sobe. Este processo pode continuar indefinidamente ou enquanto a região mais quente do fluido existir. 6.7. MECANISMOS DE TRANSFERÊNCIA DE CALOR 6.7.4 201 Radiação É o processo de transferência de calor via ondas eletromagnéticas. As ondas eletromagnéticas que transferem calor são chamadas de radiação térmica. A potência de emissão é dada por Prad = σϵAT 4 onde σ é a chamada constante de Stefan-Boltzmann e vale 5, 6704 × 10−8 W/m2 K4 ; a constante ϵ é a chamada emissividade que varia entre 0 e 1 e é adimensional e finalmente A é a área do corpo que emite a radiação. A temperatura T é medida em Kelvins e vemos então que qualquer corpo a T ̸= 0 emite radiação térmica. Um corpo que emite radiação também pode absorver radiação. A taxa de absorção é definida por 4 Pabs = σϵATamb onde Tamb é a temperatura ambiente. Assim, desde que o corpo emite e absorve radiação, então é conveniente trabalhar com a taxa lı́quida de absorção/emissão de radiação dada por: 4 Plı́q = Pabs − Prad = σϵA(Tamb − T 4) e vemos então que se Plı́q > 0 o corpo absorve mais radiação do que emite. Exemplo 1. A Fig. 6.15 mostra a seção reta de uma parede feita com uma camada interna de madeira, de espessura La , uma camada externa de tijolos Ld (= 2La ), e duas camadas externas de espessuras desconhecidas. A condutividade da madeira é ka e a dos tijolos é kd (= 5ka ). A área da parede também é desconhecida. A condução atingiu um regime estacionário, as temperaturas conhecidas são T1 = 25 o C; T2 = 20 o C e T5 = −10 o C. Qual é a temperatura T4 ? As taxas de condução devem ser as mesmas em todas as interfaces no regime estacionário. Assim, podemos escrever: ( P a = ka A T1 − T2 La ) 202 CAPÍTULO 6. TERMODINÂMICA Exterior Interior Figura 6.15: Uma parede composta de 4 camadas através da qual existe transferência de calor no regime estacionário. e, ( Pd = kd A T4 − T5 Ld ) e igualando as duas taxas de condução térmica, segue que: ( ) ( ) T4 − T5 T1 − T2 kd A = ka A Ld La ka kd (T4 − T5 ) = (T1 − T2 ) Ld La ou ainda, T4 = T5 + ka L d (T1 − T2 ) kd L a e substituindo-se os valores correspondentes, segue que: T4 = −8 o C. Capı́tulo 7 Teoria Cinética dos Gases No capı́tulo anterior definimos as bases da teoria termodinâmica enunciando as leis zero e primeira da termodinâmica. A primeira permitiu definir conceito de temperatura, essencial para indicar o equilı́brio térmico, e a primeira lei nos permitiu descrever a transferência de energia em um processo termodinâmico. Aqui faremos uma breve digressão com o objetivo de mostrar a base teórica por trás das equações desenvolvidas no capı́tulo anterior. É importante notar que as equações que desenvolvemos no capı́tulo anterior tinham sido justificadas por meio de experimentos. No entanto, hoje sabemos que a termodinâmica é o limite macroscópico da chamada fı́sica estatı́stica, um ramo muito importante da fı́sica. Aqui aplicaremos os conceitos de fı́sica estatı́stica aos chamados gases ideais que chamamos de teoria cinética dos gases. Antes de considerar as quantidades termodinâmicas, é necessário definir algumas quantidades úteis na descrição de muitas partı́culas. 7.1 O número de Avogadro Quando lidamos com átomos e moléculas é conveniente medir o tamanho das amostras em moles. Fazendo isso, temos certeza que estamos comparando amostras com o mesmo número de átomos ou moléculas. O mol é definido da seguinte forma: 1 mol é o número de átomos em uma amostra de 12g de carbono 12. O número de átomos ou moléculas em um mol é dado por NA = 6, 02 × 1023 mol−1 (7.1) O número n de moles contido em uma amostra é dada pela razão entre o número de átomos ou 203 204 CAPÍTULO 7. TEORIA CINÉTICA DOS GASES moléculas N da amostra e o número de átomos ou moléculas em um mol, i.e., n= N NA (7.2) Podemos calcular o número de moles em uma amostra a partir da massa Mam da amostra e da massa molar M (massa de 1 mol) ou da massa molecular m (massa de uma molécula): n= 7.2 Mam Mam = . M NA m (7.3) Gases Ideais Quando queremos determinar as propriedades de um gás, a primeira pergunta seria quais são as moléculas do gás? No entanto, se colocamos 1 mol de vários gases em um recipiente com um mesmo volume e sob a mesma temperatura mediremos valores de pressão ligeiramente diferentes. Se medimos a pressão para concentrações cada vez menores de gás, estas pequenas diferenças de pressões medidas tendem a desaparecer. Medidas mais precisas mostram que, em baixas concentrações, todos os gases obedecem a seguinte relação: pV = nRT (7.4) onde p é a pressão absoluta, n o número de moles, T e V são a temperatura e volume e R é a chamada constante dos gases ideais: R = 8, 31 J/mol K. A Eq. (7.4) é chamada lei dos gases ideais. Contanto que a concentração do gás seja baixa, essa lei se aplica a qualquer gás ou mistura de gases. Podemos escrever a Eq. (7.4) em termos da constante de Boltzmann, definida por: kB = R 8, 31 J/mol K 23 = J/K. −1 = 1, 38 × 10 23 NA 6, 02 × 10 mol assim, podemos escrever R = NA kB ,e substituindo na (7.4) segue que: pV = nNA kB T pV = N kB T. (7.5) 7.2. GASES IDEAIS 205 Figura 7.1: Três isotermas em um diagrama p − V . A trajetória mostrada na isoterma central representa uma expansão isotérmica de um gás no estado inicial i para um estado final f . A trajetória de f para i na mesma isoterma representa o processo inverso, uma compressão isotérmica. Note que a diferença entre as Eqs. (7.4) e (7.5) é que a primeira envolve o número de moles e a segunda envolve o número de moléculas contidas no gás. Note que todos os gases reais se aproximam da lei dos gases ideais no limite em que suas moléculas não interagem. Isto nos permite analisar o comportamento limite dos gases reais usando uma lei bastante simples. 7.2.1 O trabalho realizado por um gás ideal à temperatura constante Suponha que o gás ideal seja introduzido em um cilindro com um êmbolo como o que estudamos no capı́tulo anterior. Suponha que mantemos a temperatura do gás ideal fixa, usando o reservatório térmico, e fazemos seu volume variar desde um valor inicial Vi a um valor final Vf . Este tipo de processo a temperatura constante é chamado de expansão isotérmica (ou compressão isotérmica no caso inverso). O processo isotérmico é representado por uma curva chamada isoterma no diagrama p–V , como mostrado na Fig. 7.1. Podemos obter a expressão matemática através da lei dos gases ideais, pV = nRT que é a equação para a isoterma. ∴ p= nRT constante = V V 206 CAPÍTULO 7. TEORIA CINÉTICA DOS GASES O trabalho pode ser calculado através da Eq. (6.8): ∫ ∫ Vf W = Vf p(V ) dV = nRT Vi Vi dV V e resolvendo a integral, segue que: ( W = nRT ln Vf Vi ) (7.6) Vemos da Eq. (7.6) que se Vf > Vi e W > 0 que é o caso da expansão e no caso da compressão temos Vf < Vi e W < 0 o que implica no aumento da energia interna do gás segundo a primeira lei de termodinâmica. 7.2.2 Trabalho a pressão e volume constantes O trabalho realizado pelo gás a volume constante é dado pela Eq. (6.8): ∫ Vf ∴ p(V ) dV = 0 W = W = 0, (7.7) Vi desde que Vi = Vf quando o volume não varia. No caso da pressão constante, temos pela Eq. (6.8): ∫ ∫ Vf W = Vf p(V ) dV = p Vi dV Vi desde que a pressão é constante e não depende do volume, então podemos retirá-la da integral. Assim, W = p(Vf − Vi ). (7.8) Exemplo 1. Um cilindro tem 12 L de O2 a 20 o C e 15 atm. A temperatura é aumentada para 35 o C e o volume é reduzido para 8, 5 L. Qual é a pressão final do gás em atmosferas? Suponha que o gás é ideal. Como o gás é ideal, então podemos usar pV = nRT que é o válida nos estados inicial e final do gás, assim temos que: pi Vi = nRTi e pf Vf = nRTf 7.3. PRESSÃO, TEMPERATURA E VELOCIDADE MÉDIA QUADRÁTICA 207 de onde obtemos pf V f Tf = pi V i Ti ( ∴ pf = Tf Vi Ti Vf ) pi e convertendo as temperaturas para Kelvins, segue que: 12 pf = 8, 5 ( 273 K + 20 273 K + 35 ) × 15 atm = 22 atm. 2. Um mol de oxigênio (trate-o como gás ideal) se expande a uma temperatura constante de 310 K de um volume inicial Vi = 12 L a um volume final Vf = 19 L. Qual o trabalho realizado pelo gás durante a expansão? Temos, pela Eq. (7.6) ( W = nRT ln Vf Vi ) desde que a temperatura é mantida constante no processo. Assim, substituindo-se os valores correspondentes, segue que: ( W = 1 mol × (3, 18 J/mol K) × 310 K × ln 19 12 ) W = 1180 J. 7.3 Pressão, Temperatura e Velocidade Média Quadrática Aqui, temos como objetivo responder a seguinte pergunta: Temos n moles de um gás em uma caixa de volume V . Qual é a relação entre a pressão do gás sobre as paredes da caixa e a velocidade das moléculas do gás? Vamos considerar que as colisões das moléculas com as paredes são elásticas e ignorar as colisões entre as moléculas. Vamos determinar a transferência de momento sobre a parede da caixa paralela ao plano yz, veja a Fig. 7.2. Neste caso, a única componente do momento que muda é a componente x: ∆px = px,f − px,i = (−mvx ) − mvx = −2mvx . 208 CAPÍTULO 7. TEORIA CINÉTICA DOS GASES Normal à área sombreada Figura 7.2: Gás confinado em uma caixa de volume L3 onde consideramos a transferência de momento de uma partı́cula de velocidade ⃗v incidindo na face sombreada do cubo. Logo o momento transferido para a parede da caixa será: ∆px = +2mvx . O tempo entre as colisões é simplesmente ∆t = 2L/vx , assim, a taxa média de transferência de momento para a parede sombreada é dada por ∆px 2mvx mvx2 = = ∆t 2L/vx L Mas a 2a lei de Newton é definida por: d⃗ p F⃗ = dt ou seja, a taxa de transferência de momento é a força que age sobre a parede da caixa. Para obter a força total temos que considerar a soma de todas as contribuições das N moléculas. Além disso, a pressão é a razão entre força e a área da parede (L2 ), assim, podemos escrever F p= 2 = L 2 mvx1 L + 2 mvx2 L mv 2 + Lx3 + · · · L2 2 mvxN L ou ainda, p= m 2 2 2 2 (v + vx2 + vx3 + · · · + vxN ) L3 x1 (7.9) 7.3. PRESSÃO, TEMPERATURA E VELOCIDADE MÉDIA QUADRÁTICA 209 onde N é o número total de moléculas que existem na caixa. Como N = nNA , então temos nNA parcelas na soma entre parênteses. Podemos substituir a soma por N (vx2 )med = nNA (vx2 )med , onde (vx2 )med é a média do quadrado das velocidades. Logo, p= mnNA 2 (vx )med . L3 (7.10) Mas como M = mNA é a massa molar do gás e L3 é o volume da caixa podemos escrever ainda: p= nM 2 nM 2 (vx )med = ⟨vx ⟩ V V (7.11) onde usamos uma notação mais compacta para a média do quadrado. Para qualquer molécula temos que: v 2 = vx2 + vy2 + vz2 . Como existem muitas moléculas e elas estão se movendo em direções aleatórias, os valores médios dos quadrados das velocidades são iguais para todas as direções, i.e., ⟨vx2 ⟩ = ⟨vy2 ⟩ = ⟨vz2 ⟩ logo ⟨v 2 ⟩ = ⟨vx2 ⟩ + ⟨vy2 ⟩ + ⟨vz2 ⟩ = 3⟨vx2 ⟩ e substituindo este resultado na Eq. (7.11) segue que: nM 2 ⟨v ⟩ 3V p= (7.12) A raı́z quadrada de ⟨v 2 ⟩ é um tipo de média chamada velocidade média quadrática das moléculas e é representada por vrms 1 . Assim, podemos escrever: vrms = √ ⟨v 2 ⟩ e podemos escrever a Eq. (7.12) para a pressão na forma: p= nM 2 v 3V rms (7.13) Combinando a Eq. (7.13) com a lei dos gases ideais, podemos escrever vrms em termos da temperatura: pV = nRT ou seja, nM 2 v V = nRT 3V rms 1 do inglês “root mean square”. 210 CAPÍTULO 7. TEORIA CINÉTICA DOS GASES Gás Massa Molar (10−3 kg/mol) vrms (m/s) H2 2,02 1920 O2 32 483 SO2 64,1 342 Tabela 7.1: Tabela mostrando alguns valores da velocidade rms para alguns gases. ou ainda: √ vrms = 3RT . M (7.14) Na tabela 7.1 temos alguns valores de velocidades rms. Notamos que, por exemplo, para o gás H2 , a velocidade é extremamente alta, de 1920 m/s que equivale a aproximadamente 6900 km/h. Assim, desde que as moléculas movem-se tão depressa é natural perguntar porque levamos quase um minuto para sentir o cheiro de um perfume quando abrimos o frasco do outro lado de uma sala? A resposta é que, apesar da velocidade elevada, as moléculas do perfume se afastam muito lentamente do frasco por causa da colisão entre as moléculas. 7.3.1 Livre Caminho Médio A velocidade rms é bem elevada, conforme mostrado na tabela acima. No entanto, quando as moléculas colidem umas com as outras, a velocidade das moléculas muda de direção de modo que o movimento de qualquer molécula em um gás é completamente aleatório conforme mostrado na Fig. 7.3. Este tipo de movimento caótico é chamado de movimento difusivo ou simplesmente difusão. Desta forma, vemos que a alta velocidade das moléculas existe apenas entre duas colisões e a cada colisão a velocidade muda de direção. Com isso, a velocidade média efetiva é muito menor do que a velocidade entre duas colisões. Desde que as colisões são aleatórias, a distância percorrida pela molécula é variável. No entanto, podemos definir uma distância média entre colisões que chamamos de “livre caminho médio”, (simbolizado por l). Se consideramos que as moléculas possam ser aproximadas por esferas de diâmetro d, é de se esperar que l diminua com d e também com a concentração de moléculas (N/V ). Para estimar o livre caminho médio notamos que duas moléculas (representado por esferas) vão colidir quando a distância entre seus centros é menor ou igual a d como mostrado na Fig. 7.4a. De maneira equivalente, podemos representar 7.3. PRESSÃO, TEMPERATURA E VELOCIDADE MÉDIA QUADRÁTICA 211 Figura 7.3: Diagrama mostrando a trajetória descrita por uma molécula do gás. Devido as colisões com as outras moléculas do gás a trajetória é aleatória. (c) (a) (b) Figura 7.4: (a) Uma colisão ocorre quando a distância entre os centros das moléculas estão a uma distância menor do que o diâmetro das moléculas. (b) representação equivalente, porém mais conveniente, é pensar na molécula em movimento como tendo raio d e em todas as outras sendo pontos. (c) No intervalo de tempo t a molécula descreve um volume cilı́ndrico de raio d e comprimento ⟨v⟩t. esta mesma situação considerando que a molécula tem um diâmetro 2d e as demais são pontuais como mostrado na Fig. 7.4b. A esfera de raio d é chamada de esfera de exclusão e possui um volume 8 vezes 212 CAPÍTULO 7. TEORIA CINÉTICA DOS GASES maior do que o volume da molécula, 4 4 V = πd3 = 8 × π 3 3 ( )3 d = 8Vmolec. . 2 Quando a molécula percorre sua trajetória a sua esfera de exclusão varre um volume cilı́ndrico com eixo centrado na trajetória descrita pelo centro O (veja a Fig. 7.4c). O no médio de colisões sofridas pela molécula é igual ao no de moléculas contidas neste volume cilı́ndrico. Note que a área da seção transversal do cilindro σ = πd2 é a área efetiva da molécula que chamamos de seção de choque. Esta área desempenha um papel importante no cálculo da taxa de colisões. Para estimar o livre caminho médio, vamos considerar que as demais moléculas contidas no volume varrido são pontuais e que a única molécula em movimento é a que tem centro em O. Assim, num tempo t, a molécula varre um volume dado por, V = σ⟨v⟩t Agora, o número de colisões sofridas será dada pelo número de moléculas contidas neste volume, assim, se N/V é a concentração de moléculas então o número de colisões será no de colisões = N × σ⟨v⟩t V A freqüência com que a molécula sofre colisões será f= no de colisões N = × σ⟨v⟩ t V Dividindo a distância percorrida por unidade de tempo, que é a própria velocidade média, pelo número de colisões por unidade de tempo, obtemos l: l= ⟨v⟩ 1 = f (N/V )πd2 E vemos então que l → 0 quando N/V, d → ∞. Este cálculo não leva em conta o movimento das moléculas. Assim, em um cálculo mais preciso deve-se considerar a velocidade relativa da molécula no lugar de ⟨v⟩. Neste caso, obtemos um resultado ligeiramente diferente, l= ⟨v⟩ 1 =√ . f 2(N/V )πd2 7.4. A DISTRIBUIÇÃO DE VELOCIDADE DAS MOLÉCULAS 7.3.2 213 Energia Cinética de Translação Vamos considerar novamente uma molécula cuja energia cinética de translação em um dado instante pode ser escrita na forma mv 2 /2. A energia cinética média em um certo intervalo é dada por ⟨ ⟩ 2 mv 2 m⟨v 2 ⟩ mvrms Kmed = = = 2 2 2 onde apenas usamos os resultados anteriores. Substituindo a Eq. (7.14) segue que Kmed = 3RT m 2M e substituindo M = NA m, temos ainda Kmed = 3RT m 3RT = 2mNA 2NA e como kB = R/NA , podemos escrever ainda: 3 Kmed = kB T. 2 (7.15) A Eq. (7.15) nos diz que em uma dada temperatura T , todas as moléculas de um gás ideal têm a mesma energia cinética de translação média, 3kB T /2. Quando medimos a temperatura de um gás também medimos a energia cinética das moléculas. 7.4 A distribuição de velocidade das moléculas Até aqui consideramos apenas o valor quadrático médio da velocidade das moléculas e fizemos algum progresso na descrição do gás. Para se obter informações mais precisas, é necessário derivar a chamada distribuição de velocidades do gás obtida pela primeira vez por J. C. Maxwell: ( )3/2 M 2 P (v) = 4π v 2 e−M v /2RT 2πRT (7.16) onde v é a velocidade escalar da molécula e M é a massa molar do gás. P (v) é uma função distribuição de probabilidade: para uma dada velocidade v, o produto P (v) dv (grandeza adimensional) é a fração de moléculas cujas velocidades estão no intervalo dv em torno de v. A fração de moléculas é a área efetiva de uma faixa de altura P (v) e largura dv. A área total sob a curva de distribuição corresponde a fração de moléculas cujas velocidades estão entre zero e infinito. Como todas as moléculas estão nesta categoria então a área total deve ser igual à unidade, i.e., ∫ ∞ P (v) dv = 1. 0 214 CAPÍTULO 7. TEORIA CINÉTICA DOS GASES A fração de moléculas com velocidades entre v1 e v2 é dada por: ∫ v2 P (v) dv frac = v1 velocidade Figura 7.5: A distribuição das velocidade dada pela Eq. (7.16) para moléculas de oxigênio a uma temperatura de 300 K. As três velocidades caracterı́sticas estão indicadas: ⟨v⟩ é a velocidade média; vrms é velocidade quadrática média e vP é o valor mais provável da velocidade obtida através da condição de derivada nula da distribuição (7.16). 7.4.1 Valores Médios A velocidade média pode ser obtida a partir da distribuição da seguinte forma, ∫ ∞ ⟨v⟩ = vP (v) dv 0 Se trocarmos P (v) pelo seu valor e efetuarmos a integral, vamos obter: √ 8RT ⟨v⟩ = . πM Analogamente, a média dos quadrados das velocidades ⟨v 2 ⟩ pode ser obtida como: ∫ ∞ 2 ⟨v ⟩ = v 2 P (v) dv 0 e usando a expressão para a distribuição podemos obter o valor médio quadrático: ⟨v 2 ⟩ = 3RT M 7.5. CALOR ESPECÍFICO DE UM GÁS IDEAL 215 e tomando a raı́z quadrada, obtemos o valor rms, assim, temos: √ 3RT vrms = . M A velocidade mais provável vP , para o qual P (v) é máxima é obtida da condição dP/dv = 0 e explicitamos o valor de v que satisfaz esta equação, fazendo isso, obtemos: √ 2RT vP = . M Velocidade Figura 7.6: A distribuição das velocidade dada pela Eq. (7.16) para moléculas de oxigênio em temperaturas diferentes. Para uma temperatura de 80 K, a distribuição é deslocada para velocidades menores conforme pode ser visto claramente no gráfico acima. Os valores médios estão indicados no gráfico para a distribuição de probabilidade P (v) da Fig. 7.5. Conforme mostrado na Fig. 7.6, para velocidade menores, a distribuição é deslocada como um todo para valores menores de velocidades conforme pode ser observado comparando as curvas de 80 K e 300 K. 7.5 Calor especı́fico de um gás ideal Até aqui desenvolvemos algumas relações com o objetivo de determinar o calor especı́fico de um gás ideal. Para isso, vamos primeiro determinar a energia interna do gás ideal. Considerando que o gás é 216 CAPÍTULO 7. TEORIA CINÉTICA DOS GASES monoatômico então Eint é dada pela soma das energia cinéticas de translação das moléculas, então temos que: 3 ⟨K⟩ = kB T, 2 por átomo. Se um gás tem n moles, então temos que o número N de moléculas é dado por N = nNA e assim a energia cinética total do gás é dada por: 3 ⟨K⟩ = nNA kB T. 2 e usando a definição da constante de Boltzmann, segue que: 3 ⟨K⟩ = nRT, 2 gás ideal monoatômico. (7.17) Assim, como esta é a única forma de energia do gás, então a energia interna é simplesmente igual à energia cinética média: 3 Eint = nRT. 2 (7.18) Vamos agora determinar o calor especı́fico para um gás ideal. Desde que estamos lidando com um gás precisamos especificar as condições em que estamos aumentando a temperatura do gás, i.e., se estamos produzindo um aumento de pressão com um volume mantido constante, ou ainda, deixando o volume variar mantendo a pressão constante. A seguir, consideramos o cálculo para as duas situações. 7.5.1 Calor especı́fico a volume constante Na Fig. 7.7a, temos n moles de um gás ideal monoatômico a uma pressão p e a uma temperatura T confinados em um volume V fixo. O estado inicial i está mostrado no diagrama p − V da Fig. 7.7b. Quando o calor é fornecido pelo reservatório, aumentando lentamente a temperatura, então o gás é levado para o estado f caracterizado por uma pressão pi + ∆p e temperatura T + ∆T . O calor fornecido ao gás eleva sua temperatura por uma quantidade ∆T dada por: Q = ncV ∆T e desde que o volume é mantido constante, a quantidade de calor fornecida é transformada em um aumento da energia interna. De acordo com a primeira lei da termodinâmica, temos: ∆Eint = Q − W = ncV ∆T − W 7.5. CALOR ESPECÍFICO DE UM GÁS IDEAL 217 Pino Pressão Pino Reservatório Térmico Volume Figura 7.7: Cálculo do calor especı́fico a volume constante. (a) a temperatura de um gás ideal é aumentada de T para T + ∆T em um processo a volume constante . É adicionado calor, mas nenhum trabalho é realizado. (b) O processo é indicado em um diagrama p − V . e como W = 0, segue que: ∆Eint = ncV ∆T ou ainda, cV = ∆Eint n∆T (7.19) E como no caso do gás monoatômico a energia interna é dada unicamente pela energia cinética de translação, podemos substituir (7.18) no lugar da energia interna cV = 3nR∆T 2n∆T ou seja 3 cV = R = 12, 5 J/mol.K. 2 (7.20) É importante notar que a energia interna está relacionada ao calor especı́fico pela relação geral Eint = ncV T 218 CAPÍTULO 7. TEORIA CINÉTICA DOS GASES que pode ser aplicada a qualquer gás ideal. No caso de uma variação na temperatura temos ainda ∆Eint = ncV ∆T. 7.5.2 Calor especı́fico molar a pressão constante Vamos supor agora que nosso sistema é o gás confinado em um sistema como mostrado na Fig. 7.8a. Neste caso, o calor será fornecido ao gás pelo reservatório térmico elevando a temperatura do gás de um Pressão valor T até um valor T + ∆T e expandindo o gás de um volume V até um volume V + ∆V . A partir de Reservatório Térmico Volume Figura 7.8: Cálculo do calor especı́fico a pressão constante. (a) a temperatura de um gás ideal é aumentada de T para T + ∆T em um processo a pressão constante. (b) O processo é indicado em um diagrama p − V one o trabalho é dado pela área indicada em sombreada. experimentos nota-se que o calor está relacionado à temperatura pela relação, Q = ncp ∆T. Além disso, a expansão do gás faz um trabalho W , dado pela área sob a curva, mostrada na Fig. 7.8b: W = p∆V = nR∆T 7.6. EXPANSÃO ADIABÁTICA DE UM GÁS IDEAL 219 onde usamos a lei dos gases ideais. Assim a energia interna, dada pela primeira lei da termodinâmica pode ser escrita na forma: ∆Eint = Q − W = ncp ∆T − nR∆T ou ainda, Eint = cp − R n∆T e usando a relação envolvendo a energia interna e o calor especı́fico a volume constante obtemos finalmente: cV = cp − R ∴ cp = cV + R. Vemos que cp é maior porque parte da energia fornecida na forma de calor é transformada em trabalho e assim, só uma parcela do calor total é gasta para elevar a temperatura. 7.6 Expansão adiabática de um gás ideal Um processo em que não ocorre transferência de calor é chamado de adiabático. Neste caso, ou o processo ocorre muito rapidamente que o sistema não tem tempo de entrar em equilı́brio com a perturbação ou o processo ocorre em um ambiente isolado o bastante para garantir a ausência de contato térmico do sistema com suas vizinhanças. Vamos considerar que o gás esteja confinado em um sistema adiabático mostrado Na Fig. 7.9. Se retirarmos algumas esferas de chumbo do êmbolo, este irá se deslocar devido à expansão do gás. Como resultado, ocorre uma variação da energia interna do gás dada pela primeira lei de termodinâmica: dEint = dQ − dW e considerando que na variação infinitesimal do volume temos uma pressão bem definida aplicada pelo gás, então podemos escrever o trabalho da seguinte forma: dEint = dQ − pdV Além disso, o sistema está isolado, assim Q = 0, logo temos: dEint = −pdV. 220 CAPÍTULO 7. TEORIA CINÉTICA DOS GASES Pressão Adiabática (Q=0) Isotermas Isolante Volume Figura 7.9: O volume do gás ideal é aumentado reduzindo o peso aplicado ao êmbolo. O processo é adiabático (Q = 0). (b) O processo se desenvolve de i para f ao longo de uma adiabática do diagrama p − V . Como já discutimos, podemos escrever a energia interna da seguinte forma: dEint = ncV dT e eliminando a energia interna da primeira lei, segue que: ndT = − p dV. cV (7.21) Agora, como estamos lidando com um gás ideal, podemos usar a lei dos gases ideais para eliminar a variação na temperatura. Com efeito, temos: pV = nRT e diferenciando ambos os membros, segue que: V dp + pdV = nRdT e usando, R = cp − cV podemos escrever, ndT = V dp + pdV cp − cV (7.22) 7.6. EXPANSÃO ADIABÁTICA DE UM GÁS IDEAL 221 Assim, substituindo-se a Eq. (7.22) na Eq. (7.21), segue que: V dp + pdV p = − dV. cp − cV cV assim, podemos escrever: cV V dp + cV pdV = −cp pdV + cV pdV ou ainda, dp dV +γ =0 p V onde definimos, γ= cp cV e integrando, obtemos finalmente: pV γ = const. (7.23) pi Viγ = pf Vfγ (7.24) o que pode também ser escrito como: Usando a lei dos gases ideais, podemos eliminar a pressão e escrever uma equação para a temperatura e volume do sistema: ( nRT V ) V γ = const. o que pode ser colocado na forma final: Ti Viγ−1 = Tf Vfγ−1 (7.25) 222 CAPÍTULO 7. TEORIA CINÉTICA DOS GASES Capı́tulo 8 Entropia e 2a lei da termodinâmica Em nosso cotidiano nos deparamos com vários processos que são irreversı́veis, como a transferência de energia de um corpo quente para um corpo frio, a queda de um objeto, etc. Estes processos são ditos irreversı́veis porque ocorrem em apenas um sentido. É importante notar que o sentido inverso destes processos é possı́vel do ponto de vista da conservação da energia, i.e., um objeto sair do chão e parar na sua mão novamente, ou um corpo frio esfriar mais cedendo calor a um corpo quente. Estes processos conservam energia e assim, poderiam ser realizados. No entanto, sabemos que esta possibilidade não existe porque nunca verificamos isso na prática. A razão está no fato de que o princı́pio da conservação da energia não permite determinar se um processo é reversı́vel ou irreversı́vel. O que determina tal caracterı́stica é uma grandeza chamada entropia que vamos definir neste capı́tulo final sobre termodinâmica. Conforme veremos, qualquer processo irreversı́vel na natureza ocorre de maneira que a entropia sempre aumente. Assim, mesmo que um sistema esteja fechado, ou seja, que conserve energia, tem sua entropia aumentada caso seja irreversı́vel. Isso indica que a entropia, diferentemente da energia, não é uma grandeza conservada. De fato, a entropia sempre apresenta variações positivas ou permanece constante, a entropia de um sistema em qualquer processo sempre aumenta. A seguir vamos definir a variação da entropia de um sistema. Existem duas maneiras de fazer isso: (1) definimos a entropia em termos da temperatura do sistema e da energia que o sistema ganha ou perde na forma de calor; (2) contando as diferentes formas de distribuir os átomos ou moléculas que compõem o sistema. Aqui vamos considerar a primeira abordagem. A segunda forma é usada na formulação estatı́stica de um sistema termodinâmico que não vamos considerar aqui. 223 CAPÍTULO 8. ENTROPIA E 2a LEI DA TERMODINÂMICA 224 8.1 A variação da entropia Na Fig. 8.1, temos um exemplo de um processo irreversı́vel: a expansão livre de um gás ideal. Quando abrimos a válvula, o gás passa a ocupar os dois reservatórios atingindo o estado final (f ) ilustrado na Fig.8.1b. válvula fechada Sistema processo irreversível Vácuo isolamento (a) estado inicial (b) estado final Figura 8.1: A expansão livre de um gás ideal. (a) O gás está confinado no lado esquerdo do recipiente isolado por uma válvula fechada. (b) Note que não podemos associar valores de pressão p e volume V aos estados intermediários porque estes não são estados de equilı́brio. Assim, p e V são variáveis de estado, i.e., dependem apenas do estado do gás e não da forma como o gás chegou a este estado. Outros exemplos são a temperatura e energia. Supomos agora que o gás possua outra variável de estado: a entropia. Definimos a variação da entropia Sf − Si do sistema quando um processo leva o sistema de um estado i a f como: ∫ f dQ Sf − Si = ∆S = , T i (8.1) onde Q é a energia cedida ou absorvida na forma de calor e T é a temperatura do sistema em Kelvins. Note que o sinal de ∆S depende de Q desde que T > 0. Para obter ∆S precisamos de uma relação entre Q e T para resolver a integral. No caso de uma expansão livre, em que não temos uma sucessão de estados de equilı́brio, não temos acesso a um diagrama p − V para obter a relação. No entanto, como S depende apenas dos estados, podemos usar a trajetória para um processo reversı́vel e obter a relação entre T e Q para efetuar a integral. Um processo conveniente para calcular a integral da Eq. (8.1) é o processo isotérmico. Neste caso, a temperatura Ti = Tf = T é constante e pode ser retirado do sinal de integração. Fisicamente, isso pode ser realizado usando um cilindro com um êmbolo como mostrado na Fig. 8.2. Neste caso, o reservatório 8.2. A ENTROPIA COMO UMA FUNÇÃO DE ESTADO 225 térmico garante que a temperatura do gás é constante durante todo o processo. Além disso, as esferas de chumbo garantem que a pressão e o volume do gás sejam iguais ao do gás confinado em um dos lados do reservatório da Fig. 8.1a. Retirando-se um determinado número de esferas de chumbo o êmbolo sobe mudando os valores de pressão e volume do gás até atingir os valores correspondentes ao gás confinado nos dois reservatórios na expansão livre da Fig. 8.1b. Desde que os estados inicial e final do gás são os mesmos nos dois casos, então a variação da entropia é a mesma. Assim, considerando T constante na Eq. (8.1) segue que: ∆S = Q , T (8.2) que é a variação da entropia em um processo isotérmico. Desde que neste processo calor deve ser fornecido ao gás para manter a temperatura constante, então Q > 0 e variação da entropia é positiva. (a) isolamento (b) processo reversível reservatório térmico Figura 8.2: A expansão isotérmica de um gás ideal realizada de forma reversı́vel. O gás possui o mesmo estado inicial i e o mesmo estado final f que no processo irreversı́vel da Fig. 8.1. 8.2 A entropia como uma função de estado Supusemos que a entropia, assim como pressão, energia, temperatura e volume é um propriedade do estado de um sistema e não depende do modo como este estado é atingido. Este fato pode ser provado apenas através de experimentos. No entanto, podemos provar este fato para o caso particular em que o gás ideal passa por um processo reversı́vel . Para tornar um processo reversı́vel, devemos executá-lo lentamente, em uma série de pequenos passos, CAPÍTULO 8. ENTROPIA E 2a LEI DA TERMODINÂMICA 226 com o gás em equilı́brio no final de cada passo. Para cada passo temos uma variação infinitesimal da energia interna dada por: dEint = dQ − dW Como o processo é reversı́vel, podemos usar a expressão dW = pdV e dEint = ncV dT , assim, temos: ncV dT = dQ − pdV ∴ dQ = ncV dT + pdV e como lidamos com um gás ideal, então podemos substituir a pressão por: p= nRT V assim, dQ = ncV dT + nRT dV V e dividindo ambos os membros pela temperatura, segue que: dQ dT dV = ncV + nR T T V e integrando esta equação de um estado inicial a um estado final, vamos obter: ∫ f ∫ f ∫ f dQ dT dV = ncV + nR T T V i i i e como o primeiro membro é a variação da entropia de acordo com a definição dada pela Eq. (8.1), podemos escrever: ( ∆S = nR ln Vf Vi ) ( + ncV ln Tf Ti ) e como não precisamos especificar o caminho por onde se realizou a integração, o resultado acima é válido para qualquer processo termodinâmico. 8.3 A 2a lei de termodinâmica Quando consideramos o cilindro com o êmbolo que é levantado após a adição de calor ao gás, observamos que a entropia do gás aumentava de um valor Si a um valor Sf . Entretanto, como o processo é reversı́vel então podemos adicionar algumas esferas ao êmbolo e comprimir o gás, e ao mesmo tempo, podemos retirar o calor por meio da fonte externa. Assim, o calor é negativo e, de acordo com a Eq. (8.1), a 8.4. MÁQUINAS TÉRMICAS 227 variação da entropia é negativa. Em princı́pio, temos uma contradição com o que foi dito no inı́cio pois foi afirmado que a entropia tem apenas variações positivas. Esta aparente contradição é resolvida quando notamos que este postulado é válido apenas para processos irreversı́veis que ocorrem em sistemas fechados. O processo que acabamos de descrever é um processo reversı́vel e ocorre em um sistema aberto (o sistema é o gás e recebe energia de um fonte externa — o reservatório). Por outro lado, se consideramos como sistema o conjunto gás+reservatório, então teremos um sistema fechado. Vamos agora determinar a variação da entropia de um sistema ampliado gás+reservatório para o processo que o leva do estado ilustrado na Fig. 8.2b até ao estado da Fig. 8.2a. Durante este processo reversı́vel, energia é transferida na forma de calor do gás para o reservatório com temperatura constante. Assim, a variação da entropia do gás é simplesmente dada por: ∆Sgas = − |Q| T onde estamos considerando o valor absoluto do calor. O reservatório tem sua entropia aumentada pelo recebimento deste calor, o aumento dado por: ∆Sreserv = + |Q| T Assim, a variação total da entropia é dada por: ∆S = ∆Sgas + ∆Sreserv = 0. ou seja, no processo reversı́vel a entropia permanece fixa, mas não atinge valores negativos. Com este resultado, podemos modificar o postulado da entropia para incluir processos reversı́veis: Se um processo ocorre em um sistema fechado, a entropia deste sistema aumenta para processos irreversı́veis ou permanece constante para para processos reversı́vies. A entropia nunca diminui. Esta afirmação é a chamada 2a lei da termodinâmica. Matematicamente, podemos enunciar a 2a lei da seguinte forma: ∆S ≥ 0. 8.4 (8.3) Máquinas Térmicas Agora que definimos o conceito de entropia e mostramos que a entropia de qualquer sistema na natureza nunca diminui, vamos considerar a aplicação deste conceito em sistemas chamados de máquinas térmicas. CAPÍTULO 8. ENTROPIA E 2a LEI DA TERMODINÂMICA 228 Um máquina térmica é um dispositivo que retira calor do ambiente e realiza trabalho na forma útil. As máquinas térmicas usam uma “substância de trabalho” que opera em um ciclo, ou seja, uma série de processos termodinâmicos, chamados tempos, voltando repetidamente a cada estado de ciclo. Vamos aplicar as leis da termodinâmica para alguns exemplos de máquinas térmicas. 8.4.1 A máquina de Carnot Aqui vamos considerar um protótipo de máquina térmica mais simples possı́vel que chamamos de máquina ideal ou máquina de Carnot, i.e., uma máquina cujos processos termodinâmicos são reversı́veis e as transferências de energia são realizadas sem perdas por atrito e turbulência. Este tipo de análise nos permite analisar o caráter geral de uma máquina térmica sem as complicações de uma máquina real. Este exemplo, portanto, é apenas teórico. Observe que fizemos algo parecido quando estudamos a teoria cinética dos gases: consideramos apenas gases ideais que não apresentavam nenhuma caracterı́stica especı́fica e os resultados se aplicavam a qualquer gás no limite de baixas concentrações. A máquina térmica chamada máquina de Carnot, foi desenvolvida pelo engenheiro e cientista francês Sadi Carnot em 1824. Esta máquina funciona retirando-se uma quantidade de calor QQ de um reservatório mantido a uma temperatura fixa TQ e transformando parte deste calor em trabalho W e o restante é fornecido a um outro reservatório térmico a uma temperatura mais baixa TF . Q Q F Figura 8.3: Um diagrama p − V do ciclo seguido pelo fluido de trabalho da máquina de Carnot. O ciclo é formado por duas isotermas (ab e cd) e duas adiabáticas (dc e da). A área sombreada limitada pelo ciclo é igual ao trabalho W útil realizado pela máquina de Carnot. Uma realização fı́sica de uma máquina ideal é o exemplo do gás confinado em um cilindro com um 8.4. MÁQUINAS TÉRMICAS 229 êmbolo como mostrado na Fig. 8.2. O cilindro é isolado termicamente em todos os lados exceto na base onde existe uma parede diatérmica. A esta parede podemos conectar duas fontes de calor a temperaturas TQ e TF e ainda uma parede isolante. A máquina opera de acordo com o ciclo mostrado na Fig. 8.3 chamado de ciclo de Carnot. O ciclo é percorrido no sentido horário e é formado por quatro processos termodinâmicos: dois processos isotérmicos (de a até b e de c até d) e dois processos adiabáticos (de b até c e de d até a). Abaixo, damos uma descrição de cada processo termodinâmico: processo a → b : Uma quantidade de calor QQ é fornecida ao gás que se expande de um volume inicial Va até um volume Vb . Como o gás está a uma temperatura fixa TQ , temos uma expansão isotérmica. Consideramos que este processo é realizado de maneira lenta de modo que o mesmo é reversı́vel. processo b → c : Neste processo, trocamos o reservatório térmico na base do cilindro por uma placa isolante. Com isso, o gás continua se expandindo de um volume Vb a um volume Vc , mas agora em um processo adiabático. Como não existe troca de calor neste processo, a energia interna do gás diminui e a temperatura cai para o valor TF . processo c → d : Agora retiramos a placa isolante e colocamos um reservatório térmico mantido em uma temperatura igual à do gás, i.e., com uma temperatura TF . Após isso, comprimimos o gás de modo que este tem seu volume reduzido do valor Vc para o valor Vd . Como sabemos a compressão do gás tende a aumentar a sua energia interna e, portanto, a sua temperatura. No entanto, o reservatório térmico acoplado ao gás garante que no processo a temperatura é mantida constante através da extração de uma quantidade de calor QF necessária para manter a energia interna constante. Assim, este processo é uma compressão isotérmica. processo d → a : O gás é novamente isolado do ambiente colocando-se a placa isolante na base do cilindro. Após isso, o gás é comprimido de maneira adiabática desde o valor inicial Vd até o valor final Va . Desde que agora o gás está isolado, a compressão aumenta a energia interna do gás fazendo que sua temperatura aumente do valor inicial TF até o valor final TQ . Assim, o estado final do gás no ciclo coincide com o estado inicial de onde partiu. Portanto, colocando o gás novamente em contato com o reservatório térmico a temperatura TQ podemos reiniciar o ciclo termodinâmico. Observações: • O trabalho lı́quido produzido no ciclo de Carnot é dado pela área do circuito fechado. Este trabalho é positivo porque a área sob a curva do processo de expansão (a → b → c) é maior do que a área CAPÍTULO 8. ENTROPIA E 2a LEI DA TERMODINÂMICA 230 delimitada pelo processo de compressão (c → d → a). Este trabalho é usado para elevar um objeto, rodar um motor, etc. É o que chamamos de trabalho útil; • As transferências de calor ocorrem apenas nos processos isotérmicos e as mudanças na temperatura somente nos processos adiabáticos de modo que não se perca nenhuma energia. Em resumo, fornecemos calor de uma fonte a temperatura TQ para uma fonte fria a temperatura TF e extraı́mos um trabalho útil W . Na Fig. 8.4 temos um esquema resumido da máquina de Carnot. No caso em que o ciclo é realizado no sentido contrário, temos o processo inverso, i.e., aplicamos um trabalho W de modo a retirar calor de um fonte fria e adicionar o mesmo na fonte quente, assim, temos um refrigerador ideal. TQ QQ QF TF Figura 8.4: Diagrama ilustrando os elementos de uma máquina de Carnot. As duas setas pretas no centro indicam o ciclo termodinâmico que retira o calor QQ do reservatório superior a uma temperatura TQ que é parte convertido em trabalho W e parte entregue ao reservatório a uma temperatura inferior TF . 8.4.2 Entropia do ciclo de Carnot Temos que: ∫ ∆S = i f dQ T que mostra que qualquer processo em que exista uma troca de energia na forma de calor tem uma variação da entropia. Considerando o ciclo de Carnot, temos que no processo a → b, o sistema absorve calor a uma temperatura fixa TQ , logo ∆S > 0, pois QQ > 0. No processo c → d, o sistema cede calor QF a uma temperatura TF , assim, ∆S < 0 neste caso. 8.4. MÁQUINAS TÉRMICAS 231 O trabalho útil W pode ser determinado através da 1a lei da termodinâmica: ∆Eint = Q − W e como o ciclo é fechado, podemos escrever ∆Eint = 0, assim: W = Q. Agora, Q é o calor lı́quido trocado entre o reservatório e o sistema por ciclo. Assim, o sistema recebe uma quantidade QQ do reservatório quente e cede uma quantidade QF para o reservatório frio, então podemos escrever o trabalho útil por ciclo na forma: W = |QQ | − |QF |. (8.4) Variações na entropia Voltando à questão da variação da entropia, vimos que existem duas transferências de calor nos processos isotérmicos e nenhuma variação nos processos adiabáticos. Assim, desde que os processos são isotérmicos e conhecemos o sentido da transferência do calor, podemos escrever a variação da entropia na forma: ∆S = |QQ | |QF | − TQ TF (8.5) E como o ciclo é fechado e a entropia é uma variável de estado, então sabemos que ∆S = 0, assim, temos a seguinte igualdade: |QQ | |QF | = TQ TF (8.6) Desde que TQ > TF a Eq. (8.6) nos mostra que |QQ | > |QF |, assim, temos uma quantidade maior de energia extraı́da do reservatório quente do que fornecida à fonte fria. Isso era esperado desde que pela conservação da energia, válida neste processo reversı́vel, a quantidade extraı́da de energia deve ser igual à soma da energia cedida na forma de calor para a fonte fria com o trabalho útil realizado pelo sistema. Note que no caso de um processo irreversı́vel, caracterizado por aumento da entropia, parte da quantidade de calor extraı́da é transformada no aumento de entropia do sistema e parte vai para a fonte fria. O que vai para o aumento da entropia do sistema não é convertido em trabalho útil e assim, esta quantidade representa perdas no ciclo. CAPÍTULO 8. ENTROPIA E 2a LEI DA TERMODINÂMICA 232 8.4.3 Eficiência de uma máquina de Carnot De acordo com o que foi dito sobre o ciclo de Carnot, é natural medir o rendimento da máquina térmica pela razão da energia extraı́da na forma de calor QQ pelo trabalho W útil realizado pela máquina, assim, podemos escrever: ε= energia utilizada |W | = energia adquirida |QQ | que é a eficiência de uma máquina de Carnot. Podemos reescrever a eficiência ε, substituindo a expressão para o trabalho W obtida acima: ε= |QQ | − |QF | |QF | =1− |QQ | |QQ | e usando a igualdade da entropia dada pela Eq. (8.6) podemos escrever ainda: ε=1− TF TQ Vemos que como TF < TQ , a máquina de Carnot tem necessariamente uma eficiência menor do que 100%. Os 100% seriam atingidos apenas nos limites TF = 0 ou TQ → ∞. É importante notar que as temperaturas estão em kelvins, e assim, o limite do zero absoluto nunca é atingido de modo que o rendimento nunca será de 100%. Além disso, conforme mostraremos a seguir, qualquer máquina real apresenta uma eficiência menor do que a máquina de Carnot. Este fato, nos permite enunciar a 2a lei de termodinâmica em termos da eficiência de máquinas térmicas: N~ ao existe uma série de processos cujo único resultado seja a convers~ ao total em trabalho da energia contida em uma fonte de calor 8.5 . Refrigeradores Já comentamos rapidamente sobre refrigeradores, quando dissemos que podemos construir um através da inversão do ciclo de Carnot executando os processos no sentido anti-horário na Fig. 8.3. A idéia então é remover o calor do reservatório frio a uma temperatura TF através da introdução de um trabalho externo W e adicioná-lo à fonte quente TQ . No caso de um refrigerador doméstico, o trabalho externo é realizado por um compressor elétrico para transferir energia do compartimento onde estão guardados os alimentos (fonte fria) para o ambiente (fonte quente). No caso de um ar condicionado a única diferença é que a fonte fria é o ambiente a ser resfriado e a fonte quente é parte externa à este ambiente. Um aquecedor 8.5. REFRIGERADORES 233 também funciona da mesma forma, no entanto, os ambientes são invertidos. Na Fig. 8.5 mostramos um diagrama esquemático de um refrigerador ideal, ou refrigerador de Carnot, que é similar à máquina térmica de Carnot exceto pelo sentido das setas. TQ QQ QF TF Figura 8.5: Diagrama ilustrando os elementos de uma refrigerador de Carnot. As duas setas pretas no centro indicam o ciclo termodinâmico que retira o calor QF do reservatório inferior a uma temperatura TF , através da aplicação de um trabalho externo W , e então é entregue ao reservatório a uma temperatura TQ . Note que em um refrigerador, da mesma forma que na máquina de Carnot, todos os processos são reversı́veis, e assim, as transferência de energia na forma de calor e trabalho são realizadas sem perdas por atrito ou turbulência. Esta condição é necessária para manter a reversibilidade do ciclo. Não vamos considerar a análise do ciclo de Carnot neste caso, porque é equivalente ao caso da máquina térmica exceto pelo sentido que agora é anti-horário. Aqui vamos definir o chamado desempenho do refrigerador em termos da razão da energia utilizada QF pelo trabalho aplicado no processo W : K= |QF | energia utilizada = energia adquirida |W | onde K é o chamado coeficiente de desempenho do refrigerador. Note que não estamos falando de eficiência como no caso da máquina térmica, são definições diferentes, embora o intento seja o mesmo de quantificar a qualidade do dispositivo1 . Aplicando a 1a lei da termodinâmica, podemos escrever o trabalho em termos das diferenças entre o calor absorvido pelo calor cedido, desde que a energia interna 1 Se falamos de eficiência do refrigerador então temos que usar a razão W/|QQ | que é o ε. CAPÍTULO 8. ENTROPIA E 2a LEI DA TERMODINÂMICA 234 não muda no processo reversı́vel. Assim, temos W = |QQ | − |QF |, o que nos permite escrever: K= |QF | |QQ | − |QF | Além disso, como o refrigerador de Carnot é simplesmente a máquina de Carnot operando em sentido contrário, então, podemos eliminar o calor em termos da temperatura dos reservatórios: K= TF TQ − TF e vemos então que obtemos um melhor desempenho quando as duas fontes de calor apresentam temperaturas próximas uma da outra. Note que um refrigerador perfeito seria aquele em que não seria necessário nenhum trabalho externo para remover o calor da fonte fria para colocar na fonte quente. No entanto, isso é impossı́vel. Podemos ver isso considerando a variação da entropia do sistema. Se não temos trabalho, então todo o calor é extraı́do da fonte fria e assim, a variação da entropia dada pela Eq. (8.5) fica na forma: ∆S = |QQ | |QF | − TQ TF e fazendo |QQ | = |QF | = |Q|, então ∆S = |Q| |Q| − TQ TF (refrigerador perfeito) e como TF < TQ então chegamos a conclusão de que ∆S < 0 o que violaria a 2a lei da termodinâmica pois estamos considerando o sistema+fonte no cálculo da variação da entropia. Assim, chegamos a uma terceira maneira de enunciar a 2a lei da termodinâmica: N~ ao existe uma série de processos cujo único resultado seja transferir energia na forma de calor de uma fonte fria para uma fonte quente . O que nos indica que não existe refrigeradores perfeitos. 8.6 Eficiência de Máquinas Térmicas Reais Não é possı́vel construir uma máquina com um eficiência maior do que a máquina de Carnot. Isso pode ser demonstrado considerando a hipótese contrária e então verificando que isso leva a um absurdo. Vamos supor então que temos uma máquina térmica com eficiência εX > εC , onde εX é a eficiência da máquina hipotética e εC é a eficiência da máquina de Carnot. Partimos então da condição: εX > ϵ C . (8.7) 8.6. EFICIÊNCIA DE MÁQUINAS TÉRMICAS REAIS 235 Esta máquina então retira calor Q′Q de um reservatório quente e parte deste calor é transformado em trabalho W e o restante Q′F é transferido para um reservatório frio. Consideremos então que o trabalho realizado pela máquina X é usado em um refrigerador de Carnot como o que acabamos de descrever na seção anterior. Então, temos um sistema fechado como o esquematizado na Fig. 8.6. De acordo com a Eq. (8.7), devemos ter: |W | |W | > . |Q′Q | |QQ | TQ Q’Q Máquina QQ Refrigerador de Carnot Refrigerador perfeito QF Q’F TF Figura 8.6: (a) máquina térmica X acoplada a um refrigerador Carnot. (b) No caso de uma máquina X com eficiência maior do que a máquina de Carnot, a combinação da figura (a) é equivalente a um refrigerador perfeito que é proibido pela 2a lei da termodinâmica. Da desigualdade acima, segue que: |Q′Q | < |QQ |. (8.8) Usando a 1a lei da termodinâmica, podemos relacionar a quantidade de calor lı́quida nas duas máquinas. Assim, na máquina X, o trabalho é dado por: W = |Q′Q | − |Q′F | CAPÍTULO 8. ENTROPIA E 2a LEI DA TERMODINÂMICA 236 e também, W = |QQ | − |QF | e eliminando W entre as duas equações, segue que: |Q′Q | − |Q′F | = |QQ | − |QF | ou ainda, |QQ | − |Q′Q | = |QF | − |Q′F | = Q e de acordo com a desigualdade dada pela expressão (8.8), Q > 0. A equação acima nos indica que o efeito do refrigerador de Carnot e da máquina X trabalhando em conjunto é equivalente a um refrigerador ideal retirando calor de uma fonte fria para uma fonte quente sem a necessidade de um trabalho externo. Isto equivale a um refrigerador perfeito que já vimos não ser possı́vel desde que viola a 2a lei da termodinâmica. Exemplos 1. O ciclo Diesel, representado ma Fig. 8.7, onde AB e CD são adiabáticas, esquematiza o que ocorre num motor Diesel de 4 tempos. A diferença em relação ao ciclo de Otto (problema 35 da lista) é que a taxa de compressão rc = VA /VB adiabática é maior, aquecendo mais o ar e permitindo que ele inflame o combustı́vel injetado sem a necessidade de uma centelha de ignição: isto ocorre a pressão constante, durante o trecho BC; a taxa de expansão adiabática associada a CD é re = VA /VC . (a) Mostre que a eficiência do ciclo Diesel é dado por: 1 1 − 1 rγ rcγ ε=1− e 1 1 γ − re rc O ciclo funciona da seguinte forma: no processo AB temos uma compressão adiabática que eleva a pressão do sistema para o valor pA e um volume VA . Neste caso, como nenhum calor é trocado com o ambiente, todo o trabalho realizado é convertido em um aumento da temperatura do sistema. A seguir, temos uma expansão a pressão constante e um calor QBC deve ser adicionado ao sistema para compensar a perda de energia interna devido à expansão do gás até o volume VC . Uma vez que o ponto C é 8.6. EFICIÊNCIA DE MÁQUINAS TÉRMICAS REAIS B 237 Expansão a pressão constante C Expansão adiabática D Resfriamento a volume constante Compressão adiabática A Figura 8.7: Veja exemplo 1. atingido, ocorre mais uma expansão adiabática que leva o sistema do ponto C ao ponto D. Neste caso, a temperatura do sitema é reduzida desde que não há trocas de calor neste processo. Finalmente, temos uma redução da pressão do sistema a volume constante que leva o sistema do ponto D ao ponto A, onde o ciclo é reiniciado. Note que neste processo DA, o sistema libera uma quantidade de calor QDA para garantir que ocorra uma redução de pressão desde que o volume é fixo. A eficiência da máquina Diesel é portanto, dada por: ε= W QBC onde W é trabalho útil obtido durante o ciclo e QAB é o calor adicionado na etapa de expansão a pressão constante. De acordo com o enunciado do problema, temos as seguintes relações: VA = rc VB VA = re VC (8.9) (8.10) Como objetivamos determinar a eficiência precisamos calcular o trabalho e o calor injetado. Vamos CAPÍTULO 8. ENTROPIA E 2a LEI DA TERMODINÂMICA 238 começar com o cálculo do trabalho. Este é dado pela soma: W = WAB + WBC + WCD Vamos calcular cada termo separadamente. Comecemos com WAB : ∫ VB WAB = p dV VA Agora precisamos da relação entre a pressão e o volume. Lembrando que o processo é adiabático, então podemos escrever: pA VAγ = pV γ ∴ p= pA VAγ Vγ assim, ∫ WAB = pA VAγ VB VA dV = pA VAγ Vγ ( VB1−γ − VA1−γ 1−γ ) e usando a Eq. (8.9), podemos eliminar o volume VA = rc VB da equação acima: ) ( VB1−γ − rc1−γ VB1−γ γ WAB = pB VB 1−γ onde usamos também a igualdade pA VAγ = pB VBγ . Após alguma álgebra podemos escrever: ( ) pB VB 1 WAB = − 1 − γ−1 γ−1 rc e como pB VB = nRTB , podemos escrever ainda WAB = − nRTB γ−1 ( 1− ) 1 (8.11) rcγ−1 Vamos agora determinar o trabalho no processo BC. Neste caso temos um processo a volume constante, assim, é bastante simples calcular a integração: ( WBC = pB (VC − VB ) = pB VB VC −1 VB ) mas a razão no parênteses pode ser escrita em termos das Eqs. (8.10) e (8.10) VC VC VA rc = = VB VA VB re e usando a lei dos gases ideais, segue que: ( WBC = nRTB ) rc −1 re (8.12) 8.6. EFICIÊNCIA DE MÁQUINAS TÉRMICAS REAIS 239 Finalmente, vamos determinar o trabalho realizado no processo DA que é uma compressão adiabática. Como o cálculo é similar ao processo AB: ∫ WCD = pC VCγ VD VC dV = pC VCγ Vγ ( VD1−γ − VC1−γ 1−γ ) e como VD = VA podemos escrever: ( WCD = pC VCγ VA1−γ − VC1−γ 1−γ ) mas VA = re VC , logo: ( WCD = pC VCγ re1−γ VC1−γ − VC1−γ 1−γ ) ou seja, ( WCD = pC VC WCD = pC V C γ−1 re1−γ − 1 1−γ ( 1− 1 ) ) reγ−1 Para uniformizar a fórmula, escrevemos: pC VC = pB VC = nRTB VC rc = nRTB VB re o que nos permite escrever: WCD [ ( )] 1 nRTB rc = 1 − γ−1 γ − 1 re re (8.13) O trabalho lı́quido pode agora ser determinado somando as três contribuições dadas pelas Eqs. (8.11), (8.12) e (8.13): W = WAB + WBC + WCD nRTB W =− γ−1 ( 1− 1 rcγ−1 ) ( + nRTB ) [ ( )] rc nRTB rc 1 −1 + 1 − γ−1 re γ − 1 re re CAPÍTULO 8. ENTROPIA E 2a LEI DA TERMODINÂMICA 240 nRTB W =− γ−1 ( 1− 1 ) rcγ−1 nRTB W = γ−1 nRTB + γ−1 ( ) [ ( )] rc nRTB rc 1 (γ − 1) − (γ − 1) + 1 − γ−1 re γ − 1 re re ( −1 + 1 rcγ−1 rc rc rc rc +γ − −γ+1+ − re re re reγ ( nRTB W = γ−1 1 rcγ−1 nRTB W = γ−1 ( rc rc +γ −γ− γ re re rc rc rc −γ− γ γ +γ re rc re ) ) ) (8.14) Vamos agora determinar o calo injetado no processo BC. Para isso, notamos que a injeção de calor ocorre em um processo a pressão constante. Desde que a injeção de calor provoca uma variação da temperatura do sistema, então escrevemos: QBC = ncP (TC − TB ) Como sabemos a razão entre os calores especı́ficos: cP cV γ= e, cP = cV + R então podemos escrever o calor especı́fico a pressão constante na forma: cP = cP +R γ ∴ cP = γR γ−1 com isso, podemos escrever QBC nRTB = γ γ−1 ( ) TC −1 TB Agora precisamos a razão TC /TB , para isso usamos a lei dos gases ideais: pC VC nRTC = pB VB nRTB ∴ TC VC rc = = TB VB re 8.6. EFICIÊNCIA DE MÁQUINAS TÉRMICAS REAIS 241 e assim, a expressão para o calor toma a forma: QBC nRTB = γ γ−1 ( rc −1 re ) (8.15) Agora podemos substituir as Eqs. (8.14) e (8.15) na equação para eficiência da máquina Diesel: rc rc rc −γ− γ γ +γ W r r ) re ε= = c ( e rc QBC γ −1 re ε= ) rc rc −1 − γ re re ( ) rc γ −1 re rc +γ rcγ ( rc rc γ − γ r r e) ε = 1 + (c rc γ −1 re r ε=1− 1 γ rc rcγ −1 c − reγ rc re 1 1 − 1 rγ rcγ ε=1− e 1 1 γ − re rc (8.16) 2. No método de Rüchhardt para medir γ = cP /cV do ar, usa-se um grande frasco com um gargalo cilı́ndrico estreito de raio a, aberto para a atmosfera (p0 =pressão atmosférica), no qual se ajusta uma bolinha metálica de raio a e massa m. Na posição de equilı́brio O da bolinha, o volume de ar abaixo dela no frasco V0 (Fig. ??). Calcule a força restauradora sobre a bolinha quando ela é empurrada de uma distância z para baixo a partir do equilı́brio, o movimento sendo suficientemente rápido para que o processo seja adiabático. Mostre que a bolinha executa um movimento harmônico simples e calcule o perı́odo T em função de a, m, V0 , p0 e γ. Vamos aplicar a segunda lei de Newton à esfera considerando que a pressão é constante sobre a superfı́cie da esfera. Neste caso, estamos desprezando a variação da pressão com a altura da esfera, o CAPÍTULO 8. ENTROPIA E 2a LEI DA TERMODINÂMICA 242 que é válido no caso de uma esfera pequena em comparação com a altura do recipiente. Considerando a o hemisfério superior (em contato com o ar), podemos escrever a força exercida sobre um elemento diferencial de área na forma: ⃗ dF⃗ ext = −p0 dS ⃗ é um vetor perpendicular ao elemento de área dS do hemisfério. O sinal negativo indica que o onde dS ⃗ sentido a força que é contrário ao sentido do vetor dS. Conforme podemos notar da ilustração, a força que equilibra a esfera no gargalo do recipiente é a componente vertical (definido aqui como sendo o eixo z) da forças resultantes das pressões e a força gravitacional. Assim, queremos a componente vertical da força F , dada por: ∫ ∫ ext ⃗ Fz = − p0 k̂ · dS = −p0 k̂ · r̂ dS S S ⃗ = r̂dS, onde r̂ é um versor normal onde escrevemos o vetor elemento de área do hemisfério como dS à superfı́cie da esfera. Note que também retiramos a pressão de dentro da integral porque estamos considerando que a mesma não varia sobre a superfı́cie. Agora precisamos determinar a projeção do vetor normal à superfı́cie hemisférica. Para isso, notamos que o vetor normal é dado por: k̂ · r̂ = cos θ r̂ = cos ϕ sin θî + sin ϕ sin θĵ + cos θk̂, e o elemento de área é dado por: dS = a2 sin θ dθ dϕ onde estamos considerando que o hemisfério tem um raio a. Assim, podemos escrever: ∫ 2π ∫ π/2 ext 2 Fz = −p0 a cos θ sin θ dθ dϕ = 0 ∫ Fzext = −2πa p0 2 0 [ π/2 2 cos θ sin θ dθ = 2πa p0 0 sin2 θ 2 ]π/2 0 ou ainda, Fzext = −2πa2 p0 1 2 Fzext = −p0 (πa2 ) (8.17) 8.6. EFICIÊNCIA DE MÁQUINAS TÉRMICAS REAIS 243 O hemisfério inferior está em contato com o fluido dentro do frasco. Neste caso, podemos desenvolver um cálculo semelhante ao que foi feito acima para obter a força exercida pelo fluido sobre a parte inferior da esfera. A única diferença está na pressão que agora é p1 e o sentido da força que é para cima. Assim, escrevemos diretamente: Fzint = p1 (πa2 ) (8.18) Para a esfera ficar em equilı́brio a soma das forças ao longo da direção z deve ser igual a zero, i.e., F⃗zext + F⃗zint + m⃗g = 0 ou seja, −p0 (πa2 ) + p1 (πa2 ) − mg = 0 p1 = p0 + mg πa2 (8.19) Agora considere que a esfera é empurrada uma distância z para baixo. Considerando que isto seja feita de maneira rápida o suficiente para que possamos considerar que a compressão é adiabática, então podemos escrever: p1 V1γ = p2 V2γ Temos que considerar qual é a variação do volume neste caso. Para isso notamos que quando a esfera é empurrada, um volume igual a um cilindro de altura z e área basal πa2 , é deslocado, assim, temos que: V2 = V1 − πa2 z e substituindo na expressão para a expansão adiabática, segue que: ( )γ πa2 z γ γ 2 γ p1 V1 = p2 (V1 − πa z) = p2 V1 1 − V1 ou seja, ( )−γ πa2 z p2 = p1 1 − V1 e considerando que o volume deslocado é muito pequeno em comparação com o volume do fluido do recipiente, então podemos expandir o termo entre parênteses até primeira ordem: ( ) γπa2 z p2 = p1 1 + V1 CAPÍTULO 8. ENTROPIA E 2a LEI DA TERMODINÂMICA 244 p2 = p1 + p1 γπa2 z V1 ou ainda, (p2 − p1 )(πa2 ) = p1 (πa2 )2 γz V1 Mas o primeiro membro tem dimensão de força que deve produzir a aceleração da esfera, assim, este produto deve ser igual ao produto da massa pela aceleração. Agora, como estamos considerando o movimento de compressão do fluido, então isso significa que a massa tem aceleração negativa, i.e., a = −z̈ assim, segue que: ma = p1 (πa2 )2 γz V1 ou ainda, z̈ = − p1 (πa2 )2 γz mV1 ∴ z̈ + p1 (πa2 )2 γ z=0 mV1 de onde retiramos a freqüência angular do sistema: ω02 = p1 (πa2 )2 γ mV1 ou ainda, 4π 2 p1 (πa2 )2 γ = T2 mV1 T2 = 4π 2 mV1 4 mV1 = 4 2 4 p1 π a γ a p1 γ √ 2 T = 2 a mV1 , p1 γ onde p1 = p0 + mg πa2 8.6. EFICIÊNCIA DE MÁQUINAS TÉRMICAS REAIS 245 3. Quando 20, 9 J foram adicionados como calor a um certo gás ideal, o volume do gás variou de 50, 0 cm3 para 100, 0 cm3 , enquanto a pressão permaneceu em 1, 00 atm. (a) De quanto variou a energia interna do gás? Se a quantidade de gás presente era 2, 00 × 10−3 mol, determine (b) cP e (c) cV . (a) Estamos considerando que uma certa quantidade de calor é adicionada ao gás. Assim, este se expande a pressão constante. Assim, de acordo com a primeira lei de termodinâmica, temos que: ∆Eint = Q − W e como W = p∆V , então podemos escrever: ∆Eint = Q − p∆V = 20, 9 J − 1, 01 × 105 Pa × (100 cm3 − 50 cm3 ) × 1 × 10−6 m3 1 cm3 ∆Eint = 15, 9 J (b) Vamos calcular o calor especı́fico a pressão constante: cP = Q n∆T e usando a lei dos gases ideais, segue que: ( cP = n 20, 9 J × 8, 31 J/mol.K QR Q )= = p∆V p∆V 1, 01 × 105 Pa × 50, 0 × 10−6 m3 nR cP = 34, 4 J/mol.K (c) O calor especı́fico a volume constante pode ser obtido via: cV = cP − R = 34, 4 J/mol.K − 8, 31 J/mol.K = 26, 1 J/mol.K.