Tabagismo
Autores
José Roberto Jardim1
Júlio César Abreu de Oliveira2
Publicação: Jun-2000
Revisão: Nov-2006
1 - Quais dados são interessantes na história do tabaco?
Os dados mais antigos sobre o tabaco provêm da região da América Central, aonde era
utilizado pelos índios em rituais religiosos, pelo menos mil anos antes de Cristo. Em relação ao
uso do charuto, uma peça de cerâmica do século X dos índios Maias, da região do México,
mostra um índio com um charuto na boca.
Os primeiros europeus a terem contato com o tabaco foram os marujos da tripulação de
Cristóvão Colombo, ao chegarem às Américas em 1492. O primeiro europeu a plantar tabaco
na Europa foi Jean Nicot, embaixador francês em Portugal. Na ocasião, ele tratava Caterina de
Médici e seu filho, Rei Carlos IX, em Paris, de enxaqueca, usando o tabaco.
Em 1570, o botânico Jean Liebault deu o nome de Herba Nicotiana ao tabaco, em homenagem
a Jean Nicot, mas continuou a ser usado o nome tabaco para a planta. O nome cigarro é
derivado da palavra indígena maia sikar, que significa fumaça.
2 - Quantas pessoas fumam no Brasil?
O CEBRID (Centro Brasileiro de Informação sobre Drogas Psicotrópicas) publicou em setembro
de 2002 dados que mostram os resultados de um levantamento domiciliar sobre o tabagismo.
Este levantamento refere-se às 107 cidades brasileiras com mais de 200 mil habitantes. De
acordo com este inquérito, 51,5 % dos brasileiros já fizeram uso alguma vez em sua vida do
cigarro.
Das pessoas acima de 35 anos, 24% delas fumam regularmente (com intervalo de confiança
de 95% de 22% a 26%), sendo 28% (IC-95% de 26%-30%) dos homens e 20% (IC-95% de
19%-22%) das mulheres.
Segundo este mesmo levantamento, as prevalências nas diferentes faixas etárias são:
• 12-17 anos: 3,7% (masculino: 4,4%; feminino: 3,0%).
• 18-24 anos: 16,0% (masculino: 19,2%; feminino: 12,7%).
• 25-34 anos: 16,3% (masculino: 18,3%; feminino: 14,3%).
Considerando-se a população brasileira no total, 17,4% é fumante regular, sendo 20,3% dos
homens e 14,8% das mulheres.
Estes dados mostram que houve uma queda da população adulta fumante, pois em 1989,
32,8% eram fumantes. Além disso, pode-se observar que houve uma maior queda nos homens
(de 42% para 28,3%) do que nas mulheres (de 25% para 20,2%).
3 - Qual a proporção da população brasileira que pode ser considerada dependente da
nicotina?
São considerados dependentes de nicotina pelo CEBRID 2002 as pessoas que assinalaram
mais de dois dos sinais/sintomas abaixo:
• gastou grande parte do tempo para conseguir tabaco, para usá-lo ou para se recobrar
do seu efeito;
• usou nicotina em maior quantidade ou em maior freqüência do que pretendia;
• apresentou tolerância (mais quantidade para produzir os mesmos efeitos);
• apresentou riscos físicos sob o efeito ou logo após o efeito do tabaco (por exemplo:
dirigir, pilotar, usar máquinas, nadar etc);
• teve problemas pessoais por causa do tabaco (tais como: com familiares, com amigos,
no trabalho, com a polícia, emocionais ou psicológicos);
1
Professor Adjunto 4 da UNIFESP - Escola Paulista de Medicina; Coordenador do Programa de PósGraduação em Reabilitação da UNIFESP.
2
Chefe da Disciplina de Pneumologia da Universidade Federal de Juiz de Fora; Doutor em Pneumologia
pela UNIFESP - Escola Paulista de Medicina.
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• teve desejo de diminuir ou de parar o seu uso.
O sinal/sintoma que mais freqüentemente apareceu foi o desejo de diminuir ou parar o uso,
com 16,2%, seguido do uso da nicotina em maior quantidade ou em maior freqüência do que
pretendia com 8,2%.
Na distribuição por faixas etárias, os resultados do número de dependentes foi o seguinte:
• 12 e 17 anos, 2,2%;
• 18 e 24 anos, 8,4%;
• 25 e 34 anos, 9,9%;
• Acima de 35 anos, 11,3%.
No total geral da população acima de 12 anos, 9% são dependentes à nicotina.
4 - Há dados com relação a crianças e adolescentes brasileiros que cursam o 1º e 2º
graus em relação ao tabagismo?
Sim. O CEBRID já realizou cinco levantamentos em capitais brasileiras: 1987, 1989, 1993,
1997 e 2004. No levantamento mais recente foram avaliadas todas as 27 capitais brasileiras. A
população alvo foi constituída por estudantes do ensino fundamental (a partir da quinta série) e
médio. Foi utilizada a classificação da OMS quanto ao uso de drogas para definir o contato das
crianças e adolescentes com o cigarro, subdividindo-os em 5 grupos:
• Uso na vida: quando a pessoa fez uso de qualquer droga psicotrópica pelo menos uma
vez na vida;
• Uso no ano: quando a pessoa utilizou droga psicotrópica pelo menos uma vez nos
doze meses que antecederam a pesquisa;
• Uso no mês: quando a pessoa utilizou droga psicotrópica pelo menos uma vez nos
trinta dias que antecederam a pesquisa;
• Uso freqüente: quando a pessoa utilizou droga psicotrópica por seis ou mais vezes nos
trinta dias que antecederam a pesquisa;
• Uso pesado: quando a pessoa utilizou droga psicotrópica vinte ou mais vezes nos trinta
dias que antecederam a pesquisa.
O resultado, de acordo com as regiões, no ano de 2004, está demonstrado na tabela 1.
Tabela 1. Crianças e adolescentes que já fizeram uso na vida ou fazem uso
freqüente de cigarro
Região
Uso na vida
Uso freqüente
Norte
26,1%
3,7%
Nordeste
23,9%
3,6%
Centro-Oeste
22,4%
3,4%
Sudeste
25,4%
4,1%
Sul
27,7%
4,6%
Brasil
24,4%
3,8%
Os resultados do estudo em algumas capitais podem ser vistos na tabela 2.
Tabela 2. Crianças e adolescentes das principais capitais brasileiras que já fizeram
uso na vida ou fazem uso freqüente de cigarro
Capitais brasileiras
Uso na vida
Uso freqüente
Belém
23,7%
3,1%
Belo Horizonte
24,6%
4,9%
Brasília
21,8%
4,2%
Curitiba
25,1%
3,7%
Fortaleza
30,1%
4,6%
Porto Alegre
33,7%
7,3%
Recife
26,8%
5,4%
Rio de Janeiro
26,0%
3,7%
Salvador
17,3%
2,0%
São Paulo
26,3%
4,2%
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5 - Quais os dados relativos ao estado atual do tabagismo entre os adolescentes
americanos?
O CDC (Center for Disease Control and Prevention) estimou, após estudo em estudantes do
segundo grau, que:
• 29% deles são fumantes (tendo diminuído de 36% em 1997);
• o número que disse que já fumou caiu de 70% para 64%;
• os fumantes freqüentes caíram de 17% para 14%;
• os estudantes brancos e hispânicos são mais propensos a fumar do que os negros.
O CDC atribui o declínio do tabagismo entre os jovens norte-americanos ao aumento de 70%
no preço dos cigarros entre o final de 1997 e 2001, associado à expansão das campanhas
dirigidas contra o tabagismo.
6 - Como é a prevalência de fumantes entre os pneumologistas brasileiros?
Em levantamento por questionário entre os sócios da Sociedade Brasileira de Pneumologia e
Tisiologia, Hisbello Campos (Bol Pneum Sanit 1995;3:47-55) mostrou que 8,7% eram fumantes
e 20,8% ex-fumantes. O tabagismo foi equivalente entre os sexos e menor entre os mais
jovens (menos que 31 anos). A média global de cigarros fumados por dia era 15,5, sendo
pouco maior entre os homens. Ele também mostrou que 68% dos fumantes já haviam tentado
parar de fumar, enquanto que os ex-fumantes haviam tido uma média de 3,6 tentativas até
pararem definitivamente. Um dado interessante é que 85% dos pneumologistas, em média,
aconselham seus clientes a parar de fumar, mas esta porcentagem é menor entre os fumantes
e ex-fumantes.
7 - Em que se baseia a afirmação de que 50% dos fumantes irão falecer de alguma
doença associada ao cigarro?
Esta afirmação é baseada no acompanhamento de 34.439 médicos ingleses a partir de 1951
por mais de 40 anos. Nos primeiros 20 anos morreram 10 mil médicos e outros 10 mil
morreram nos 20 anos seguintes. Neste estudo, 24 causas de morte foram positivamente
associadas com o cigarro. A taxa de morte entre os tabagistas ao longo de 20 e 40 anos de
seguimento, comparados com os que nunca fumaram, foi aproximadamente três vezes maior
entre as idades de 45 e 64 anos e duas vezes maior entre 65 e 84 anos. Esta maior
mortalidade foi principalmente causada por doenças ligadas ao cigarro: câncer de boca,
esôfago, faringe, laringe, pulmões, pâncreas e bexiga; doença pulmonar obstrutiva crônica e
outras doenças respiratórias; doenças vasculares; úlcera péptica; e, talvez se confundindo pelo
fator personalidade e álcool, cirrose, suicídio e envenenamento. Aqueles que pararam de fumar
antes dos 35 anos de idade tiveram uma expectativa de vida igual aos que nunca fumaram
(Doll. BMJ 1994;309:901-911).
Atualmente, segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) ocorrem,
aproximadamente, cinco milhões de óbitos por ano no mundo, devido às doenças relacionadas
ao tabagismo, o que corresponderia a seis mortes por segundo. As estimativas da OMS, desde
que mantida a prevalência atual do tabagismo, são de que no ano de 2.025 ocorrerão 10
milhões de mortes provocadas pelo cigarro.
8 - Qual a taxa de impostos que está acoplada à venda do cigarro no Brasil?
O Brasil tem uma das mais altas cargas de impostos sobre a venda de cigarro no mundo. O
imposto incide sobre 74,7% do preço do cigarro:
• IPI=41,3%;
• ICMS da industrialização=22,2%;
• ICMS de venda=2,8%;
• imposto do selo=4%;
• COFINS=3,5%;
• PIS=0,9%.
9 - Como é a composição do cigarro?
O cigarro contém mais de 4.500 substâncias, distribuídas como fase gasosa e fase particulada.
O constituinte mais importante da fase gasosa é o nitrogênio, numa proporção de 55% a 72%
do total; em seguida aparecem o oxigênio com 9,2% a 14,3%; o gás carbônico com 6,9% a
13,4% e o monóxido de carbono com 1,9% a 6,3%. Outras 500 substâncias (benzeno, amônia,
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tolueno, acetaldeído, acroleína etc) encontram-se na fase gasosa do cigarro. A fase particulada
do cigarro contém, pelo menos, 3.500 outras substâncias (alcatrão, nicotina, colesterol, fenol,
ácido fórmico, ácido acético, chumbo, cádmio, zinco, níquel etc). O tabaco contém, ainda,
substâncias radioativas, tais como o rádio-226 e polônio-210. Os fertilizantes fosfatados são a
principal fonte destes radioelementos.
10 - O que é a corrente principal e a corrente secundária da fumaça do cigarro e quais as
suas importâncias?
A corrente principal da fumaça do cigarro é a aquela que é filtrada pelo cigarro e diretamente
inalada pelo fumante, enquanto a corrente secundária é a que sai da extremidade do cigarro
aceso e se espalha diretamente no ar ambiente. A corrente secundária é o elemento principal
como poluente do ar ambiente, por não ser filtrada e, conseqüentemente, ter altas
concentrações dos materiais tóxicos gasosos e particulados do cigarro.
11 - O cigarro realmente causa dependência? Qual a melhor maneira de se referir ao uso
do cigarro?
A Organização Mundial de Saúde considera que os termos adição, vício e hábito são
imprecisos e deveriam ser abandonados. O melhor termo é simplesmente a palavra
dependência, abandonando, do mesmo modo, os termos dependência física e dependência
psicológica.
Dependência a alguma substância é definida como um padrão de má adaptação ao seu uso,
que leva a intenso prejuízo ou sofrimento, que se tornam aparentes pela ocorrência de, pelo
menos, três dos seguintes critérios durante o mesmo período de 12 meses:
Tolerabilidade
• necessidade crescente da substância para alcançar a intoxicação ou o efeito desejado;
• efeito grandemente diminuído com o uso da mesma quantidade da substância.
Síndrome de abstinência
• a síndrome de abstinência característica para a substância;
• a substância é usada para aliviar ou para evitar sintomas da síndrome de abstinência;
• a substância é tomada em grandes quantidades ou por períodos de tempo mais longos
do que foi inicialmente planejado.
Desejo persistente (ou esforço mal sucedido para diminuir o uso da substância)
• grande quantidade de tempo gasto em conseguir a substância, usar a substância ou
recuperar-se dos seus efeitos;
• importantes atividades sociais, ocupacionais ou de recreação são abandonadas ou
reduzidas por causa do uso da substância;
• o uso da substância continua, apesar do indivíduo saber que pode ter um problema
persistente ou recorrente, físico ou psicológico, que provavelmente foi ou será causado
pelo uso exacerbado da substância.
12 - Qual é a escala prática para avaliação do grau de dependência à nicotina?
A escala mais conhecida é a de Fagerström, que se baseia no número de pontos obtidos em
seis perguntas (tabelas 3 e 4).
Tabela 3. Escala de Fagerström para caracterização da dependência à nicotina
Questões
Pontuação
Quanto tempo após acordar você fuma o seu primeiro cigarro?
Dentro de cinco
Entre 6-30
Entre 31-60
Após 60
minutos
minutos
minutos
minutos
(3 pontos)
(2 pontos)
(1 ponto)
(0 ponto)
Você acha difícil não fumar em lugares proibidos, como igrejas, bibliotecas,
cinemas, ônibus etc?
Sim (1 ponto)
Não (0 ponto)
Qual o cigarro do dia que te traz mais satisfação?
O primeiro da manhã (1 ponto)
Outros (0 ponto)
Quantos cigarros você fuma por dia?
Menos de 10
De 11 a 20
De 21 a 30
Mais de 31
(0 ponto)
(1 ponto)
(2 pontos)
(3 pontos)
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Você fuma mais freqüentemente pela manhã?
Sim (1 ponto)
Não (0 ponto)
Você fuma mesmo doente, quando precisa ficar de cama a maior parte do
tempo?
Sim (1 ponto)
Não (0 ponto)
Total
Tabela 4. Conclusão sobre o grau de dependência
0 a 2 pontos
Muito baixo
3 a 4 pontos
Baixo
5 pontos
Médio
6 a 7 pontos
Elevado
8 a 10 pontos
Muito elevado
* Uma soma acima de 6 pontos indica que, provavelmente, o paciente sentirá desconforto
(síndrome da abstinência) se deixar de fumar.
13 - Quais as características da nicotina e qual o seu papel na dependência tabágica?
A nicotina é um alcalóide vegetal básico lipossolúvel e hidrossolúvel. No cigarro ela é
encontrada na forma ácida, o que a torna absorvível somente pelos alvéolos. Ao contrário, ela
se encontra na forma básica na fumaça do charuto e do cachimbo, fazendo com que seja
altamente absorvível pela mucosa oral. Uma vez no pulmão, a nicotina é rapidamente
transportada pelo sangue aos mais diferentes órgãos, chegando ao cérebro em 7 a 20
segundos. Um cigarro contém 0,6 a 1,1 mg de nicotina, absorvendo o fumante em torno de 0,1
a 0,3 mg, por cigarro.
14 - Como é a ação da nicotina nos receptores específicos?
A nicotina possui propriedades neuro-psicofarmacológicas características ao se relacionar com
os sistemas de neurotransmissão. Ela se une a receptores do tipo muscular (localizados na
união neuromuscular) e do tipo neuronal (localizados nos gânglios autônomos, terminações
nervosas sensitivas e em várias regiões do sistema nervoso central). A sua ação, em ambos os
receptores, é a abertura dos canais iônicos e a despolarização das membranas: o efeito nos
receptores musculares é a transmissão neuromuscular, enquanto que no neuronal, ocorre a
transmissão ganglionar e a facilitação neurossináptica. Os agonistas para os receptores
musculares são vários, sendo a acetilcolina o mais importante; nos neuronais, também a
acetilcolina é um agonista, mas a nicotina tem uma participação importante. A dependência à
nicotina e a síndrome de abstinência pela sua retirada estão intimamente associadas com as
ações diretas sobre estes receptores e indiretas, pela sua ação sobre os sistemas de
neurotransmissão dopaminérgico e noradrenérgico.
15 - O que faz com que uma pessoa fume?
Inicialmente, o adolescente fuma para parecer mais velho ou para se parecer com os amigos
mais velhos, pais ou ídolos. Isso se associa à interferência direta da publicidade do cigarro que
passa a idéia de que fumar está relacionado a um estilo de vida alegre, saudável, esportivo e
economicamente bem sucedido.
O fumante de longa data fuma principalmente por três razões, entre outras várias: prazer,
hábito e dependência.
• Prazer: de um modo geral o fumante relata que fumar durante ou após o café ou as
refeições é bastante prazeroso. O número de cigarros neste caso não deveria passar
de 7 a 9 (café da manhã, café às 10 horas, almoço, outros cafés as 14 e 17 horas,
jantar e um último cafezinho às 22 horas).
• Hábito: o fumante, habitualmente, acende um cigarro assim que começa alguma ação
específica: falar ao telefone, sentar à direção do automóvel, trabalhar no computador,
participar de reunião. A ocorrência do hábito é constatada pelo relato comum dos
fumantes de que algumas vezes acendem o cigarro e ao colocá-lo no cinzeiro notam
que já havia outro cigarro aceso nele. O ato de acender o segundo cigarro foi
automático, deflagrado pelo início de uma ação que está associada a ele.
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•
Dependência: este é o componente mais importante. A nicotina liga-se às células
cerebrais criando um mecanismo de satisfação. Sempre que a nicotinemia e a
concentração de nicotina nas células cerebrais diminuem, há um estímulo forte para
que a nicotina seja reposta. Caso não ocorra a reposição, mecanismos de insatisfação
são iniciados e vários sintomas desagradáveis ocorrem, constituindo a síndrome da
abstinência. A dependência da nicotina apresenta as manifestações próprias dos
dependentes de qualquer outra droga, com a diferença que ela não gera manifestações
psíquicas, como euforia e agressividade. O ato característico da alta dependência da
nicotina é representado pela necessidade que o fumante tem de fumar logo após
acordar de manhã, antes mesmo de tomar o café. Quanto menor esse tempo, maior é
a sua dependência (lembrar que ele ficou várias horas sem fumar durante o sono,
diminuindo a sua concentração de nicotina, desencadeando a síndrome de
abstinência).
16 - Existe algum componente genético que possa fazer com que o indivíduo fume ou
tenha mais dificuldade de parar de fumar?
Vários estudos desenvolvidos entre 1958 e 1995, em sete países, mostraram que há uma
concordância de 74± 1,5% para o tabagismo entre pares de gêmeos monozigóticos (MZ) e
dizigóticos (DZ). O componente herdado para tornar-se fumante regular seria em torno de 5060%. Vários genes estão sendo estudados como possíveis candidatos à dependência à
nicotina, incluindo enzimas que metabolizam a nicotina, subunidades de receptores de nicotina
e receptores de dopamina que podem modular a resposta à nicotina. Discute-se se o fator
genético poderia interagir com o fator ambiental, fazendo com que os predispostos
geneticamente procurassem grupos de convivência mais semelhantes, aumentando a chance
de se tornarem fumantes. Outra possibilidade é a dependência à nicotina estar associada à
predisposição de origem psiquiátrica, como estado de depressão e ansiedade.
A nicotina é metabolizada pela enzima CYP2A6. Existe a hipótese de que as pessoas que
tenham pelo menos um alelo defeituoso desta enzima tornar-se-ão menos prováveis de serem
fumantes porque, ao iniciarem com o cigarro, sofrerão mais intensamente os efeitos adversos
da nicotina, pelo retardo do seu metabolismo. Um estudo americano (do Instituto M.D.
Anderson Cancer Center, Houston, EUA) estudou pessoas com o gene específico DRD2, um
receptor de dopamina, e concluíram que os portadores do gene DRD2, forma A1 (que é
herdado do pai), têm mais dificuldade de parar de fumar; os portadores da forma A2 (herdada
da mãe) respondem bem aos antidepressivos.
17 - Há evidência que um só cigarro seja lesivo ao pulmão?
Com o desenvolvimento de técnicas que medem as substâncias exaladas pode-se constatar
que há aumento significante do peróxido de hidrogênio no ar expirado após o uso de um único
cigarro (Guatura. São Paulo Med J 2000;118:93-8). A fumaça de cigarro contém uma alta
quantidade de radicais livres (da ordem de quatrilhões em cada tragada), os quais, ao entrarem
em contato com a mucosa das vias aéreas geram radicais superóxidos e peróxido de
hidrogênio. Estes radicais podem lesar a superfície das mucosas levando a peroxidação
lipídica e estresse oxidativo.
18 - É verdade que o fumante tem rugas mais precoces?
Em um trabalho de Kadunce (Ann Int Med 1991;114:840-44) mostrou-se que a prevalência de
rugas precoces estava independentemente associada ao número de cigarros fumados e à
exposição ao sol. Os fumantes com mais de 50 anos-maço tinham uma probabilidade de 4,7
vezes mais do que os não fumantes de apresentarem rugas. A exposição ao sol de mais de 50
mil horas aumentava a chance de aparecerem rugas em 3,1 vezes. A associação de exposição
ao sol e o uso de cigarro era multiplicativo e a chance para o desenvolvimento de rugas era 12
vezes. A razão para o aparecimento de rugas precoces nos fumantes seria a vasoconstrição
cutânea causada pela nicotina e o monóxido de carbono, alterando a capacidade da pele
produzir colágeno. Também poderia contribuir para a degradação do colágeno, a enzima
metaloproteinase 1, habitualmente aumentada nos fumantes.
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19 - Há alguma relação entre o sexo e a sensibilidade ao tabagismo para
desenvolvimento da DPOC?
Foi realizada uma análise em profundidade de dois estudos de base populacional
(Copenhagen City Heart Study e o Glostrup Population Studies), com 13.897 e 4.814
indivíduos, respectivamente, aonde se estudou não só o declínio do VEF1, mas também outros
parâmetros que expressam um indicador mais sensível de morbidade e do impacto da doença,
como a necessidade de hospitalização. Os homens apresentaram uma exposição e consumo
superior de tabaco, com uma proporção maior de fumantes e de inaladores, assim como maior
tempo fumando do que as mulheres. A análise de regressão de Cox, utilizando a exposição em
anos/maço, mostrou um risco superior de hospitalização para as mulheres com qualquer
consumo, embora sem alcançar significado estatístico, com uma razão de risco de mulherhomem de 1,3 no grupo do Copenhagen City e de 1,9 no Glostrup. Outra análise que levou em
conta a inalação, o consumo de tabaco e os anos fumando, novamente mostrou que as
mulheres têm maior probabilidade de hospitalização: 1,5 no Copenhagen City e 3,6 no
Glostrup. Os autores concluem que a condição de ser mulher confere um maior impacto do
tabaco sobre a função pulmonar e maior risco de hospitalização por DPOC (Prescott. Eur
Respir J 1997;10:822-7).
20 - Que ações de intervenção no tabagismo podem ser adotadas nos consultórios e
durante as consultas médicas?
Na sala de espera:
• exibir cartazes de "proibido fumar";
• retirar cinzeiros;
• combinar com toda a equipe de saúde a proibição de fumar no ambiente médico;
• criar oportunidades para que seu paciente peça ajuda para largar o cigarro, por
exemplo, incluindo folhetos sobre o abandono do tabagismo entre os materiais de
leitura da sala de espera ou exibindo filmes educativos em vídeo.
Anamnese e exame físico:
• incorporar perguntas sobre tabagismo, quais sejam:
o número diário de cigarros;
o número de anos fumando;
o tentativas anteriores de abandono: tempo de abstinência, problemas
enfrentados;
• perguntar sobre os sintomas relacionados ao tabagismo, como:
o tosse;
o produção de catarro;
o dificuldade respiratória;
o infecções respiratórias recorrentes;
• rever histórico familiar relacionado ao fumo, tais como:
o doença coronariana;
o doença pulmonar obstrutiva crônica;
o câncer;
• transformar o exame físico em intervenção:
o dar mais ênfase ao exame cardiovascular e dos pulmões;
o aferir a pressão arterial;
o explicar a relação entre tabagismo e esses sistemas;
o relacionar sintomas detectados ao tabagismo;
o discutir os benefícios físicos, em curto prazo, de parar de fumar.
Exames laboratoriais:
• utilizar exames laboratoriais para individualizar a mensagem, por exemplo:
o medir o pico do fluxo expiratório;
o medir a saturação de oxigênio;
o realizar espirometria.
Diagnóstico e plano de tratamento:
• incorporar o abandono do tabagismo ao plano de tratamento:
o quando um paciente tem diagnóstico de doenças relacionadas ao tabaco ou
sua doença é exacerbada pelo fumo, enfatizar a importância do abandono do
tabagismo para o tratamento da doença;
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o
o
quando receitar algum medicamento que possa interagir com o fumo, informar
o paciente sobre essas interações;
aproveitar os retornos para reforçar a importância em parar de fumar e para
controlar o progresso do paciente que está largando o cigarro.
21 - O que é a abordagem cognitivo-comportamental como método de cessação de
fumar?
Como o próprio nome indica, é transmitir conhecimentos ao fumante e ensiná-lo técnicas ou
estratégias que possam modificar o seu comportamento. Os principais componentes desta
abordagem são:
a. detectar as situações de risco de recaída;
b. o desenvolvimento de estratégias para enfrentar tais situações. Estas técnicas podem
ser: automonitoração, controle de estímulos, relaxamento e técnicas aversivas. O que
se pretende é que o próprio fumante se controle e consiga mudar seu comportamento.
A mudança de comportamento é um processo dinâmico e um modelo foi criado, baseado no
fato que o fumante deve passar por etapas:
Pré-contemplação: o fumante não considera a possibilidade de uma mudança de
comportamento e nem se preocupa com a questão; ele não considera a possibilidade de deixar
de fumar nos próximos seis meses;
Contemplação: admite que o tabagismo é um problema, pretende parar nos próximos seis
meses, mas ainda é ambivalente;
Ação: pretende efetivamente parar de fumar e neste período já são tomadas medidas para
livrar-se do fumo, inclusive na mudança de condições ambientais;
Manutenção: é uma fase que requer um trabalho contínuo por parte do fumante e do agente
de saúde envolvido no processo, para diminuir a chance de recaída. Podem estar envolvidas
mudanças de comportamento da pessoa, para que esta se mantenha sem fumar (como deixar
de tomar café e iniciar exercício físico, por exemplo). A idéia por detrás deste esquema é que o
indivíduo sempre seja estimulado a passar de um estágio a outro, focado no objetivo de cessar
de fumar.
22 - Existe comprovação científica de que os métodos cognitivos comportamentais
aumentam o índice de cessação do tabagismo?
Sim. Estudos mostram que quanto maior o tempo de abordagem, assim como o número de
abordagens, maior o índice de sucesso de cessação do tabagismo. No entanto, abordagens
com um tempo total maior que 90 minutos não levam a aumento adicional na taxa de
abstinência (Fiore et al 2000). Quando comparadas situações em que nenhum aconselhamento
é dado ao fumante e abordagens de menos de 3 minutos, há um aumento na cessação do
tabagismo em 30%, a abordagem de 3 a 10 minutos aumenta em 60% e a abordagem de 10
minutos aumenta em mais de 100%.
23 - O que é o método PAPA preconizado pelo INCA (Instituto Nacional do Câncer) como
abordagem ao fumante?
Esta sigla quer dizer Pergunte/Aconselhe/Prepare/Acompanhe. Esta abordagem não deverá
tomar mais que 10 minutos e deveria ser parte integrante do atendimento de qualquer
profissional da área de saúde (enfermeiro, fisioterapeuta, médico).
• Pergunte a todo paciente se ele já pensou em parar de fumar; se ele responder
positivamente, colha todas as informações referentes à sua história tabágica, incluindo
as tentativas anteriores.
• Aconselhe, sempre, o paciente deixar de fumar, dizendo que como seu médico,
fisioterapeuta, enfermeiro, você se importa com a sua saúde e que acha muito
importante que ele deixe de fumar, de um modo que o paciente sinta o seu interesse
particular nele. Prepare o fumante para deixar de fumar; marque uma data que esteja
próxima, talvez coincidindo com uma data que seja importante para ele (aniversário de
casamento, dia dos pais, dia das mães). Estimule-o a fazer exercícios (servem para
diminuir o estresse, além de que adeptos de exercício estão mais preocupados com a
saúde e tendem a não ter vícios), ler material de auto-ajuda, ter vida saudável, evitar os
gatilhos que lhe faziam fumar e, acima de tudo, coloque-se à sua disposição.
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•
•
Prepare o paciente para a cessação do tabagismo, sugerindo que ele marque uma
data para parar de fumar. É importante explicar os sintomas da abstinência e sugerir
estratégias para controlar a vontade de fumar (tomar água, chupar balas, mascar
chicletes) e quebrar os estímulos associados ao fumo (restringir o uso de café e
bebidas alcoólicas, desfazer-se de isqueiros, evitar situações de estresse e ambientes
que estimulem o uso de cigarro).
Acompanhe todo o transcorrer do processo de cessação de fumar, marcando retornos
para discutir o progresso e os problemas enfrentados que possam levar à recaída. A
síndrome de abstinência é mais intensa nas duas primeiras semanas, portanto, marque
um retorno neste período.
24 - Quais informações devemos dar aos pacientes que estão deixando de fumar?
Oriente em relação à síndrome de abstinência. Nas primeiras 24 horas podem ocorrer: desejo
intenso por cigarros, irritabilidade, dificuldade de concentração, inquietação, insônia, cefaléia,
tontura e distúrbios gastrintestinais.
• Os pacientes precisam saber também que:
o os sintomas físicos da abstinência são passageiros, durando de uma a duas
semanas;
o eles terão apoio médico durante esse período difícil;
o mesmo superando os sintomas de abstinência, ex-fumantes podem continuar
sentindo desejo de fumar devido à dependência psicológica;
o qualquer que seja o tratamento escolhido, ele terá apoio permanente;
o recaídas acontecem e não devem ser tomadas como fracasso total;
o algumas pessoas só deixam de fumar após sete tentativas ou mais.
25 - Quais são as perguntas rotineiras sobre o consumo tabágico que devem ser feitas
ao paciente durante a consulta?
• "você fuma?" ou "você continua fumando?"
• "há quanto tempo?" ou "com que idade começou?"
• "quantos cigarros por dia você fuma em média?"
• "quanto tempo após acordar você fuma seu primeiro cigarro?"
• "você está interessado em parar de fumar?"
• "você já tentou parar de fumar antes?", em caso afirmativo: "o que aconteceu?"
26 - Quais são as perguntas a serem feitas se houver recaída?
• "o que aconteceu?"
• "o que estava fazendo nessa hora?"
• "como se sentiu ao fumar seu primeiro cigarro?"
• "você já pensou em nova data para parar de fumar?"
27 - O que mais se pode falar com o fumante durante a consulta que poderia estimulá-lo
a deixar de fumar?
• Para os adolescentes:
o mau hálito;
o vestes e cabelos impregnados pelo odor do fumo;
o dores de garganta;
o tosse;
o infecções respiratórias freqüentes;
o falta de ar;
o mau desempenho nas atividades esportivas;
o despesas com cigarro;
o perda da independência - "ser controlado pelo cigarro".
• Para as mulheres grávidas:
o risco aumentado de aborto espontâneo e morte fetal;
o risco aumentado de imaturidade pulmonar do feto;
o risco aumentado de recém-nascido com baixo peso ao nascer.
• Para os pais:
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bronquite, alergias e infecções respiratórias mais freqüentes entre crianças de
pais fumantes;
o mau exemplo para os filhos.
Para os adultos assintomáticos:
o risco duplicado de doença cardíaca;
o seis vezes maior o risco de enfisema pulmonar;
o dez vezes maior o risco de câncer de pulmão;
o esperança de vida encurtada de cinco a oito anos;
o despesa aumentada com cigarros;
o despesa aumentada com tratamento de doenças ligadas ao cigarro;
o respiração difícil;
o hábito socialmente inadequado por causar doenças naqueles que não fumam;
o envelhecimento precoce com aparecimento de rugas;
o dentes e pontas dos dedos escuros.
Para os adultos sintomáticos:
o infecções das vias aéreas inferiores e superiores;
o tosse;
o dor de garganta;
o doenças nas gengivas;
o dispnéia;
o úlcera do trato digestivo;
o angina;
o claudicação;
o osteoporose;
o esofagite;
o impotência sexual;
o redução do desempenho das atividades físicas.
Para os fumantes recentes:
o mais fácil parar agora;
o menos risco de adoecer.
Para qualquer fumante:
o garantia de que outros não sejam afetados pelos males da sua fumaça;
o economia de dinheiro;
o melhora da resistência física para exercícios;
o melhora da qualidade de vida;
o sensação de bem estar e certeza de ter conquistado algo importante para si.
o
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•
•
28 - Quais são as principais doenças associadas ao uso do cigarro?
• Câncer: 30% de todos os cânceres são relacionados ao cigarro. Os principais são os
cânceres de pulmão (o cigarro é o responsável em 85% dos casos), boca, laringe,
faringe, estômago, pâncreas, rim, bexiga e colo do útero.
• Doenças coronárias: responsável por 25% dos infartos e anginas.
• Doença pulmonar obstrutiva crônica: 85% dos pacientes com bronquite crônica e
enfisema são fumantes.
• Acidente vascular cerebral: 25% das ocorrências de derrame cerebral.
• O cigarro ainda está bastante relacionado ao desenvolvimento de úlceras
gastroduodenais e infecções respiratórias.
29 - O charuto também causa câncer, doença coronariana e DPOC?
Sim. Publicação do Instituto Nacional de Câncer dos Estados Unidos chegou às seguintes
conclusões:
• fumar charuto causa câncer de pulmão e o risco está diretamente relacionado ao
número de charutos fumados por dia e à profundidade com que a fumaça é tragada;
• os riscos para câncer de boca e de faringe são semelhantes aos do fumante de cigarro
(7 a 10 vezes mais altos do que os de não fumantes);
• câncer de laringe é elevado entre os fumantes de charuto, aproximando-se do risco
dos fumantes de cigarro para os que fumam 5 ou mais charutos por dia ou que tragam
a fumaça;
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•
câncer de esôfago é várias vezes mais freqüente nos fumantes de charuto do que
entre os não fumantes;
• não há dados suficientes para se chegar a alguma conclusão sobre a incidência do
câncer de bexiga;
• a taxa de câncer pancreático é mais elevada e está diretamente relacionada ao número
de charutos fumados por dia.
Ainda segundo o relatório do Instituto Nacional de Câncer dos Estados Unidos, os estudos
demonstram que há risco aumentado para doenças coronarianas para os fumadores de
charutos, estando essa taxa diretamente relacionada ao número de charutos fumados por dia e
à profundidade com que o indivíduo traga a fumaça. Quanto a DPOC, o seu aparecimento está
mais relacionado ao volume de fumaça tragada.
30 - O que é tabagismo passivo?
Este termo refere-se à inalação da fumaça do cigarro por pessoas não fumantes e que estão
no ambiente em que pessoas estão fumando. A quantidade de fumaça inalada depende do
tamanho do ambiente, da ventilação e do número de cigarros fumados pelas pessoas. O
cigarro é considerado como o maior poluente doméstico ambiental pela Organização Mundial
da Saúde, tendo em vista que 80% do tempo as pessoas passam em ambiente fechado.
Nestes ambientes fechados nos quais se fuma, tem-se um número muito elevado de partículas,
bem acima do nível aceitável de poluição ambiental, que é em torno de 60 mcg/cm3 de
partículas suspensas respiradas: ambientes de festa, 200 mcg/cm3; bar e restaurantes, 400
mcg/cm3; sala de jogos, 600 mcg/cm3.
Em relação ao monóxido de carbono, é considerado como boa qualidade do ar, quando existe
uma concentração de 9 partes por milhão (9 ppm); a concentração máxima permitida no ar
ambiente é de 30 ppm e no trabalho é de 50ppm. Quando o ar das cidades alcança uma
concentração de 40 ppm de CO, medidas urgentes e adequadas para o controle de poluição
têm que ser acionadas. Em um ambiente de 1000 metros quadrados, com 25 fumantes
consumindo 4 cigarros/hora cada um, a concentração de monóxido de carbono chega a 100
ppm. Deve-se lembrar que experimentos de indução de enfisema em ratos são realizados
fazendo-os inalar fumaça de cigarro por 2 horas com concentração de 50 ppm de monóxido de
carbono, por 2 meses (Falando sobre tabagismo, INCA 1996).
31 - Que comprovação existe de que as pessoas não fumantes estão inalando a fumaça
do ambiente?
A dosagem de cotinina (um metabólito da nicotina) na urina, quando a pessoa convive com um
a cinco fumantes no trabalho, pode chegar a 0,6 mcg/mg Cr, em contraste com o valor próximo
de zero quando não há nenhum fumante em casa ou no trabalho. Quando há pessoas na casa
que fumam uma grande quantidade de cigarro e há mais de 6 fumantes no ambiente de
trabalho, a concentração de cotinina urinária alcança 1,2 mcg/mg Cr (esta concentração
equivale a 1 ou 2 cigarros "fumados").
Há alguns anos atrás, o grupo de tabagismo da Universidade Federal da São Paulo mediu a
concentração de monóxido de carbono no ar exalado e a concentração de nicotina na saliva de
garçons, não fumantes, no início e no final da jornada de trabalho. Houve um aumento de mais
de 5 vezes em ambas as medidas. (São Paulo Medical J 2000;118:89-92).
Uma outra pesquisa realizada no berçário dos filhos de funcionários da UNIFESP (Ribeiro e
col, São Paulo Medical J 2001) mostrou, claramente, que os filhos de pais fumantes tinham
muito mais infecções respiratórias.
32 - As crianças são afetadas pelo tabagismo passivo de uma forma particular?
Sim, antes e após o nascimento. Hoje está comprovado que filhos de mães fumantes nascem
com menos peso e estatura mais baixa. Além disso, ocorrem mais abortamentos espontâneos,
há mais nascimentos prematuros, mais complicações placentárias e maior incidência de
hemorragia.
Quanto às crianças até um ano de idade, as infecções respiratórias (pneumonias, bronquites e
bronquiolites) praticamente dobram a freqüência (de 15% para 30%) quando há um fumante na
residência; as infecções acometem 40% das crianças quando há dois fumantes e chegam a
50% se há mais de dois fumantes no domicílio.
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Recentemente o grupo de tabagismo da Universidade Federal de São Paulo fez um
levantamento entre as crianças do berçário da Escola Paulistinha, onde ficam os filhos de
funcionários da UNIFESP, e encontrou resultados muito semelhantes, demonstrando a
importância negativa dos pais fumantes nos domicílios aonde co-habitam crianças pequenas.
33 - É verdade que as pessoas que deixam de fumar sempre ganham peso?
Realmente, não é incomum que as pessoas que deixam de fumar ganhem um certo peso.
Estima-se que 80% dos ex-fumantes aumentem de peso, sendo este aumento médio de 2,5 Kg
em um ano; um terço dos ex-fumantes podem ganhar até 8 kg. Não se sabe, exatamente,
porque os ex-fumantes ganham peso, mas eles relatam um aumento da vontade de comer
hidratos de carbono. Acredita-se que este desejo esteja associado a alguma alteração do
metabolismo do sistema dopamina-serotonina-noradrenalina. O uso da bupropiona, que age
nesta via metabólica como uma medicação adjuvante no processo de deixar de fumar, pode
diminuir este desejo, o que não deixa de ser um fator positivo. Desde o inicio do tratamento, os
fumantes deveriam ser orientados a terem uma dieta mais adequada a esta fase e estimulados
a realizar exercício físico. Estas simples medidas poderiam ajudá-los a não ganhar peso.
34 - Qual farmacoterapia temos disponível para uso no tratamento do tabagismo?
As bases da terapia contra o tabagismo são as medidas cognitivo-comportamentais. Contudo,
algumas medicações são eficazes em auxiliar o indivíduo que quer parar de fumar, e podem
ser divididas em medicamentos nicotínicos e não-nicotínicos.
• Medicamentos nicotínicos: ou terapia de reposição de nicotina (TRN). Consiste em
formas de liberação lenta (adesivos, gomas de mascar) e rápida (aerossol, inalador) de
nicotina. As formas de liberação rápida ainda não são disponíveis no nosso mercado.
• Medicamentos não-nicotínicos: são os antidepressivos bupropiona e nortriptilina, o antihipertensivo clonidina e uma nova medicação, vareniclina (ainda não disponível
comercialmente no Brasil), desenvolvida exclusivamente para o tratamento do
tabagismo.
35 - Quais os critérios para utilização da farmacoterapia?
A terapia de reposição de nicotina e a bupropiona são consideradas drogas de 1ª linha e
devem ser usadas preferencialmente, o mesmo deverá ocorrer com a vareniclina quando
estiver disponível comercialmente no Brasil. A nortriptilina e a clonidina são medicamentos de
2ª linha e somente são indicadas após insucesso das medicações de 1ª linha.
Para a prescrição de medicação, o Ministério da Saúde e o INCA recomendam que o indivíduo
se enquadre em pelo menos uma das categorias abaixo:
• fumantes, com história de 20 ou mais cigarros ao dia;
• fumantes de mais de 10 cigarros ao dia no mínimo, mas que fumam o 1º cigarro até 30
minutos após acordar;
• fumantes com escore de Fageström igual ou maior que 5, ou avaliação individual, a
critério do profissional;
• fumantes que já tentaram parar de fumar anteriormente apenas com a abordagem
cognitivo-comportamental, mas não obtiveram êxito devido aos sintomas da síndrome
de abstinência;
• não haver contra-indicações clinicas (condição obrigatória).
Inicialmente deve-se optar por uma medicação de 1ª linha, sendo a escolha de acordo com a
avaliação individual do paciente pelo profissional de saúde. Em caso de falha, a associação de
goma de mascar ou adesivo com a bupropiona, ou até mesmo de goma de mascar com
adesivo de nicotina aumenta as taxas de sucesso. Deve ser lembrado que a associação de
bupropiona com terapia de reposição de nicotina pode levar a hipertensão arterial. Nestes
casos a pressão deve ser monitorizada e, em caso de hipertensos, a associação de duas
formas de reposição de nicotina pode ser preferível.
Devido os efeitos colaterais e poucos estudos científicos, a clonidina e a nortriptilina só devem
ser usadas em caso de falha da medicação de primeira linha e sob supervisão médica.
36 - Como funciona a bupropiona?
A bupropiona foi desenvolvida como um medicamento antidepressivo, mas ao longo do tempo
constatou-se que as pessoas que faziam uso dela diminuíam muito a vontade de fumar.
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Atualmente, a sua indicação é, basicamente, como adjuvante para o tratamento antitabagismo.
O mecanismo exato de como a bupropiona age diminuindo a vontade de fumar não é
totalmente conhecido. Este medicamento é um inibidor da recaptação da norepinefrina, da
serotonina e da dopamina pelas células nervosas, fazendo crer, portanto, que seu mecanismo
de ação esteja associado aos sistemas dopaminérgicos ou noradrenérgicos. Estudos em ratos
expostos por longo tempo a bupropiona mostraram uma concentração aumentada de
dopamina no interstício do nucleus accumbens. Este aumento de dopamina é um componente
da via de "recompensa" e poderia ser responsável pela diminuição da vontade de fumar que é
associada ao vício da nicotina. Por outro lado, já se demonstrou que a bupropiona diminui a
ativação dos neurônios noradrenérgicos no locus ceruleus de ratos, que seria a responsável
pela diminuição dos sintomas da síndrome da abstinência.
37 - Existem contra-indicações para o uso de bupropiona?
A bupropiona está indicada para fumantes acima de 18 anos. Ela está contra-indicada em
pacientes que têm história de convulsão, doenças cérebro-vasculares, tumor do sistema
nervoso central, convulsão febril na infância, alcoólatra em fase de retirada do álcool, anorexia
nervosa e bulimia. Há um risco maior que o normal destes indivíduos apresentarem
convulsões. Como a incidência de convulsões é diretamente relacionada à dose de
bupropiona, os fumantes em uso de qualquer outro medicamento que tenha bupropiona em
sua fórmula deveriam utilizar outro método para o tratamento antitabágico. Não se deve
administrar bupropiona a pacientes que estão recebendo ou receberam, há menos de 15 dias,
inibidores da monoaminooxidase (IMAO).
Em casos de hipertensão arterial, não há contra-indicação, apenas um maior rigor no controle
da pressão deve ser adotado devido ao risco de elevação ser maior.
38 - Como se usa a bupropiona?
A bupropiona é vendida em caixas de 60 comprimidos de 150 mg. Do primeiro ao terceiro dia
de tratamento deve ser prescrito um comprimido ao dia, a partir do quarto dia altera-se a
posologia para dois comprimidos diários com intervalo mínimo de oito horas entre as doses.
Deve-se evitar tomar a medicação próxima à hora de dormir. A partir do oitavo dia de
tratamento o paciente deve interromper completamente com o tabagismo.
As vantagens da bupropiona são o seu uso oral, que traz maior aderência ao tratamento, e a
não reposição de nicotina. A sua desvantagem é justamente a não reposição da nicotina, que é
a responsável pela dependência física e a causadora da síndrome de abstinência.
A associação dos dois medicamentos é recomendável, de acordo com a observação da
evolução dos pacientes. Deve-se ter sempre em mente que o deixar de fumar é bastante
desagradável para a maioria dos fumantes e não há razão em deixá-los sofrer. Com certeza, o
uso da bupropiona e a reposição de nicotina tornam muito mais aceitável o ato de cessar de
fumar.
39 - O que é uma terapêutica de reposição de nicotina?
É aquela que tem por objetivo diminuir o quadro da síndrome de abstinência, aumentando a
aderência do paciente ao seu propósito de parar de fumar. O uso de qualquer um dos modos
de reposição de nicotina dobra o índice de sucesso ao longo do tempo, em relação ao uso de
placebo.
40 - Como se usa a terapêutica de reposição de nicotina?
No nosso meio, há dois modos para se repor a nicotina, o adesivo transcutâneo e a goma de
mascar.
• Adesivo transcutâneo: os adesivos do mercado contêm 21, 14 ou 7 mg de nicotina.
Eles são colocados sobre a pele uma vez ao dia e liberam a nicotina lenta e
constantemente durante as 24 horas. Ao contrário do cigarro, que promove um pico de
alta concentração no sangue arterial e cérebro, a concentração plasmática de nicotina
pelo adesivo sobe menos rapidamente e não alcança o mesmo pico, mantendo a
concentração estável durante o dia;
• Goma de mascar: a goma é apresentada na forma de tabletes mastigáveis, tendo
como componente ativo 2 mg de nicotina na forma de resinato. A concentração
plasmática de nicotina por uso de goma de mascar é mais baixa que a do adesivo e o
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seu pico é alcançado em um tempo mais longo que o do adesivo. A absorção é
diminuída com bebidas e café.
O grupo que mais vai ser beneficiado com a reposição de nicotina é o de fumantes de mais de
15 cigarros ao dia (não se tem um bom termo, alguns chamam de fumantes pesados, que não
achamos que seja adequado) e os pacientes que já tentaram parar anteriormente e tiveram
dificuldade pela síndrome da abstinência.
Deve-se lembrar que em torno de 80 a 90% das pessoas que deixam de fumar o fazem por
decisão própria e sem auxílio de qualquer droga. No entanto, é nossa opinião que, uma vez
existindo no mercado métodos de reposição de nicotina, eles sempre deveriam ser utilizados
para abrandar os sintomas de síndrome de abstinência. Por outro lado, deve ficar claro que a
terapia de reposição de nicotina não é milagrosa e o seu sucesso aumenta muito com
aconselhamento e acompanhamento por um profissional com experiência na área cognitivocomportamental.
41 - Como deve ser usada a goma de mascar de nicotina e quais as suas vantagens?
O tablete deve ser colocado na boca e mastigado até que ele sinta um gosto amargo de
nicotina ou formigamento na boca. Neste momento a nicotina está sendo liberada e o fumante
deve parar de mastigar e acomodar o tablete entre a gengiva e a bochecha. No momento em
que o sabor ou o formigamento desaparece, ele deve voltar a mastigar o tablete até sentir o
mesmo efeito. Este procedimento deve-se repetir por 25-30 minutos. Um tablete deveria ser
utilizado a cada 1 ou 2 horas, ou de acordo com a necessidade. O uso pode ser programado
para ser decrescente ao longo de três meses. Uma proposta do Ministério da Saúde e do INCA
é a seguinte:
• pacientes que fumam até 20 cigarros/dia e fumam seu 1º cigarro nos primeiros 30
minutos após acordar
o semana 1 a 4: 1 tablete 2 mg a cada 1 a 2 horas
o semana 5 a 8: 1 tablete 2 mg a cada 2 a 4 horas
o semana 9 a 12: 1 tablete 2 mg a cada 4 a 8 horas
• pacientes que fumam mais de 20 cigarros/dia:
o semana 1 a 4: 2 tabletes 2 mg a cada 1 a 2 horas
o semana 5 a 8: 1 tablete 2 mg a cada 2 a 4 horas
o semana 9 a 12: 1 tablete 2mg a cada 4 a 8 horas
A grande vantagem da goma é que ela é usada de forma específica, o fumante masca quando
sente necessidade.
42 - O fumante pode ficar viciado no uso da goma de mascar com nicotina?
Pode. Há relatos que até 10% dos que utilizam esse método podem ter dificuldade em deixar a
goma. É difícil saber se ele criou um novo vício ou se está mantendo sua dependência à
nicotina. De qualquer modo, a concentração plasmática que é alcançada com o uso do tablete
com nicotina é bem mais baixa que a alcançada pelo uso do cigarro e, além disso, deve-se
sempre pensar que o tablete não possui as outras 4.700 substâncias que o cigarro tem. A
nicotina causa dependência, mas não está associada às outras 30 ou 40 substâncias que
causam câncer, por exemplo.
43 - Há contra-indicações do uso de goma de mascar de nicotina?
Sim. Incapacidade de mascar, úlcera péptica, período de 15 dias após episódio de infarto
agudo do miocárdio. Em caso de gestantes, é preferível usar a goma que o adesivo, devido ao
nível contínuo de nicotina proporcionado pelo adesivo.
44 - Como deve ser utilizado o adesivo transcutâneo de nicotina na terapêutica de
reposição e quais as suas vantagens e desvantagens?
O adesivo é colocado diariamente, pela manhã, e trocado a cada 24 horas. Há uma absorção
de 0,9 mg de nicotina por hora. Deve ser aplicado em uma região do corpo sem pêlos, para
que possa ficar bem aderido e o local deve ser trocado a cada dia para evitar irritação cutânea.
O efeito adverso mais comum é o prurido local, que é freqüente nos primeiros dias e tende a se
abrandar e desaparecer logo após as primeiras aplicações. É incomum que o paciente não
suporte seu uso diário. Efeitos colaterais menos freqüentes são insônia e pesadelos. O fumante
deveria ser recomendado, explicitamente, para não fumar durante o uso do adesivo para não
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ocorrer superconcentração plasmática de nicotina. Deve-se começar com adesivo de
concentração mais alta e trocar para o adesivo com concentração abaixo a cada quatro
semanas. O tratamento deve durar, em média, doze semanas. O uso mais prolongado pode
ser mantido se houver necessidade.
A vantagem do adesivo é sua liberação contínua, sem o inconveniente de se ter que mastigar o
tablete (pode-se estar no meio de uma reunião ou em algum outro local que não seja possível
o seu uso). Por outro lado, a concentração constante promovida pelo adesivo não reflete as
flutuações da concentração plasmática pelo uso do cigarro, que parece ser um fator de
satisfação.
45 - Qual a posologia do adesivo transcutâneo e suas contra-indicações?
Pacientes com escore de Fageström entre 8 e 10, e/ou fumante de mais de 20 cigarros por dia,
utilizar:
• semana 1 a 4: adesivo de 21 mg a cada 24horas
• semana 5 a 8: adesivo de 14 mg a cada 24horas
• semana 9 a 12: adesivo de 7 mg a cada 24horas
Pacientes com escore de Fageström entre 5 a 7, e/ou fumantes de 10 a 20 cigarros por dia e
que fumam seu primeiro cigarro nos 30 primeiros minutos após acordar, utilizar:
• semana 1 a 4: adesivo de 14 mg a cada 24horas
• semana 5 a 8: adesivo de 7 mg a cada 24horas
O adesivo é contra-indicado em casos de doenças dermatológicas que impeçam sua aplicação,
período de 15 dias após episódio de infarto agudo do miocárdio, gestação e amamentação.
46 - Como age a vareniclina no tratamento do tabagismo?
A vareniclina é um agonista parcial dos receptores nicotínicos colinérgicos subtipo alfa4beta2,
localizados no sistema nervoso central (SNC). Os efeitos da nicotina responsáveis pelo
desenvolvimento da dependência parecem ser mediados em parte pela ação agonista da droga
sobre esses receptores. A ativação dos receptores alfa4beta2 pela nicotina aumenta a
liberação de dopamina no nucleus accumbens e no córtex pré-frontal, efeito comum à maioria
das substâncias que geram dependência, embora a via neurotransmissora seja distinta. A
vareniclina apresenta alta afinidade para esses receptores, porém os ativa apenas
parcialmente, ou seja, promove a liberação de apenas 30 a 60% da quantidade de dopamina
que normalmente é liberada pela estimulação da nicotina. A cessação do tabagismo gera
redução significativa de dopamina no sistema límbico, situação que tem sido associada à
fissura e à síndrome de abstinência, levando o indivíduo a buscar o cigarro. Assim, o aumento
sustentado e moderado de dopamina no SNC alcançado com a vareniclina seria capaz de
contrabalançar esses efeitos negativos da queda de dopamina no SNC. Adicionalmente, a
vareniclina ao se ligar aos receptores alfa4beta2 compete com a nicotina bloqueando a sua
ação sobre esses receptores colinérgicos, de tal maneira que a nicotina não produziria
elevação dos níveis de dopamina e consequentemente o cigarro deixaria de provocar a
sensação de prazer habitualmente experimentada por quem fuma.
47 - Quais são os resultados dos estudos clínicos envolvendo a vareniclina no
tratamento do tabagismo?
A eficácia e segurança da vareniclina foram testadas em diversos estudos clínicos envolvendo
mais de cinco mil indivíduos tabagistas.
Em estudo randômico, duplo-cego, controlado por placebo, Oncken e colaboradores avaliaram
a eficácia de diferentes esquemas posológicos com vareniclina. Seiscentos e quarenta e sete
fumantes participaram do estudo, sendo que os resultados mostraram que a parcela de
pacientes que se absteve totalmente do tabaco no período compreendido entre a 9ª e 12ª
semana de tratamento foi significativamente maior no grupo que recebeu a vareniclina quando
comparado com o grupo placebo (p < 0,001). 40 semanas após o tratamento, a taxa de
indivíduos que permaneceram abstinentes também foi maior nos grupos de vareniclina (p <
0,001).
Dois grandes estudos randômicos, duplo-cegos e controlados por placebo compararam a
eficácia da vareniclina e da bupropiona em relação á cessação do tabagismo. Gonzáles e
Jorenby avaliaram respectivamente 1.025 e 1.027 tabagistas. Os pacientes receberam o
tratamento medicamentoso por 12 semanas, e foram acompanhados por mais 40 semanas
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após o término da farmacoterapia. Em ambos os estudos a vareniclina foi significativamente
mais eficaz do que o placebo em relação á cessação do tabagismo, independente do período
avaliado. Quando comparada com a bupropiona, as taxas de abstinência do tabagismo, nos
períodos compreendidos entre a 9ª e 12ª semanas e entre a 9ª e 24ª semanas, foram
estatisticamente superiores no grupo de pacientes que receberam a vareniclina em ambos os
estudos. Quando se avaliou todo o período de acompanhamento, ou seja, entre a 9ª e 52ª
semana, os resultados mostraram que as taxas de abstinência do tabagismo foram superiores
entre os pacientes tratados com a vareniclina, embora a significância estatística somente foi
atingida no estudo de Jorenby (23% com a vareniclina vs 14,6% com a bupropiona, p= 0,004).
Não há ainda estudos avaliando a associação da vareniclina com outras modalidades
farmacológicas no tratamento do tabagismo.
48 - Quais são os eventos adversos relacionados ao uso da vareniclina?
Os estudos mostraram que a vareniclina foi uma droga segura e geralmente bem tolerada. Os
eventos adversos que ocorreram com maior freqüência entre os pacientes tratados com a
vareniclina foram: náuseas, insônia, cefaléia e sonhos anormais. A tabela abaixo mostra os
eventos adversos que ocorreram com freqüência superior a 5%, entre os pacientes que
receberam vareniclina, no estudo de Gonzáles:
Tabela 5. Eventos adversos mais freqüentes entre pacientes tratados com
vareniclina.
Evento adverso
Grupo vareniclina
Grupo bupropiona
Grupo placebo
Gastrintestinal
Náusea
28,1%
12,5%
8,4%
Boca seca
6,6%
8,8%
5,5%
Flatulência
5,7%
4,3%
2,9%
Constipação
5,4%
7,0%
3,8%
Psiquiátrico
Insônia
14,0%
21,9%
12,8%
Sonhos anormais
10,3%
5,5%
5,5%
Irritabilidade
6,0%
5,2%
5,8%
Distúrbio do sono
5,7%
4,0%
3,8%
Neurológico
Cefaléia
15,5%
14,3%
12,2%
Vertigem
6,0%
5,8%
5,8%
As náuseas foram classificadas, de acordo com a sua intensidade, em leve/moderada na
grande maioria dos pacientes que receberam a vareniclina, além de apresentar caráter
transitório (predominaram nas primeiras duas semanas de tratamento). A descontinuação do
tratamento com vareniclina devido ás náuseas variou de 2,3% a 4,0% nos diferentes estudos.
Quando se avaliou a descontinuação do tratamento devido a qualquer evento adverso,
verificou-se que tal fato foi mais freqüente entre os pacientes que receberam bupropiona do
que naqueles que receberam vareniclina.
49 - Como se prescreve a vareniclina para o tratamento do tabagismo?
Em maio de 2006, o FDA (órgão dos EUA que é responsável, entre outras coisas, pela
vigilância farmacológica) aprovou a vareniclina para o tratamento do tabagismo, com a seguinte
posologia:
• Dias 1 a 3: 0,5 mg uma vez ao dia;
• Dias 4 a 7: 0,5 mg duas vezes ao dia;
• A partir do 8º dia até o fim do tratamento: 1,0 mg duas vezes ao dia.
O paciente deve ser orientado a interromper com o cigarro no oitavo dia de tratamento. Os
pacientes que apresentam eventos adversos mais intensos podem ter a posologia reduzida
temporariamente para 0,5 mg duas vezes ao dia. A duração do tratamento na maioria dos
estudos foi de 12 semanas, sendo que em um ensaio clínico desenvolvido por Tonstad a
extensão do tratamento por mais 12 semanas reduziu a taxa de recaída após um ano do início
da terapêutica.
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50 - Como proceder nos casos de gestantes e nutrizes que fumam?
As gestantes devem ter atenção especial na abordagem cognitivo comportamental. Em casos
de falha, devem ser pesados o malefício do cigarro e o uso de medicações para a cessação do
tabagismo. A farmacoterapia traz riscos para o feto. A terapia de reposição de nicotina com
goma de mascar deve ser preferida, devido aos níveis mais baixos de nicotina, ao contrário dos
níveis séricos mais altos e constantes dos adesivos transcutâneos.
51 - Existe algum estudo sobre o uso de "vacina" antifumo?
Um laboratório inglês de biotecnologia, Xenova Plc, está desenvolvendo um produto, TA-NIC®,
que gera anticorpos que se ligam à nicotina. A idéia por trás deste produto é de prevenir que a
nicotina alcance o cérebro e desenvolva o vicio. Os primeiros estudos em humanos já foram
realizados. Os 60 voluntários que tomaram parte na fase I deste ensaio clínico receberam uma
injeção de TA-NIC a cada duas semanas. Ainda existe um longo caminho a ser percorrido
nesta pesquisa e, caso este produto mostre-se seguro e eficaz, ele só viria a entrar no mercado
após 2006.
52 - Os cigarros light são menos nocivos à saúde?
Os cigarros light têm concentração mais baixa de nicotina, alcatrão e monóxido de carbono e,
teoricamente, poderiam ser menos nocivos aos fumantes. No entanto, o que faz a pessoa
dependente fumar é a necessidade de manter uma determinada concentração de nicotina
plasmática. Assim, os fumadores de cigarros light tendem a fumar um maior número de
cigarros ou a inalar mais profundamente a fumaça. Além disto, ainda permanecem no cigarro
substâncias cancerígenas.
53 - Leitura recomendada
Anderson JE et al. Treating tobacco use and dependence. An evidence-based clinical practice
guideline for tobacco cessation. Chest 2002;121:932-941.
Brasil. Ministério da Saúde. Instituto Nacional do Câncer – INCA. Coordenação de Prevenção e
Vigilância (CONPREV). Abordagem e tratamento do fumante – Consenso 2001. Rio de Janeiro:
INCA, 2001 38p. il.
Coe JW, Brooks PR, Vetelino MG et al. Varenicline: an alfa4beta2 nicotinic receptor partial
agonist for smoking cessation. J Med Chem 2005; 48:3474-3477.
Doll, R., Peto, R., Wheatley, K. e col. Mortality in relation to smoking: 40 years' observations on
male British doctors. BMJ; 1994, 309: 901-911.
Gonzales D, Rennard SI, Nides M et al. Verenicline, an alfa4beta2 nicotinic acetylcholine
receptor partial agonist, vs sustained-release bupropion and placebo for smoking cessation. A
randomized controlled trial. JAMA 2006; 296:47-55.
Jorenby DE, Hays JT, Rigotti Na et al. Efficacy of varenicline na alfa4beta2 nicotinic
acetylcholine receptor partial agonist, vs placebo or sustained-release bupropion for smoking
cessation. A randomized controlled trial. JAMA 2006; 296:56-63.
Jorenby, D. E., Leischow, S. J., Nides, M. A. e col. A controlled trial of sustained-release
bupropion, and nicotine patch, or both for smoking cessation. New Eng. J. Med; 1999, 340: 685691.
Raw, M., McNeill, A., West, R. Smoking cessation guidelines for health professionals. Thorax;
1998, 53: S1-S38.
Rigotti NA. Treatment of tobacco use and dependence. N. Engl. J. Med. 2002;346:506-512.
Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. Diretrizes para cessação do tabagismo.
Jornal Brasileiro de Pneumologia 2004; 30 (Supl 2):S1-S76.
Tang, J. L., Law, M., Wald, N. How effective replacement therapy in helping people to stop
smoking? BMJ; 1994, 308: 21-26.
Tonstad S, Tonnesen P, Hajek P et al. Effect of maintenance therapy with varenicline on
smoking cessation. A randomized controlled trial. JAMA 2006; 296:64-71.
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