FEBRASGO - Manual de Perinatologia
MANUAL DE PERINATOLOGIA
Federação Brasileira das Associações de
Ginecologia e Obstetrícia
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Vice-Presidente Região Sudeste:
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Diretor de Defesa Profissional:
Hélcio Bertolozzi Soares
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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Preparada pela Biblioteca da
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
©reprodução autorizada pelo auto
Manual
de
perinatologia
/
[coordenado
por]
Eduardo
Sérgio Valério Borges da Fonseca. – São Paulo : Federação
Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia, 2013.
118 p.
1.Perinatologia. 2. Pré-termo. 3. Perinatologia (Ética) I.
Fonseca, Eduardo Sérgio Valério Borges da. II. Federação Brasileira das
Associações de Ginecologia e Obstetrícia.
NLM WQ210
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Federação Brasileira das Associações de
Ginecologia e Obstetrícia
MANUAL DE ORIENTAÇÃO
Comissão Nacional de Perinatologia
Presidente: Eduardo Sérgio Valério Borges da Fonseca (PB)
Vice-Presidente: Jorge Fonte de Rezende Filho (RJ)
Secretário: Patricia Costa Fonseca Meirelles Bezerra (RN)
Membros
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Frederico Vitório Lopes Barroso (MA)
Keila Santos Pereira (GO)
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Glaucio de Moraes Paula (RJ)
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Belmiro Gonçalves Pereira (SP)
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Ricardo Porto Tedesco (SP)
Roberto Eduardo Bittar (SP)
Marcos Takimura (PR)
Edson Nunes de Morais (RS)
Comissão Nacional de Medicina Fetal
Presidente: Renato Augusto Moreira de Sá (RJ)
Vice-Presidente: Antonio Fernandes Moron (RJ)
Secretário: Coridon Franco da Costa (ES)
Membros
Lilian Cristina Caldeira Thomé (PA)
Antonio Carlos Vieira Lopes (BA)
Franscisco Herlânio Costa Carvalho (CE)
Alex Sandro Rolland de Souza (PE)
Ernesto Antonio Figueiro Filho (MS)
Marcos Murilo de Lima Faria (MG)
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Outros Colaboradores
Fernanda Campos da Silva
Mário Júlio Franco
Regina Amélia Pessoa de Aguiar
Sidney Garcia
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Todo conteúdo deste manual de orientações pode ser encontrado
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Índice
Seção 1
Perinatologia e cuidados antenatais
Perinatologia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9
Avaliação pré-concepcional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12
Genética para o obstetra: bases do aconselhamento genético . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25
Seção 2
Complicações maternas e obstétricas: prevenção, diagnóstico e conduta
Prematuridade: aspectos relevantes na paciente assintomática . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Prematuridade: aspectos relevantes na paciente sintomática . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Prematuridade: vitabilidade, viabilidade e via de parto . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Corticoterapia antenatal: quando e como indicar? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Rotura prematura das membranas ovulares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Restrição de crescimento fetal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Encefalopatia hipóxico-isquêmica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Manejo do terceiro período do parto: prevencão e tratamento da hemorragia pós-parto . . .
45
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76
82
91
99
Seção 3
Parto em situações especiais
Parto do feto com restrição de crescimento fetal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Parto do feto macrossômico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Parto do feto portador de malformações congênitas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Parto do feto pós-termo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Parto na gestação gemelar . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Anestesia: efeitos sobre o concepto . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
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111
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Seção 4
Ética em perinatologia
Aspectos importantes da ética em perinatologia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Interrupção eletiva da gestação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Cirurgia materna de urgência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Prematuridade extrema - limite da viabilidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Procedimentos invasivos para tratamento ou diagnóstico
materno e/ou fetal durante a gestação e conflitos éticos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
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MANUAL DE PERINATOLOGIA
APRESENTAÇÃO
A Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e
Obstetrícia, numa ação conjunta das comissões nacionais de
medicina fetal e perinatologia, traz esta versão revisada do
MANUAL DE PERINATOLOGIA, abordando temas importantes na
prevenção da mortalidade e morbidade neonatal. Nosso objetivo
é, através de informações atualizadas, proporcionar uma base
para a racionalização do emprego dos melhores conhecimentos,
incluindo os métodos diagnósticos e terapêuticos em situações
clínicas específicas.
Este manual não se destina a exaurir todas as possibilidades
existentes em cada tema abordado; tampouco pretende substituir
o raciocínio clínico que, como se sabe, é elemento de relevância
ímpar na prática clínica. Assim, constitui-se apenas em fonte de
consulta e, dentro do possível, em um documento normalizador.
De forma didática, este manual, dividido em quatro seções, tem
por objetivo servir como roteiro para a condução de situações
frequentes na perinatologia, buscando melhorar a qualidade da
vida desde seu início, alicerçado no cuidado fetal e neonatal.
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Seção 1
Perinatologia e cuidados antenatais
PERINATOLOGIA
A morte fetal, do recém-nascido ou de uma mulher na gravidez ou no parto, constitui-se
sempre em uma tragédia. A redução destas mortes precoces faz parte das metas do milênio
da ONU. Estas mortes decorrem, no mais das vezes, de uma combinação de fatores biológicos, sociais, culturais e de falhas no sistema de saúde. As causas diretas de morte materna,
fetal e neonatal, ou seja, a situação clínica final, decorre de uma sequência de eventos prejudiciais ao longo do ciclo de vida, assim como das etapas da assistência da saúde.
O termo perinatologia foi introduzido em 1936 por um pediatra alemão, Pfaundler, para
definir um período em torno do nascimento, caracterizado por alta mortalidade fetal e neonatal, mas com causa de morte diferente das observadas em crianças mais velhas. O período
fetal e o neonatal são, portanto, os períodos estudados na perinatologia.
Comparações internacionais de mortalidade neonatal e perinatal e seus componentes são
de grande importância. Esta informação procura identificar problemas, desafios temporais
e geográficos e diferenças, além de facilitar a proposta de mudanças na política de saúde
pública e na sua prática. Uma terminologia precisa se faz necessária para descrever todos os
eventos associados com os resultados perinatais. O período fetal estudado na perinatologia
se inicia com 22 semanas completas (154 dias de gestação) e se estende até o parto. O período neonatal, por sua vez, corresponde ao decorrido do nascimento até o sétimo dia de vida
(período neonatal precoce). Assim, o período perinatal se inicia com 22 semanas completas
(154 dias) de gestação, que corresponde a um peso fetal estimado de 500g, até o sétimo dia
de vida (Figura 1).
Figura 1: Esquema sumarizando algumas definições usadas em perinatologia
Mortalidade fetal
Precoce
Intermediária
Mortalidade infantil
Tardia
Neonatal
Precoce
Pós-neonatal
Tardia
Mortalidade perinatal
20 semanas
28 semanas
Nascimento
07 dias
28 dias
01 ano
Modificado de Aguiar et al. (2007)
A perinatologia vem sendo alvo de crescente preocupação para a saúde pública no Brasil
desde a década de 1990, quando a mortalidade neonatal passou a responder pela maior
proporção de óbitos infantis (60% a 70%), em decorrência da redução mais acentuada das
mortes no período pós-neonatal (28 dias de vida a um ano). As afecções perinatais são a
primeira causa de mortalidade neonatal e infantil no país, além de corresponderem a 85%
das mortes de menores de 05 cinco anos.
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A mortalidade neonatal precoce representa três quartos das mortes neonatais, cujas origens obstétricas são similares às do natimorto. Considerando-se que a maioria
das mortes ocorre próximo ao momento do parto, o estudo da mortalidade perinatal
constitui um bom indicador da saúde materna e da qualidade do cuidado obstétrico
e neonatal (Tabela 1). Entendem-se como vantagens do uso deste marcador a facilidade de reconhecimento e a especificidade do evento, a possibilidade de agrupamento
das causas de morte fetal e neonatal e o fato de não ser necessário o conhecimento
da causa. Por outro lado, são consideradas desvantagens a falta de informação em
relação às causas evitáveis, os baixos registros em muitas regiões e o fato de não refletir a idade gestacional e o peso ao nascimento.
Tabela 1: Estatística vital
TMF = (NM/TN) X 1.000
TMNP = (MNP/NV) X 1.000
TMP = [(NM+MNP)/TN] X 1.000
TMF - Taxa de morte fetal
NM - Natimorto
TN - Total de nascidos
TMNP - Taxa de morte neonatal precoce
MNP – Mortes neonatais precoces
NV – Nascidos vivos
TMP – Taxa de morte perinatal.
Modificado de Aguiar et al. (2007)
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Leitura complementar
1. LANSKY, S. Perinatologia – Situação Atual e Perspectivas. In: ALVES FILHO, N;
CORRÊA, MD (eds.). Perinatologia Básica. 3ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan,
2006, p. 1-6.
2. CABERO, L; CARRERA, JM (orgs.). Perinatology. 1ª ed. Bologna: Monduzzi, 2001.
3. AGUIAR, RALP; AGUIAR, MLP; ABBAS, AP. Mortalidade Perinatal. In: CHAVES
NETTO, H; MOREIRA DE SÁ, RA. Obstetrícia Básica. São Paulo: Atheneu, 2007, p.
1021-1032.
4. PRUDENT, L. Conflictos Bioéticos en La Relación Maternofetal. El Feto como
Paciente. In: GADOW, EC; FIORILLO, AE. Obstetricia en Esquemas. Buenos Aires: El
Ateneo, 2004, p. 420-424.
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
AVALIAÇÃO PRÉ-CONCEPCIONAL
O cuidado pré-concepcional tem por objetivo primário a promoção da saúde da
mulher em idade reprodutiva antes da concepção para, assim, melhorar os resultados
perinatais, tanto maternos quanto infantis. Sabe-se que diversas intervenções antes
da gestação, que serão abordadas nesta seção, melhoram o desfecho gestacional.
Em linhas gerais, essas intervenções podem ser divididas em quatro categorias:
(1) planejamento familiar; (2) identificação de fatores de risco; (3) intervenções e
aconselhamento; (4) vacinação.
A procura espontânea por avaliação pré-concepcional por parte das mulheres ainda
não é comum no Brasil, já que mais da metade das gestações não são planejadas. Além
disso, ainda temos uma taxa baixa de assistência pré-natal: somente 45,6% das mulheres
tiveram sete ou mais consultas de pré-natal em 2001. É necessária a conscientização,
principalmente do profissional de saúde responsável pela atenção primária, seja ele
médico ou enfermeiro, sobre a importância do cuidado pré-concepcional, incluindo
o planejamento familiar. Muitas dessas gestações não planejadas, ou mesmo a baixa
adesão ao pré-natal, devem-se à falta de orientação adequada. Além disso, para
algumas condições clínicas, iniciar um tratamento após o diagnóstico de gravidez pode
ser tarde demais.
As orientações a seguir têm como meta tornar a avaliação pré-concepcional mais
acessível às mulheres brasileiras, de forma que elas concebam com maior planejamento
e gozando de boa saúde, reduzindo os riscos e as complicações perinatais.
1. PLANEJAMENTO FAMILIAR
Toda mulher em idade reprodutiva, ao frequentar qualquer consulta médica,
deveria ser questionada sobre seu planejamento reprodutivo. É a oportunidade
de se abordarem questões como o desejo de ter ou não filhos, número de filhos
e o momento e o espaçamento entre as gestações. A consulta incluiria também
orientação sobre contracepção para alcançar esse plano, como melhorar a saúde
para aumentar o sucesso da gestação e aconselhamento sobre riscos relacionados à
idade. Os principais objetivos do planejamento familiar são expostos a seguir:
Objetivos:
•
Orientação em relação ao planejamento da vida reprodutiva da mulher, incluindo a contracepção,
especialmente nos grupos de risco (adolescentes, portadoras de doenças crônicas).
•
Diminuir gestações não planejadas e abortos provocados.
•
Diminuir taxa de cesarianas para ligadura tubária.
•
Aumentar o intervalo interpartal.
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2. IDENTIFICAÇÃO DE FATORES DE RISCO GESTACIONAIS:
Durante o período pré-concepcional, alguns fatores de risco para a gestação, seja
para a mãe ou para o feto, podem ser identificados e muitas vezes corrigidos. Uma
avaliação de risco pré-concepcional deve considerar:
•
Avaliação pessoal de risco
•
•
•
História pessoal e familiar, exame clínico e rastreamento laboratorial
Prevenção
•
Planejamento familiar
•
Nutrição, suplementos, controle do peso e exercícios
•
Vacinação
Riscos individuais
•
Doenças crônicas
•
Uso de medicações
•
Abuso de substâncias, exposição ambiental
Muitas comorbidades clínicas são agravadas pela gestação ou pioram o prognóstico
da gestação em si. É importante que na concepção as mulheres estejam na sua melhor
condição clínica. As diabéticas, por exemplo, precisam de um bom controle glicêmico,
da suspensão de hipoglicemiantes orais e de uma avaliação do seu estado de saúde,
já que aquelas com nefropatia podem ser desaconselhadas a engravidar. O controle
glicêmico adequado parece diminuir em três vezes o risco de abortamento espontâneo
ou malformações congênitas. Em outras doenças, as drogas usadas para controle são
sabidamente teratogênicas, como o ácido valproico e os anticoagulantes orais.
Além de doenças crônicas, muitas mulheres que engravidam têm comportamento de
risco, ou seja, hábitos que sabidamente afetam a gestação, como: o fumo, que tem
relação com parto prematuro e baixo peso; o consumo de álcool que está ligado à
síndrome alcoólica fetal, uma das maiores causas de retardo mental; o uso de algumas
substâncias lícitas ou ilícitas; ou um comportamento sexual com risco de exposição a
doenças sexualmente transmissíveis.
É interessante uma abordagem com questionário a ser respondido pela própria paciente,
talvez antes mesmo do início da consulta, para que o rastreio de fatores de risco seja
completo, a fim de que o aconselhamento e as intervenções sejam melhor direcionados
(Quadro 1). A identificação de algum fator de risco impõe que este seja mais bem detalhado na anamnese, no exame físico e, possivelmente, em exames complementares.
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Quadro 1: Formulário de avaliação de risco pré-concepcional
Nome:
Data:
Sim
Não
1. A senhora pretende engravidar no próximo ano?
2. Acha que está acima ou abaixo do peso?
3. Realiza atividade física regular?
4. Está realizando alguma dieta especial (por exemplo, vegetariana, redução de peso)?
5. Ingere mais que três xícaras de café por dia?
6. Fuma?
7. Faz uso de bebida alcoólica?
8. Faz uso de drogas ilícitas?
9. Faz uso regular de alguma medicação? Qual?
10. Tem alergia a alguma medicação?
11. Tem alguma doença crônica, como hipertensão arterial, diabetes mellitus ou disfunção de tireoide?
12. Teve algum episódio de infecção urinária nos últimos três anos?
13. Teve catapora ou rubéola?
14. Já ouviu falar em toxoplasmose e suas formas de transmissão?
15. Fica exposta a infecções ou agentes químicos no trabalho?
16. Já sofreu abuso físico, mental ou sexual?
17. Tem história familiar de defeitos congênitos ou doenças hereditárias?
18. Teve três ou mais perdas gestacionais por abortamento?
19. Teve alguma perda gestacional após 14 semanas?
20. Teve algum problema de saúde na gestação anterior? Diabetes mellitus? Hipertensão arterial?
21. Algum filho anterior nasceu prematuro (antes de 37 semanas)?
22. Algum filho anterior foi encaminhado à UTI neonatal após o nascimento?
23. Já teve sífilis?
24. Já foi testada para HIV?
25. Já teve herpes oral ou genital?
26. Já foi vacinada para hepatite B e rubéola?
3. INTERVENÇÕES E ACONSELHAMENTO
Uma história clínica e exame físico completos são fundamentais para a decisão das
intervenções e do aconselhamento. Algumas intervenções e exames laboratoriais devem
ser realizados de forma rotineira para completar a avaliação de risco pré-concepcional.
No entanto, a identificação de fatores de risco pelo questionário proposto implica em
ações de aconselhamento e intervenções específicas em relação à história clínica e
obstétrica pregressas, hábitos sociais e história familiar.
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NUTRIÇÃO, PESO E EXERCÍCIOS
Hábitos de vida e de dieta saudáveis e exercícios físicos regulares devem ser iniciados
antes da concepção. Essas medidas podem evitar complicações na gestação, como
diabetes gestacional e hipertensão arterial. Dentre as orientações dietéticas, é importante
o cozimento adequado das carnes e peixes, lavagem exaustiva de verduras e frutas e
ingestão de ovos e laticínios pasteurizados. Em relação ao peso, mulheres com índice de
massa corpórea (IMC) fora da faixa normal (19 a 25) devem ser aconselhadas em especial.
Naquelas com baixo peso, deve ser investigada a possibilidade de bulimia ou anorexia,
e naquelas com sobrepeso, a alternativa de redução de peso. O exercício físico deve ser
estimulado na pré-concepção. Exemplos de atividades que podem ser continuadas na
gestação incluem: ioga, caminhada, corrida, natação, andar de bicicleta, entre outros. A
atividade física deve ser realizada por 30 a 60 minutos, cinco vezes ou mais por semana.
SUPLEMENTOS
A suplementação com benefício mais estabelecido é o ácido fólico na dose de 400μg/
dia para a prevenção de defeitos do tubo neural (DTN). Essa suplementação deve ser
iniciada 30 dias antes da concepção e mantida por dois ou três meses após. Ela reduziu
em 93% a incidência de DTN.
Em mulheres que já tiveram uma gestação com feto com DTN, a dose deve ser de 4 mg/dia,
o que reduziu a reincidência em 69%. O uso do ácido fólico também parece diminuir
a incidência de defeitos cardíacos e fendas faciais. Desde 2002, a lei brasileira obriga a
adição de ácido fólico nas farinhas de trigo e de milho, sendo a proporção de 150μg
de ácido fólico a cada 100g de farinha, na tentativa de reduzir a incidência dessas
malformações. Em 2012, a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia
e Obstetrícia fez uma recomendação formal que incluía as recomendações acima
descritas, a exemplo de organismos internacionais como a Organização Mundial
de Saúde (OMS), o Congresso Americano de Obstetras e Ginecologistas (ACOG), o
Colégio Real de Obstetrícia e Ginecologia (RCOG), entre outros.
DOENÇAS INFECCIOSAS
Busca-se o estado sorológico das mulheres em relação a doenças infecciosas que
tenham algum tipo de repercussão negativa sobre a gestação. O Quadro 2 resume o
rastreio e o aconselhamento em relação a doenças infecciosas.
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Quadro 2: Doenças infecciosas e pré-concepção
Doença
HIV
Força de
evidência
A
Qualidade da
evidência
Recomendação
I-b
Todo casal deve ser encorajado a saber seu
estado sorológico para HIV. Caso negativo,
orientar sobre formas de transmissão. Caso
positivo, orientar sobre risco de transmissão
vertical, oferecer contracepção. Caso opte por
gestar, iniciar tratamento antes da concepção.
Não há evidência de que o rastreamento
universal para hepatite C melhore o desfecho
gestacional. Mulheres com alto risco devem
ser testadas. As com sorologia positiva devem
ser aconselhadas sobre risco para a saúde
e transmissão, as que estão em tratamento
devem ser desaconselhadas de gestar.
Hepatite C
C
III
Tuberculose
B
II-2
Mulheres com alto risco devem ser rastreadas e
tratadas antes da gestação.
Não há evidência clara de que o
aconselhamento e o rastreamento reduzam a
infecção. Quando testadas, aquelas positivas
podem ser confortadas de que não estão em
risco de aquisição na gestação. As negativas
devem ser aconselhadas sobre formas de
transmissão.
Toxoplasmose
C
III
Citomegalovírus
C
II-2
Listeriose
C
III
Aconselhar mulheres a evitar patês e queijo
fresco produzido com leite não pasteurizado e
a cozinhar comidas enlatadas como salsichas.
Parvovírus
E
III
Sem evidência de melhora de desfecho com
rastreio ou aconselhamento.
Mulheres que têm filhos pequenos ou
que trabalham com crianças devem ser
aconselhadas sobre redução de risco com
cuidados de higiene.
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
Doença
Força de
evidência
Qualidade da
evidência
Malária
C
III
Gonorreia
B
II-2
Mulheres com alto risco devem ser rastreadas
e tratadas.
Clamídia
A
I-a
Todas as mulheres abaixo de 25 anos ou com
fatores de risco devem ser rastreadas em
consultas rotineiras antes da gestação.
Sífilis
A
II-1
É recomendado o rastreio universal antes da
concepção e tratamento dos casos.
Recomendação
Aconselhar a evitar viagem para áreas
endêmicas. Caso não seja possível, orientar
contracepção e fornecer quimioprofilaxia.
Herpes simples
B
II-1
Mulheres com histórico de herpes genital
devem ser aconselhadas sobre transmissão.
As sem histórico, sobre formas de aquisição.
O rastreio sorológico universal não é
recomendado.
Bacteriúria
assintomática
E
II-1
O rastreio e tratamento na pré-concepção não
diminui a infecção e suas consequências na
gestação. Não é recomendado.
I-b
O rastreio e o tratamento de doenças
periodontais, apesar de benéficos para a mãe,
não fazem parte do cuidado pré-concepcional
por não terem benefício direto para o feto
comprovados.
D/C
I-b
Em mulheres sem histórico de parto
prematuro, não há benefício do rastreio
universal (D). Naquelas com parto prematuro
anterior, o rastreio e tratamento parecem ser
benéficos (C).
E
I-2
O rastreio de colonização na pré-concepção
não é recomendado.
Doenças
periodontais
Vaginose bacteriana
Streptococcus do
grupo B
C
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DOENÇAS CRÔNICAS
A identificação de doenças crônicas através do questionário deve ser melhor explorada
na anamnese e no exame físico, de forma que um aconselhamento correto possa ser
realizado. Algumas situações específicas em relação a comorbidades clínicas e hábitos
sociais são abordadas também no Quadro 3.
•
DIABETES MELLITUS
Há aumento do risco de malformações congênitas, principalmente cardíacas e do
tubo neural, relacionado ao mau controle glicêmico. Este controle glicêmico deve
ser feito com dieta, exercícios físicos e insulina quando indicado. Além de ajustar
a glicemia, a avaliação pré-concepcional também deve rastrear as complicações
vasculares do diabetes e desestimular a gravidez na presença de doença cardíaca
isquêmica, retinopatia proliferativa, nefropatia com clearance de creatinina abaixo
de 50mL/min, proteinúria acima de 2g/24h ou creatinina acima de 2mg/dL,
hipertensão não controlada e gastroparesia. É interessante a dosagem do TSH, já
que 40% das diabéticas tipo 1 têm hipotireoidismo.
•
HIPERTENSÃO ARTERIAL
A hipertensão está relacionada a complicações graves maternas e fetais. Todas as
mulheres hipertensas, antes de engravidar, devem realizar a dosagem de creatinina,
proteinúria de 24 horas, clearance de creatinina, eletrocardiograma e exame
oftalmológico. É importante a identificação de fatores de risco cardiovasculares, de
causas reversíveis de hipertensão e de possível comprometimento de órgãos alvo.
Hipertensão secundária, lesão de órgão alvo (insuficiência cardíaca, retinopatia,
nefropatia, acidente vascular cerebral prévio), dislipidemia, idade maior que 40
anos, pressão arterial sistólica maior ou igual a 160mmHg ou diastólica maior
ou igual 110mmHg estão associados a maior risco na gestação. Medidas como
controle de peso, exercícios físicos regulares e restrição de sódio na dieta são
recomendadas. Quando necessário o uso de medicações, os inibidores da enzima
conversora de angiotensina e os antagonistas de receptores de angiotensina devem
ser evitados por serem teratogênicos.
•
EPILEPSIA
A concepção deve ser adiada até que as crises estejam controladas com dose baixa
de medicação e, de preferência, com monoterapia. A melhor droga é aquela que
melhor controla as crises. A maioria das drogas é classificada como categoria C,
exceto carbamazepina, primidona, ácido valproico e fenitoína, que são potenciais
teratógenos. Mulheres que estão sem crise há dois anos e com eletroencefalograma
normal podem ser candidatas a suspensão da medicação após consultar um
neurologista. Muitos anticonvulsivantes interferem no metabolismo do ácido
fólico, de forma que sua suplementação deve ser com a dose de 4mg/dia.
18
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HÁBITOS SOCIAIS
O fumo na gestação está associado a diversos desfechos adversos. Os benefícios da
interrupção do fumo são significativos: prevenção de 10% das mortes perinatais, 35%
dos recém-natos de baixo peso e 15% dos partos prematuros. O consumo de um a
cinco cigarros por dia está associado à incidência de baixo peso ao nascer 55% maior
do que que em não fumantes. A consulta pré-concepcional deve enfatizar esses riscos
e aconselhar a cessação do fumo.
A síndrome alcoólica fetal é uma das principais causas de retardo mental preveníveis
no mundo. A estimativa do consumo de álcool na gravidez é de mais de 12%, e
nenhuma dose de álcool é segura em nenhum momento da gestação. Seu uso deve
ser desestimulado na orientação pré-concepcional.
Quadro 3: Intervenções pré-concepcionais para mulheres com fatores de risco específicos
Fator de risco
Intervenção
Prevenção
Tabagismo
Cessar o fumo
PMT, BPN etc.
Álcool
Evitar ingestão
Anomalias congênitas, retardo mental
Obesidade
Dieta e exercícios para normalizar
IMC. Rastreio para DM
Infertilidade, DTN, PMT, PC, HAS, DM,
TEV
Diabetes mellitus
Euglicemia, rastreio de bacteriúria
assintomática
Anomalias congênitas, abortamento,
mortalidade perinatal, hospitalização
materna, doença renal materna
Hipertensão arterial
Evitar inibidores da ECA, rastreio de
lesão renal, oftálmica e cardíaca
Anomalias congênitas, complicações
hipertensivas, PC, CIUR, DPP, PMT,
morte perinatal
Hipotireoidismo
Suplementação de tiroxina para
manter TSH normal (0,5 – 2,0mUI/L)
Infertilidade, HAS, PE, anemia, PMT,
morte fetal, possíveis problemas
neurológicos na criança
Hipertireoidismo
Suplementação com propiltiouracil
para T4l normal superior e TSH
normal inferior
Perda gestacional espontânea, PMT,
PE, morte fetal, CIUR, ICC materno,
crise tireotóxica, doença de Gravis
neonatal
Epilepsia
Menor dose segura de
anticonvulsivante, monoterapia,
ácido fólico 4mg/dia
Anomalias congênitas
Asma
Controle clínico como em não
gestantes
PMT, BPN, PE, mortalidade perinatal
Lúpus eritematoso
sistêmico
Mais que seis meses de estabilidade
clínica
HAS, PE, PMT, morte fetal, CIUR, lupus
neonatal
HIV
Iniciar ou ajustar medicação para:
1- carga viral inferior a 1000c/mL,
2- evitar drogas teratogênicas
Infecção perinatal pelo HIV
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
PMT: prematuridade
BPN: baixo peso ao nascimento
IMC: índice de massa corpórea
DM: diabetes mellitus
DTN: defeito do tubo neural
PC: parto cesáreo
HAS: hipertensão arterial
TEV: tromboembolismo venoso
ECA: enzima conversora de angiotensina
CIUR: crescimento intrauterino restrito
DPP: descolamento prematuro de placenta
PE: pré-eclâmpsia
ICC: insuficiência cardíaca congestiva
HIV: vírus da imunodeficiência adquirida.
HISTÓRIA REPRODUTIVA
•
ANTECEDENTE DE RECÉM-NATO COM BAIXO PESO
O peso ao nascimento menor que 2.500g inclui os nascidos antes de 37 semanas
e os com crescimento fetal restrito. Trinta por cento dos prematuros também
sofreram restrição do crescimento fetal, de forma que muitos fatores de risco e
medidas de prevenção são comuns.
Mulheres que tiveram um parto prematuro anterior têm risco aumentado de
prematuridade em uma futura gestação. Quanto mais precoce o nascimento,
maior esse risco. Após um parto antes de 35 semanas, a mulher tem 16% de
chance de um segundo parto prematuro. Esse risco aumenta para 41% após dois
partos prematuros e 67% após três. O antecedente de prematuridade é o fator de
risco com maior impacto para outro parto prematuro. Outros fatores importantes
são o peso materno abaixo de 50kg, o IMC abaixo de 19,8, raça negra, fumo,
pequeno intervalo interpartal, história de incompetência istmocervical ou colo
curto ao ultrassom na gestação.
Já a restrição de crescimento fetal tem outros fatores de risco maternos, fetais
e placentários. Dentre os maternos, estão a doença vascular crônica materna,
hipertensão arterial, insuficiência renal, diabetes mellitus e doenças do colágeno. Os
fetais incluem alterações cromossômicas, diversas síndromes genéticas e infecções.
Os placentários, por sua vez, são o descolamento crônico, placenta prévia e infartos
placentários.
Esse conhecimento dos fatores de risco é fundamental para um bom aconselhamento
pré-concepcional. É a oportunidade de identificar essas mulheres através da história
clínica e tentar reverter os riscos modificáveis. Em especial, a manutenção do peso
adequado, a interrupção do fumo, orientação sobre correção da incompetência
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
istmocervical na gestação e o possível uso de progesterona nos casos de parto
prematuro anterior espontâneo.
•
ABORTAMENTO ESPONTÂNEO ANTERIOR
As perdas gestacionais no primeiro trimestre podem ser esporádicas ou de repetição.
As primeiras acontecem ao acaso ao longo da vida reprodutiva e em 10% a 15%
das gestações reconhecidas. Já o aborto de repetição é definido como três ou mais
perdas consecutivas espontâneas.
As pacientes que sofreram uma perda esporádica antes de 14 semanas de gestação
podem ser aconselhadas em relação ao bom prognóstico para futuras gestações
e seguir orientação pré-concepcional de rotina. Aquelas cuja perda foi após 14
semanas podem ser melhor avaliadas na tentativa de relacionar a perda a um parto
prematuro ou natimorto.
Já no caso de abortamento de repetição, a investigação deve incluir a pesquisa
de anticorpos antifosfolipídeos, cariotipagem dos pais e ultrassonografia do útero
para a pesquisa de anomalias uterinas. A avaliação da função tireoidiana, o teste de
tolerância a glicose ou deficiência da fase lútea não têm comprovação de relação
com aborto de repetição, não havendo evidências suficientes para a recomendação.
A presença de anticorpos antifosfolipídeos pode indicar o uso de aspirina e
heparina, que, em um estudo, diminuiu a taxa de aborto em 54%. Os casais com
alteração cromossômica devem ser encaminhados para aconselhamento genético
na pré-concepção, e as anomalias uterinas como os septos ou alguns tipos de
miomas devem ser removidos também antes da próxima gestação. Quando não é
identificada uma causa, o prognóstico é favorável (I-a).
•
ANTECEDENTE DE NATIMORTO
Os natimortos correspondem à metade da mortalidade perinatal e 50% têm causa
desconhecida. O risco de recorrência é de duas a 10 vezes aumentado em relação a
uma mulher sem esse antecedente. O risco depende das características do episódio
anterior, como a etiologia, a idade gestacional no acontecimento e a presença de
restrição de crescimento. Muitas condições clínicas maternas aumentam o risco
fetal e, com isso, os óbitos (Quadro 4). Além disso, um natimorto anterior aumenta
o risco de diversas outras complicações obstétricas. O ideal é que o maior número
de informações seja conseguido no momento do óbito fetal. É muito importante a
autópsia do feto, o exame patológico da placenta e cariotipagem quando possível.
A orientação pré-concepcional é muito baseada nesses relatórios de autópsia e patologia
da placenta. Como cerca de metade dos casos tem restrição de crescimento associada,
as intervenções relacionadas ao CIUR devem ser consideradas, como controle de
comorbidades clínicas e interrupção do fumo.
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
Quadro 4: Risco de natimortalidade em relação a fatores de risco maternos
Condição clínica
Prevalência (%)
Taxa de natimortos
por 1000
6,4
1,0
80
4-4,5
0,86
6-10
6-25
1,5-2,7
Todas as gestações
Gestações de baixo risco
Razão de
chances
Doenças hipertensivas
•
HAS crônica
•
Pré-eclâmpsia
•
Leve
5,8-7,7
9-51
1,2-4,0
•
Grave
1,3-3,3
12-29
1,8-4,4
Diabetes mellitus
•
Uso de dieta
•
Uso de insulina
2,5-5
6-10
1,2-2,2
2,4
6-35
1,8-4,4
Lupus eritematoso sistêmico
<1
40-150
6-20
Doença renal
<1
15-200
2,2-30
0,2-2
12-20
2,2-3,0
1-5
18-40
2,8-5,0
10-20
10-15
1,7-3,0
Doenças da tireoide
Trombofilias
Fumo acima de 10 cigarros/dia
Obesidade (pré-concepção)
•
IMC 25-29,9kg/m²
21
12-15
1,9-2,7
•
IMC * 30kg/m²
20
13-18
2,1-2,8
Antecedente de CIUR
Antecedente de natimorto
6,7
12-30
2-4,6
0,5-1
9-20
1,4-3,2
Gestação múltipla (atual)
•
Dupla
2,7
12
1,0-2,8
•
Tripla
0,14
34
2,8-3,7
15-18
11-14
1,8-2,2
2
11-21
1,8-3,3
15
12-14
2,0-2,2
Idade materna avançada
•
35-39 anos
•
* 40 anos
Raça negra x raça branca
4. VACINAÇÃO
Muitas doenças que podem ser prevenidas com vacinação podem ter consequências
graves para a mãe e o feto durante a gestação, de forma que a imunização no período
pré-concepcional é uma questão importante. Algumas vacinas agem evitando a infecção
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congênita e outras evitando a transmissão perinatal. Algumas são recomendadas na préconcepção porque não podem ser administradas na gestação, outras por terem uma
vantagem para a saúde materna pelas doenças terem tratamento contraindicado na
gestação. O Quadro 5 resume as indicações de vacinação no período pré-concepcional.
Quadro 5: Vacinas recomendadas na pré-concepção
Todas as mulheres em
idade reprodutiva
• Gestação planejada durante a época de epidemia de gripe: influenza
• Sem evidência de imunidade a rubéola ou varicela: MMR e/ou varicela (orientar
contracepção por três meses)
• Tétano, difteria, pertussis caso cartão de vacinação não esteja em dia
Idade
• Todas entre nove e 26 anos: HPV
• Todas abaixo de 18 anos: hepatite B
Ocupacional
• Profissionais de saúde: hepatite B, influenza, MMR, varicela
• Qualquer profissão com risco de contaminação com sangue: hepatite B
• Militares: meningococo
História social
• Múltiplos parceiros sexuais: hepatite B
• Contato próximo com pessoa infectada cronicamente pelo vírus da hepatite B:
hepatite B
• Usuários de drogas injetáveis: hepatite B
• Fumo, abuso de álcool: pneumococo
Viagens/imigração
• Viagem para áreas endêmicas de hepatite A, ou febre amarela ou meningococo:
hepatite A, febre amarela ou meningococo
Doenças crônicas
• Pulmonar incluindo asma: pneumococo
• Cardiovascular: influenza, pneumococo
• Renal: influenza, pneumococo, hepatite B (quando em diálise)
• Diabetes mellitus: influenza, pneumococo
• Hematológica/imunológica:
• Distúrbios de coagulação: hepatite A
• Esplenectomizadas ou com asplenia funcional: pneumococo, influenza
• Imunocomprometidos (HIV, câncer, quimioterapia, uso de corticoide):
pneumococo
• Hepática: hepatite A e B, pneumococo
Infecções
• DST: hepatite B
• HIV: hepatite B, influenza, pneumococo, considerar meningococo
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
Leitura complementar
1. MOOS, MK; CEFALO, RC. Preconceptional health promotion: a focus for obstetric
care. Am J Perinatol. 1987; 4: 63-7.
2. JACK, BW; CULPEPPER, L. Preconceptional care: risk reduction and health promotion
in preparation for pregnancy. JAMA. 1990; 264: 1147-9.
3. [IBGE] Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. 2002. Disponível em: http://
www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/12062003indic2002.shtm. Acessado
em: 24 jan. 2010.
4. [ACOG] American Congress of Obtetricians and Gynecologists. ACOG Committe
opinion n. 313. The importance of preconceptional care in the continuum of
women’s health care. Obstet Gynecol. 2005; 106: 665-6.
5. JOHNSON, K; POSNER, SF; BIERMANN, J; CORDERO, JF; ATRASH, HK; PARKER, CS;
BOULET, S; CURTIS, MG; GROUP, CDC. ATSDR Preconception Care Work e Care.
Select Panel on Preconception. Recommendations to improve preconception health
and health care – United States. MMWR Recomm Rep. 2006; 21(55): 1-23.
6. [ICSI] Institute for Clinical Systems Improvement. ICSI – Health Care Guidelines:
Routine Prenatal Care. 2009. Disponível em: http://www.icsi.org/guidelines_and_
more/gl_os_prot/womens_health/prenatal_care_4/prenatal_care__routine__3.
html. Acessado em: 24 jan. 2010.
7. TIEU, J; CROWTER, CA; MIDDLENTON, P. Dietary advice in pregnancy for preventing
gestational diabetes mellitus. Cochrane Database Syst Rev. 2008; CD006674.
8. BERGHELLA, V; BUCHANAN, E; PEREIRA. L; BAXTER, JK. Preconception Care.
Obstet Gynecol Survey. 2010; 65: 119-31.
9. LUMLEY, L; WATSON, L; WATSON, M et al. Preconceptional supplementation with
folate and/or multivitamins to prevent neural tube defects. Cochrane Database Syst
Rev. 2005; CD001056.
10. [ANVISA] Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução – RDC nº 344, de 13
de dezembro de 2002. D.O.U. – Diário Oficial da União; Poder Executivo. 2002.
11. JACK, BW; ATRASH, HA; COONROD DV; MOOS MK; O’DONNEL, J; JOHNSON. K.
The clinical content of preconception care: an overview and preparation of this
supplement. Am J Obstet Gynecol. 2008; 199(6): S266-79.
12. American Diabetes Association. Preconceptional care of women with diabetes.
Diabetes Care. 2004; 27: S76-8.
13. American Academy of Neurology. Practice parameter: management issues for
women with epilepsy (summary statement). Report of the Quality Standards
Subcommitte of the American Academy of Neurology. Neurology. 1998; 51: 944-8.
14. Center of Disease Control and Prevention. The Health benefits of smoking
cessations. JAMA. 1990; 264: 1930.
15. Center of Disease Control and Prevention. Alcohol consumption among women
who are pregnant or who might become pregnant. MMWR. 2004; 53: 1178-81.
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
GENÉTICA PARA O OBSTETRA: BASES DO ACONSELHAMENTO GENÉTICO
A genética é a especialidade médica que lida com o diagnóstico, tratamento e o
controle dos distúrbios hereditários. Com o advento da ultrassonografia e das técnicas
de reprodução assistida, a genética passou a fazer parte do dia a dia da obstetrícia
criando, com isso, a necessidade de que o obstetra tenha conhecimento de conceitos
básicos e princípios do aconselhamento genético.
A idealização do filho perfeito é, em algumas circunstâncias, interrompida com a
identificação de uma anomalia congênita ou doença genética. A introdução da
ultrassonografia na rotina da obstetrícia tem permitido que, pelo menos nos casos
das anomalias anatômicas maiores, essa identificação seja antecipada para o período
pré-natal.
Anomalia congênita é qualquer anomalia anatômica, estrutural ou funcional presente
ao nascimento, embora possa não ser aparente neste momento, sendo o seu
diagnóstico realizado somente mais tarde, algumas vezes já na vida adulta.
A ocorrência de uma anomalia congênita não é evento raro na prática obstétrica.
Cerca de 2% a 4% dos recém-nascidos vivos apresentam alguma anomalia congênita
identificável ao nascimento. Ao fim do primeiro ano de vida, esse número dobra. Entre
as perdas perinatais, essa proporção é ainda maior. Estima-se que 20% das mortes
perinatais se devem a anomalias congênitas.
É importante ter em mente que nem toda anomalia congênita é genética e também
nem toda síndrome genética se manifesta com anomalias congênitas identificáveis
durante a gestação ou mesmo no parto.
Além dos conceitos apresentados nesse capítulo, é preciso estar atento para o
significado de alguns termos em genética para evitar a interpretação equivocada do
texto. Em genética, quando utilizamos o termo “portador” estamos nos referindo
a um indivíduo sem a presença da doença, mas que carrega uma alteração, seja
cromossômica, seja gênica, que está etiologicamente relacionada à doença presente
em um dos seus filhos. Quando nos referimos ao indivíduo com o diagnóstico firmado
de uma doença genética utilizamos o termo “afetado”.
1. ETIOLOGIA DAS ANOMALIAS CONGÊNITAS
Embora seja difícil determinar com precisão as causas das anomalias congênitas, estimase que as causas genéticas, isoladamente ou em conjunto com fatores ambientais,
estejam etiologicamente envolvidas em um terço dessas anomalias.
As anomalias congênitas podem ser divididas em dois grandes grupos: induzidas por
teratógenos ou de etiologia genética.
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
1.1 TERATÓGENOS
Denomina-se teratógeno qualquer agente que seja capaz de produzir uma alteração
permanente na estrutura ou função de um organismo após a exposição durante a
vida embrionária ou fetal. Os teratógenos englobam, então, fatores ambientais,
medicamentos, drogas de abuso e químicos ocupacionais. O Quadro 1 apresenta os
principais teratógenos relacionados a anomalias congênitas em humanos.
Quadro 1: Teratógenos e anomalias congênitas
Doenças maternas: diabetes mellitus, fenilcetonúria, distrofia miotônica, lúpus eritematoso sistêmico,
tumores secretores de androgênios
Doenças infecciosas: sífilis, toxoplasmose, rubéola, citomegalovírus, herpes, varicela, parvovírus
Agentes ionizantes: radiação terapêutica (radioterapia), iodo radioativo
Drogas e medicamentos: álcool, cocaína, talidomida, metotrexate, difenilhidantoína, ácido valproico,
carbamazepina, fenobarbital, ácido retinoico e seus derivados, lítio, warfarina e seus derivados,
inibidores da ECA (enzima de conversão da angiotensina), antagonistas dos receptores da angiotensina,
misoprostol, anti-inflamatórios não esteroides (após 32 semanas de gestação), metimazole,
ciclofosfamida, danazol e outros androgênios, ribavirina, antilipedêmicos (sinvastatina, fluvastatina,
lovastatina, cerivastatina, atorvastatina, pravastatina), fluorouracil, antineoplásicos, luprolide, bosentan,
xenodiol, mifepristone, estrogênios
Agentes ambientais: metilmercúrio e chumbo
1.2 DOENÇAS GENÉTICAS
A informação genética das células humanas é transmitida através do DNA – ácido
desoxirribonucleico. O DNA é encontrado, em sua maior parte, no núcleo da célula, e
o restante nas mitocôndrias, no citoplasma.
O conteúdo haploide do DNA de um gameta humano (óvulo ou espermatozoide) é
denominado genoma e é composto por 22 cromossomos autossômicos, numerados
de um a 22, e um cromossomo sexual, X ou Y. Um indivíduo normal tem duas cópias
de cada cromossomo autossômico e um par de cromossomos sexuais, ou seja, um total
de 46 cromossomos. A estrutura anatômica do DNA carrega a informação química que
permite a transmissão exata da informação genética durante a divisão celular e, em
consequência, de uma geração para a próxima.
Cada cromossomo humano é constituído de uma dupla hélice de DNA contínua e
única, totalizando mais de 6 bilhões de nucleotídeos. Um gene é uma sequência de
nucleotídeos do DNA que codifica (transcreve) moléculas funcionais de RNA. O produto
da maioria dos genes é uma proteína, cuja estrutura determina sua função particular
na célula. A posição ocupada por um gene em um cromossomo é denominada locus.
A informação genética em determinado locus é denominada alelo.
Embora existam outros padrões de herança, as doenças genéticas são classicamente
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divididas em três grupos: doenças cromossômicas, doenças monogênicas (ou
mendelianas) e doenças de herança complexa (ou multifatoriais). Diversas doenças
genéticas apresentam heterogeneidade, ou seja, uma mesma doença pode ter
mecanismos diferentes de herança ou ter apresentação clínica diferente. Isso ocorre
porque elas podem ser determinadas por mutações em loci diferentes ou por mutações
diferentes em um mesmo locus.
A Tabela 1 apresenta a frequência dos diferentes tipos de doenças genéticas na
população humana.
Tabela 1: Frequência das doenças genéticas (por 1.000)
Tipos
Incidência ao
nascimento
Prevalência
aos 25 anos
Prevalência na
população
6
10
~ 50
1,8
3,6
~ 50
3,8
20
~ 600
Doenças causadas por mutações genômicas e
cromossômicas
Doenças monogênicas
Doenças com herança complexa
1.2.1
DOENÇAS CROMOSSÔMICAS
As anomalias cromossômicas são causadas por alterações no número ou estrutura
dos cromossomos e podem envolver autossomos, cromossomos sexuais ou ambos. A
grande maioria das doenças cromossômicas pode ser investigada pela realização do
cariótipo.
Algumas anomalias estruturais podem passar despercebidas ao estudo cromossômico
que utiliza as técnicas habituais de citogenética. Por isso, em situações particulares,
algumas técnicas especiais de análise cromossômica podem ser necessárias.
1.2.1.1 ANOMALIAS CROMOSSÔMICAS NUMÉRICAS
O tipo mais comum da anomalia cromossômica com repercussão clínica é a aneuploidia,
termo que representa um número anormal de cromossomos. Entre as aneuploidias, as
mais comuns são as trissomias e as monossomias. Na trissomia existem três cópias de
um dos cromossomos, enquanto na monossomia existe apenas uma cópia de um dos
cromossomos. Os indivíduos euploides, ou seja, com número de cromossomos normal,
têm duas cópias de cada um dos cromossomos.
As alterações numéricas mais frequentes (trissomias e monossomias), em geral, são
resultantes da falha na separação de dois cromossomos homólogos (fenômeno de não
disjunção) durante a gametogênese (meiose). Existe influência direta da idade da mulher
no risco de filhos afetados com trissomias livres: quanto maior a idade materna, maior
o risco. As trissomias frequentemente vistas em amostras fetais (material de aborto,
vilo corial, amniocentese e cordocentese) são as que envolvem o cromossomo 16 (mais
comum em abortamentos precoces) e os cromossomos 13 (síndrome de Patau), 18
(síndrome de Edwards) e 21 (síndrome de Down). A monossomia do cromossomo X
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(Síndrome de Turner) é também comum em material de abortamentos e em material
obtido por técnicas invasivas de diagnóstico pré-natal, mas não sofre influência da
idade materna. A trissomia do cromossomo 21 e a monossomia do cromossomo X são
compatíveis com a vida em longo prazo, enquanto as trissomias 13 e 18 raramente
ultrapassam o período neonatal precoce.
Outros tipos de doenças cromossômicas numéricas são as poliploidias – presença
de um conjunto extra de cromossomos, ou seja, 69 cromossomos (triploidia), 92
cromossomos (tetraploidia). As poliploidias são mais frequentemente encontradas em
abortamentos e podem estar associadas à degeneração molar.
1.2.1.2 ANOMALIAS CROMOSSÔMICAS ESTRUTURAIS
As anomalias cromossômicas estruturais resultam da quebra, seguida pela reconstituição
com uma combinação anormal na sequência dos genes no cromossomo. Elas são
consideradas balanceadas quando o rearranjo se dá de tal forma que não determina
perda ou excesso de material cromossômico, e não balanceadas quando há perda
ou excesso de material cromossômico. São mais raras que as alterações numéricas,
mas muitas são familiares, o que exige uma investigação genética cuidadosa quando
achado um portador dessa alteração.
Em geral, o indivíduo portador de anomalia cromossômica balanceada apresenta
fenótipo normal, mas tem alto risco de ter filhos com anomalias cromossômicas não
balanceadas. Nos casos familiares, o risco de recorrência pode ser alto e depende
do tipo de anomalia do cromossomo envolvido e de qual dos membros do casal é o
portador. Por isso, diante de um diagnóstico de anomalia cromossômica estrutural
em um feto, se impõe o estudo cromossômico dos pais para identificar se um deles
é portador de uma anomalia balanceada ou se se trata de um arranjo cromossômico
de novo, de ocorrência acidental. Essa informação é imprescindível para prover um
adequado aconselhamento genético ao casal.
Anomalias cromossômicas estruturais também são etiologicamente relacionadas
a perdas gestacionais de repetição. Sendo assim, o estudo cromossômico é parte
integrante na avaliação de casais com perdas repetidas (abortamentos, natimortalidade).
1.2.1.3 NOMENCLATURA CROMOSSÔMICA
O resultado do estudo cromossômico é feito utilizando nomenclatura específica
padronizada por normas internacionais. A compreensão dessa nomenclatura auxilia ao
clínico compreender o resultado citogenético.
Primeiro, é apresentado o número de cromossomos, lembrando que o normal é 46. A
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seguir, é colocado o par sexual – XX ou XY. No caso de alterações estruturais, elas são
descritas a seguir utilizando abreviações como mostrado no Quadro 2.
Quadro 2: Abreviações das anomalias cromossômicas pelas normas do ISCN (2009)
del: deleção
t: translocação
p: braço curto do cromossomo
q: braço longo do cromossomo
mar: cromossomo marcador
dup: duplicação cromossômica
r: cromossomo em anel (ring)
I: isocromossomo
fra: sítio frágil
ins: inserção
inv: inversão
dic: cromossomo dicêntrico
der: cromossomo derivativo
Por exemplo, um resultado 46, XX significa uma mulher cromossomicamente normal.
Um cariótipo com resultado 45, XY, t (13q; 14q) representa um homem com uma
translocação balanceada entre os braços longos dos cromossomos 13 e 14. Como
os cromossomos 13 e 14 são acrocêntricos, essa translocação gera a “fusão” de dois
cromossomos, ficando o número em 45. Essa translocação é denominada robertsoniana.
Um cariótipo com resultado 47, XX + 21, representa uma mulher com um cromossomo
21 a mais, ou seja, uma trissomia livre do cromossomo 21 (síndrome de Down).
1.2.2 DOENÇAS MONOGÊNICAS
As doenças monogênicas são causadas por um alelo (forma alternativa de um gene)
mutante ou um par de alelos mutantes em um mesmo locus gênico. Na dependência
do padrão de herança, elas se subdividem em autossômicas dominantes, autossômicas
recessivas, dominantes ligadas ao cromossomo X e recessivas ligadas ao cromossomo X.
Enquanto as doenças cromossômicas podem ser investigadas por meio de um único
exame – cariótipo –, as doenças monogênicas exigem técnicas de diagnóstico mais
complexas, em geral, utilizando metodologias de biologia molecular, embora para
algumas doenças possam ser aplicados testes bioquímicos. Outra dificuldade no
diagnóstico das doenças monogênicas é que, para cada doença ou mutação na qual o
defeito gênico já está estabelecido, existe um teste diagnóstico específico. Por isso, a
investigação de uma doença gênica, por meio de teste de biologia molecular, exige alta
suspeição clínica para seleção dos exames a serem solicitados. Em algumas situações,
ainda não existe conhecimento do defeito molecular e o diagnóstico é feito por meio
de parâmetros clínico-genéticos.
1.2.2.1 DOENÇAS AUTOSSÔMICAS DOMINANTES
São determinadas pela presença do alelo mutante em heterozigose, ou seja, a presença
da mutação no gene de apenas um cromossomo homólogo determina a ocorrência
da doença. A doença autossômica dominante pode ocorrer por uma mutação nova
(proporção significativa dos casos) ou ser herdada de um dos pais. São exemplos de
doenças autossômicas dominantes a acondroplasia, síndrome de Marfan, entre outras.
Existe relação direta entre o risco de doença autossômica dominante e a idade
paterna. O Quadro 3 apresenta as principais características das doenças autossômicas
dominantes.
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Quadro 3: Características das doenças autossômicas dominantes
Distribuição vertical de indivíduos afetados no heredograma
Ambos os sexos são afetados em proporções iguais
Há transmissão de pai para filho
Se um dos genitores é afetado, a probabilidade de cada filho herdar a doença é de 50%
Genitores normais não transmitem a doença aos filhos
1.2.2.2 DOENÇAS AUTOSSÔMICAS RECESSIVAS
Esse grupo de doenças é determinado pela presença do alelo mutante em homozigose,
ou seja, o indivíduo afetado apresenta a mutação nas duas cópias dos cromossomos
homólogos. São exemplos de doenças autossômicas recessivas: hiperplasia congênita
de suprarrenal, fenilcetonúria, algumas hidropisias não imunitárias, síndrome de
Meckel-Gruber, síndrome de Roberts, entre outras. O Quadro 4 apresenta as principais
características das doenças autossômicas recessivas.
Quadro 4: Características das doenças autossômicas recessivas
Em geral, a distribuição da doença no heredograma é horizontal ou pula gerações. A doença pode ser vista em irmãos
do afetado, mas não em seus pais ou outros parentes
Ambos os sexos são afetados em proporções iguais. Algumas doenças autossômicas recessivas podem ser mais letais
em um sexo, dando a impressão de predominância para um sexo quando se analisa apenas os indivíduos vivos de
uma família
Os pais do afetado, na quase totalidade das vezes, são sadios, mas são obrigatoriamente portadores de um alelo
mutante (heterozigotos)
A consanguinidade entre os genitores favorece a ocorrência desde grupo de doenças.
O risco de recorrência em gravidezes de casal com um filho afetado é de 25%
1.2.2.3 DOENÇAS LIGADAS AO CROMOSSOMO X
O tipo de herança mais comum entre as doenças ligadas ao cromossomo X é o padrão
recessivo. O exemplo mais clássico de doença recessiva ligada ao cromossomo X é a
hemofilia. Outros exemplos são a insensibilidade androgênica (síndrome dos testículos
feminilizantes), distrofia muscular de Duchene, entre outras. As principais características
dessas doenças são apresentadas no Quadro 5. Proporção significativa das doenças
com herança recessiva ligada ao cromossomo X é determinada por mutação nova.
Quadro 5: Características das recessivas ligadas cromossomo X
A doença afeta principalmente homens
Os indivíduos afetados são, em geral, conectados no heredograma através de mulheres não afetadas (heterozigotas,
portadoras). Cinquenta por cento dos filhos (sexo masculino) de uma portadora serão afetados e 50% das filhas de
uma portadora serão também portadoras
Os afetados são filhos de pais sem a doença e, em geral, de mães portadoras sãs
Um pai afetado não transmite a doença para seus filhos homens (o pai passa o cromossomo Y para o filho homem),
mas todas as suas filhas serão portadoras do alelo mutante
Existem poucas doenças dominantes ligadas ao cromossomo X, sendo as suas principais
características apresentadas no Quadro 6.
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Quadro 6: Principais características das doenças dominantes ligadas ao X
Acomete ambos os sexos, mas com maior frequência mulheres
As mulheres afetadas costumam apresentar a doença de forma mais leve e mais variável do que
os homens
A mulher afetada tem 50% de risco de ter um filho afetado
Todos os filhos de um homem afetado são saudáveis e todas as filhas afetadas
1.2.2.4 PADRÕES ATÍPICOS DE HERANÇA GENÉTICA
Algumas raras doenças monogênicas não seguem os clássicos padrões mendelianos
de herança.
As doenças mitocondriais são de herança exclusivamente materna, já que todas as
mitocôndrias do ovo são herdadas do gameta feminino. Consequentemente, uma
mulher com uma mutação em seu DNA mitocondrial irá transmitir essa mutação para
todos os seus filhos. Homens afetados não transmitem a doença. Como na divisão
celular o DNA mitocondrial é transmitido à célula-filha de forma aleatória, a expressão
fenotípica vai depender da proporção entre DNA normal e DNA mutante herdado.
Atualmente, sabemos que em algumas doenças genéticas a expressão do fenótipo
dependerá da origem do gene mutante, se paterno ou materno. Diferenças na
expressão do gene entre o alelo herdado da mãe e do pai são resultantes do fenômeno
denominado impressão genômica (imprinting). A impressão genômica é causada
por alteração, ainda não completamente compreendida, na cromatina que afeta
a expressão do gene, mas não a sequência do seu DNA. As síndromes de PraderWilli e de Angelman são os exemplos mais bem estudados do papel da impressão
genômica nas doenças humanas. O fenótipo em cada uma delas é bastante diferente,
tanto no aspecto físico quanto comportamental, e em cerca de 70% dos casos são
determinadas pela ausência de um mesmo segmento do braço longo do cromossomo
15. A ausência do segmento de origem paterna determina a síndrome de Prader-Willi
e a do segmento de origem materna determina a síndrome de Angelman.
A dissomia uniparental é determinada pela presença de uma linhagem celular com dois
cromossomos ou segmentos destes, vindos de um único genitor, se dois cromossomos
estão presentes.
1.2.3 DOENÇAS DE HERANÇA COMPLEXA
Também denominadas doenças multifatoriais, resultam da interação entre fatores
genéticos e ambientais. Acredita-se que os fatores genéticos envolvam vários genes
aumentando ou diminuindo a suscetibilidade a uma doença e que os fatores ambientais
podem iniciar, acelerar, exacerbar ou proteger contra a progressão da doença.
As doenças de herança complexa afetam ambos os sexos, mas algumas são mais
frequentes em um sexo. O risco de recorrência, em geral, é bem menor que o
das doenças monogênicas, mas depende do número de indivíduos afetados na
família, da gravidade da doença e, às vezes, do sexo do afetado. Os exemplos mais
clássicos de doença multifatorial são defeito de fechamento do tubo neural e a
maioria das cardiopatias.
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1.3 CONCEITOS BÁSICOS DA AVALIAÇÃO DE RISCO PARA ANEUPLOIDIAS
1.3.1 CASAIS COM RISCO AUMENTADO PARA FILHOS COM DOENÇAS CROMOSSÔMICAS:
• Idade reprodutiva elevada: mulheres com 35 anos ou mais apresentam risco
aumentado de vir a ter filhos com doenças cromossômicas numéricas, especialmente
síndrome de Down.
•
Casais com perdas gestacionais de repetição: cerca de 3% a 5% dos casais com
duas ou mais perdas gestacionais, sejam elas abortamentos ou natimortos, são
portadores de anomalia cromossômica estrutural balanceada, com risco aumentado
de novas perdas gestacionais e de vir a ter filhos com malformações e retardo
mental. Assim, esses casais, antes de engravidar novamente, devem realizar estudo
cromossômico.
•
Filho anterior com anomalias congênitas: em porcentagem significativa de casos,
as anomalias congênitas têm etiologia cromossômica. O risco de recorrência de
anomalias cromossômicas numéricas, principalmente as trissomias, é em torno de
1%. Nos casos de filho com anomalia estrutural não balanceada, o casal pode ser
portador de anomalia cromossômica estrutural balanceada que influencia o risco
de recorrência.
•
Diagnóstico de anomalia cromossômica estrutural balanceada em um dos parceiros:
o risco para filhos futuros dependerá dos cromossomos envolvidos e do sexo do
parceiro portador. Em casos raros, o risco pode ser de até 100%.
•
Anomalias congênitas em parentes próximos: anomalias congênitas podem ser de
natureza gênica, cromossômica ou multifatorial. Os casais com este tipo de história
devem ter esclarecidos o diagnóstico e a etiologia da anomalia para uma avaliação
correta de riscos e da propedêutica a ser realizada.
•
Retardo mental em parente próximo: também o retardo mental pode ter etiologias
múltiplas e casais com este tipo de história também devem ter esclarecido a
etiologia do retardo mental para uma avaliação correta de riscos e da propedêutica
a ser realizada.
1.3.2 CASAIS COM RISCO AUMENTADO PARA FILHOS COM DOENÇAS GÊNICAS
• História familiar de doença autossômica dominante: a determinação de risco nas
doenças autossômicas dominantes pode ser complexa devido a problemas como
expressividade variável, não penetrância, mutações novas, antecipação, mosaicismo
gonadal, expressão tardia, sendo mais prudente uma avaliação pelo geneticista
quando existir na família do casal história deste tipo de doença. Com as técnicas
moleculares hoje disponíveis, em algumas situações já é possível avaliar com
precisão se um dos membros é heterozigoto para um gene mutante determinado,
bem como realizar o diagnóstico pré-natal.
•
Consanguinidade: a consanguinidade é fator de risco para doenças autossômicas
32
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recessivas. Quanto mais próxima for esta consangüinidade, maior o risco. Através da
história familiar, é possível estabelecer esse risco com relativa precisão. Quando na
avaliação for detectada a presença de doença autossômica recessiva, ou a existência
de portadores de genes deste tipo de doença na família, em algumas ocasiões,
pode-se oferecer o diagnóstico molecular para identificação de portadores.
•
História de doença recessiva ligada ao cromossomo X na família da mulher: quando
este tipo de doença existir, o risco para filhos pode ser muito baixo ou de 25%.
Com a construção do heredograma, pode-se avaliar melhor este risco e em diversos
casos identificar ou afastar a possibilidade da mulher ser portadora do gene em
questão, através de exames moleculares.
•
Portadores de genes mutantes para doenças autossômicas recessivas: com a
disseminação da triagem neonatal, certamente essa situação tende a ser mais
frequentemente identificada na prática cotidiana. Sempre que um dos membros
do casal for reconhecidamente portador de um gene para doença autossômica
recessiva, o outro membro merece investigação para avaliação de riscos. Com a
triagem neonatal rotineira da anemia falciforme, esta tende a ser a doença mais
frequentemente identificada nesta situação.
•
Idade paterna elevada: a idade paterna elevada se associa a risco maior de
mutações novas de doenças autossômicas dominantes. Há controvérsia a partir
de que idade este risco é significativo, com alguns autores preconizando a mesma
idade considerada elevada para a mulher, ou seja, 35 anos.
•
Outras situações: deve ser lembrado que as síndromes de anomalias congênitas
múltiplas, o retardo mental e as perdas gestacionais podem também ser
determinados por doenças gênicas. Assim, em algumas situações, este tipo de
etiologia deve ser avaliado.
1.3.3 CASAIS COM RISCO AUMENTADO PARA FILHOS COM DOENÇAS MULTIFATORIAIS
Grande número de anomalias congênitas isoladas é de natureza multifatorial, com
risco de recorrência não desprezível. Deve ser lembrado que esse risco de recorrência
depende do sexo do afetado, da gravidade da doença e da presença de outros casos
em parentes próximos. As doenças mais importantes que exigem atenção são:
•
Filho anterior com defeito de fechamento do tubo neural: os defeitos do tubo
neural (anencefalia, meningocele, mielomeningocele) apresentam risco de
recorrência em torno de 5%. Este risco pode ser reduzido a cerca de 1% pelo uso
periconcepcional de 4mg diários de ácido fólico nos meses (idealmente três) que
antecedem a gestação.
•
Filho anterior com cardiopatia congênita: as cardiopatias congênitas podem ser
determinadas por diversos mecanismos, embora, na maioria das vezes, sejam de
natureza multifatorial. O risco de recorrência dependerá do tipo de cardiopatia e
da história familiar.
33
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•
Filho anterior com outras malformações isoladas: para as demais malformações, é
aconselhável uma avaliação por geneticista. As mais frequentes são: polidactilia,
fendas labiais e palatinas, malformações de vias urinárias, malformações do sistema
nervoso central.
2. RASTREAMENTO PRÉ-NATAL
Apesar da identificação de diversas situações de risco para doenças genéticas, a maioria
das crianças com anomalias congênitas são filhos de pais nos quais estas situações
de risco não são identificadas. Assim, desenvolveram-se diversos testes de triagem
para a identificação de gravidezes com risco maior de resultar em recém-nascido com
anomalias congênitas.
Tratam-se de procedimentos não invasivos, com o objetivo de identificar, entre as
gravidezes, um grupo no qual o risco de anomalias fetais é maior do que o esperado
na população. Um teste de triagem alterado indica uma situação de risco, não firma
um diagnóstico. Assim, ele exige um diagnóstico específico posterior que confirme ou
afaste a doença suspeitada.
Os métodos de rastreamento para anomalias congênitas mais comuns são a medida da
translucência nucal, avaliação do osso nucal e os testes bioquímicos.
2.1 TRANSLUCÊNCIA NUCAL
A medida ultrassonográfica da área anecoica da porção posterior do pescoço fetal
realizada entre 11 e 14 semanas é um dos testes não invasivos mais utilizados em
nosso meio para rastreamento de anomalias congênitas. Para sua correta aplicação,
o embrião deve ter comprimento cabeça-nádega (CCN) mínimo de 45mm e máximo
de 84mm. Existem programas computadorizados que relacionam a medida obtida
com a idade gestacional e com a idade materna, fazendo uma estimativa de risco. É
considerada anormal a medida acima do percentil 95 para a idade gestacional.
Desenvolvida para triagem da trissomia do cromossomo 21, a translucência nucal
pode estar aumentada em outras anomalias cromossômicas, defeitos anatômicos,
principalmente cardiopatias e doenças gênicas, devendo a gestante ser alertada sobre
isto antes da realização do exame.
2.2 OSSO NASAL
Mais recentemente, foi incorporada ao exame ultrassonográfico do primeiro trimestre
a avaliação da presença ou não do osso nasal. Parcela significativa dos fetos com
síndrome de Down não apresenta o osso nasal nessa fase. Assim como no caso da
translucência nucal, a avaliação do osso nasal é teste de rastreamento e não permite
firmar a presença da doença nem a ausência da mesma.
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2.3. TESTES BIOQUÍMICOS EM SORO MATERNO
Amplamente utilizados em países desenvolvidos como parte da avaliação rotineira de
todas as gestações, os testes bioquímicos ainda são pouco usados em nosso meio.
Voltados inicialmente para a triagem de anomalias cromossômicas, hoje eles podem
ser utilizados para algumas outras doenças. O mais utilizado é o teste tríplice, com a
dosagem simultânea da alfa-fetoproteína, gonadotrofina coriônica e estriol conjugado.
Quando se opta por rastreamento bioquímico no primeiro trimestre, a dosagem da
alfa-fetoproteína é substituída pela dosagem da proteína plasmática associada à
gravidez (PAPP-A).
2.3.1 DOSAGEM DA ALFA-FETOPROTEÍNA
A alfa-fetoproteína é sintetizada pelo saco vitelino, trato gastrintestinal e fígado
fetal, e em menor quantidade pela placenta e rins fetais. Ela atravessa a placenta e é
encontrada na circulação materna.
As seguintes situações se associam a níveis de alfa-fetoproteína aumentados na
circulação materna: defeitos de fechamento do tubo neural (anencefalia, encefalocele,
meningomielocele), defeitos de fechamento da parede abdominal (onfalocele,
gastrosquise, extrofia de cloaca), obstruções do trato digestivo, agenesia renal, rins
policísticos, nefrose congênita, osteogênese imperfeita, higroma cístico, defeitos de
pele e outras menos frequentes.
Níveis reduzidos de alfa-fetoproteína são descritos em doenças cromossômicas fetais,
especialmente trissomias e doença trofoblástica.
A dosagem da alfa-fetoproteína no soro materno é utilizada como teste de triagem
pré-natal para doenças cromossômicas, especialmente da síndrome de Down e dos
defeitos de fechamento do tubo neural. Deve ser realizada entre 15 e 20 semanas
de gravidez. Seus resultados são expressos como múltiplos da mediana (MoM). Sua
utilização com esses objetivos exige laboratório experiente e curva de normalidade na
população alvo.
Como os níveis de alfa-fetoproteína variam em função da idade gestacional, esta tem
de ser conhecida com certeza. Baixo peso fetal, oligoidrâmnio, gemelaridade e baixo
peso materno podem elevar os níveis séricos maternos da alfa-fetoproteína. Morte
fetal e peso materno elevado são causas de níveis baixos.
2.3.2 DOSAGEM DE GONADOTROFINA CORIÔNICA
É o marcador bioquímico mais sensível para a triagem pré-natal da síndrome de Down.
Entre 15 e 20 semanas de gestação, os níveis de gonadotrofina coriônica no soro
materno se encontram significativamente elevados em gravidezes de fetos com esta
síndrome. Diferentemente, na trissomia do cromossomo 18, são encontrados níveis
muito baixos da fração livre da subunidade ` da gonadotrofina coriônica (`-hCG). Os
seus resultados são expressos em múltiplos da mediana da população (MoM).
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2.3.3. ESTRIOL NÃO CONJUGADO
Os níveis de estriol não conjugado no soro materno se encontram diminuídos no
segundo trimestre de gravidezes de fetos com síndrome de Down. Seus resultados
também são expressos em múltiplos da mediana da população (MoM).
2.3.4. PROTEÍNA PLASMÁTICA ASSOCIADA À GRAVIDEZ – PAP-A
A proteína plasmática associada à gravidez (PAP-A) é de origem placentária, e
aumenta exponencialmente no soro materno até o fim da gravidez. Níveis reduzidos
da mesma, já no primeiro trimestre de gravidez, se associam a doenças cromossômicas
numéricas fetais.
2.3.5. TESTES DUPLO, TRIPLO E QUÁDRUPLO
As dosagens bioquímicas no soro materno são testes de triagem. Assim, quando
alterados, exigem a realização de testes diagnósticos, como a amniocentese e biópsia
de vilo corial, para sua confirmação. A utilização de apenas um desses marcadores
faz com que grande número de testes diagnósticos tenha resultados normais, o que
implica gastos econômicos e estresse emocional desnecessários. Para reduzir estas
perdas, criou-se a estratégia de associar as dosagens de alfa-fetoproteína e da `-hCG
(teste duplo) ou as três dosagens, incluindo o estriol (teste triplo). O período ótimo
para a sua realização é entre 16 e 18 semanas de gravidez, podendo ser estendido para
15 e 20 semanas. O rastreamento no primeiro trimestre é feito entre 11 e 13 semanas,
sendo a alfa-fetoproteína substituída pela PAP-A.
O teste quádruplo associa os testes bioquímicos em soro materno e a medida da
translucência nucal.
3. DIAGNÓSTICO PRÉ-NATAL
Atualmente, um grande número de doenças é passível de diagnóstico pré-natal e
este número não para de crescer. Seguem-se basicamente quatro abordagens para
o diagnóstico pré-natal de anomalias fetais: estudos ultrassonográficos, estudos
cromossômicos, testes bioquímicos e análise do DNA.
3.1. ESTUDOS ULTRASSONOGRÁFICOS
A ultrassonografia é um método importante para estudar a anatomia fetal. As anomalias
maiores mais frequentemente diagnosticadas pela ultrassonografia são: hidrocefalia,
defeitos de fechamento do tubo neural, holoprosencefalia, microcefalia, macrocefalia,
hidranencefalia, cistos de plexo coroide, anomalia de Dandy-Walker, higromas císticos,
cardiopatias, hérnias diafragmáticas, onfalocele, gastrosquise, extrofias de bexiga e de
cloaca, atresias do tubo digestivo, agenesia renal, hidronefrose, rins policísticos, cistos
renais e obstruções uretrais com megabexiga. Entre as síndromes dismórficas, diversas
displasias ósseas podem ter o seu diagnóstico estabelecido.
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Ao ser identificada uma anomalia fetal, está indicado um estudo cuidadoso da
anatomia fetal em busca de outras anomalias. É também indispensável o estudo
cromossômico fetal, pois as doenças cromossômicas se associam às mais diversas
anomalias congênitas.
Diante de um feto com anomalias estruturais e estudo cromossômico normal, é preciso
ter muita cautela e evitar as tentativas de diagnósticos sindrômicos ou tranquilizar o
casal precipitadamente (“o feto é normal exceto por este achado ultrassonográfico”).
Mesmo após o nascimento, com o exame físico completo e todos os demais exames
disponíveis, os melhores centros de diagnóstico dismórfico do mundo não conseguem
estabelecer um diagnóstico sindrômico em cerca de 40% dos pacientes. A abordagem
desta situação deve ser feita preferencialmente por equipe multidisciplinar que conte
com a participação de ultrassonografista experiente em morfologia fetal, geneticista,
obstetra, neonatologista e, algumas vezes, cirurgião pediátrico e psicólogo.
3.2. CARIÓTIPO FETAL
O exame de natureza genético indicado na grande maioria das situações na qual está
indicado o diagnóstico pré-natal é o cariótipo fetal. Suas principais indicações são:
•
Idade materna elevada.
•
Resultado anormal em testes de triagem pré-natal.
•
Anomalias fetais detectadas na ultrassonografia.
•
Filho anterior com anomalias cromossômicas numéricas.
•
Anomalias cromossômicas estruturais balanceadas em um dos membros do casal e
determinação do sexo fetal.
•
Mãe portadora de gene de doença recessiva ligada ao X.
3.3. ESTUDOS DO DNA
Embora um grande número de doenças genéticas já tenha o seu gene identificado,
isto não significa que seja sempre possível o seu diagnóstico molecular, porque, em
muitas delas, o número de mutações possíveis é muito grande (para algumas doenças,
centenas), em outras, mais de um gene pode ser responsável por sua gênese.
O diagnóstico molecular pode utilizar métodos diretos ou indiretos. Os métodos diretos
estudam a própria estrutura molecular do gene. Na maioria das vezes, utilizam enzimas
de restrição associadas ao Southern Blot ou à Reação em Cadeia da Polimerase (PCR).
Nas abordagens indiretas, são realizados estudos de ligação. Para que isso seja
possível, é necessário que se conheça um locus polimórfico próximo a um gene que,
quando mutado, predispõe ou determina a manifestação de uma doença. O princípio
do estudo de ligação é que dois loci próximos não sofrem recombinação na meiose,
sendo então segregados por várias gerações. O locus polimórfico funciona como um
sinal que prediz a presença ou ausência do gene no feto. Para isso, são analisados o
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DNA do feto e dos pais, que serão tipados por Southern Blot ou PCR, para o locus
polimórfico conhecido.
Os estudos de ligação são indicados quando o gene é desconhecido, sendo impossível
procurar mutações, ou quando o gene apresenta um grande número de mutações e
nenhuma delas é prevalente na população, sendo uma procura sistemática das diversas
mutações muito dispendiosa.
3.3.1. OUTRAS TÉCNICAS CITOGENÉTICAS
O FISH e citogenética molecular são técnicas essencialmente moleculares, mas se situam
na fronteira entre os estudos cromossômicos e os de DNA. Trata-se do estudo de regiões
críticas do DNA de diversas regiões cromossômicas para identificar a sua presença em
dose extra (trissomias, por exemplo) ou sua ausência (monossomias). Em diagnóstico
pré-natal, elas são usadas, muitas vezes, para um resultado rápido, que não depende
de culturas celulares, ou para o diagnóstico de algumas síndromes específicas, como
deleções cromossômicas muito pequenas e síndromes de genes contíguos.
O cariótipo multicolorido, conhecido como M-FISH (Multiplex-FISH), SKY (Spectral
Karyotyping) ou CCK (Color Changing Karyotyping), marca e identifica cada
cromossomo humano com uma cor diferente. São utilizadas misturas de sondas
específicas, desenhadas para cobrir todo o cromossomo, e marcadas com diferentes
fluoróforos. O cariótipo multicolorido é bastante útil para detectar e identificar
rearranjos estruturais não identificáveis por outros métodos, especialmente em casos
de câncer, em que os rearranjos cromossômicos podem ser bastante variáveis. Além do
alto custo, as principal limitação do cariótipo multicolorido é que, além de necessitar de
preparações cromossômicas, ou seja, cultivo celular prévio, essa metodologia também
não identifica com segurança rearranjos como microdeleções ou rearranjos muito
pequenos, inversões, duplicações e deleções, sendo necessária a confirmação por FISH.
A CGH (Comparative Genomic Hybridization) analisa, comparativamente, as variações
de número de cópias do DNA entre uma amostra controle (amostra de DNA normal) e
a amostra a ser testada (por exemplo, uma amostra de tumor). O princípio da técnica
é a hibridização in situ competitiva entre duas sequências de DNA marcadas com
fluorescências diferentes. A principal vantagem da CGH é a possibilidade de se estudar
o genoma inteiro, sem, necessariamente, uma hipótese diagnóstica. A maior limitação
da CGH é a incapacidade de detectar rearranjos cromossômicos como translocações
recíprocas ou inversões, e há dificuldade em detectar mosaicismos. Além disso, como é
uma técnica muito sensível para detectar desbalanços quantitativos no DNA, resultados
de CGH tendem a ser complexos, sendo ainda difícil determinar quais diferenças
detectadas são realmente significativas e quais correspondem apenas a polimorfismos
sem implicação médica.
A MLPA (Multiplex Ligation-Dependent Probe Amplification) é uma técnica em que até
45 sequências diferentes no genoma podem ser utilizadas em uma única reação de
PCR semiquantitativa. As principais vantagens da MLPA são: seu custo relativamente
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baixo, a rapidez de execução e a utilização de equipamentos usualmente presentes
na maioria dos laboratórios de biologia molecular. As limitações da MLPA envolvem a
confecção elaborada das sondas e o fato de que cada conjunto de sondas é construído
para analisar cromossomos específicos (até 45 segmentos de DNA), existindo, portanto,
a necessidade de haver uma hipótese diagnóstica prévia.
3.4. ESTUDOS BIOQUÍMICOS
Diversas doenças metabólicas, como mucopolissacaridoses, lipidoses e erros do
metabolismo dos aminoácidos, podem ter o seu diagnóstico pré-natal através de
dosagens enzimáticas ou de metabólitos, realizadas em líquido amniótico ou vilo
corial. No entanto, em nosso país, são muito poucos laboratórios que as realizam, e as
técnicas de diagnóstico molecular as vêm substituindo com vantagens.
3.5. TÉCNICAS INVASIVAS PARA COLETA DO MATERIAL FETAL
O objetivo dessas técnicas é a coleta de células fetais que permitam a realização dos
estudos cromossômicos, de DNA ou dosagens bioquímicas. A escolha da melhor
técnica dependerá, muitas vezes, de avaliação prévia de cada caso. As técnicas mais
importantes são coleta de vilo corial, amniocentese, cordocentese e diagnóstico préimplantação. A discussão dos detalhes técnicos de cada uma delas não é objeto deste
Manual.
3.5.1. COLETA DE VILO CORIAL
Consiste na retirada de uma pequena quantidade do córion frondoso, que é
geneticamente representativo do feto, como amostra dos exames a serem realizados.
Pode ser realizada, com segurança, a partir de 10 semanas de gravidez. Quando
realizada a partir de 12 semanas, alguns autores denominam este procedimento de
biópsia de placenta.
Apesar de inicialmente ter sido utilizada a via transcervical, hoje esse procedimento
está praticamente restrito à via transabdominal, onde o risco de complicações é bem
menor. Utilizando esta via, a coleta pode ser realizada até o final da gravidez.
A quantidade de material a ser colhido dependerá da habilidade do laboratório e,
algumas vezes, dos exames a serem realizados. Em geral, para estudos cromossômicos,
a quantidade ideal é de 20mg de vilo, no entanto, alguns laboratórios conseguem
resultados em quantidades tão pequenas como 1mg a 5mg.
Quando se deseja material para estudos de DNA (diagnóstico de doenças gênicas,
determinação de paternidade), este é o método de escolha, pois, para este tipo de
análise, não é necessária a realização de cultura. Para estudos cromossômicos, alguns
laboratórios preferem a cultura em curto prazo (24 horas), que permite o resultado
entre três e cinco dias.
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A grande vantagem da coleta de vilo corial é a sua precocidade, reduzindo o período
de incerteza do casal.
Em cerca de 1% dos casos, são encontrados mosaicismos cromossômicos. Na maioria das
vezes, esses mosaicismos estão restritos a tecidos trofoblásticos. No entanto, para essa
definição, é necessária a realização posterior de amniocentese. Nos poucos casos em que
a amniocentese confirmar o mosaicismo encontrado no vilo, o aconselhamento genético é
complexo e exigirá a consulta com geneticista experiente em diagnóstico pré-natal.
Embora pouco frequentes, as divergências entre o cariótipo fetal obtido por meio
de vilo corial e o cariótipo e/ou fenótipo do nascimento podem ocorrer na prática
clínica. Os resultados falsos negativos têm uma incidência de 0,1%, ou seja, um a cada
mil diagnósticos. Outro tipo de discrepância de resultados que podemos encontrar
ocorre, por exemplo, no vilo corial apresentando trissomia livre e líquido amniótico
com cariótipo normal. Esse fenômeno pode ser explicado pelo mecanismo de resgate
trissômico, que pode determinar a ocorrência de um feto cromossomicamente normal
ou a existência da chamada dissomia uniparental. Na dissomia uniparental, fenômeno
que ocorre em um terço dos casos de mosaicismo confinado à placenta (MCP), os
cromossomos presentes no feto são provenientes de um dos progenitores, ou seja, um
par de cromossomos herdado do pai ou da mãe. Ela pode manifestar-se clinicamente
como doenças específicas (por exemplo, síndrome de Prader-Willi), doenças recessivas
e/ou retardo mental, além de atraso de crescimento fetal.
Os riscos maternos mais frequentes da coleta de vilo corial são sangramento vaginal,
infecção e sensibilização pelo fator Rh. Eles são minimizados com a experiência dos
profissionais envolvidos na coleta e com o uso de imunoglobulina após o procedimento
em mulheres Rh-negativas. O risco de abortamento é menor que 1%.
Estudo conduzido sob controle da Organização Mundial de Saúde abrangendo
138.996 coletas de vilo corial concluiu que este tipo de exame é seguro, com taxa de
perda fetal comparável à da amniocentese e com a mesma incidência de defeitos de
membros da população em geral. Este mesmo estudo concluiu pela inexistência de
qualquer anomalia congênita associada à biópsia de vilo corial.
LIMITAÇÕES
O diagnóstico molecular pode ser realizado por FISH, PCR e, mais recentemente, pela
avaliação com “microarrays”, tanto para avaliação de aneuploidias quanto de doenças
genéticas específicas (talassemia, determinação do fator Rh etc.). Nesta situação,
usualmente é necessária uma pequena amostra de vilo corial. O resultado pode levar
de um a cinco dias.
O diagnóstico citogenético depende de cultura das células que só podem ser avaliadas
durante a sua divisão. Nesta situação, usualmente é necessária uma amostra maior de
vilo corial. O resultado pode levar de cinco a 10 dias.
Neste exame, a falha de cultura é muito menos frequente, porém, a ocorrência de
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mosaico placentário é três vezes maior do que no líquido amniótico. Como estes
mosaicos podem estar confinados à placenta, a amniocentese pode ser indicada se
estes forem encontrados no vilo corial.
É possível fazer a utilização de heparina na agulha para evitar a coagulação de sangue
dentro dela, levando a perda de parte do material já extraído e facilitando a avaliação
primária da amostra para saber se será ou não suficiente para a análise.
A realização de PCR para pesquisa dos principais cromossomos envolvidos em
aneuploidias fetais – X, Y, 13, 18 e 21 –, quando aliada à análise direta, pode encurtar
o tempo do resultado para 12 horas a partir da chegada no laboratório.
O laboratório de citogenética deve ser de alta qualidade, assegurando a correta
identificação das amostras e liberação correta dos laudos. Lembrando-se que o
médico que realiza a coleta é também corresponsável pelo resultado laboratorial
(acurácia e insucesso).
PERSPECTIVAS
A possibilidade de avaliar as células, ou o próprio DNA do feto, livres na circulação
materna abre uma oportunidade para a avaliação genética fetal, sem a necessidade
de exames invasivos. Desta forma, estaria disponível para todas as gestantes. Os
princípios básicos de isolamento deste material, células fetais íntegras ou DNA fetal
livre na circulação da mãe, estão sendo estudados, porém, ainda não se mostraram
clinicamente aplicáveis.
3.5.2 AMNIOCENTESE
Consiste na utilização de líquido amniótico, colhido pela punção da cavidade amniótica,
como amostra para a realização dos estudos necessários. Habitualmente, são aspirados
cerca de 20mL de líquido amniótico, dos quais são extraídas células fetais (fibroblastos)
provenientes da descamação da pele, vias urinárias e tubo digestivo, após cultura.
Podem ser realizados estudos cromossômicos, análise do DNA, testes bioquímicos e
dosagens hormonais.
Em geral, a amniocentese é realizada a partir de 15 semanas, e o seu resultado, como
depende de cultura celular, demora cerca de 10 a 14 dias. Alguns laboratórios, para
um resultado mais rápido em relação às anormalidades mais comuns neste exame
(trissomias 21, 13, 16, 18, 22, monossomia X, triploidias) e tranquilidade materna,
realizam técnicas de citogenética molecular ou FISH para estas alterações. Estas técnicas
permitem um resultado preliminar em relação a estas anormalidades em um a dois dias
e, posteriormente, um resultado definitivo, com o estudo citogenético tradicional.
A amniocentese é um procedimento bastante seguro, com risco de abortamento
de menos de 0,5%. Suas complicações mais frequentes são sangramento vaginal e
sensibilização pelo fator Rh.
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LIMITAÇÕES
O diagnóstico molecular pode ser realizado por FISH (Fluorecent in Vitro Hybridization),
PCR (Polimerase Chain Reaction) e, mais recentemente, pela avaliação com
“microarrays”, tanto diagnóstico de aneuploidias quanto de doenças genéticas
específicas (talassemia, determinação do fator Rh etc.). Nesta situação, usualmente é
necessária uma pequena amostra (1mL a 3mL) de líquido amniótico. O resultado pode
levar de um a cinco dias.
O diagnóstico citogenético depende de cultura das células que só podem ser avaliadas
durante a sua divisão, pois os cromossomos são contados quando as células estão em
metáfase (condensados no núcleo celular). Nesse caso, habitualmente é necessária
uma amostra mínima de 15mL a 20mL de líquido amniótico. O resultado pode levar
de 10 a 21 dias.
Na eventualidade de haver falha de cultura (1% a 5% dos casos) ou de não se atingir
um número mínimo de metáfases a serem avaliadas, o resultado pode ser inconclusivo,
levando a grande frustração do médico e do paciente. Dessa forma, cuidados no
armazenamento e transporte do material são essenciais para evitar esta ocorrência.
Deve-se solicitar que o laboratório de citogenética armazene, ou extraia, o DNA da
amostra antes da colocação em cultura. Esta medida tem por objetivo permitir que,
em caso de falha de cultura, este material separado seja enviado para o laboratório
de biologia molecular para realização de PCR, permitindo pelo menos a pesquisa dos
principais cromossomos envolvidos em aneuploidias fetais: X, Y, 13, 18 e 21. Com
esta medida, pelo menos se obtém um resultado parcial afastando-se as principais
trissomias. Alguns autores no Reino Unido têm preconizado que apenas o diagnóstico
molecular seja realizado nas amostras fetais, por uma questão de custo e padronização.
O laboratório de citogenética, para o qual a amostra será enviada, deve ser de alta
qualidade, assegurando a correta identificação do material e liberação correta dos
laudos. Lembrando-se que o médico que realiza a coleta é também corresponsável
pelo resultado laboratorial (acurácia e insucesso).
A presença de mosaico no resultado citogenético, ou seja, quando se identificam duas
linhagens celulares numa amostra, é muito rara (0,3%) e sua interpretação necessita
de avaliação conjunta com o geneticista clínico.
PERSPECTIVAS
A possibilidade de avaliar as células, ou o próprio DNA do feto, livres na circulação
materna abre uma oportunidade para a avaliação genética fetal, sem a necessidade de
exames invasivos. Dessa forma, a avaliação estaria disponível para todas as gestantes.
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Os princípios básicos de isolamento deste material, células fetais íntegras ou DNA fetal
livre na circulação da mãe, estão sendo estudados, porém, ainda não se mostraram
clinicamente aplicáveis.
3.5.3 CORDOCENTESE
É a coleta de sangue diretamente do cordão umbilical, guiada por ultrassonografia.
O sangue obtido pode ser utilizado para estudos cromossômicos, estudos do DNA,
dosagens bioquímicas, diagnósticos de hemoglobinopatias, dosagens de IgG e IgM
fetais e uma variedade crescente de novos exames.
Suas indicações mais frequentes são: achado de anomalia fetal pelo estudo
ultrassonográfico, falha em obter resultado e resultado ambíguo na amniocentese ou
para doenças que só podem ser diagnosticadas por testes bioquímicos em plasma fetal
ou células sanguíneas.
Pode ser realizada a partir de 18 semanas de gravidez e é um procedimento
tecnicamente mais difícil do que a coleta de vilo corial e amniocentese. A perda fetal
pelo procedimento se situa em torno de 1%. Suas complicações mais comuns são:
sangramento no local da punção, hematoma de cordão umbilical, bradicardia fetal,
hemorragia feto-materna, sensibilização pelo fator Rh, descolamento prematuro da
placenta e parto pré-termo.
LIMITAÇÕES
O diagnóstico molecular pode ser realizado por FISH, PCR e, mais recentemente, pela
avaliação com “microarrays”, tanto para avaliação de aneuploidias quanto de doenças
genéticas específicas. Nesta situação, usualmente é necessária uma pequena amostra
(0,5mL a 1,0mL) de sangue. O resultado pode levar de um a cinco dias.
O diagnóstico citogenético depende de cultura das células que só podem ser avaliadas
durante a sua divisão. Nesse caso, habitualmente é necessária uma amostra mínima de
1,5mL e o resultado pode levar de 10 a 21 dias.
É recomendação deste autor que o teste de Kleihauer-Betke deva ser sempre solicitado
para avaliação da pureza da amostra de sangue fetal, que pode ser contaminado por
sangue materno, principalmente se a punção ocorrer na inserção placentária do cordão.
PERSPECTIVAS
No passado, o diagnóstico das infecções fetais era realizado principalmente através da
cordocentese, atualmente, a pesquisa de DNA ou RNA do agente em questão pode
ser realizada unicamente no líquido amniótico, na maioria das infecções congênitas.
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
Leitura complementar
1. JAUNIAUX, E; RODECK C. Use, risks and complications of amniocentesis and
chorionic villous sampling for prenatal diagnosis in early pregnancy. Early Pregnancy.
1995; 1(4): 245-52. Review.
2. KAGAN, KO; ETCHEGARAY, A; ZHOU, Y; WRIGHT, D; NICOLAIDES, KH. Prospective
validation of first-trimester combined screening for trisomy 21. Ultrasound Obstet
Gynecol. 2009; 34(1): 14-8.
3. NDUMBE, FM; NAVTI, O; CHILAKA, VN; KONJE, JC. Prenatal diagnosis in the first
trimester of pregnancy. Obstet Gynecol Surv. 2008; 63(5): 317-28.
4. PATHAK, B; KHAN, A; ASSAF, SA; MILLER, DA; CHMAIT, RH. Amniopatch as a
Treatment for Rupture of Membranes following Laser Surgery for Twin-Twin
Transfusion Syndrome. Fetal Diagn Ther. 2010. Epub ahead of print.
5. WILSON, RD; LANGLOIS, S; JOHNSON, JA. Society of Obstetricians and
Gynaecologists of Canada. Mid-trimester amniocentesis fetal loss rate. J Obstet
Gynaecol Can. 2007; 29(7): 586-95. Review.
6. WRIGHT, CF; BURTON, H. The use of cell-free fetal nucleic acids in maternal blood
for non-invasive prenatal diagnosis. Hum Reprod Update. 2009; 15(1): 139-51.
Review.
7. MACIULEVICIENE, R; GAURILCIKAS, A; SIMANAVICIUTE, D; NADISAUSKIENE, RJ;
GINTAUTAS, V; VAITKIENE, D; BALIUTAVICIENE, DK. Fetal middle cerebral artery
Doppler velocimetry in cases of rhesus alloimmunization. J Matern Fetal Neonatal
Med. 2008; 21(6): 361-5.
8. ROMANELLI, RM; MAGNY, JF; JACQUEMARD, F. Prognostic markers of symptomatic
congenital cytomegalovirus infection. Braz J Infect Dis. 2008; 12(1): 38-43.
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
Seção 2
Complicações maternas e obstétricas:
prevenção, diagnóstico e conduta
PREMATURIDADE: ASPECTOS RELEVANTES NA PACIENTE ASSINTOMÁTICA
O parto prematuro, definido como a ocorrência do nascimento antes de 37 semanas
completas de gestação, apresenta incidência variável de acordo com as características
populacionais. Na Europa, sua incidência varia de 6% a 10%. Nos Estados Unidos EUA,
tem sido observado aumento de sua frequência, sendo que, em 2006, atingiu 12,8%
dos nascidos vivos. Outros países desenvolvidos, tais como o Canadá, a Austrália e a
Dinamarca, também têm revelado aumento das taxas da prematuridade. As informações
publicadas pelo Ministério da Saúde mostram que os nascimentos prematuros na
população brasileira têm se mantido constantes nos últimos anos, com média de 6,6%,
sendo variáveis de estado para estado, podendo atingir taxas de até 9% e com tendência
à elevação em algumas metrópoles.
Embora a sobrevida dos recém-nascidos prematuros tenha melhorado nos últimos
anos, a prematuridade ainda é a principal causa de morbidade e mortalidade neonatal.
Além disso, as implicações econômicas desfavoráveis que se estendem além do período
neonatal têm sido cada vez mais preocupantes.
A prematuridade pode ser classificada, segundo a sua evolução clínica, em eletiva ou
espontânea.
Na prematuridade eletiva, a gestação é interrompida em virtude de complicações
maternas (por exemplo, doença hipertensiva, descolamento prematuro de placenta,
placenta prévia etc.) e/ou fetais (como restrição do crescimento fetal ou sofrimento fetal)
nas quais o fator de risco é geralmente conhecido e corresponde a 25% dos nascimentos
prematuros.
A prematuridade espontânea corresponde a 75% dos casos e decorre do trabalho
de parto prematuro (TPP). Nesse grupo, a etiologia é complexa e multifatorial ou
desconhecida.
As estratégias de prevenção primária devem ser focadas em medidas gerais de promoção
da saúde antes mesmo da mulher engravidar e na qualidade do pré-natal. Entre as
principais medidas, destacam-se: prevenção do fumo e drogas ilícitas, redução do
estresse e controle nutricional.
Levando-se em conta que, na maioria das vezes, a prevenção primária é difícil de ser
implementada e tendo em vista que muitos dos fatores de risco não podem ser modificados
antes ou durante a gestação, assumem importância a prevenção secundária e terciária.
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A prevenção secundária consiste no reconhecimento de sinais e sintomas precoces do
TPP além do emprego de outros indicadores preditivos. Entre estes, destacam-se as
modificações do colo uterino detectadas pela ultrassonografia transvaginal e os métodos
bioquímicos. Com a melhora na detecção desses casos, torna-se possível a adoção de
medidas preventivas secundárias (repouso, circlagem do colo uterino e progesterona) e
também terciárias (tocólise, corticoterapia antenatal, antibioticoterapia profilática para o
estreptococo do Grupo B e a transferência da gestante para unidade de referência). No
entanto, ainda existem dúvidas sobre a real eficácia da maioria dessas intervenções em
relação à diminuição da morbidade e mortalidade neonatal.
Nesse texto, discutiremos os principais indicadores de risco para o parto prematuro
espontâneo.
FATORES DE RISCO
A realização de anamnese detalhada é o primeiro passo para se identificar a mulher com
risco para o parto prematuro. A busca por indicadores clínicos deve ser instituída, de
preferência, antes da concepção, para permitir o controle dos riscos e contribuir para uma
evolução favorável da gestação.
Apesar de o parto prematuro ser considerado de etiologia desconhecida em cerca de 50%
dos casos, com frequência ocorre associação de fatores de risco maternos e fetais que
podem ser classificados em epidemiológicos, obstétricos, ginecológicos, clínico-cirúrgicos,
genéticos, iatrogênicos e desconhecidos.
Entre os possíveis fatores que conferem maiores riscos, destacam-se a história de parto
prematuro espontâneo, a gemelidade e os sangramentos persistentes de segundo
trimestre.
Após um parto prematuro espontâneo, o risco de repetição varia de 14% a 22%, é de
28% a 42% após dois e de 67% após três partos prematuros. A ocorrência de partos a
termo diminui o risco de partos prematuros em gestações subsequentes.
A gemelidade corresponde ao intervalo de 2% a 3% de todos os nascimentos, mas está
presente em 17% dos nascimentos abaixo de 37 semanas e em 23% dos nascimentos
abaixo de 32 semanas12. A maior disponibilidade de técnicas de reprodução assistida tem
sido responsável pela maior incidência de gestações múltiplas e, consequentemente, maior
risco de nascimentos prematuros.
O sangramento decidual persistente manifestado pelo sangramento vaginal de segundo
trimestre é fator de risco para rotura prematura de membranas ovulares e parto prematuro.
Há vários estudos que associam as infecções genitourinárias ao parto prematuro
espontâneo. No entanto, o diagnóstico e o tratamento das infecções vaginais constituem
intervenções ainda não comprovadas para reduzir a prematuridade. Por outro lado, o
mesmo não pode ser dito em relação à bacteriúria assintomática. O seu diagnóstico e
tratamento diminuem o risco de parto prematuro.
A relação direta entre os possíveis fatores de risco e o parto prematuro espontâneo é,
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muitas vezes, difícil de ser estabelecida. Geralmente, ocorre apenas a suspeita entre a
exposição e a ocorrência do nascimento prematuro. A diversidade de etiologias, o fato
de que muitos desses nascimentos ocorrem em mulheres sem fatores de risco e a não
existência de modelo animal adequado para testar o parto prematuro e suas causas
não permitem que esses indicadores sejam utilizados com sucesso para a predição do
parto prematuro. Dessa maneira, outros marcadores de risco para a prematuridade vêm
ganhando importância nos últimos anos.
MARCADORES ULTRASSONOGRÁFICOS
A avaliação do colo uterino, durante a gestação, pode ser útil na identificação do risco
para o parto prematuro espontâneo. Quanto menor o comprimento do colo, maior a
probabilidade de prematuridade, uma vez que o esvaecimento cervical constitui uma
das primeiras etapas do processo de parturição e precede o trabalho de parto em
quatro a oito semanas.
O exame do colo uterino pode ser feito pelo toque vaginal e pela ultrassonografia
abdominal ou vaginal. O toque vaginal com objetivo de verificar as características
do colo (dilatação, esvaecimento e posição) revela baixa sensibilidade e baixo valor
preditivo positivo para a detecção do parto prematuro. Obtém-se melhor desempenho
para o rastreamento do parto prematuro com a ultrassonografia transvaginal. Em
comparação com a técnica abdominal, a via vaginal é mais vantajosa, pois permite a
avaliação da porção supravaginal do colo uterino com menor interferência das partes
fetais no segmento inferior do útero, além de não necessitar do enchimento da bexiga
materna e evitar erros na medição pelo falso alongamento do colo uterino.
O comprimento do colo é o indicador ultrassonográfico mais importante, e a sua
medida é feita linearmente entre o orifício externo e interno, delimitados pelo início
e fim da mucosa endocervical ecogênica. Outros achados secundários também
podem ser obtidos com o exame, tais como a presença de afunilamento, detectado
pela abertura do orifício interno do colo uterino superior a 5mm e a ausência do eco
glandular endocervical.
Algumas limitações estão presentes nos estudos de predição do parto prematuro pela
ultrassonografia transvaginal, entre elas a ausência de padronização em relação à idade
gestacional da avaliação inicial e a indefinição do ponto de corte abaixo do qual o risco
de parto prematuro torna-se significante. A medida do comprimento do colo uterino
antes de 15 semanas não apresenta bons resultados para a predição e a maioria dos
estudos a utilizam durante o segundo trimestre da gestação, principalmente entre a
22ª e 24ª semanas, quando os resultados preditivos são melhores.
A definição de colo curto varia entre os diferentes autores, na dependência dos
melhores valores de sensibilidade e especificidade para gestantes sintomáticas
ou assintomáticas e de acordo com a idade gestacional da ocorrência do parto.
Atualmente, há tendência da literatura internacional em utilizar como ponto de corte
comprimento inferior a 25mm. Entre nós, a Clínica Obstétrica do HC-FMUSP preconiza
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a avaliação ultrassonográfica transvaginal para medir o comprimento do colo uterino
em todas as gestantes assintomáticas com ou sem risco para o parto prematuro, entre
a 22ª e 24ª semana, por ocasião da ultrassonografia morfológica fetal, utilizando 20 mm
como ponto de corte. Na gestação gemelar, considera-se o colo curto quando inferior
a 25mm.
Na presença de colo curto, recomendamos o repouso, a investigação de infecções
genitourinárias, o acompanhamento seriado das contrações uterinas, do comprimento
do colo e realização de testes bioquímicos. Da mesma maneira, orientamos para o uso
da progesterona natural, 200mg/dia, pela via vaginal até a 36ª semana.
Na gestante sintomática, ou seja, quando o diagnóstico de trabalho de parto prematuro
é duvidoso, consideramos de risco para o parto prematuro a medida do comprimento
do colo uterino inferior a 15mm. Nesta situação, deve ser realizada a prevenção
terciária – internação para tocólise e corticoterapia antenatal.
MARCADORES BIOQUÍMICOS
Dos possíveis marcadores bioquímicos conhecidos, podem ser citados: as interleucinas
(IL 6 e 8), hormônio liberador da corticotropina (CRH), estriol salivar, a fibronectina
fetal e, mais recentemente, a proteína-1 fosforilada ligada ao fator de crescimento
insulina-símile (phIGFBP-1). As interleucinas, o CRH e o estriol demonstraram baixas
sensibilidades e baixos valores preditivos e não trazem benefícios para a predição do
parto prematuro.
Entre todos os indicadores bioquímicos, a fibronectina fetal (fFN) é a que apresenta os
melhores resultados para a predição do parto prematuro.
A fFN é uma glicoproteína produzida pelo trofoblasto, cuja função fisiológica é
assegurar a aderência do blastocisto à decídua. Normalmente, a fFN está presente
no conteúdo vaginal na primeira metade da gestação. Após a 22ª semana, ocorre a
fusão do âmnio com o cório e a fFN desaparece da vagina até a 35ª semana, a menos
que haja rotura de membranas, presença de fator mecânico, infeccioso, inflamatório
ou isquêmico na interface materno-fetal. Portanto, o teste só tem utilidade quando
realizado entre 22 e 34s6d.
Para a detecção da fFN, podem ser utilizados dois tipos de teste – o quantitativo e o
qualitativo. Em nosso meio, dispomos apenas do teste rápido (qualitativo), em que o
resultado é obtido em 10 minutos. A gestante é colocada em posição ginecológica
e introduz-se um espéculo estéril na vagina para a coleta do conteúdo vaginal da
porção posterior do colo, por meio de swab de Dácron, por aproximadamente 10
segundos. Posteriormente, o swab com o material coletado é introduzido em frasco
com solução tampão, onde é vigorosamente agitado por 10 segundos. Em seguida, o
swab é descartado e insere-se a fita de leitura na solução tampão e, a partir de então,
aguardam-se 10 minutos para a realização da leitura. O teste é considerado positivo
quando são formadas duas linhas róseas na fita de leitura, o que significa a presença
da fFN em concentrações superiores a 50mg/mL. É importante destacar que, antes
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da obtenção da amostra, não pode haver manipulação do colo pelo toque vaginal ou
ultrassonografia de colo, coito, uso de lubrificantes ou medicamentos por um período
de 24 horas, devido à possibilidade de resultados falsos positivos ou negativos.
O teste da fFN pode ser utilizado em gestantes sintomáticas, em que há dúvidas em
relação ao diagnóstico do trabalho de parto prematuro, ou em gestantes assintomáticas
com risco para o parto prematuro espontâneo.
A utilidade do teste em gestantes sintomáticas pode ser confirmada pela revisão
sistemática em que foram incluídos 40 estudos prospectivos. Cerca de 80% das
mulheres que tiveram parto prematuro tiveram o teste positivo para a fFN uma semana
antes do nascimento, ou seja, trata-se de um teste sensível que geralmente é positivo
quando ocorre o parto prematuro. Apenas 13% das que não tiveram o parto em uma
semana apresentaram resultado positivo do teste da fFN, ou seja, raramente é positivo
quando a gestação evolui para o termo.
O principal benefício do teste da fFN reside no seu elevado valor preditivo negativo
(superior a 90%), ou seja, a probabilidade de parto a termo em mulheres com teste
negativo é alta. Diante de um teste negativo, pode-se evitar internações e intervenções
desnecessárias. Por outro lado, o valor preditivo positivo é mais baixo (inferior a 50%),
mas superior a outros marcadores bioquímicos, tais como o estriol, interleucinas e CRF.
Diante do teste positivo, recomenda-se a internação, corticoterapia antenatal e tocólise.
Em gestantes sintomáticas, há um sinergismo evidente entre a medida do comprimento
do colo uterino pela ultrassonografia transvaginal e o teste da fFN. Em estudo com 215
gestantes sintomáticas, entre 22 e 35 semanas, verificou-se que quando o comprimento
do colo era inferior a 15mm e a fFN positiva, todos os partos ocorriam dentro de 20
dias. Por outro lado, diante do comprimento do colo maior ou igual a 15mm e fFN
negativa, a ocorrência do parto era postergada.
Em gestantes assintomáticas com antecedente de parto prematuro, o teste da fFN
revela melhores valores de sensibilidade quando em combinação com a medida do
comprimento do colo uterino pela ultrassonografia transvaginal.
Em estudo multicêntrico com 1.282 gestantes assintomáticas e com partos prematuros
anteriores, demonstrou-se que diante do comprimento do colo menor que 25mm e
fFN positiva na 24ª semana, o risco de repetição do parto prematuro foi de 64%, e de
25% quando a fFN era negativa. No entanto, observou-se que mesmo com colo longo
(maior que 35mm) houve repetição do parto prematuro em 28% dos casos quando
a fFN era positiva e de 7% quando a fFN era negativa. Sem dúvida, a medida do
comprimento do colo uterino é útil, mas a fFN consegue identificar aquelas gestantes
de risco que já possuem alterações bioquímicas mas que ainda têm um colo longo.
Quando a ultrassonografia transvaginal e o teste da fFN revelam resultados negativos,
menos de 1% têm chance de parto prematuro nas duas semanas seguintes. Nesses
casos, recomenda-se que ambos os exames sejam repetidos a cada duas semanas. O
manejo dos casos com positividade apenas do teste da fFN ainda é discutível, pois a
sensibilidade é menor e os falsos positivos maiores. Embora exista maior risco de parto
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prematuro quando os dois exames são positivos em gestantes assintomáticas, o parto
geralmente não ocorre nos próximos sete dias. No entanto, em tal situação, a partir de
26 semanas deve ser considerada a administração do corticoide e possível internação
para a tocólise. Até o momento, não se sabe se o uso da progesterona nesses casos
pode trazer benefícios.
Recentemente, surgiram evidências de que o parto prematuro seria precedido pela
presença da proteína-1 fosforilada ligada ao fator de crescimento insulina-símile
(phIGFBP-1) no conteúdo cervical. A phIGFBP-1 é uma proteína produzida pela decídua
humana, cuja função ainda não está totalmente esclarecida. Supõe-se que o seu
aparecimento na segunda metade da gestação seja semelhante ao que acontece com a
liberação da fFN, ou seja, secundário a um processo mecânico, inflamatório/infeccioso
ou isquêmico na interface materno-fetal. A maioria dos estudos disponíveis utilizou
gestantes sintomáticas nas quais o teste revelou valor preditivo negativo elevado
(90%). No entanto, ainda não há estudos com casuística suficiente que comprovem
sua utilidade prática.
CONCLUSÃO
A identificação de alguns fatores de risco modificáveis antes da concepção ou no
início da gestação pode evitar o parto prematuro. No entanto, a maioria dos partos
prematuros espontâneos ocorre em mulheres sem fatores de risco.
Embora até o momento não exista nenhum teste preditivo ideal em termos de
sensibilidade e valores preditivos, a predição do parto prematuro tornou-se mais precisa
com o advento da medida do comprimento do colo uterino pela ultrassonografia
transvaginal e com o teste da fibronectina fetal. Os melhores valores de predição são
obtidos quando ambos os exames são utilizados simultaneamente tanto em gestantes
sintomáticas quanto assintomáticas de risco. A principal utilidade dos exames reside
nos elevados valores preditivos negativos (acima de 90%) e não nos valores preditivos
positivos, que são mais baixos.
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
Leitura complementar
1. HAMILTON, BE; MARTIN, JA; VENTURA, SJ. Births: preliminary data for 2006. Natl Vital
Stat Rep. 2007; 56: 17.
2. LANGHOFF-ROOS, J; KESMODEL, U; JACOBSSON, B; RASMUSSEN, S; VOGEL,
I. Spontaneous preterm delivery in primiparous women at low risk in Denmark:
population based study. Br Med J. 2006; 332(7547): 937-9.
3. Secretaria de Vigilância em Saúde; Ministério da Saúde. Uma análise dos nascimentos
no Brasil e regiões 2000-2004. 2006. Disponível em: http://www.saude.gov.br/svs.
Acessado em: 5 out. 2013.
4. [SEADE] Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados. Declaração de Nascidos
Vivos. Sistema de tabulação dos microdados do registro civil para o Estado de São
Paulo. 2006. Disponível em: http://seade.gov.br/produtos/mrc.
5. CHANDIRAMANI, M; SHENNAN, A. Preterm labour: update on prediction and
prevention strategies. Curr Opin Obstet Gynecol. 2006; 18: 618-24.
6. DA FONSECA, EB; BITTAR, RE; CARVALHO, MH; ZUGAIB, M. Prophylatic administration
of progesterone by vaginal suppository to reduce the incidence of spontaneous preterm
birth in women at increased risk: A randomized placebo-controlled double-blind study.
Am J Obstet Gynecol. 2003; 188: 419-24.
7. MEIS, PJ; KLEBANOFF, M; THOM, E et al. Prevention of recurrent preterm delivery by 17
alpha-hidroxyprogesterone caproate. N Engl J Med. 2003; 348: 2379.
8. DA FONSECA, EB; CELIK, E; PARRA, M et al. Progesterone and the risk of preterm birth
among women with a short cervix. N Engl J Med. 2007; 357: 462.
9. DA FONSECA, EB; BITTAR, RE; DAMIÃO, R; ZUGAIB, M. Prematurity prevention: the
role of progesterone. Curr Opin Obstet Gynecol. 2009; 21: 142-7.
10. BITTAR, RE; PEREIRA, PP; LIAO, AW. Prematuridade. In: ZUGAIB, M (ed.). Obstetrícia.
Barueri: Manole, 2008, p.646-66.
11. MCMANEMY, J; COOKE, E; AMON, E; LEET, T. Recurrence risk for preterm delivery. Am
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12. ACOG Practice Bulletin # 56: Multiple Gestation: Complicated Twin, Triplet, and HighOrder Multifetal Pregnancy. Obstet Gynecol. 2004; 104: 869.
13. VILLAR, J; GULMEZOGLU, AM; DE ONIS, M. Nutritional and antimicrobial interventions
to prevent preterm birth: An overview of randomized controlled trials. Obstet Gynecol
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14. YAMASAKI, AA; BITTAR, RE; FONSECA, EVB; MARTINELLI, S; SASAKI, S; ZUGAIB,
M. Prevenção do parto prematuro: emprego do toque vaginal e da ultrassonografia
transvaginal. Rev Bras Ginecol Obstet. 1998; 20: 35-46.
15. CARVALHO, MHB; BITTAR, RE; BRIZOT, ML; MAGANHA, PPS; FONSECA, ESVB; ZUGAIB,
M. Cervical length at 11-14 week’s gestation evaluated by transvaginal sonography,
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preterm delivery in the second trimester. Obstet Gynecol. 2005; 105: 532.
17. BITTAR, RE; DA FONSECA, EB; CARVALHO, MHB; MARTINELLI, S; ZUGAIB, M.
Predicting preterm delivery in asymptomatic patients with prior preterm delivery by
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18. FUJITA, MM; BRIZOT, ML; LIAO, AW; BERNATH, T; CURY, L; BANDUKI NETO, JD;
ZUGAIB, M. Reference range for cervical length in twin pregnancies. Acta Obstet
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19. LOCKWOOD, CJ; SENYEI, AE; DISCHE, MR; CASAL, D; SHAH, KD; THUNG, SN. Fetal
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
PREMATURIDADE: ASPECTOS RELEVANTES NA PACIENTE SINTOMÁTICA
TOCÓLISE
A inibição das contrações uterinas, ou tocólise, é o último recurso preventivo disponível
ao obstetra para adiar o nascimento. Sabe-se que a tocólise geralmente não evita o
parto prematuro, pois as causas desencadeantes do TPP persistem e, na maioria das
vezes, consegue-se apenas abolir as contrações uterinas por algum tempo. No entanto,
ao se conseguir adiar o parto por pelo menos 48 horas, torna-se possível a realização
da corticoterapia antenatal e, com isso, reduz-se o risco de complicações neonatais,
tais como a síndrome do desconforto respiratório (SDR), a hemorragia cerebral, a
enterocolite necrosante e de morte neonatal. Além disso, tal medida permite a eventual
transferência da gestante para outro serviço hospitalar com melhores condições de
atendimentos a prematuros.
DIAGNÓSTICO DO TRABALHO DE PARTO PREMATURO
A primeira dificuldade é o reconhecimento do início do trabalho de parto (TP). O útero
apresenta atividade contrátil durante toda a gestação, com contrações de dois tipos:
de baixa amplitude e de grande amplitude (Braxton Hicks). No último trimestre da
gestação, as contrações de Braxton Hicks vão se tornando cada vez mais frequentes e
podem ser confundidas com contrações de trabalho de parto. Tal fato é responsável
pelas internações desnecessárias em cerca de 50% das gestantes supostamente em
TPP.
As dificuldades existentes para o diagnóstico inicial do TPP fazem com que até o
momento não exista protocolo, baseado em evidências, sobre quais alterações de
contratilidade uterina e do colo uterino justificam a realização do tratamento. Dessa
maneira, os critérios para o diagnóstico do TPP variam na literatura2. A seguir, os
critérios mais aceitos para o diagnóstico de TPP:
•
Contrações uterinas regulares a cada cinco minutos. O American Congress
of Obstetricians and Gynecologists enfatiza a importância da persistência das
contrações, ou seja, pelo menos quatro contrações em 20 minutos ou oito
contrações em 60 minutos.
•
Dilatação cervical de pelo menos 1cm.
•
Presença de esvaecimento cervical.
No falso trabalho de parto (FTP), não ocorre a mudança progressiva do colo e as
contrações cessam espontaneamente após um período de observação (Quadro 1).
Quadro 1: Diferenças clínicas entre trabalho de parto e falso trabalho de parto
TRABALHO DE PARTO
FALSO TRABALHO DE PARTO
Contrações em intervalos regulares
Contrações em intervalos irregulares
Contrações com intensidade crescente
Intensidade variável
Dores predominantemente na região sacral
Dores abdominais
Aumento das contrações ao deambular
O deambular não exerce efeito
Esvaecimento e dilatação progressivos do colo uterino
Esvaecimento e dilatação: se presentes, não evoluem
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
Para o diagnóstico diferencial em casos duvidosos, é importante que a gestante seja
observada durante duas a três horas antes de se iniciar a tocólise. Nesse sentido, o
teste rápido para detecção da fibronectina fetal (fFN) e a ultrassonografia transvaginal
para avaliação do comprimento do colo (CC) uterino são medidas úteis para diferenciar
o falso do verdadeiro trabalho de parto prematuro e evitar internação e medicalização
desnecessárias.
Diante de teste positivo para fFN e medida do CC uterino menor ou igual a 15mm é
altamente provável que o parto ocorra nos próximos sete dias. Por outro lado, quando
o teste da fFN for negativo e a medida do CC uterino for maior ou igual a 15mm,
sugere-se FTP.
Infelizmente, a dificuldade de se diagnosticar o verdadeiro TPP e os diferentes critérios
utilizados para o seu diagnóstico torna difícil a interpretação dos resultados de
trabalhos científicos sobre os diferentes tipos de uterolíticos.
AVALIAÇÃO INICIAL
Antes de se instituir a terapêutica inibitória, deve-se estar atento às indicações e
contraindicações da tocólise (Tabelas 1 e 2). A gestante deve ser hospitalizada e as
seguintes providências e avaliações devem ser realizadas:
•
Vitalidade fetal: desde que haja viabilidade fetal, ou seja, idade gestacional igual ou
superior a 26 semanas, deve ser realizada a cardiotocografia fetal. Posteriormente,
durante a tocólise, os batimentos cardíacos fetais também devem ser monitorados
em intervalos regulares. Com tal medida, também são monitoradas as contrações
uterinas.
•
Ultrassonografia para confirmar a apresentação fetal, analisar o volume de
líquido amniótico, estimar o peso fetal, a idade gestacional e pesquisar possíveis
malformações fetais.
•
Exame bacterioscópico e cultura de conteúdo vaginal e anal para o estreptococo
do Grupo B, coleta do conteúdo cervical para pesquisa de Chlamydia trachomatis
e Neisseria gonorrhoea. Na impossibilidade destes testes, deve-se considerar a
gestante com colonizada pelo estreptococo do Grupo B.
•
Acesso venoso e coleta de hemograma. Coleta de urina para exame de urina tipo I
e cultura de urina.
Tabela 1: Condições para o uso de uterolíticos
Período de latência do trabalho de parto (dilatação cervical < 3 cm)
Esvaecimento não pronunciado
Idade gestacional entre 22 e 34 semanas
Ausência de contraindicações
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
Tabela 2: Contraindicações para a tocólise
Morte fetal
Sofrimento fetal
Malformações fetais incompatíveis com a vida
Restrição do crescimento fetal
Rotura da bolsa das águas
Infecção amniótica
Descolamento prematuro de placenta
Placenta prévia sangrante
Síndromes hipertensivas
Diabetes insulino-dependente instável
Cardiopatias
Hipertireoidismo não compensado
Anemia falciforme
TOCÓLISE
1. LIMITES INFERIORES E SUPERIORES PARA A TOCÓLISE
A idade gestacional mínima para se realizar a tocólise é motivo de controvérsia e
não existem recomendações baseadas em evidências. Alguns autores consideram
15 semanas, momento em que as perdas decorrentes de alterações genéticas são
menos frequentes. Outros adotam 20 ou 22 semanas. Quanto ao limite superior de
idade gestacional, a maioria dos autores adota 34 semanas – período a partir do
qual diminuem consideravelmente a morbidade e a mortalidade neonatal –, que não
justificam as complicações maternas e fetais decorrentes da tocólise. Além disso, a
administração do corticoide antenatal só é indicada até 34 semanas.
2. HIDRATAÇÃO
Estudos randômicos demonstraram que a hidratação não reduz a taxa de partos
prematuros. No entanto, nos casos em que as contrações uterinas e alterações
cervicais são pouco pronunciadas e existe dúvida quanto ao diagnóstico do TPP, podese infundir por via IV soro fisiológico e glicosado a 5%, em partes iguais, num total
de 1.000mL. Se, após uma hora, persistirem as contrações uterinas, introduz-se a
terapêutica medicamentosa.
3. UTEROLÍTICOS
As drogas uterolíticas são utilizadas para inibir o TPP há quase 50 anos. Durante todos
esses anos, apenas duas drogas foram desenvolvidas especialmente para esse fim:
a ritodrina (agonista beta-adrenérgico) e a atosibana (antagonista do receptor de
ocitocina). As outras drogas foram adaptadas para a tocólise. Atualmente, há três tipos
de uterolíticos mais utilizados: agonistas beta-adrenérgicos, bloqueadores do canal de
cálcio e antagonistas do receptor de ocitocina. Outras drogas também utilizadas para
inibir o TPP (sulfato de magnésio, inibidores de prostaglandinas e doadores de óxido
nítrico) carecem de comprovação quanto à eficácia ou são responsáveis por efeitos
colaterais importantes.
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ESCOLHA DO UTEROLÍTICO
Devem ser levadas em conta a eficácia e a segurança. Quanto à eficácia, o ideal seria a
diminuição da taxa de partos prematuros, da morbidade e da mortalidade neonatal, e
não apenas o adiamento do parto por 48 a 72 horas ou sete dias, como a maioria dos
estudos relatam. Além disso, a droga deve ser segura para a mãe, o feto e o recémnascido.
FALHAS DE TOCÓLISE
Diante da incapacidade de inibir as contrações uterinas com determinado uterolítico,
pode-se substituí-lo por outro. No entanto, antes da utilização de um segundo
tocolítico, deve-se excluir a presença de corioamnionite e de alterações da vitalidade
fetal.
TRABALHO DE PARTO PREMATURO RECORRENTE
Não existem estudos controlados sobre o uso repetido de uterolíticos para o tratamento
do parto prematuro recorrente, embora recomendemos que, se necessária, a repetição
da tocólise seja feita apenas uma só vez.
AGONISTAS BETA-ADRENÉRGICOS
Em 1961, pela primeira vez, propôs-se o emprego de um agente betamimético, a
isoxsuprina, para inibir as contrações uterinas. Com ação predominantemente em
receptores beta-1 (coração e intestinos), causa mais efeitos colaterais cardiovasculares
e deve ser evitada. Em seu lugar, deve-se dar preferência às drogas de efeito
predominantemente beta-2 (com ação em miométrio, vasos sanguíneos e bronquíolos),
tais como a terbutalina, o salbutamol e a ritodrina. Destas três, apenas a ritodrina está
aprovada pela Food and Drug Administration (FDA) dos Estados Unidos para inibir o TPP.
MECANISMO DE AÇÃO
Ao atuarem em receptores da célula miometrial, determinam o seu relaxamento por
diminuição do cálcio livre no interior das células. O mecanismo envolvido nesse efeito
consiste na ativação da enzima adenilciclase, que catalisa a conversão do ATP em AMP
cíclico. Este último, por sua vez, diminui o cálcio livre intracelular.
EFICÁCIA
Em revisão da Cochrane, na qual foram incluídas 1.332 gestantes pertencentes a
11 estudos randômicos e placebo-controlados, verificou-se que os agonistas betaadrenérgicos evitam o parto prematuro nas primeiras 48 horas (RR 0,63, IC 95% 0,530,75) e possivelmente antes de sete dias (RR 0,67, IC 95% 0,48-1,01). Observou-se
também uma tendência em reduzir a síndrome do desconforto respiratório (SDR) dos
recém-nascidos, mas que não foi significante (RR 0,87, IC 95% 0,71-1,08), e nenhum
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efeito sobre a mortalidade neonatal (RR 1,00, IC 95% 0,48-2,09). Entre as críticas desta
pesquisa, destaca-se a de que vários estudos que participaram dessa metanálise não
utilizavam o corticoide antenatal de rotina, o que pode ter influenciado nos resultados.
EFEITOS COLATERAIS
Os agonistas beta-adrenérgicos também agem em outros órgãos e, no sistema
cardiovascular, contribuem para o aparecimento de dor torácica, taquicardia, dispneia,
mal-estar e edema agudo de pulmões. Além disso, atuam no SNC e causam cefaleia,
tonturas e tremores. Tais efeitos colaterais contribuem para a descontinuidade
do tratamento. Além disso, atravessam a placenta, tendo sido descritos inúmeros
efeitos colaterais no feto e no recém-nascido, como taquicardia, hiperinsulinismo,
hipoglicemia, hipocalemia e hipotensão arterial.
Em virtude dos efeitos colaterais, alguns cuidados devem ser tomados por ocasião do
uso de tais drogas: realizar eletrocardiograma materno prévio; controlar com cuidado
o pulso e a pressão arterial, mantendo o pulso materno abaixo de 120bpm; auscultar
periodicamente os pulmões e coração; e monitorar os batimentos cardíacos fetais.
Deve-se salientar que os efeitos colaterais cardiovasculares, como o edema agudo
de pulmões, são mais frequentes em situações de hipervolemia materna, como no
polidrâmnio, na gestação gemelar e em pacientes submetidas à infusão de grande
quantidade de líquidos. É importante destacar que, diante da tocólise com betaagonistas, a administração de líquidos não deve ultrapassar 2L em 24 horas.
ESQUEMA TERAPÊUTICO
Diluem-se cinco ampolas de terbutalina (1 amp = 0,5mg) em soro glicosado a 5% (500mL),
que são infundidas por via intravenosa, iniciando-se com 2,5μg/min (10 gotas/min); a
seguir, aumentam-se 10 gotas/min a cada 20 minutos até um máximo de 80 gotas/
min; uma vez obtida a dose mínima capaz de cessar as contrações, mantém-se o
gotejamento por 24 horas.
Caso as contrações não diminuam em seis horas ou se a tocólise for necessária por
mais de 24 horas, deve-se pesquisar a presença de corioamnionite ou insuficiência
placentária. Após as 24 horas de administração da droga, diminuem-se 10 gotas a
cada 20 minutos, até a suspensão total da mesma. A paciente deve ser mantida em
repouso absoluto e sob vigilância por mais 24 horas e, caso ocorra o retorno das
contrações, utiliza-se o esquema intravenoso mais uma vez.
BLOQUEADORES DO CANAL DE CÁLCIO
MECANISMO DE AÇÃO
Inibem a entrada do cálcio extracelular através da membrana citoplasmática, impedem
a liberação do cálcio intracelular do retículo sarcoplasmático e aumentam a saída do
cálcio da célula miometrial.
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
EFICÁCIA
Até o momento, não existem estudos placebo-controlados que avaliem a eficácia dos bloqueadores
de canal do cálcio em inibir o TPP. Há apenas estudos comparativos com outras drogas, os quais
devem ser interpretados com cautela.
Em metanálise de nove estudos (679 gestantes) em que se comparou a nifedipina com terbutalina
ou ritodrina, verificou-se que a nifedipina foi mais eficaz em inibir o TPP nas primeiras 48 horas
(OR 1,52, IC 95% 1,03-2,24).
Posteriormente, o mesmo grupo de autores realizou nova metanálise com 12 estudos (1.029
gestantes), em que comparou-se o uso de bloqueadores do canal de cálcio com outras drogas
uterolíticas (principalmente agonistas beta-adrenérgicos), e observou-se que os bloqueadores do
canal de cálcio não reduziram significantemente o risco de parto prematuro nas primeiras 48 horas
(RR 0,80, IC 95% 0,61-1,05), mas conseguiram reduzir o risco quando considerado o intervalo de
sete dias para a ocorrência do parto (RR 0,76; IC 95% 0,60-0,97). Segundo os resultados desse
estudo, houve redução significante da SDR, enterocolite necrosante e hemorragia cerebral nos
recém-nascidos com a utilização dos bloqueadores do canal do cálcio. Entre as críticas, destacase o fato de que dois estudos participantes da metanálise exerceram forte influência sobre os
resultados e pertenciam ao mesmo grupo de autores. Além disso, não houve seguimento dos
recém-nascidos após a alta do berçário.
Recentemente, foi realizada revisão sistemática do uso da nifedipina para inibir o TPP. Foram
identificados 45 estudos sobre o tema; entretanto, nessa revisão, foram incluídos apenas 31, dos
quais 77% apresentavam vieses de amostragem, de aferição, de seleção e confusão. Além disso,
o próprio fabricante não indica o seu uso para a inibição do TPP. Portanto, ainda há necessidade de
estudos clínicos controlados para determinar com maior precisão a aplicabilidade dessas drogas.
EFEITOS COLATERAIS
Por serem vasodilatadores periféricos, os bloqueadores do canal de cálcio podem causar rubor
facial, cefaleia, tonturas, palpitações e hipotensão arterial, sendo de menores intensidades do que
com os agonistas beta-adrenérgicos. Nas doses habitualmente utilizadas para inibir o TPP, não há
dados sobre os efeitos colaterais fetais.
ESQUEMA TERAPÊUTICO
A posologia ideal é desconhecida. Há vários esquemas que podem ser utilizados, entre eles:
30mg VO, seguidos de 20mg VO a cada quatro ou seis horas; 20mg VO, seguidos de 20mg VO
em 90 minutos e 10mg VO a cada 20 minutos, num total de quatro doses.
ANTAGONISTAS DE RECEPTOR DA OCITOCINA
MECANISMO DE AÇÃO
O Atosibana é o primeiro antagonista específico da ocitocina utilizado clinicamente. Sua estrutura
química, muito semelhante à da ocitocina, lhe permite ocupar os receptores específicos, impedindo
a contração uterina. Entre tais drogas, destaca-se o Atosibana, comumente utilizado na Europa.
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
EFICÁCIA
Estudos comparativos de tamanhos amostrais relevantes têm demonstrado que a atosibana
é tão eficaz quanto à ritodrina, salbutamol e terbutalina em inibir o TPP, sendo, porém, mais
seguro e mais bem tolerado que os agonistas beta-adrenérgicos. Da mesma forma, a morbidade
e mortalidade neonatal foram semelhantes nos grupos avaliados.
Quanto à comparação da atosibana com o placebo, em revisão da Cochrane na qual foram
avaliados seis estudos com 1.695 gestantes, verificou-se que o primeiro elevou o risco de parto
prematuro nas primeiras 48h após o início do tratamento (RR 2,50, IC 95% 0,51-12,35), elevou
o risco de nascimento abaixo de 28 semanas (RR 2,25, IC 95% 0,80-6,35) e também abaixo de
37 semanas (RR 1,17, IC 95% 0,99-1,37). No entanto, nenhum desses aumentos apresentou
significância estatística. A morbidade e a mortalidade neonatal foram semelhantes nos dois grupos.
Há de se destacar que o emprego do corticoide antenatal variou amplamente entre os estudos.
Além disso, dois estudos que fizeram parte dessa metanálise, num total 613 gestantes, revelaram
que a atosibana associou-se à menor média de peso ao nascimento e complicações neonatais.
Posteriormente, verificou-se que a randomização dos grupos foi inadequada, pois havia duas
vezes mais mulheres com idade gestacional menor que 26 semanas no grupo atosibana do que
no grupo placebo, ou seja, os grupos não eram homogêneos. Naquelas com idade gestacional
superior a 28 semanas, os resultados maternos e neonatais foram melhores no grupo atosibana.
Diante de tais controvérsias, a mesma revisão Cochrane demonstrou que a atosibana foi
igualmente eficaz aos agonistas beta-adrenérgicos em evitar o nascimento prematuro dentro das
primeiras 48 horas (RR 0,98, IC 95% 0,68-1,41) ou dentro dos primeiros sete dias de tratamento
(RR 0,91, IC 95% 0,69-1,20). A atosibana também demonstrou menores efeitos colaterais
maternos (RR 0,04, IC 95% 0,02-0,11) quando comparado aos agonistas beta-adrenérgicos.
EFEITOS COLATERAIS
Entre os efeitos colaterais maternos mais observados, destacam-se: náuseas, tonturas e cefaleia.
Não foram observados efeitos cardiovasculares. Em relação aos efeitos colaterais fetais e neonatais,
há um único estudo em que se demonstrou maior taxa de complicações neonatais com o uso de
atosibana em prematuros extremos. Conforme já discutido anteriormente, a interpretação desses
dados é discutível porque a randomização desses grupos foi inadequada.
Estudo nacional prospectivo e randomizado envolvendo 80 pacientes em trabalho de parto
prematuro comparou o uso do atosibana com a terbutalina. O antagonista de ocitocina
apresentou melhor desempenho (sucesso tocolítico em 97,5% dos casos, contra 77,5% no
grupo terbutalina) sem efeitos colaterais. O tratamento tocolítico com a terbutalina precisou ser
suspenso, devido à presença de efeitos adversos em 10% dos casos; isto não foi necessário em
nenhum caso do grupo com atosibana”
ESQUEMA TERAPÊUTICO
O atosibana pode ser administrado, inicialmente, em duas etapas:
•
Dose de ataque de 0,9mL (6,75mg) injetada diretamente na veia durante um
minuto.
59
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•
Manutenção: infundem-se duas ampolas de 5mL em 90mL de SG5% (solução
de 100mL), IV, durante três horas na velocidade de 24mL/h (300mg/min);
posteriormente, infundem-se os 28mL restantes da solução anterior em três horas
e 30 minutos na velocidade de 8mL/h, totalizando seis horas e 30 minutos. Antes
de continuar com a administração da droga, devem ser monitoradas as contrações
uterinas. Em nossas observações, a administração da droga por seis horas e 30
minutos é suficiente para inibir as contrações uterinas em 75% dos casos.
•
Caso as contrações persistam, realiza-se a terceira etapa: solução IV de 90mL de
SG5% com duas ampolas de 5mL de atosibana na velocidade de 8mL/h até que
totalize 48 horas desde o início do tratamento.
SULFATO DE MAGNÉSIO
MECANISMO DE AÇÃO
Ainda não se tem conhecimento exato de como age o magnésio sobre as contrações
uterinas, mas provavelmente compete com o cálcio, impedindo a sua entrada pela
membrana da célula miometrial.
EFICÁCIA
Na última revisão da Cochrane, a qual envolveu 190 gestantes, comparado ao placebo,
o sulfato de magnésio não reduziu o nascimento prematuro antes de 48 horas (RR
0,57, IC 95% 0,28-1,15) e nem a SDR (RR 1,09, IC 95% 0,98-1,22). No mesmo estudo,
também se verificou que o sulfato de magnésio não foi melhor e nem pior do que
outros uterolíticos (beta-adrenérgicos, bloqueadores de canais de cálcio e inibidores da
ciclo-oxigenase). No entanto, o tamanho amostral foi pequeno e o corticoide antenatal
também não foi utilizado em todos os casos.
EFEITOS COLATERAIS
Apesar dos riscos potenciais, poucos efeitos colaterais maternos são observados
quando a concentração sérica de magnésio é mantida em níveis terapêuticos
(4 a 6 mEq/L – mg/dL). No entanto, na hipermagnesemia surgem náuseas, vômitos,
cefaleia, distúrbios visuais, letargia, fraqueza muscular, diminuição de reflexos,
hipotensão arterial, palpitações e depressão respiratória. O magnésio atravessa
facilmente a barreira placentária e a hipermagnesemia pode causar hiporreatividade
e hipotonia fetal. Dessa maneira, a gestante deve ser cuidadosamente monitorada
em relação à diurese, frequência respiratória e reflexos patelares. Além disso, deve-se
avaliar a magnesemia materna a cada seis horas.
ESQUEMA TERAPÊUTICO
A dose preconizada é de 4g diluídos em soro glicosado a 10% e infundidos IV em 20
minutos, como dose de ataque, seguidos de 2 a 3g/h até cessarem as contrações uterinas.
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INIBIDORES DE PROSTAGLANDINAS
MECANISMO DE AÇÃO
Atuam inibindo a ciclo-oxigenase, enzima responsável pela síntese de prostaglandinas
a partir do ácido aracdônico. Entre essas drogas, a indometacina é a mais utilizada para
a inibição do TPP.
EFICÁCIA
Em revisão realizada pela Cochrane com apenas 70 casos, comparada ao placebo, a
indometacina reduziu o risco de parto em 48 horas (RR 0,20, IC 95% 0,03 – 1,28) e em
sete dias (RR 0,41, IC 95% 0,10 -1,66). Não houve diferença nos resultados neonatais.
No mesmo estudo, comparou-se a indometacina a outros uterolíticos (agonistas
beta-adrenérgicos e sulfato de magnésio) em 415 casos. A indometacina revelou-se
mais eficaz em evitar o parto em 48 horas (RR 0,59, IC 95% 0,34-1,02), embora
os resultados não tenham sido estatisticamente significantes. Portanto, em vista do
tamanho pequeno da amostra, quando comparada ao placebo, e dos resultados
duvidosos quando comparada a outras drogas, a sua eficácia ainda é discutível.
EFEITOS COLATERAIS
Entre os efeitos colaterais maternos, destacam-se: náuseas, vômitos e disfunção
plaquetária. Entre os efeitos colaterais fetais mais comumente relacionados, podem
ser citados o oligoâmnio e o fechamento precoce do ducto arterioso, principalmente
quando a droga é utilizada acima de 32 semanas. Outras complicações neonatais
estão associadas à indometacina: enterocolite necrosante, leucomalácia e hemorragia
intraventricular.
ESQUEMA TERAPÊUTICO
O esquema mais comumente empregado é o de uma dose inicial de 100mg por via
retal, seguida de 25mg por via oral a cada seis horas, por um período máximo de
48 horas, para idades gestacionais de até 32 semanas. A ultrassonografia fetal e a
ecocardiografia fetal devem ser realizadas periodicamente caso o tratamento exceda
48 horas.
DOADORES DE ÓXIDO NÍTRICO
O óxido nítrico atua na atividade do sistema enzimático da quinase de cadeia leve da
miosina e promove o relaxamento da célula miometrial. A nitroglicerina transdérmica
é a mais utilizada na inibição do TPP.
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
EFICÁCIA
Ainda não existem evidências suficientes para o uso dessas drogas no TPP.
Em estudo randômico com 153 parturientes entre 24 e 32 semanas, comparou-se a
nitroglicerina com placebo. Entre as que utilizaram a nitroglicerina (n = 74), houve
risco neonatal mais baixo (hemorragia intraventricular, leucomalácia, complicações
pulmonares e enterocolite necrosante) quando comparado com placebo (n = 79) (RR
0,29, IC 95% 0,08-1,00). Não se observou diferença significante entre os dois grupos
na diminuição do risco de parto antes de 28 semanas e nem de prolongamento da
gestação por sete dias23.
Em outro estudo, com 238 parturientes, comparou-se o óxido nítrico com agonistas
beta-adrenérgicos (salbutamol ou ritodrina). A inibição do TPP foi mais eficaz com os
agonistas beta-adrenérgicos.
EFEITOS COLATERAIS
Hipotensão arterial materna, tonturas, palpitações. Até o momento, não há relatos de
efeitos colaterais fetais e neonatais.
ESQUEMA TERAPÊUTICO
Embora possa se utilizar a via intravenosa, a mais utilizada é a via transdérmica, por
meio de adesivos de nitroglicerina. Apesar de a dose ideal ainda não ser conhecida,
recomenda-se, pela via transdérmica, o uso de adesivo de 10mg aplicado na pele do
abdome. Após uma hora, caso persistam as contrações, aplica-se mais um adesivo,
sendo que ambos podem permanecer no local durante 24 horas e depois ser removidos.
MANUTENÇÃO PÓS-TOCÓLISE
Ainda não existem estudos com tamanhos amostrais adequados e bem conduzidos
sobre a utilização de uterolíticos após o sucesso da tocólise.
Em revisão da Cochrane na qual foram avaliados 11 estudos randômicos com agonistas
beta-adrenérgicos e placebo, não se observou diferenças significantes entre os grupos
quanto ao prolongamento da gestação.
Outros estudos, em que foram avaliados o sulfato de magnésio, a nifedipina e o
antagonista da ocitocina, também não demonstraram vantagens em relação ao
placebo.
É possível que a progesterona possa trazer algum benefício para a manutenção da
gestação após a tocólise. Assim, após a inibição do TPP e por ocasião da alta hospitalar,
a gestantes pode ser orientada para repouso físico, sexual e utilização da progesterona
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natural – uma cápsula de 200mg, via vaginal, a cada 12 horas, até a 36ª semana. Não
utilizamos outro tipo de medicamentos para a manutenção. O seguimento da gestação
é feito por meio de controle semanal em ambulatório especializado.
CONCLUSÕES
A tentativa de bloquear o trabalho de parto prematuro, utilizando-se drogas tocolíticas,
constitui estratégia importante para amenizar os relevantes efeitos da parturição em
idade gestacional precoce. Entre as opções tocolíticas de melhor desempenho, mais
disponíveis em nosso meio, temos a terbutalina, nifedipina, indometacina e a atosibana.
Embora a eficácia desses medicamentos seja considerada muito semelhante, a atosibana
é o único medicamento específico para inibir o trabalho de parto prematuro; os outros
já foram empregados em tratamentos de doenças pulmonares, cardiovasculares e
inflamatórias, com maiores riscos de aparecimento de efeitos adversos até graves para
a mãe e/ou concepto. Além disso, a atosibana é o único a possuir esquema posológico
bem padronizado de uso, tornando sua ministração mais fácil, prática e segura. Os
custos referentes ao uso da atosibana são maiores; dependendo do local de atendimento
isto tem sido destacado como fator dificultador para sua aquisição. Lembramos que
cerca de 70 a 80% dos casos de trabalho de parto prematuro podem ser inibidos com
sucesso com a ministração das fases 1 e 2 do medicamento; a utilização da fase 3, nos
casos mais refratários realmente tornam o tratamento mais dispendioso. Devemos,
entretanto, ressaltar que os custos destes tratamentos não podem ser avaliados de
forma simplista. A interrupção da tocólise em função de efeitos colaterais relevantes
pode significar em muitos casos o nascimento prematuro, impondo tratamento muito
mais oneroso, além dos riscos de sequelas neonatais inerentes à prematuridade.
Estudos iniciais de farmacoeconomia comparando os custos do nascimento pré-termo
com aqueles decorrentes da utilização do atosibana, indicam relação custo/benefício a
favor do uso do fármaco.
Por fim, outro aspecto a ser valorizado é que o processo de tocólise, na atualidade,
deve ser encarado como uma associação de drogas. O tocolítico raramente vai ser
utilizado isoladamente; seu uso será associado ao corticoide (para acelerar a maturidade
pulmonar fetal), antibiótico (para prevenção da sepse neonatal pelo estreptococo do
grupo B) e em alguns casos ao sulfato de magnésio (como neuroproteção do concepto).
Em função dessas observações, torna-se mais favorecido o uso de medicamentos
específicos, nitidamente associados a menores índices de efeitos colaterais.
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
Leitura complementar
1. MCPHEETERS, GA; MILLER, WC; HARTMANN, KE. The epidemiology of threatened
preterm labor: a prospective cohort study. Am J Obstet Gynecol. 2005; 192: 1325.
2. [ACOG] American Congress of Obtetricians and Gynecologists. Practice Bulletin.
Clinical management guidelines for obstetrician-gynecologist. Management of
preterm labor. Obstet Gynecol. 2003; 101: 1039.
3. BITTAR, RE; ZUGAIB, M. Tratamento do trabalho de parto premature. Rev Bras
Ginecol Obstet. 2009; 31(8): 415-22.
4. GOMEZ, R; ROMERO, R; MEDINA, L. Cervicovaginal fibronectin improves the
prediction of preterm delivery based on sonographic cervical length in patients
with preterm uterine contractions and intact membranes. Am J Obstet Gynecol.
2005; 192: 350.
5. BITTAR, RE; PEREIRA, PP; LIAO, AW. Prematuridade. In: ZUGAIB, M (ed.). Obstetrícia.
Barueri: Manole, 2008, p. 645-66.
6. GOLDENBERG, RL. The management of preterm labor. Obstet Gynecol. 2002; 100:
1020.
7. KORENBROT, CC; AALTO, LH; LAROS, RK. The cost effectiveness of stopping
preterm labor with beta-adrenergic treatment. N Engl J Med. 1984; 310: 691.
8. PIRCON, RA; STRASSNER, HT; KIRZ, DS; TOWERS, CV. Controlled trial of hydration
and bed rest versus bed rest alone in the evaluation of preterm uterine contractions.
Am J Obstet Gynecol. 1989; 161: 775.
9. GUINN, DA; GOEPFERT, AR; OWEN, J. Management options in women with
preterm uterine contractions: a randomized clinical trial. Am J Obstet Gynecol.
1997; 177: 814.
10. SIMHAN, H; CARITIS, S. Inhibition of acute preterm labor. Up to Date. 2009.
Disponível em: http://www.uptodateonline.com. Acessado em: 6 out. 2013.
11. BISHOP, EH; WOUTERXZ, TB. Isoxsuprine, a myometrial relaxant. Obstet Gynecol.
1961; 17: 442-6.
12. ANOTAYANONTH, S; SUBHEDAR, NV; GARNER, P. Betamimetics for inhibiting
preterm labour. Cochrane Database Syst Rev. 2004; CD004352.
13. TSATSARIS, V; PAPATSONIS, D; GOFFINET, F. Tocolysis with nifedipine or betaadrenergic agonists: a meta-analysis. Obstet Gynecol. 2001; 97: 840.
14. KING, JF; FLENADY, VJ; PAPATSONIS, DN. Calcium channel blockers for inhibiting
preterm labour. Cochrane Database Syst Rev. 2003; CD002255.
15. LAMONT, RF; KHAN, KS; BEATTIE, B. The quality of nifedipine studies used to assess
tocolytic efficacy: a systematic review. J Perinat Med. 2005; 33(4): 287-95.
16. MOUTQUIN, JM; SHERMAN, D; COHEN, H. Double-blind, randomized, controlled
trial of atosiban and ritodrine in the treatment of preterm labor: A multicenter
effectiveness and safety study. Am J Obstet Gynecol. 2000; 182: 1191-9.
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
17. The Worldwide Atosiban versus Beta-agonists Study Group. Effectiveness and safety
of the oxytocin antagonist atosiban versus beta-adrenergic agonists in the treatment
of preterm labour. Br J Obstet Gynecol. 2001; 108: 133-42.
18. PAPATSONIS, D; FLENADY, V; COLE, S; LILEY, H. Oxytocin receptor antagonists for
inhibiting preterm labour. Cochrane Database Syst Rev. 2005; CD004452.
19. ROMERO, R; SIBAI, BM; SANCHEZ-RAMOS, L; VALENZUELA, GJ; VEILLE, JC; TABOR,
B et al. An oxytocin receptor antagonist (atosiban) in the treatment of preterm
labor: a randomized, double-blind, placebo-controlled trial with tocolytic rescue.
Am J Obstet Gynecol. 2000; 182(5): 1173-83.
20. CABAR, FR; BITTAR, RE; GOMES, CM; ZUGAIB, M. O atosibano como agente
tocolítico: uma nova proposta de esquema terapêutico. Rev Bras Ginecol Obstet.
2008; 30(2): 87-92.
21. CROWTHER, CA; HILLER, JE; DOYLE, LW. Magnesium sulphate for preventing
preterm birth in threatened preterm labour. Cochrane Database Syst Rev. 2002;
CD001060.
22. KING, J; FLENADY, V; COLE, S; THORNTON, S. Cyclo-oxygenase (COX) inhibitors for
treating preterm labour. Cochrane Database Syst Rev. 2005; CD001992.
23. Smith, GN; Walker, MC; Ohlsson, A. Randomized double-blind placebo-controlled
trial of transdermal nitroglycerin for preterm labor. Am J Obstet Gynecol. 2007;
196: 37.
24. BISITS, A; MADSEN, G; KNOX, M. The randomized nitric oxide tocolysis trial
(RNOTT) for the treatment of preterm labor. Am J Obstet Gynecol. 2004; 191: 683.
25. DODD, J; CROWTHER, C; DARE, M; MIDDLETON, P. Oral betamimetics for
maintenance therapy after threatened preterm labour. Cochrane Database Syst
Rev. 2006; CD003927.
26. LYELL, DJ; PULLEN, KM; MANNAN, J. Maintenance nifedipine tocolysis compared
with placebo: a randomized controlled trial. Obstet Gynecol. 2008; 112: 1221.
27. VALENZUELA, GJ; SANCHEZ-RAMOS, L; ROMERO, R. Maintenance treatment of
preterm labor with oxytocin antagonist atosiban. The Atosiban PTL-098 Study
Group. Am J Obstet Gynecol. 2000; 182: 1184.
28. FACCHINETTI, F; PAGANELLI, S; COMITINI, G; DANTE, G; VOLPE, A. Cervical length
changes during preterm cervical ripening: effects of 17-alpha-hydroxyprogesterone
caproato. Am J Obstet Gynecol. 2007; 196(5): 453.
29. BORNA, S; SAHABI, N. Progesterone for maintenance tocolytic therapy after
threatened preterm labour: A randomized controlled trial. Aust NZJ Obstet
Gynaecol. 2008; 48(1): 58-63.
65
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
PREMATURIDADE: VITABILIDADE, VIABILIDADE E VIA DE PARTO
AVALIAÇÃO DO BEM-ESTAR FETAL
INDICAÇÕES
A avaliação da vitalidade fetal está indicada em situações de maior risco para o
comprometimento da oxigenação fetal:
1. Intercorrências clínicas – síndromes hipertensivas, endocrinopatias, cardiopatias,
frequência, colagenoses, hemopatias, trombofilias, entre outras.
2. Intercorrências obstétricas e fetais – mau passado obstétrico, rotura prematura das
membranas ovulares, gemelidade, aloimunização Rh, placenta prévia, restrição do
crescimento fetal, oligoidrâmnio e polidrâmnio, infecções fetais e malformações
fetais.
MÉTODOS DE AVALIAÇÃO DA VITALIDADE FETAL
Com o intuito de diminuir a morbidade fetal e perinatal, utilizam-se métodos
subsidiários para detectar precocemente as modificações indicadoras de frequência.
Nesse sentido, as técnicas biofísicas mais comumente utilizadas são:
1. Cardiotocografia anteparto
2. Perfil biofísico fetal
3. Dopplervelocimetria
De maneira geral, na insuficiência placentária com hipoxemia fetal progressiva, o doppler
de artéria umbilical revela as primeiras alterações, seguidas pelas anormalidades da
frequência cardíaca fetal (FCF) detectadas pela cardiotocografia e, por últimos, pelos
outros parâmetros do PBF (movimentos respiratórios, corpóreos e tônus). Embora as
alterações do doppler de artéria umbilical sejam mais precoces, posteriormente surgem
alterações no fluxo de outros vasos fetais (na sequência – aorta, artéria cerebral média,
ducto venoso e pulsação da veia umbilical).
Tais métodos apresentam vantagens, desvantagens e predições diferentes. Desse modo,
a literatura tem demonstrado que a utilização de uma única técnica propedêutica não
avalia suficientemente as condições de vitalidade fetal, sendo necessário associar as
várias metodologias de investigação.
A dopplervelocimetria é a técnica mais recente incorporada ao arsenal propedêutico
obstétrico, que passou a desempenhar papel importante no seguimento das gestações
de alto risco, particularmente na avaliação da hipoxemia do prematuro antes da 32ª
semana. Trata-se de um método que efetua a mensuração das velocidades de fluxo em
vasos da circulação materna e fetal (artéria uterina, artéria umbilical, artéria cerebral média,
ducto venoso e veia umbilical). Os casos que mais se beneficiam da dopplervelocimetria são
aqueles com diagnóstico de restrição do crescimento fetal. Por meio desta metodologia,
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pode-se identificar o momento adequado para a resolução da gravidez. Dessa maneira, a
aplicabilidade e os significados das alterações na dopplervelocimetria serão discutidos na
apresentação do tema restrição do crescimento fetal.
A cardiotocografia de repouso e com estímulo sônico têm sido os métodos mais
comumente utilizados na avaliação da vitalidade fetal, por serem inócuos, não invasivos,
de fácil execução e de baixo custo. A interpretação do traçado exige a adoção de
critérios bem estabelecidos. De maneira geral, a presença de variabilidade normal da
FCF e acelerações transitórias em resposta à movimentação fetal sugerem adequada
oxigenação do feto. As desacelerações da FCF indicam anormalidades. A elevação
da FCF basal e a redução da variabilidade são sinais adicionais de acidose metabólica
fetal. A interpretação dos resultados exige a adoção de critérios bem estabelecidos que
podem ser encontrados em textos específicos sobre o tema.
Nesse método, a prematuridade extrema pode prejudicar a interpretação dos
resultados. Uma vez que a influência do sistema parassimpático sobre a FCF aumenta
gradativamente com o avanço da idade gestacional, o método está mais indicado a
partir da maturidade do sistema nervoso autônomo fetal, ou seja, ao final do segundo
trimestre da gestação.
O perfil biofísico fetal (PBF) avalia variáveis biofísicas fetais (movimentos respiratórios,
movimentos corpóreos, tônus fetal e resultados da cardiotocografia) e o volume de
líquido amniótico5. O índice de PBF varia de 0 a 10, sendo que cada parâmetro recebe
pontuação 2, durante um período máximo de 30 minutos de observação. O valores 8
e 10 são considerados normais; 6, suspeito; e inferior a 6, provável asfixia ou asfixia
já instalada. Na prematuridade, já a partir da 26ª semana, espera-se que em situações
normais o índice de PBF seja de pelo menos 8, desconsiderando-se a FCF.
O PBF não é considerado um método sensível para detecção de infecção intrauterina,
uma das possíveis causas de prematuridade. Não se demonstrou relação entre sinais
histológicos de inflamação aguda da placenta e os resultados do PBF em casos de
rotura prematura das membranas ovulares antes da 32ª semana.
LIMITE DA VIABILIDADE: PREMATURIDADE EXTREMA
Os prematuros fazem parte de um grupo bastante amplo e heterogêneo, onde estão
incluídos aqueles recém-nascidos no limite da viabilidade até os que nascem próximo
ao termo da gestação, apresentando características fisiológicas e patológicas muito
variáveis.
Considerando-se a idade gestacional ao nascimento, classificamos a prematuridade
segundo os critérios de Lumley:
•
Prematuridade extrema: de 20 a 27 semanas.
•
Prematuridade moderada: de 28 a 31 semanas.
•
Prematuridade leve: de 32 a 36 semanas.
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As complicações neonatais mais comuns da prematuridade incluem a síndrome do
desconforto respiratório, a hemorragia intraventricular, a enterocolite necrosante e a
sepse. Tais intercorrências são mais frequentes em idades gestacionais inferiores a 32
semanas e tornam-se ainda mais importantes abaixo de 28 semanas.
A capacidade de sobrevivência, ou seja, a viabilidade de fetos prematuros é variável e
depende de vários fatores. Embora em centros de excelência, a partir de 24 semanas,
a maioria dos prematuros sobreviva à custa de atendimento intensivo adequado, a
viabilidade varia de acordo com a etiologia envolvida e de instituição para instituição,
pois depende do suporte dado à parturiente durante o trabalho de parto e ao recémnascido. Torna-se fundamental o conhecimento dos limites de cada serviço para se
adequar à idade gestacional de nascimento. Na maioria dos Serviços Terciários no
Brasil, adota-se 26 semanas como o limite da viabilidade.
Apesar de a evolução da assistência em unidades adequadamente equipadas e com
equipe multidisciplinar especializada ter contribuído em diminuir o limite da viabilidade
fetal para níveis inimagináveis até poucas décadas atrás, as sequelas da prematuridade
e os custos crescentes continuam sendo as principais preocupações para os familiares
e gestores de saúde.
VIA DE PARTO
O melhor tipo de parto no prematuro ainda é motivo de controvérsia, e a decisão deve
ser precedida por avaliação criteriosa de cada caso. Devem ser considerados: idade
gestacional (viabilidade), peso estimado do feto, apresentação fetal, condições do colo
uterino, integridade das membranas ovulares e a possibilidade de monitoração fetal e
experiência da equipe envolvida. No trabalho de parto, quando o feto é considerado
inviável, deve-se preferir a via vaginal para se evitar os riscos médicos associados à
cesárea.
APRESENTAÇÃO CEFÁLICA
Alguns autores optam pela cesárea na apresentação cefálica com idade gestacional
inferior a 28 semanas (abaixo de 1.000g). Como ainda não há estudos randômicos
controlados com tamanho amostral adequado que comprovem que a cesárea é mais
benéfica na apresentação cefálica, preconizamos o parto vaginal, independente do
peso fetal calculado, desde que as condições materno-fetais sejam adequadas. Deve
ser enfatizado que o feto prematuro tem menor tolerância à asfixia do que o de termo
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e, portanto, os batimentos cardíacos fetais devem ser cuidadosamente monitorados.
Compete ao obstetra, no decurso da assistência ao parto, evitar os traumatismos
obstétricos, importantes no desencadeamento de fraturas e hemorragias intracranianas.
Para isso, é necessário avaliar se as condições são satisfatórias para um parto vaginal.
A avaliação da bacia obstétrica é fundamental para que se evite a moldagem excessiva
do crânio com consequente hemorragia cerebral.
Não se recomenda a aplicação do fórcipe no prematuro quando o peso fetal estimado
for inferior a 1.500g pelo maior risco de trauma fetal e hemorragia intracraniana.
Em outras situações em que haja indicação obstétrica, não se deve utilizar o vácuo
extrator, pois proporciona maior risco de hemorragia intracraniana.
Em relação ao parto prematuro induzido, por indicação materna e/ou fetal, as
condições devem ser ideais para a sua realização. Julgamos que a via abdominal é a
preferencial para fetos com pesos estimados abaixo de 1.500g, quando os riscos da
indução passam a ser maiores do que seus possíveis benefícios.
APRESENTAÇÃO PÉLVICA
A via vaginal na apresentação pélvica traz maior risco de complicações perinatais do
que na apresentação cefálica. É importante salientar que a apresentação pélvica é
mais frequente no parto prematuro do que no parto a termo, podendo estar presente
em 25% dos casos na 28ª semana de gestação. As tentativas de parto vaginal na
apresentação pélvica estão mais associadas a riscos de traumatismos fetais e prolapso
de cordão do que na apresentação cefálica. A cabeça fetal é relativamente maior que
o tronco e pode haver dificuldade de seu desprendimento em virtude do colo uterino
estar insuficientemente dilatado. Nesse caso, manobras de extração podem causar
hipoxia, lesões traumáticas e, consequentemente, sequelas neurológicas.
Nós realizamos sistematicamente a cesárea nos prematuros em apresentação pélvica. No
entanto, tal conduta é baseada apenas em estudos retrospectivos, pois não há estudos
prospectivos e randômicos sobre o tema na literatura. Tal carência é explicada pela
necessidade de tamanho amostral elevado diante da incidência reduzida desses casos na
população geral. Além disso, outros fatores, tais como as causas relacionadas ao parto
prematuro, o tipo de assistência durante o trabalho de parto e a assistência neonatal,
também podem interferir e produzir resultados que desviam dos valores verdadeiros.
Contudo, a prática da cesárea também pode conduzir a complicações e o obstetra deve
estar atento aos cuidados para facilitar a extração fetal e evitar traumatismos.
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
Leitura complementar
1. HAMILTON, BE; MARTIN, JA; VENTURA, SJ. Births: preliminary data for 2006. Natl
Vital Stat Rep. 2007; 56: 17.
2. LANGHOFF-ROOS, J; KESMODEL, U; JACOBSSON, B; RASMUSSEN, S; VOGEL,
I. Spontaneous preterm delivery in primiparous women at low risk in Denmark:
population based study. Br Med J. 2006; 332(7547): 937-9.
3. Secretaria de Vigilância em Saúde; Ministério da Saúde. Uma análise dos
nascimentos no Brasil e regiões 2000-2004. 2006. Disponível em: http://www.
saude.gov.br/svs. Acessado em 6 out. 2013.
4.
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
CORTICOTERAPIA ANTENATAL: QUANDO E COMO INDICAR?
Embora já exista consenso desde 1995 sobre as vantagens da corticoterapia antenatal
para os casos de risco de parto prematuro1, ainda se discute sobre o tipo ideal de
corticoide, suas doses e as vantagens de repetição dos ciclos.
QUAL CORTICOIDE DEVE SER UTILIZADO?
Atualmente, são preconizadas duas opções para a corticoterapia: com betametasona
ou com dexametasona (Quadro 1).
Os consensos do NIH publicados em 1995 e 2001 concluíram que ambos aceleram a
maturidade pulmonar fetal e reduzem a incidência da hemorragia intraventricular e da
enterocolite necrosante.
As doses assinaladas no Quadro 1 foram inicialmente escolhidas arbitrariamente, mas
avaliações posteriores demonstraram que as mesmas disponibilizam concentrações
semelhantes aos níveis de cortisol secundários ao estresse fisiológico que ocorrem após
o nascimento. Doses maiores não trazem benefícios. Não foram feitas avaliações com
doses menores.
Quadro 1: Opções para a corticoterapia anteparto
Esquema de Liggins e Howie (1972)
Betametasona – 12mg IM/dia – dois dias
Esquema de Morales et al. (1986)
Dexametasona – 6mg IM duas vezes ao dia – dois dias
Embora a betametasona e a dexametasona tenham estruturas semelhantes, a
primeira tem demonstrado resultados melhores quanto à prevenção da síndrome do
desconforto respiratório, hemorragia intraventricular e morte neonatal. Além disso, há
70 um estudo que constatou maior incidência de leucomalácia periventricular com o
uso da dexametasona, enquanto que a betametasona diminuiu a incidência da mesma
quando comparada ao placebo. Em vista dos resultados acima citados, preferimos a
betametasona na forma de 3 mg de acetato de betametasona mais 3 mg de fosfato
dissódico de betametasona, como a maioria dos autores. Entretanto, na falta da
betametasona, deve-se utilizar a dexametasona, porque os seus benefícios ainda são
maiores que os riscos.
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
QUANDO UTILIZAR O CORTICOIDE?
O corticoide está indicado para as gestantes com risco de parto prematuro dentro
de sete dias, entre 26 e 34 semanas. Estão incluídas aquelas gestantes que entram
espontaneamente em trabalho de parto e aquelas que têm a gestação interrompida
de maneira eletiva. Tal medida constitui nível de evidência 1, segundo a classificação
da US Preventive Services Task Force. Apesar de alguns autores considerarem o seu
uso a partir de 24 semanas, entre 24 e 26 semanas os dados disponíveis ainda são
escassos e discutíveis. Acima de 34 semanas, as vantagens são ainda menos evidentes.
O número de mulheres que teriam que ser tratadas para se evitar um caso de SDR é
muito elevado.
Em 2005, surgiu um estudo que causou polêmica por ter utilizado corticoide em 998
gestantes antes de cesáreas eletivas entre 37 e 39 semanas. No grupo que utilizou
a betametasona nas 48 horas que antecederam a cesárea, houve menor número
de admissões na UTI devido à SDR (redução de 50%). Não ocorreu nenhum óbito
no grupo-controle, mas houve maior número de internações em UTI. Na verdade,
o estudo confirmou o que já se sabia de estudos anteriores – que a cesárea eletiva
antes de 39 semanas eleva o risco da SDR. Além disso, o estudo falhou por não ter
avaliado a evolução neurológica das crianças que receberam o corticoide. Vários são
os estudos que já demonstraram que o corticoide em animais eleva a taxa de morte
celular em regiões cerebrais mitoticamente ativas, retarda a mielinização cerebral e
reduz crescimento dos tecidos cerebrais. Em humanos, pode reduzir o peso do RN,
associa-se a distúrbios de comportamento na idade de três anos e resistência à insulina.
Tais achados foram observados principalmente com ciclos repetidos de corticoide, mas
o ciclo único também está relacionado a complicações.
Diante de tais riscos, não utilizamos o corticoide em idades gestacionais mais avançadas,
quando o risco de complicação respiratória é mais baixo. Seguimos o Consenso do NIH
de 1995 e 2001, assim como o Consenso Europeu de 2008, em que o seu emprego
acima de 34 semanas só se justifica nos casos em que houver evidência de imaturidade
pulmonar pela análise do líquido amniótico.
Há situações, como na gemelidade, de rotura prematura das membranas ovulares
(RPMO), restrição do crescimento fetal, síndromes hipertensivas e diabetes, em que
ainda existem questões não esclarecidas. No entanto, nestes casos os benefícios
superam os riscos.
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
Na última revisão da Cochrane, verificou-se que diante da RPMO o uso do corticoide
diminuiu a morte neonatal, a SDR, a hemorragia cerebral e a enterocolite necrosante
sem evidência de elevar o risco de infecções maternas e neonatais.
No diabetes mellitus, o corticoide pode ser administrado desde que haja monitoração
da glicemia. Após a administração de corticóide, o controle glicêmico deve ser rigoroso
nos próximos três dias. Se houver evidência de imaturidade pulmonar fetal pela análise
do líquido amniótico, após 34 semanas, o corticoide poderá ser administrado.
COMO UTILIZAR O CORTICOIDE?
Utilizamos apenas um ciclo de corticoide, de preferência com betametasona –
12mg IM/dia – em dois dias seguidos, entre 26 e 34 semanas. Essa orientação
segue os últimos consensos americano e europeu. Além desses consensos, em 2008
foi publicado estudo multicêntrico, randômico e controlado, com 1858 casos, do
qual participaram vários países. Nele, ficou demonstrado que os ciclos múltiplos de
corticoide a cada 14 dias, entre 25 e 32 semanas, quando comparados ao placebo,
não reduzem a morbidade e mortalidade neonatal. Além disso, comprometem o peso,
o comprimento e a circunferência cefálica fetal. Dessa maneira, a repetição dos ciclos
não é recomendada.
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
Leitura complementar
1. NIH Consensus Development Panel on the effect of corticosteroids for fetal
maturation on perinatal outcomes. Effects of corticosteroids for fetal maturation
on perinatal outcome. JAMA. 1995; 273: 413-8.
2. NIH Consensus Development Conference Statement. Antenatal corticosteroids
revisited: repeat courses. Obstet Gynecol. 2001; 98: 144-50.
3. LIGGINS, GC; HOWIE, RN. A controlled trial of antepartum glucocorticoid treatment
of the respiratory distress syndrome in premature infants. Paediatrics. 1972; 50:
515-25.
4. MORALES, WJ; DIEBEL, ND; LAZAR, AJ; ZADROZNY, D. The effect of antenatal
dexamethasone on the prevention of respiratory distress syndrome in preterm
gestation with premature rupture of membranes. Am J Obstet Gynecol. 1986; 154:
591.
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associated with antenatal dexamethasone versus antenatal betamethasone.
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cystic periventricular leukomalacia in very premature infants. N Engl J Med. 1999;
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Am J Prev Med. 2001; 20(3S): 21-34.
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psychological functioning and health related quality of life 31 years after inclusion
in randomized controlled trial. BMJ. 2005; 331: 665.
10. MIRACLE, X; DI RENZO, GC; STARK, A. Guideline for the use of antenatal
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help in the setting of preterm rupture of membranes? Am J Obstet Gynecol. 2001;
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corticosteroids for preterm birth (MACS): a randomised controlled trial. Lancet.
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
ROTURA PREMATURA DAS MEMBRANAS OVULARES
A prematuridade, fator diretamente relacionado ao baixo peso ao nascer, é a principal
causa de morte e morbidade neonatal. Apesar de todos os esforços para a redução da
frequência de parto pré-termo, mesmo países que investem muito em saúde mantêm
taxas de RN pré-termo praticamente estáveis, restando, portanto, investir na atenção
neonatal a estes RN com todas as complicações da prematuridade. A necessidade
crescente de UIT neonatal, de profissionais altamente qualificados, de tecnologia
complexa de equipamentos para tratamento e diagnósticos, os altos custos de
internação nesta área e a crescente demanda da clientela por resultados satisfatórios
vêm se tornando um problema de saúde pública. Agrava este fato a realidade atual
de interrupções eletivas de gestações precoces, em decorrência do diagnóstico de
ambiente intrauterino hostil, para gravidezes cujo peso fetal e idade gestacional antes
eram considerados inviáveis. São, portanto, importantíssimos estudos epidemiológicos
dos fatores ligados à prematuridade, na busca de possíveis ações que reduzam as taxas
de parto pré-termo e de seus fatores causas etiológicos ou de associação, constituindo
uma das prioridades em saúde pública no mundo e em nosso meio.
Dentro dessa visão, a rotura prematura de membranas (RPM), intrinsecamente ligada
à prematuridade, incide em aproximadamente 10% das gestações, é responsável por
um terço dos partos prematuros e por 10% das mortes neonatais.
CONCEITO
A rotura prematura das membranas ovulares é definida como a rotura das membranas
(âmnio e cório) que ocorre antes do desencadeamento do trabalho de parto. O
período de latência, isto é, aquele que demanda entre a rotura de membranas e o
desencadeamento do trabalho de parto, deve ter duração de mais de duas horas para
esta definição. Para que as condutas sejam dirigidas a particularidades relacionadas à
idade gestacional, utilizam-se os termos rotura prematura de membranas no termo
(RPMT) para esta ocorrência após 37 semanas e de rotura prematura de membranas
pré-tremo (RPM-PT) para a ocorrência antes de 37 semanas de gravidez.
EPIDEMIOLOGIA
As frequências de RMP são semelhantes nos textos sobre o assunto, pois são poucas
as formas de intervenção ou de prevenção desta entidade. É importante se notar que
ocorrência da RPM em 10% das gestações determina o nascimento de um número
enorme de RN com complicações da prematuridade e da presença ou risco de infecção
e anoxia. A etiologia da RPM é multifatorial, sendo que os processos inflamatórios
infecciosos têm papel importante em sua gênese. Demonstra-se que a infecção
subclínica e a inflamação corio-decidual compõem esta etiologia. A via mais frequente
de inflamação e infecção decidual é a ascendente, e a flora bacteriana é a do trato
genital inferior. A liberação local de fatores inflamatórios promove degradação da
matriz extracelular, perda da elasticidade e apoptose celular das membranas ovulares,
implicando fragilidade e rotura.
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
FISIOPATOLOGIA
Uma vez rotas as membranas, existe perda do isolamento da câmara âmnica, com
exposição do feto e anexos, bem como de tecidos uterinos, às agressões biológicas
e bioquímicas que se estabelecem e se mantêm até que parto seja resolvido. A
colonização do ambiente uterino e fetal é certa e conhecida. As decorrências da
RPM são: o desencadeamento do trabalho de parto, o risco de corioamnionite, da
prematuridade, da infecção neonatal e de infecção puerperal materna. Desta forma,
a ação mais correta é a interrupção da gravidez antes de instalado o quadro de
infecção, mas com possibilidade de sobrevida assegurada para o RN. Tal raciocínio tem
implicação, como veremos, na conduta em casos de RPM.
FATORES DE RISCO
Descrevem-se como fatores de risco para a RPM: história anterior de prematuridade ou
de RPM, intervenções obstétricas (como amniocentese, fetoscopia, circlagem cervical),
infecções do trato genital inferior e coriomanionite. Outros fatores relacionados são
déficit de vitamina C, tabagismo, hemorragia anteparto e superdistensão uterina. O
fator de risco mais evidente, no entanto, é a exposição de membranas através do colo
uterino pérvio.
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
A perda de líquido por via vaginal é a manifestação clínica mais evidente e que faz o
diagnóstico. Enquanto perdurarem os mecanismos de tolerância microbiana materna
e fetal, a sintomatologia que se observa é a de manutenção da perda líquida vaginal.
Em geral, quanto mais avançada a gestação, mais curto o período de latência após a
RPM e o trabalho de parto se desencadeia com a presença de contrações de frequência
e intensidade evolutivas e com maior desconforto. O feto, enquanto não houver
manifestação clínica de coriomanionite, tem respostas fisiológicas nas avaliações
de vitalidade fetal, como a cardiotocografia e a movimentação fetal, indicando boa
oxigenação do SNC. O perfil biofísico fetal se mostra normal, exceto pelo volume de
líquido amniótico que, por ser reduzido pela RPM, não deve constituir fator de análise
nesta situação. Instalado quadro infeccioso, os sinais clínicos de corioamnionite são:
febre materna, taquicardia fetal, taquicardia materna, fisometria (líquido amniótico
fétido) e presença de dor uterina (indicando dinâmica).
Na presença de infecção, o parto se processa, resultando em RN com sinais de infecção,
fisometria e placenta com membranas opacas, espessadas, mostrando evidência clínica
de corioamnionite. O RN infectado terá, na evolução neonatal, evidências clínicas e
laboratoriais de infecção. Além do risco de infecção materna e fetal, a RPM pode
complicar-se com prolapsos de cordão e a consequências do oligoâmnio prolongado,
como a hipoplasia pulmonar, as deformidades fetais por acolamento à parede uterina
e as compressões de cordão. É mandatório, portanto, a propedêutica seriada da
vitalidade fetal.
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
DIAGNÓSTICO
O diagnóstico se faz com base na informação materna de perda de líquido por via
vaginal. Na maioria das vezes, este diagnóstico é simples e evidente, pela constatação
de líquido exteriorizando-se pela vulva, pela constatação desta perda através de exame
especular e, quando necessário, pelo toque vaginal. Existem, no entanto, situações em
que estas evidências clínicas não estão presentes ou claramente demonstradas, fato
que constitui dúvidas diagnósticas e necessidade de complementação subsidiária.
O diagnóstico mediado por exames utiliza:
1. Verificação de pH neutro ou menos ácido (acima de 6,0 a 6,5) na vagina, pela
neutralidade do líquido amniótico. Para tanto, se utilizam substâncias corantes ou
dispositivos que indicam viragem de pH vaginal, como o fenol vermelho ou fitas de
mensuração de pH. Limitações: condições ou infecções vaginais que alcalinizam o
pH vaginal. Uso de substâncias antissépticas para a aplicação do espéculo ou para
o toque etc.
2. A cristalização do muco cervical, recolhido na vagina, em folha de samambaia
também evidencia a presença de cloreto de sódio no conteúdo vaginal, oriundo
da presença de líquido amniótico. Limitações: técnica de coleta, necessidade de
microscópio, presença de cloreto de sódio no conteúdo vaginal por outras causas.
3. Pesquisa de células alaranjadas coradas pelo sulfato de azul do Nilo a 0,1% pela
presença de gordura que não existem na vagina e têm origem fetal, portanto
indicando solução de continuidade das membranas ovulares. Este método,
inicialmente descrito por Brosens e Gordon, que estudavam o diagnóstico de rotura
de membranas, teve, como consequência indireta, o mérito de resultar também em
forma de avaliação da maturidade fetal, uma vez que a quantidade destas células
fetais tem correlação com a idade gestacional. A limitação deste método é o fato
de que as células alaranjadas surgem e aumentam em percentual somente após a
34ª semana de gravidez, portanto seu uso em gestações mais precoces não obtém
a meta desejada de confirmar a perda de líquido amniótico. Também depende da
disponibilidade de microscópio.
4. Fibronectina. Esta substância, quando encontrada no conteúdo vaginal, também se
associa à rotura de membranas, porém, pode ser detectada em casos de integridade
da bolsa, portanto não constitui método diagnóstico de certeza.
5. Ultrassonografia. Mostra oligoâmnio, relacionado à perda de líquido. A limitação
deste método é o fato de que o feto repõe permanentemente o volume de
líquido amniótico, portanto a presença de volume normal de líquido não afasta o
diagnóstico de RPM. O método é utilizado, como rotina, para avaliação da idade
gestacional, peso fetal, localização placentária e apresentações anômalas.
DIAGNÓSTICO DE INFECÇÃO
Subsidiário: utiliza-se o leucograma seriado. Níveis acima de 15 mil leucócitos ou
aumento progressivo do número de leucócitos indicam possibilidade de infecção. Da
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
mesma forma, a proteína C reativa (PCR) elevada indica possibilidade de infecção.
Trata-se de formas indiretas de suspeição de quadro infeccioso e não é frequente que
a decisão clínica de interrupção da gestação se faça exclusivamente com base nesta
propedêutica se não existirem manifestações clínicas de infecção.
TRATAMENTO E MANEJO
A RPMT (no termo) indica interrupção da gestação assim que feito o diagnóstico.
Dois fatores são os pilares de base para estabelecer condutas: a prematuridade – decorrente
do parto antecipado pela conduta ativa – e a infecção – que pode ocorrer com a conduta
expectante, com repercussões fetais e maternas. Com relação a estes riscos, a literatura é
praticamente unânime em aconselhar a interrupção da gravidez após a 34ª semana, pois as
mortes por insuficiência respiratórias são mais raras, o peso fetal se encontra em torno de 2 mil
g e a sobrevida é semelhante à das gestações de termo. Evidentemente, cada instituição deve
estudar e conhecer suas taxas de mortalidade e morbidade perinatal específicas (por exemplo,
limitações de berçário ou de UTI neonatal) e adequar este limite para mais de 34 semanas.
Antes desta idade gestacional, existem ações a serem adotadas.
Existe discussão atual sobre o limite de viabilidade relacionada à idade gestacional. A
sobrevida em idades gestacionais muito precoces tem feito com que sejam realizados
investimentos no feto já a partir de 24 semanas, limite para o início da função alveolar
e a partir da qual a corticoterapia pode reduzir a gravidade das hemorragias cerebrais,
típicas do prematuro. Gestações com idade abaixo de 22 semanas com RPM-PT devem ser
encaradas como abortamentos.
A RPM-PT deverá ter conduta particularizada, tanto pela idade gestacional quanto pelo
quadro clínico de presença ou ausência de infecção. O uso de corticoide para maturação
pulmonar está indicado, uma vez que mostra vantagens para o feto e RN, assim como não
determina mascaramento do quadro clínico ou riscos maternos. A repetição periódica do
corticoide ainda não é consenso.
O desencadeamento do trabalho de parto já é evidência de infecção, portanto não deve
ser bloqueado e sim permitir-se que o parto se processe, independentemente da idade
gestacional.
O bloqueio do trabalho de parto em casos de rotura prematura de membranas só teria
indicação para a administração de corticoide por no máximo 48 horas, mas tal conduta
deve constituir exceção.
A antibioticoterapia profilática ainda não é consenso. Existem evidências de que o uso
profilático de antibióticos retarda o trabalho de parto e reduz a mortalidade perinatal7. Tal
revisão, porém, foi realizada com gestações de menos de 37 semanas, incluindo aquelas com
idade gestacional entre 34 e 36 semanas e seis dias, em que a maioria dos autores adota a
conduta ativa e interrompe a gestação.
Algumas questões se colocam para esta ausência de consenso do uso de antibioticoterapia na
RPM-PT com tratamento expectante:
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
1. Qual antibiótico usar, uma vez que a flora vaginal é múltipla?
2. Por quanto tempo utilizar enquanto a expectação é a conduta, que pode ter
duração prolongada?
3. Há possibilidade de seleção de cepas resistentes aos medicamentos utilizados?
Em relação à profilaxia para septicemia neonatal por streptoccoccus do Grupo B, a
RPM-PT contempla duas das indicações para sua utilização, ou seja: o parto pré-termo
e a rotura prolongada de membranas. Sendo assim, deve-se utilizar a profilaxia para
sepse neonatal nestes casos quando da proximidade ou decisão do parto.
Com base no exposto, sugere-se o fluxograma apresentado no Quadro 1.
Quadro 1: Fluxograma de condutas na rotura prematura de membranas
Gestação < 22 semanas
Abortamento
Gestação entre 24 e 34 semanas
Gestação > = 34 semanas
Uso de corticoide
Avaliação seriada da vitalidade fetal
Pesquisa de outros focos de infecção
Sinais clínicos de infecção
Comprometimento fetal
Trabalho de parto
Instalação de antibioticoterapia
para coriomnionite
Normal
Profilaxia para sterptoccoccus B
34 semanas
Parto
PROGNÓSTICO
Nas gestações com idades gestacionais iguais ou maiores que 34 semanas, o prognóstico
é bom, com baixas taxas de mortalidade, uma vez que as mais frequentes causas de
mortes neonatais em RN de pré-tremo são as síndromes de desconforto respiratório.
Após 34 semanas, se presentes, estas em geral não levam a mortes. Nas gestações
com menos de 34 semanas, com a adequada utilização de corticoide e -profilaxia de
sepse neonatal, a sobrevida e sequelas dependerão da idade gestacional ao nascer e da
presença de infecção. É relevante considerar que, mesmo sobrevivendo ao desconforto
respiratório e demais complicações relacionadas à prematuridade, estes RN terão
longos períodos de internação em unidades de terapia intensiva neonatal, com os
riscos inerentes de infecções hospitalares e das terapêuticas necessárias instituídas,
como a retinopatia por O2.
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
Leitura complementar
1. BRASÍLIA. Ministério da Saúde. Pacto Nacional pela redução da Mortalidade
Materna e Neonatal. Disponível em: http://drt2002.saude.gov.br/proesf/Site/
Arquivos_pdf_word/pdf/Protoclo%20de%20Inten_347_365es%20-Pacto-%20
MS-COANASS-CONASEMS.pdf.
2. RIVERA, RZ; CABA, FB; SMIRSON, MS; AGUILERA, JT; LARRAIN, AH. Fisiopatologia
de la rotura prematura de membranas ovulares en embarazos pretermino. Rev Chil
Obstet Ginecol. 2004; 69(3): 249-55.
3. MERCER, BM. Preterm premature rupture of membranes. ACOG. Obstet Gynecol.
2003; 101(1): 178-93.
4. MERCER, BM. Preterm premature rupture of membranes: diagnosis and
management. Clin Perinatol. 2004; 31: 765-82.
5. OCHOA, PA; PÉREZ, DJ. Preterm labour. Premature rupture of membranes:
Chorioamnionitis. An Sist Sanit Navar. 2009; 32(1): 105-19.
6. HARDING, JE; KNIGTH, DB; LIGGINS, GC. Do antenatal corticosteroids help in the
setting of preterm rupture of membranes? Am J Obstet Gynecol. 2001; 184(2):
131-139.
7. KENON, S; BOULVAIN NIELSON, J. Antibióticos para rotura prematura de
membranas. (Cochrane review). In: Resumo de revisões sistemáticas em português.
Issue. CD001058-PT.
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RESTRIÇÃO DE CRESCIMENTO FETAL
A restrição do crescimento fetal (RCF), também denominada crescimento intrauterino
restrito (CIUR), atinge cerca de 15% das gestações e está associada à elevada morbidade
e mortalidade perinatal. Além disso, há evidências de que pode causar alterações
permanentes na fisiologia e metabolismo fetal, dando origem a doenças que surgirão
posteriormente, na idade adulta, como a hipertensão arterial, hipercolesterolemia,
coronariopatias e diabetes.
Muitos aspectos relacionados a essa entidade continuam desafiando os obstetras tais
como a sua definição, fisiopatologia, diagnóstico e tratamento. Há de se considerar que
o mecanismo fisiológico do crescimento fetal ainda não está totalmente esclarecido,
mas sabe-se que é resultante da interação entre o potencial genético e vários fatores
ambientais, muitos dos quais ainda desconhecidos.
DEFINIÇÃO
Não há uma definição universalmente aceita, mas a mais utilizada é a do crescimento
fetal abaixo do 10º percentil para a idade gestacional, empregando-se curvas-padrão
específicas de cada população1. Outros autores consideram percentis menores2,3. É
importante salientar que nem todos os recém-nascidos abaixo do percentil adotado
apresentam maior risco neonatal; alguns são constitucionalmente pequenos. A
incidência desses casos pode atingir 70% dos casos quando é considerado o 10º
percentil4. Por outro lado, alguns portadores de RCF podem revelar peso acima do 10º
percentil. Um concepto com potencial de crescimento que resultaria em peso de 4 mil g
pode, por não ter sido adequadamente suprido, alcançar somente 3 mil g.
Independentemente do percentil adotado, é fundamental conhecer com exatidão a
idade gestacional, sem a qual é impossível fazer o diagnóstico.
FATORES ETIOLÓGICOS
Vários são os fatores que podem estar envolvidos na gênese da RCF (Tabela 1)5. Tais
agentes podem ser de origem exclusivamente fetal, placentária, materna, ambiental
ou pode haver associação entre os mesmos. Alguns desses fatores, se diagnosticados
e tratados no período pré-concepcional, podem evitar os seus efeitos danosos durante
a organogênese e o crescimento fetal. Já durante a gravidez, uma das poucas medidas
que evita a RCF é o abandono do fumo ainda no primeiro trimestre (nível de evidência
2-1). É importante destacar que em cerca de 40% dos casos, a etiologia é desconhecida.
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Tabela 1: Fatores de risco para a restrição do crescimento fetal
FATORES FETAIS
CROMOSSOMOPATIAS
Trissomia 21 (síndrome de Down)
Trissomia 18 (síndrome de Edwards)
Trissomia 13 (síndrome de Patau)
Monossomia X (síndrome de Turner)
Mosaicismos
OUTRAS ANOMALIAS GENÉTICAS
Defeitos do tubo neural
Acondroplasia
Condrodistrofias
Osteogênese imperfeita
MALFORMAÇÕES CONGÊNITAS
Sistema cardiovascular
Sistema nervoso
Sistema genitourinário
Sistema digestivo
Sistema músculo-esquelético
INFECÇÕES
VIRAIS
Citomegalovírus
Rubéola
Herpes
Varicela-zoster
HIV
PROTOZOÁRIOS
Toxoplasmose
Malária
GESTAÇÃO GEMELAR
FATORES PLACENTÁRIOS
PATOLOGIAS PLACENTÁRIAS
Placenta prévia
Placenta circunvalada
Corioangiomas
Inserção velamentosa de cordão
Artéria umbilical única
TRANSFERÊNCIA PLACENTÁRIA DEFICIENTE
FATORES MATERNOS
Síndromes hipertensivas
Cardiopatias
Anemias
Diabetes mellitus
Doenças autoimunes
Trombofilias
Desnutrição
FATORES AMBIENTAIS
Estresse, ansiedade e depressão
Drogas
Álcool
Fumo
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As gestantes com fatores de risco devem receber maior atenção no que se
refere ao crescimento fetal – acompanhamento cuidadoso da altura uterina e
ultrassonografia seriada.
DIAGNÓSTICO
O acompanhamento obstétrico adequado durante o pré-natal é de suma importância
para o diagnóstico da RCF. As gestantes com fatores de riscos devem receber maior
atenção em relação ao crescimento fetal.
O diagnóstico da RCF só é possível diante da determinação exata da IG. Datando-se
a gestação, podem ser valorizadas as medidas da altura uterina e os futuros exames
ultrassonográficos. A datação da gestação deve levar em conta a certeza da data da
última menstruação (DUM) concordante com a ultrassonografia obstétrica realizada até
a 12ª semana ou, pelo menos, duas ultrassonografias compatíveis até a 20ª semana. Daí
a importância da realização da ultrassonografia precoce na gestação. Em situações em
que a IG é incerta, a avaliação do crescimento fetal torna-se difícil e deve ser realizada
por meio de ultrassonografias seriadas a cada duas semanas.
MEDIDA DA ALTURA UTERINA
A medida da altura uterina (AU) menor do que a esperada para a idade gestacional, ou
seja, abaixo do percentil 10, constitui sinal clínico suspeito de RCF e deve ser sempre
utilizada para o seu rastreamento. É importante que tais medidas sejam seriadas,
utilizando-se curvas-padrão próprias da população a ser avaliada (Figura 2).
Figura 2: Medidas uterinas em função da idade gestacional
A
L
T
U
R
A
P90
P10
U
T
E
R
I
N
A
(cm)
IDADE GESTACIONAL (semanas)
Nossa opinião é que a medida da altura uterina com a fita métrica apresenta boa
taxa de detecção da RCF, com sensibilidade e especificidade acima de 80%. Quando
a medida obtida encontra-se acima do percentil 10, a probabilidade de crescimento
normal também é superior a 90%. Por outro lado, quando a medida obtida é inferior
ao percentil 10, a probabilidade de ser um feto com crescimento restrito é cerca de
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60%, ou seja, o seu valor preditivo positivo é baixo. Dessa maneira, a RCF pode ser
sobrediagnosticada em cerca de 40% dos casos.
Entre as principais causas de erros do método destacam-se o desconhecimento da
idade gestacional e a imprecisão na medida da altura uterina. Seu emprego tem pouco
valor na situação transversa, gestação gemelar, polidrâmnio e obesidade extrema.
ULTRASSONOGRAFIA
O diagnóstico provável da RCF é feito pela ultrassonografia, que é mais precisa do que
a medida da AU, embora cerca de 30% dos casos de RCF não sejam detectados pela
ultrassonografia.
Na avaliação do crescimento fetal pela ultrassonografia, diversos parâmetros
permitem a detecção e classificação do RCF. São importantes as medidas do diâmetro
biparietal (DBP), circunferência cefálica (CC), circunferência abdominal (CA), relação CC/CA,
comprimento do fêmur (F), relação F/CA. Entre essas medidas, a CA é um dos
marcadores mais importantes do estado nutricional do feto por refletir o volume
do fígado e da gordura subcutânea abdominal. O volume do fígado depende da
quantidade de glicogênio armazenado, que é influenciada por fatores que levam à
RCF, especialmente do tipo II. Mesmo diante da estimativa de peso fetal acima do
percentil 10, se a CA for inferior à esperada para a IG, deve-se manter a vigilância.
Para o cálculo do peso fetal, utilizam-se as medidas da cabeça, do abdome e do fêmur.
Consideramos a presença de RCF quando o peso fetal encontra-se abaixo do percentil
10 em relação à IG (Figura 3).
Figura 3: Peso fetal estimado pela ultrassonografia em função da idade gestacional
P
E
S
O
(gramas)
IDADE GESTACIONAL (semanas)
Feito o diagnóstico de RCF, a relação CC/CA pode sugerir o tipo de RCF. Em fetos
com crescimento normal, a relação CC/CA é superior a 1,0 antes de 32 semanas;
é de aproximadamente 1,0 entre 32 e 34 semanas, e torna-se inferior a 1,0 após
34 semanas. Na RCF do tipo I, a relação CC/CA mantém-se normal, já que tanto a
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CC como a CA estão diminuídas. Na RCF do tipo II, tal relação mantém-se elevada.
Igualmente ao DBP, em alguns casos, a medida da CC pode ser dificultada pela posição
fetal e, nestas situações, recomenda-se a medida do fêmur. Na RCF do tipo II, o fêmur
é preservado e uma relação F/CA superior a 23,5 sugere RCF do tipo assimétrico.
A medida do volume de líquido amniótico (LA) tem grande valor prognóstico, pois
a sua diminuição é indicativa de queda da diurese fetal consequente à insuficiência
uteroplacentária. Para avaliação do volume de LA, utilizamos a técnica dos quatro
quadrantes. Em cada quadrante é medido o diâmetro vertical do maior bolsão de LA.
As quatro medidas são somadas e o resultado, em centímetros, é denominado índice
de líquido amniótico (ILA), sendo considerado oligoidrâmnio quando inferior a 5,0cm
e oligoidrâmnio grave quando inferior a 3,0cm. Quanto menor o volume de LA, maior
a mortalidade perinatal.
É importante lembrar que a RCF é importante fator de risco para a presença de
anomalias estruturais fetais. Portanto, diante do crescimento fetal restrito, deve-se
realizar a ultrassonografia morfológica e a ecocardiografia fetal para a detecção de
possíveis malformações fetais.
Apesar da ajuda incontestável da ultrassonografia no diagnóstico da RCF, sua
confirmação só é feita após o nascimento, quando o RN é classificado como pequeno
para a idade gestacional (PIG) diante do peso inferior ao percentil 10 para a IG
correspondente (Figura 4).
Figura 4: Peso ao nascer em função da idade gestacional
P
E
S
O
(gramas)
IDADE GESTACIONAL (semanas)
DOPPLERVELOCIMETRIA
Diante do diagnóstico de RCF, com volume de LA normal e sem anomalias congênitas,
a dopplervelocimetria permite diferenciar o feto pequeno patológico do pequeno
constitucional, além de proporcionar a avaliação do grau de insuficiência placentária.
Inicialmente, devem ser avaliadas as artérias umbilicais. Nas situações patológicas por
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placentação inadequada, eleva-se a resistência de perfusão e, consequentemente,
diminui-se o fluxo diastólico. Com isso, aumenta a relação sístole/diástole (A/B). Com o
agravamento, o fluxo diastólico torna-se nulo (diástole zero) ou reverso (diástole reversa).
Vários estudos têm demonstrado que tais alterações de fluxo nas artérias umbilicais constituem
preditores importantes de morbidade e mortalidade perinatal (evidência nível I)10. Por outro
lado, os fetos pequenos com fluxo normal de artérias umbilicais não demonstram risco
perinatal e são considerados constitucionalmente pequenos.
O estudo da artéria cerebral média (ACM) fetal nos informa sobre a redistribuição
do fluxo sanguíneo para os territórios mais nobres (centralização), em decorrência
da hipoxia. A diminuição do índice de pulsatilidade de ACM (A-B/média) reflete
vasodilatação secundária à hipoxia. É importante salientar que, isoladamente, os
valores anormais servem de alerta, mas não devem ser considerados indicativos de
interrupção imediata da gestação.
A avaliação do ducto venoso, por meio do índice de pulsatilidade para veias – IPV,
quando elevado, está associado à acidose fetal, caracterizando estágio mais avançado
de sofrimento fetal. A gravidez deve ser interrompida diante da elevação do IPV.
Predição da restrição de crescimento fetal pela dopplervelocimetria de artérias uterinas:
Segundo alguns estudos, a presença de relação A/B e índice IP elevados (quando acima
da 20ª semana) e incisura protodiastólica nas artérias uterinas (esta última fisiológica
abaixo da 26ª semana) indicam provável invasão trofoblástica inadequada e risco para
RCF. Em revisão sistemática de 15 estudos, verificou-se que o aumento da resistência
em artérias uterinas identificou apenas 20% dos casos, em população geral, que
evoluíram para a RCF. Segundo revisão da Fundação Cochrane, não há evidências que
justifiquem o emprego rotineiro do doppler de artérias uterinas, na população geral,
com o objetivo de rastrear a RCF.
CONDUTA CLÍNICA
Embora não existam evidências científicas de que o repouso materno melhore o
crescimento fetal, nos casos em que há insuficiência placentária, se recomenda o
repouso, pois supõe-se que possa melhorar o fluxo uteroplacentário.
A gestante deve ser desencorajada quanto ao fumo ou ao uso de drogas ilícitas e
receber dieta adequada (acima de 2.500 calorias) se for desnutrida. A alimentação
parenteral deve ser utilizada apenas diante de complicações gastrointestinais, tais
como hiperemese gravídica, pancreatite aguda, retocolite ulcerativa, doença de Crohn,
esofagite aguda, gastrite hemorrágica e neoplasias gastrointestinais. Apesar de ainda
existirem dúvidas quanto à composição da solução parenteral a ser utilizada durante a
gestação, a maioria dos estudos comprova boa tolerabilidade materna e fetal.
Não há evidências científicas que justifiquem a administração materna de
hiperoxigenação, expansão do volume plasmático, beta-adrenérgicos e ácido
acetilsalicílico.
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Diante da possibilidade da participação de aspectos psicossociais no comprometimento
do crescimento, fetal é importante o trabalho em conjunto com outros profissionais
para ajudar a gestante a lidar com os problemas do dia a dia.
Pelo exposto, são evidentes as dificuldades de abordagens clínicas diante da RCF.
Consideramos mais importante a realização da propedêutica obstétrica, com o
controle da vitalidade fetal ao se atingir a viabilidade, e o planejamento da interrupção
da gestação no momento oportuno.
CONDUTA OBSTÉTRICA
A propedêutica da vitalidade fetal é realizada a partir da 26ª semana, por meio da
cardiotocografia anteparto de repouso, e estimulada e complementada pelo perfil
biofísico fetal (PBF) e a dopplervelocimetria. Tais exames são realizados pelo menos
uma vez por semana e, nos casos mais graves, diariamente. Com esta abordagem,
individualizamos o momento do parto para as situações em que o risco de o feto
permanecer no útero torna-se maior do que o de receber os cuidados no berçário.
Diante de peso fetal estimado inferior ao 10o percentil e quantidade de líquido
amniótico normal, realizamos a dopplervelocimetria de artéria umbilical para
diferenciar o feto pequeno constitucional daquele com RCF decorrente de insuficiência
placentária (Figura 5).
Figura 5: Conduta obstétrica na RCF a partir da 26ª semana de gestação
Restrição do crescimento fetal
Peso fetal
Oligoidramnia
Abaixo do 10º percentil
Diástole reversa
Doppler a. umbilical
Anormal
DIÁSTOLE ZERO
IG≥34 sem
se maturidade (+)
PARTO
NORMAL
Doppler de ducto venoso
Anormal - IPV>1
PARTO
IG≥37 sem
PARTO
Se PF>500g
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Quando o doppler de artéria umbilical mantém-se normal, o diagnóstico mais provável é de
um pequeno constitucional e não há necessidade de hospitalização, podendo a gestante
ser seguida em ambulatório. Nestes casos, a interrupção da gestação pode ser programada
a partir da 37ª semana.
Diante do achado de doppler de artéria umbilical anormal, ou seja, relação A/B acima
do percentil 95 para a IG, interrompemos a gravidez a partir da 34ª semana se houver
maturidade fetal comprovada pela amniocentese.
Embora hoje em dia a amniocentese para pesquisa de maturidade venha sendo realizada
com menos frequência, ainda é um recurso importante e que deve ser utilizado diante da
possibilidade de interrupção da gestação e dúvida de maturidade fetal. Diante de condições
que prejudicam o crescimento fetal, a interrupção da gravidez na presença de maturidade fetal
constitui-se na melhor maneira de favorecer o prognóstico perinatal. Quando o estudo do LA,
por meio de seus componentes, revela maturidade, nos dá segurança para a interrupção da
gestação, uma vez que o risco de falsos positivos é muito pequeno e não ultrapassa 1%.
Na presença de diástole zero, internamos a gestante e realizamos o doppler de ducto venoso.
Se o índice de pulsatilidade para veias (IPV) situar-se entre 1,0 e 1,5, fazemos um ciclo de
corticoterapia (desde que entre a 26ª e a 34ª semana) e interrompemos a gravidez após 48
horas. Entretanto, interrompemos a gravidez imediatamente quando o IPV é superior a 1,5.
Constatada oligoidrâmnia ou diástole reversa pelo doppler de artéria umbilical, preconizamos
a interrupção da gestação a partir da viabilidade fetal (26ª semana), independente da
maturidade fetal.
A interrupção da gestação na ausência de maturidade comprovada só é indicada na
presença de sinais de sofrimento fetal ou por indicação materna decorrente de doença com
agravamento clínico.
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
Leitura complementar
1. BATTAGLIA, FC; LUBCHENCO, LO. A practical classification of newborn infants by
weight and gestational age. J Pediatr. 1967; 71: 159.
2. USHER, R; MCLEAN F. Intrauterine growth of live-born caucasian infants at sea level:
standards obtained from measurements in 7 dimensions of infants born between 25
and 44 weeks gestation. J Pediatr. 1969; 74: 901.
3. MANNING, FA; HOHLER, C. Intrauterine growth retardation: diagnosis, prognostication
and management based on ultrasound methods. In: FLEISHER, AC; ROMERO, R;
MANNING, FA (eds.). The principles and practice of ultrasonography in obstetrics and
gynecology. Norwalk: Appleton & Lange. 1991.
4. OTT, WJ. Intrauterine growth retardation and preterm delivery. Am J Obstet Gynecol.
1993; 168: 1710.
5. BITTAR, RE; PEREIRA, PP; LIAO, AW. Restrição do crescimento fetal. In: ZUGAIB, M (ed.).
Obstetrícia. Barueri: Manole, 2008, p. 630-44.
6. MARTINELLI, S; BITTAR, RE; ZUGAIB, M. Proposta de Nova Curva de Altura Uterina para
Gestações entre a 20a e a 42a Semana. Rev Bras Ginecol Obstet. 2001; 23(4): 235-241.
7. HADLOCK, FP; HARRIST, RR; MARINEZ-POYER. In utero analysis of fetal growth: a
sonographic weight standard. Radiology. 1991; 181: 129-33.
8. ALEXANDER, GR; HIMES, JH; KAUFMAN, RB; MOR, J; KOGAN, M. A United States
National Reference for Fetal Growth. Obstet Gynecol. 1996; 87(2): 163-8.
9. [ACOG] American Congress of Obtetricians and Gynecologists. Practice Bulletin.
American Congress of Obstetricians and Gynecologists. Intrauterine growth restriction.
Int J Ginecol Obstet. 2001; 72: 85.
10. MAULIK, D. Doppler velocimetry for fetal surveillance: adverse perinatal outcome and
fetal hypoxia. In: MAULIK, D (ed.). Doppler Velocimetry in Obstetrics and Gynecology. 2
ed. Heidelberg: Springer, 2005.
11. FRANCISCO, RPV; MIYADAHIRA, S; ZUGAIB, M. Predicting pH at Birth in Absent or
Reversed End-Diastolic Velocity in the Umbilical Arteries. Obstet Gynecol. 2006; 107(5):
1-7.
12. CAMPBELL, S; PEARCE, JMF; HACKETT, G et al. Qualitative assessment of uteroplacental
blood flow: Early screening test for high risk pregnancies. Obstet Gynecol. 1986; 68:
649.
13. TRUDINGER, BJ; GILES, WB; COOK, CM. Uteroplacental blood flow velocity-time
waveforms in normal and complicated pregnancy. Br J Obstet Gynaecol. 1985; 92: 39.
14. SCHULMAN, H; DUCEY, J; FARMAKIDES, G et al. Uterine artery Doppler velocimetry: the
significance of divergent systolic/diastolic ratios. Am J Obstet Gynecol. 1987; 157: 1539.
15. PAPAGEORGHIOU, AT; YU, CK; CICERO, S et al. Second-trimester uterine artery Doppler
screening in unselected popupations: a review. J Matern Fetal Neonatal Med. 2002; 12:
78.
16. BRICKER, L; NEILSON, JP. Routine Doppler ultrasound in pregnancy. Cochrane Database
Syst Rev. 2000; (2): CD001450.
17. AMIN JÚNIOR, J; LIMA, MLA; FONSECA, ALA; CHAVES NETTO, H, Montenegro CAB.
Dopplervelocimetria da artéria umbilical: valores normais para a relação A/B, índice de
resistência e índice pulsátil. J Bras Ginec. 1990; 100(10): 337.
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
ENCEFALOPATIA HIPÓXICO-ISQUÊMICA
O obstetra, com foco dirigido particularmente à assistência à gravidez e ao parto,
muitas vezes deixa de ver os resultados tardios que se observam no recém-nascido
(RN) após o parto. A tarefa de entregar o RN vivo ao neonatologista não é mais
suficiente, sendo também missão daquele que o RN tenha as melhores condições de
vitalidade e, em decorrência, o melhor prognóstico futuro de desenvolvimento. Desta
forma, a asfixia perinatal constitui quadro que deve, sempre, indicar preocupação e
responsabilidade dos profissionais que assistem gestações e partos. A asfixia perinatal
permanece, apesar de todo o arsenal propedêutico e terapêutico disponível, causando
morte e sequelas. Aproximadamente 2% dos RN apresentam algum grau de asfixia.
Em decorrência dos mecanismos fetais de defesa, na maioria dos casos de asfixia,
o insulto é leve, sem repercussões. Aproximadamente 0,4% dos RN asfixiados
apresentam repercussões que levam à disfunção cerebral e de múltiplos órgãos, sendo
que, em 0,1% dos casos, a asfixia determina comprometimento neurológico, no
desenvolvimento psicomotor, com paralisia cerebral, retardamento mental, convulsões,
cegueira e surdez. Trata-se, portanto, de quadro com enormes repercussões sociais,
psicológicas e que implicam desagregação familiar, além do alto custo dos tratamentos
multidisciplinares aos quais esta criança deverá ser submetida. Dependendo da idade
gestacional, 10% a 60% dos RN acometidos por encefalopatia hipóxico-isquêmica
(EIH) podem morrer e 25% dos sobreviventes apresentarão sequelas neurológicas2.
Apesar das limitações da fonte, a asfixia perinatal constitui o terceiro diagnóstico em
frequência como causa de óbito na mortalidade neonatal (zero a 28 dias de vida)
documentado nas certidões de óbito.
CONCEITO
A EHI constitui um quadro decorrente de lesão tissular neurológica devido à asfixia
perinatal, que resulta em comprometimento neurológico e de múltiplos órgãos,
podendo resultar em morte ou sequelas de vários graus.
EPIDEMIOLOGIA
A EIH pode resultar de asfixia nos períodos anteparto, intraparto e pós-parto, portanto
não tem ligação exclusiva com o parto. Dessa forma, fatores que complicam a
gestação, como patologias maternas, fatores que complicam o parto e complicações
após o nascimento podem resultar em déficit de oxigenação e causar lesões do tecido
cerebral, com desenvolvimento de EIH.
FISIOPATOLOGIA
A EIH decorre de asfixia perinatal, portanto a fisiopatologia se inicia com a redução
de oxigenação tissular, particularmente a cerebral, no feto ou no RN. Cinco fatores ou
mecanismos, didaticamente causadores de asfixia no RN, são apresentados no Quadro 1.
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Quadro 1: Mecanismos determinantes de asfixia perinatal
1. Falência de trocas gasosas pela placenta
2. Interrupção do fluxo sanguíneo pelo cordão umbilical
3. Perfusão materna inadequada da placenta
4. Feto comprometido que não suporta a hipoxia transitória do trabalho de parto
5. Impossibilidade de o feto iniciar e manter o mecanismo de insuflação pulmonar após parto
O diagnóstico de asfixia pode ser feito através dos critérios definidos pelo Colégio
Americano de Obstetrícia e Ginecologia, em 1992, devendo todos estar presentes,
apresentados no Quadro 2.
Quadro 2: Características da asfixia perinatal
- Acidemia profunda, metabólica ou mista (pH < 7,00), ou BE > -12, em amostra de sangue de artéria umbilical
- Persistência de boletim de Apgar de 0 a 3 por mais de cinco minutos
- Sequelas neurológicas clínicas no período neonatal imediato, que incluem a presença de
convulsões, hipotonia, coma ou EIH
- Evidências de disfunção de múltiplos órgãos
Em consequência da hipoxemia, hipercarbia e acidose metabólica, os mecanismos
de controle, que são muito eficazes no feto, perdem suas ações. Assim, frente aos
fatores citados, a resposta bioquímica de vasodilatação cerebral, a autorregulação da
pressão vascular cerebral e a centralização hemodinâmica fetal, que atuam durante
determinado tempo, se mostram ineficazes para manter a homeostase. Mantendo-se
a perfusão inadequada e ultrapassados os mecanismos protetores fetais, têm-se, como
consequência, alterações no nível celular, tanto bioquímicas quanto inflamatórias,
resultando em morte e apoptose celular.
FATORES DE RISCO
Os fatores de risco para asfixia perinatal, consequentemente para o desenvolvimento
de EIH, se ligam às seguintes condições:
1- Falência de trocas gasosas pela placenta.
- Placenta prévia, descolamento prematuro de placenta.
2- Interrupção do fluxo sanguíneo pelo cordão umbilical.
- Prolapso de cordão, nó verdadeiro de cordão.
3- Perfusão materna inadequada da placenta, qualitativa e quantitativamente.
- Síndromes hipertensivas, diabetes, anemias maternas, droga-adição e
alcoolismo, parto prolongado.
4- Feto comprometido que não suporta a hipoxia transitória do trabalho de parto.
- Restrição de crescimento intrauterino, sofrimento fetal agudo, infecções
congênitas, rotura prematura de membranas, feto exposto a parto prolongado.
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5- Impossibilidade de o feto iniciar e manter o mecanismo de insuflação
pulmonar após parto.
- Feto de pré-termo, asfixia intraparto, aspiração de mecônio, hidropsia,
sedação fetal, infecção.
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
Apesar de o diagnóstico da EHI ligar-se fundamentalmente às manifestações
neurológicas, as alterações sistêmicas da asfixia se mostram presentes em variados
graus, em vários sistemas, a depender da intensidade, da duração ou do momento em
que se iniciou o evento asfixico. Complicando a EHI, existem quadros de acometimento
asfíxico de pulmões (hipertensão pulmonar, aspiração de mecônio, comprometimento
do sistema surfactante), rins (oligúria e insuficiência renal aguda), cardiovasculares
(insuficiência tricúspide, necrose miocárdica, hipotensão, choque), metabólicas (acidose
metabólica, hipoglicemia, hiponatremia, hipocalcemia), gastrointestinais (disfunção
hepática, enterocolite necrosante) e hematológicas (trombocitopenia e coagulação
intravascular disseminada), além do quadro neurológico em pauta, que são fatores
agravantes. Assim, as manifestações clínicas da EIH são tanto neurológicas quanto
relacionadas a múltiplos órgãos e sistemas, como um quadro sindrômico.
DIAGNÓSTICO
O Comitê de Encefalopatia Neonatal da Academia Americana de Pediatria e do
Colégio Americano de Ginecologia e Obstetrícia, em 2003, estabeleceram critérios
para o diagnóstico de EIH, descritos no Quadro 3.
Quadro 3: Critérios diagnósticos para EHI
Critérios essenciais
-
Ph da artéria umbilical ou de artéria periférica < 7 ou BE > -12
-
Presença precoce de sinais clínicos de encefalopatia moderada a grave em RN por mais de
três semanas
-
Paralisa cerebral do tipo quadriplegia espástica ou discinesia
-
Exclusão de outras causas de encefalopatia (trauma, infecções, causas genéticas etc.)
Critérios adicionais
-
Identificação de evento ou situação hipóxica antes ou durante o parto
-
Bradicardia ou perda de variabilidade normal da FCF em cardiotocografia, desacelerações
tardias ligadas a situação hipóxica quando era normal a FCF
-
Boletim de Apgar menor ou igual a 3 por mais de cinco minutos
-
Exame de imagem cerebral mostrando comprometimento difuso
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ULTRASSONOGRAFIA
A abordagem diagnóstica por métodos por imagem inicia-se pela ultrassonografia
transfontanela, que pode demonstrar sinais de edema cerebral pelo colabamento
dos ventrículos laterais. Uma vez que as áreas cerebrais mais afetadas não são as
que têm acesso ao US (ventrículos laterais e regiões periventriculares), isso limita este
tipo de propedêutica. O US pode ainda detectar sangramentos periventriculares e
intraventriculares, além da leucomalácia, mais tardia.
TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA
O edema cerebral pode ser detectado pelo método, assim como o colabamento
ventricular e lesões isquêmicas focais. As alterações são melhor detectadas com o
exame sendo realizado entre o segundo e o quarto dia. O prognóstico, no entanto, é
melhor avaliado pelo exame realizado após a regressão do edema cerebral, entre duas
e seis semanas.
RESSONÂNCIA MAGNÉTICA
Determina melhor diferenciação das lesões agudas e crônicas, permitindo avaliação
de alterações metabólicas e funcionais dos tecidos sadios e comprometidos. O valor
prognóstico da RM também é melhor avaliado pelo exame realizado tardiamente,
ou seja, quarto mês de vida. Este método vem sendo sensibilizado pela utilização de
complementações, como a RM com difusão e aquela com espectroscopia.
TRATAMENTO
As ações que se adotam para o tratamento da EIH se iniciam com o diagnóstico de
probabilidade, dado que o quadro é evolutivo. Além da morte celular precoce, a
apoptose que resultará nos grupos celulares que estão lesionados e ainda não destruídos
desencadeará esta evolução. A perfusão inadequada e o edema cerebral estabelecidos
serão os fatores atuantes desta evolução. Medidas de suporte são adotadas nesta fase.
Paro o lado do SNC, as medidas que devem ser estabelecidas se referem ao suporte da
perfusão cerebral, ou seja, à manutenção da pressão arterial, tratando-se a hipotensão
com reposição volêmica e uso de drogas vasoativas. A dopamina está indicada nos casos
em que existe disfunção miocárdica devido à isquemia e ao controle do edema cerebral.
O edema cerebral (mais intenso entre 36 e 72 horas) decorrente de lesão neuronal é
fundamental para redução da manutenção da perfusão. Deve ser manejado com restrição
hídrica. Uso de manitol e corticosteroides não se mostra efetivo para esta finalidade.
A secreção inadequada de hormônio antidiurético e a insuficiência renal devem ser
detectadas, pois agravam a retenção hídrica e o edema cerebral.
As convulsões devem ser tratadas, tendo como droga de escolha o fenobarbital, associandose a difenilhidantoina, se necessário. O midazolan é utilizado em infusão contínua se as
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medidas anteriores não surtirem o efeito desejado; o thiopental também pode ser utilizado.
Os efeitos de depressões do SNC e do miocárdio podem ser indesejáveis.
Para as alterações mutissistêmicas da asfixia, as medidas propostas são:
•
Pulmonar: cuidados com a apneia decorrente de sedação, convulsões e lesão
neurológica. A PaO2 e a PaCO2 devem ser mantidas em níveis normais. A aspiração
de mecônio se associa a estes quadros de EHI, com implicações nas trocas gasosas
e com desenvolvimento de hipertensão pulmonar.
•
Renal: por vários mecanismos, a oligúria se estabelece e o combate à hipotensão é
mandatório. O uso de teofilina tem sido proposto, em dose única.
•
Cardíaco: a isquemia transitória do miocárdio é acompanhada por sinais a ela
ligados, ou seja, cianose, desconforto respiratório, insuficiência cardíaca e choque.
A análise evolutiva comparativa dos níveis das enzimas miocárdicas, bem como o
ecocardiograma mostrando disfunção miocárdica, é utilizada para este diagnóstico.
A CK-MB com valores superiores a 10% da CK implica dano miocárdico. O uso de
dopamnina é indicado na presença de disfunção contrátil.
•
Aparelho digestivo: a nutrição parenteral deve ser iniciada precocemente, pois o
risco de enterocolite necrosante indica adiamento da dieta enteral, por pelo menos
72 horas.
•
Hematológico: tratamento adequado da plaquetopenia e reposição de fatores de
coagulação quando diagnosticada CIVD.
•
Matabolismo: controle da hipoglicemia decorrente de depleção de glicogênio por
liberação de catecolaminas e hiperinsulinemia.
Como visto, a EHI tem repercussões sistêmicas várias, que agravam as possibilidades de
lesão neurológica, independentemente da injúria cerebral primária.
O tratamento pode incluir a adoção de medidas com ação neuroprotetoras, visando
à redução da necrose e da apoptose sequencial. Quanto mais precoce a intervenção,
maiores serão as possibilidades de sucesso (duas a seis horas após a agressão), que são:
•
Farmacológicas: alopurinol, sulfato de magnésio, bloqueadores de cálcio e
barbitúricos. Destes, o alopurinol mostrou redução da formação de radicais livres
que se formam após a reperfusão tissular.
•
Hipotermia: a hipotermia, com aplicação em animais submetidos à hipóxia,
demonstrou vantagens na sobrevida7, passando e ser utilizada em RN como
terapia coadjuvante, mostrando resultados semelhantes em relação à sobrevida.
Outros estudos, no entanto, mostraram efeitos adversos desta utilização em RN,
desestimulando, assim, seu uso. Atualmente, após períodos de otimismo e de
abandono, estudos sobre a hipotermia, cuja aplicação se deu tanto em todo o corpo
quanto no corpo e crânio, estão sendo conduzidos para verificação de sua eficácia
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no tratamento do EIH. As discussões sobre a segurança, período de implementação,
duração do tratamento, grau de hipotermia, entre outras questões, ainda reservam
a aplicação desta metodologia a estudos científicos.
PROGNÓSTICO
O prognóstico, ou seja, probabilidade de morte ou de sequelas, baseia-se nos seguintes
fatores:
•
Grau de intensidade do agravo asfíxico.
•
Convulsões, particularmente de início precoce e de difícil controle, que perdurem
por mais de duas semanas.
•
Aumento da pressão intracraniana.
•
Padrões específicos de fraqueza muscular.
•
Anormalidades persistentes do tronco cerebral.
•
Estádio da EHI, baseado no quadro a seguir.
Quadro 4: Avaliação cliniconeurológica do RN (adaptado de Sarnat e Sanar, 1976 apu Segre, 2002).
Estádio I
Estádio II
Hiperalerta
Letargia
Coma
Motricidade espontânea Exacerbada
Diminuída
Ausente
Tônus muscular
Hipotonia
Flacidez
Nível de consciência
Normal
Estádio III
Reflexos próprios do RN Pouco reduzidos
Diminuídos
Ausentes
Pupilas
Midriáticas
Mióticas
Levemente fotorreativas
Ritmo cardíaco
Taquicardia
Bradicardia
Variável
Respiração
Espontânea
Espontânea/apneia
Apneia
Crises convulsivas
Ausentes
Focais ou multifocais
Ausentes
Os casos de EHI nos estádios I e II têm prognóstico bom. No estádio III, a mortalidade é
de 80% e os sobreviventes podem apresentar anormalidades como paralisia cerebral,
retardo mental grave, cegueira cortical e distúrbios convulsivos.
PERSPECTIVAS
Todos os textos que tratam sobre asfixia perinatal e EHI se iniciam com a afirmação
de que a prevenção da asfixia é o fator em que se deve investir, uma vez que os
tratamentos, como citado, têm aspecto ainda meramente expectante, não existindo
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ações ou procedimentos específicos a serem adotados quando da instalação da
síndrome. É importante notar que o diagnóstico é pós-natal e que os únicos critérios
relacionados ao período ante e intraparto são as alterações da cardiotocografia e,
mesmo assim, como critério adicional e não essencial. Trata-se, portanto, de quadro
de patologia neonatal e não obstétrica.
Do ponto de vista obstétrico, as ações que são de sua competência são:
1.
Procurar identificar fatores de risco que possam motivar déficit de oxigenação
intraútero, durante a gestação e durante o parto.
2.
Administração de corticoide para os casos de evidência de risco ou necessidade de
antecipação do parto em idades gestacionais precoces, por suas ações no sistema
surfactante e, particularmente, pela redução de hemorragias cerebrais.
3.
Procurar evidências da possibilidade de sofrimento fetal através da cardiotocografia,
particularmente a presença de desacelerações tardias e variáveis graves e perda
de variabilidade. Os casos em que o líquido é meconial devem ser avaliados, tanto
por sua associação a sofrimento fetal quanto pela possibilidade de aspiração de
mecônio. É sabido, no entanto, que qualquer método de avaliação da vitalidade
fetal, incluída aí a cardiotocografia e, após o parto, o boletim de Apgar (os dois
métodos mais utilizados em nosso meio) não guarda correlação perfeita com o
diagnóstico e prognóstico de asfixia ou de SHI.
4.
Realização da assistência ao parto em instituições que possam oferecer todas as
condições de atendimento neonatal imediato ao RN anoxiado, com treinamento
de toda a equipe profissional envolvida em reanimação neonatal.
5.
Ter clara consciência de que mesmo os partos que não se mostram de risco ou
distócicos podem ter complicações emergentes determinantes de asfixia e que sua
assistência deve ser adequada em qualquer nível de complexidade.
Com relação ao tratamento – que é sempre neonatal –, além da utilização de fármacos
(que se mostra limitada para o manejo da EHI, sendo tal arsenal terapêutico limitado à
teofilina) e da hipotermia (alvo de pesquisas em andamento), a mais nova perspectiva
para esta meta é a utilização de células-tronco, que se mostram capazes de regenerar
tecidos específicos. Particularmente, as células-tronco de cordão umbilical se mostram
capazes de diferenciar-se em células do estroma de medula óssea, tecido cartilaginoso,
ósseo, muscular e conjuntivo, e ainda hepatócitos, endotélio e neurônios. O reparo
neuronal vem sendo testado em estudos e ensaios em humanos no caso de doenças
degenerativas do SNC, como esclerose lateral amiotrófica.
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
Leitura complementar
1. LOW, JA. Intrapartum fetal asphyxia, diagnosis and classification. AM J Obstet Gynecol.
1977; 176: 957-60.
2. SEGRE, CAM. Asfixia perinatal. In: SEGRE, CAM. Perinatologia: fundamentos e prática.
São Paulo: Sarvier, 2002, p. 465.
3. BELET, N; BELET, U; LUTFI; UYSAL, S; OZINAL, S; KESKIN, T; SUNTER, T; KUÇUKODUK,
S. Hypoxic-Ischemic Encephalopathy: correlation of serial MRI and outcome. Pediatr
Neurol. 2004; 31(4): 267-274.
4. MOSELY, M; COHEN, Y; KUCHARCZYK, J et al. Diffusion-weigthed MR-imaging of
anisotropic water diffusion in cat central nervous sistem. Radiology.1990; 176: 39-45.
5. BARKOVICH, AJ; BARANSKI, K; VIGNERON, D et al. Proton MS spectroscopy for the
evaluation of brain energy in asphyxiated term neonates. AJNR.1999; 20: 1399-1405.
6. BHAT, MA; SHAH, ZA; MAKHDOOMI, MS; MUFTI, MH. Theophyline for fetal function
in term neonates with perinatal asphyxia: a randomized placebo-controled trial. J
Pediatr. 2006; 149(2): 180-184.
7. MILLER, JA; MILLER, FS. Actors in neonatal resistance to anoxia. Tempeature and
survival of newborn guines pigs under anoxia. Science. 1949; 110: 113-114.
8. DUNN, JM; MILLER, JA. Hypothermia combined with positive pressure ventilation in
ressucitation of the asphyxiated neonate. Am J Obst Gyn. 1966; 104: 58-67.
9. GANDY, GM; ADAMSON, K; CUNNINGHAN, N et al. Thermal environment and acidbase homeostasis in human infants during the first fews hours of life. J Clin Invest.
1964; 41: 751-758.
10. AZZOPARDI, D; STROHM, B; EDWARDS, A; DYET, L; HALLIDAY, H; JUSZCZAK, E;
KAPELLOU, O; LEVENE, M; MARLOW, N; PORTER, E; THORESEN, M; WHITELAW, A;
BROCKLEHURST, P. Moderate Hypothermia to Treat Perinatal Asphyxial Encephalopathy.
N Engl J Med. 2009; 361: 1349-1358. Disponível em: http://www.npeu.ox.ac.uk/toby/.
Acessado em: 7 out. 2013.
11. JACOBS, SE; STEWART, M; INDER, TE; DOYLE, L; MORLEY, C. Feasibility of a pragmatic
randomized controlled trial of whole body cooling for term newborns with hypoxicischaemic encephalopathy. Neonatology Mettings Procedings. 2002.
12. TOPCZEWSKI, A. Síndrome hipóxico-isquêmica. In: SEGRE, CAM. Perinatologia:
fundamentos e prática. São Paulo: Sarvier, 2002, p. 472.
13. ROBERTSON, CMT; FINNER, NN. Long term follow up of term neonates with perinatal
asphyxia. Pediatr Clin North Am.1993; 20: 483-99.
14. HENNING, RJ; ABU-ALI, H; BALIS, JU; MORGAN, MB; WILING, AE; SANBERG, PR.
Human umbilical cord blood mononuclear cells for the treatment of acute myocardial
infarction. Cell transplant. 2004; 13(7-8): 729-739.
15. CHEN, N; HUDSON, JE; WALCZACK, P; MISIUTA, I; GARBUZOVA-DAVIS, S; JIANG, L;
SANCHEZ-RAMOS, J; SANBERG, PR; ZIGOVA, T; WILLING, AE. Human umbilical cord
blood progenitors: the potential of these hematopoietic cells to become neural. Stem
cells. 2005: 23: 1560-157.
16. MAZZINI, L; FAGIOLI, F; BOCCALETTI, R et al. Stem cell therapy in amyotrophic lateral
scler other methodological approach in humans. Amyotroph lateral sclerosis motor
neuron disorders. 2003: 4: 158-61.
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
MANEJO DO TERCEIRO PERÍODO DO PARTO:
PREVENÇÃO E TRATAMENTO DA HEMORRAGIA PÓS-PARTO
A hemorragia pós-parto (HPP) é uma das principais causas de mortalidade materna
no mundo, com aproximadamente 140 mil mortes por ano, ou uma a cada quatro
minutos. A maioria das mortes acontece nas primeiras quatro horas após o parto,
o que indica relação com o terceiro período do parto. Quando não é fatal, contribui
com a morbidade materna aumentando o número de procedimentos intervencionistas:
anemia ferropriva, infarto pituitário (síndrome de Sheehan), coagulopatias e lesão
de órgãos como consequência de hipotensão e choque. Como todas as gestantes
estão em risco de HPP, os profissionais da saúde devem estar habilitados na prática do
manejo ativo do terceiro período do parto para prevenir a HPP, além de reconhecer e
tratar a perda excessiva de sangue.
DEFINIÇÃO
HHP primária é definida como a perda sanguínea excessiva que acontece nas primeiras
24 horas do parto. Tradicionalmente, essa perda é excessiva quando maior que 500mL
após um parto vaginal e 1.000mL após uma cesariana. Na prática clínica, a HPP pode
ser definida como um sangramento pós-parto nque produz sinais de instabilidade
hemodinâmica. O volume de sangue perdido capaz de causar instabilidade
hemodinâmica depende da condição clínica prévia da paciente. Aquelas com anemia
ou estados de vasoconstrição (pré-eclâmpsia e desidratação) são mais propensas a uma
repercussão clínica significativa ao sangramento.
O sangramento excessivo resulta em diminuição do volume intravascular e da oferta de
oxigênio aos tecidos e órgãos. Mecanismos compensatórios como taquicardia reflexa,
vasoconstrição periférica e aumento da contratilidade miocárdica ajudam a manter a
perfusão. Uma perda sanguínea maior resulta em colapso circulatório, lesão de órgãos
alvo e, finalmente, na morte. Idealmente, o profissional assistente deve ser capaz de
estimar a quantidade de sangue perdido para estimar o volume a ser reposto. Os sinais
e sintomas expostos na Tabela 1 vêm a ajudar na estimativa do volume de perda.
Tabela 1: Sinais e sintomas de choque por hemorragia
Grau do choque
Perda sanguínea
Sinais e sintomas
Leve
< 20%
- Diaforese
- Aumento do enchimento capilar
- Extremidades frias
- Ansiedade
Moderada
20% a 40%
- Todos os a cima mais:
- Taquicardia e taquipneia
- Hipotensão postural
- Oligúria
Grave
> 40%
- Todos os a cima mais:
- Hipotensão
- Agitação/confusão
- Instabilidade hemodinâmica
Adaptado de Leduc et al. (2009)
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ETIOLOGIA
A principal causa de HPP é a atonia uterina. O mecanismo primário de proteção para
hemostasia primária imediatamente após o parto é a contração miometrial, que causa
oclusão dos vasos uterinos, mecanismo chamado de “ligaduras vivas de Pinard”. Os
principais fatores de risco para HPP podem ser lembrados pelos quatro “T”s: tônus,
tecido, trauma e trombina. Estão listados na Tabela 2.
Tabela 2: Fatores de risco para hemorragia pós-parto (HPP)
Categoria e processo etiológico
Fatores de risco clínicos
Tônus:
• Sobredistensão uterina
• Exaustão do miométrio
• Infecção intra-amniótica
• Distorsão anatômica ou funcional do útero
• Medicações uterolíticas
• Polidrâmnia, gestação múltipla, macrossomia
• Trabalho de parto rápido ou prolongado, multiparidade,
uso de ocitocina
• Febre, rotura de membranas ovulares prolongada
• Miomatose, anormalidades uterinas
• As usadas para tocólise, anestésicos halogenados
Tecido: retenção
• Retenção de produtos da concepção: placentação anormal, lobo
sucenturiado, cotilédones
• Retenção de coágulos
• Placenta incompleta no delivramento, cirurgia uterina
prévia, multiparidade
• Atonia uterina
Trauma: do trato genital
• Laceração do colo, vagina ou períneo
• Extensão ou laceração na cesariana
• Rotura uterina
• Inversão uterina
•
•
•
•
Trombina: distúrbios da coagulação
• Estados pré-existentes: hemofilia A, doença de Von Willebrand,
antecedente de HPP
• Adquiridas na gravidez: púrpura trombocitopênica idiopática,
trombocitopenia com pré-eclâmpsia, coagulação intravascular
disseminada, hipertensão na gestação com feto morto, infecção
grave, descolamento de placenta, embolia amniótica
• Anticoagulação terapêutica
• História de coagulopatias hereditárias ou doença hepática
• Equimoses, aumento da pressão arterial, óbito fetal, febre,
neutrofilia ou neutropenia, hemorragia anteparto, colapso
súbito
• História de doença trombótica
Parto precipitado ou operatório
Mau posicionamento, insinuação profunda
Cirurgia uterina prévia
Multiparidade, placenta fúndica, tração excessiva do cordão
Adaptado de Leduc et al. (2009)
PREVENÇÃO DA HPP
O manejo ativo do terceiro período do parto envolve intervenções para assistir a
expulsão da placenta com o objetivo de prevenir ou diminuir a perda sanguínea. Essas
intervenções incluem o uso de uterotônicos, o clampeamento do cordão umbilical e
a tração controlada do cordão. Enquanto isso, o manejo expectante ou fisiológico
permite a expulsão espontânea da placenta com intervenção subsequente quando
necessário.
A partir de uma meta-análise de 2000 – que demonstrou que o manejo ativo diminuiu
de forma significativa o risco de HPP –, em 2004, a International Confederation of
Midwives e a Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia (FIGO) endossaram
a assistência ativa ao delivramento com uterotônicos, tração controlada do cordão
e massagem do fundo uterino. A Organização Mundial de Saúde (OMS), em 2007,
realizou revisão que gerou as seguintes recomendações:
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•
O manejo ativo deve ser oferecido a todas as parturientes por profissionais
treinados.
•
Profissionais treinados devem oferecer uterotônicos (preferencialmente a ocitocina)
para prevenção de HPP.
•
O clampeamento precoce do cordão é recomendado somente quando o recémnato precisa de ressuscitação.
•
Apesar da falta de evidência que suporte a tração do cordão, a prática deve ser
continuada.
UTEROTÔNICOS
Promovem contrações uterinas para prevenir atonia e aumentar a velocidade do
delivramento. Os agentes uterotônicos incluem a ocitocina, a ergonovina, a carbetocina,
o misoprostol e a sintometrina (uma combinação de ergonovina e ocitocina não
disponível no Brasil).
•
Ocitocina x ergonovina: diversos estudos avaliaram o uso de ocitocina e ergotamina
no terceiro período do parto. Esses estudos foram avaliados por duas revisões
do grupo Cochrane, em 2001 e 2004, que constataram uma superioridade da
ocitocina em relação à ergotamina, além desta última ter mais efeitos colaterais
maternos. Houve menor incidência de sangramento (abaixo de 500mL e acima de
1.000mL), menor incidência de retenção placentária e menor necessidade de uso
de outros uterotônicos. A ergotamina foi associada ao aumento da pressão arterial,
náusea e vômitos.
•
Esquemas de uso na profilaxia de HPP:
• Ocitocina:
•
5 UI IM após o desprendimento do ombro anterior nos partos
vaginais de baixo risco (esquema preferencial – IA).
•
20 a 40 UI em 1.000 mL, 150 mL/h (esquema alternativo – IB).
5 a 10 UI IV em bôlus, administrados de um a dois minutos, podem ser
•
utilizados para prevenção de HPP em partos vaginais, mas ainda não
é recomendado após cesariana (IIB).
• Ergonovina:
•
•
0,2 mg IM. Segunda escolha para prevenção de HPP, pela maior
incidência de efeitos colaterais maternos e maior necessidade de
extração manual placenta em relação à ocitocina. Contraindicada em
pacientes hipertensas (IA).
Misoprostol: Prostaglandina com efeito uterotônico e interessante para uso na
prevenção de HPP pela via de administração, segurança, custo e facilidade de
armazenamento. Algumas características:
•
Menor intervalo de tempo até o pico de ação quando administrado por via oral
e não vaginal ou retal.
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•
A administração sublingual resulta em início mais rápido do efeito e pico de
concentração mais alto.
•
O aumento inicial do tônus com a administração oral é maior do que com a
vaginal.
•
Os efeitos têm início mais lento, porém mais duradouros, com administração
retal ou vaginal do que com a oral.
•
Febre é mais comum com dose maior que 600μg.
•
Dose: 600 a 800μg por via oral, vaginal ou retal. Pode ser usado também como
segunda escolha quando a ocitocina não estiver disponível.
MANEJO DA PLACENTA
• Clampeamento do cordão:
O momento ideal do clampeamento do cordão umbilical varia na literatura mundial.
Os países ocidentais usualmente fazem o clampeamento precoce do cordão.
Estudos de fisiologia indicam que 25% a 60% da circulação fetoplacentária se
encontra na placenta. O clampeamento precoce no recém-nato a termo pode
diminuir até 20 a 40mL/kg de sangue para ele. O clampeamento tardio, por
outro lado, aumenta o volume circulatório, que pode evoluir com complicações
como angústia respiratória, icterícia neonatal e policitemia. Algumas revisões
sistemáticas abordaram essa questão. Nos prematuros, o clampeamento após 30
a 120 segundos diminuiu a necessidade e transfusão sanguínea e a hemorragia
intraventricular. Nos recém-natos a termo, não houve diferença em relação à HPP,
mas ocorreu maior incidência de icterícia com necessidade de fototerapia. Aos seis
meses, essas crianças tinham ferritina e hemoglobina em níveis maiores.
•
•
Recomendação: sempre que possível, atrasar o clampeamento do cordão
em um minuto nos recém-natos com menos que 37 semanas de gestação,
já que há menor incidência de hemorragia intraventricular e necessidade de
hemotransfusão (IA).
Momento da dequitação:
A dequitação placentária é essencial para a contração urterina e redução do
sangramento pós-parto. O processo se completa em cinco minutos em 50% dos
partos, e em 15 minutos em 90%. A retenção placentária é um conhecido fator de
risco para HPP e é classicamente definida como a falha na dequiação por mais de 30
a 45 minutos do parto.
•
Recomendação: não há evidência de que, no parto não complicado sem
sangramento, intervenções que aceleram a dequitação para menos que 30 a
45 minutos reduzam o risco de HPP (II2C).
TRATAMENTO DA HPP RECONHECIDA
Tem-se demonstrado que os profissionais habitualmente subestimam a perda
sanguínea. Os sinais e sintomas clínicos expostos na Tabela 1 são bons indicadores
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
à beira do leito da quantidade de sangramento e podem ajudar no tratamento. É
indispensável um plano de ação para o tratamento da HPP para o caso de falha das
medidas preventivas. Esse plano deve incluir medidas de ressuscitação volêmica, de
controle do sangramento e acesso a um centro cirúrgico e a profissionais de suporte.
O objetivo das medidas de ressuscitação é manter estabilidade hemodinâmica e a
correta oxigenação dos tecidos. A reposição deve ser feita com soluções cristalóides,
a serem infundidas com jelco de calibre grosso, e oxigênio deve ser administrado. A
determinação da causa do sangramento exige a avaliação do tônus uterino e o exame
do trato genital inferior à procura de lesões de trajeto. A avaliação do estado clínico e
a resposta ao tratamento exigem a monitorização dos sinais vitais, do débito urinário
e da saturação de oxigênio, além de testes laboratoriais que devem ser colhidos em
paralelo à instalação das medidas terapêuticas. A Tabela 3 resume a proposta de
tratamento de HPP.
Tabela 3: Tratamento da hemorragia pós-parto
Avaliação inicial
e tratamento
primário da HPP
Etiologia
Útero amolecido e
Atonia uterina
relaxado
Solicitar ajuda
Ressuscitação
• “ABC”
• “Oxigênio sob
máscara
• Acesso
venoso
• Cristaloides/
fluidos
isotônicos
• Monitorização
dos sinais
vitais
• Esvaziar
bexiga, avaliar
débito
urinário
Testes
laboratoriais
• Hemograma
• Testes de
coagulação
• Tipagem
sanguínea e
prova cruzada
Placenta não
separada
Hemorragia logo
após o parto,
útero contraído
Terapia
direcionada
Compressão uterina
não cirúrgica:
• Compressão
uterina bimanual
Massagem uterina
• Compressão
Uterotônicos
aórtica externa
• Empacotamento
uterino
• Tamponamento
com balão
Retenção
placentária
Retenção total
• Uterotônicos
• Tração
controlada do
cordão
Retenção parcial
• Aspiração a
vácuo
• Exploração
manual
• Curetagem
cuidadosa
Trauma do trato
genital inferior
Reparação do
períneo, vulva
e colo
Rotura uterina
Laparotomia:
reparação ou
histerectomia
Fundo uterino
não palpável no
Inversão uterina
abdome ou visível
na vagina
Coagulação
Continuação do
sangramento
Correção sob
anestesia
Placenta ainda
retida: extração
manual
Continuação do
sangramento
Suturas
compressivas
• B-Lynch
• Compressão
vertical
Embolização das
artérias uterinas
Placenta ainda
retida (acreta):
Remoção da
placenta por
laparotomia
Continuação do
sangramento
Ligadura
arterial (uterina,
hipogástrica)
Histerectomia
total ou subtotal
Histerectomia
Cirurgia:
Se a correção
não cirúrgica não Correção por
funcionar, manter laparotomia
Histerectomia
útero contraído
Distúrbios da coagulação: tratar com hemoderivados
Adaptado de WHO (2007).
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
MASSAGEM UTERINA E UTEROTÔNICOS
Já que a causa mais comum de HPP é atonia uterina, os esforços iniciais devem ser
direcionados ao tratamento desta causa, inicialmente com manobras básicas de
massagem do fundo uterino e administração de uterotônicos, que incluem:
1-
Ocitocina
a- 10 UI IM.
b- 5 UI IV em bôlus.
c- 20 a 40 UI em 250mL de solução salina, 500 a 1.000mL/h IV.
2-
Misoprostol
a- 400 a 800μg. O início do efeito é mais rápido na administração oral.
b- 800 a 100μg. O efeito é mais duradouro com administração via vaginal ou retal.
3-
Ergonovina
a- 0,25mg IM ou IV, pode ser repetida a
cada duas horas.
b- Contraindicada para hipertensas e nas para as que usam certas medicações (por
exemplo, proteases para infecção por HIV).
4-
Fator VII ativado recombinante
a- Já foi usado para HPP, mas em um pequeno número de estudos não
randomizados. Sem evidência para uso rotineiro.
TAMPONAMENTO
O modo mais rápido de realizar o tamponamento é pela compressão bimanual
do útero. Uma mão é colocada sobre o útero externamente e a outra pela vagina
fazendo pressão no segmento inferior. A compressão com ambas as mãos resulta uma
compressão externa do útero, reduzindo o fluxo sanguíneo. Essa manobra pode ser
mantida até que outras sejam realizadas ou que chegue ajuda.
A compressão direta do útero, na situação de atonia uterina, pode ser realizada pelos
mecanismos seguintes:
•
Cateter de Bakri SOS com balão de tamponamento.
•
Cateter esofageano de Sengstaken Blakemore.
•
Cateter de Foley com 60mL a 80mL de solução estéril.
•
Cateter hidrostático de condom.
•
Empacotamento uterino com compressas.
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
A técnica de inserção de um cateter com balão é relativamente simples e eficaz para
conter temporariamente o sangramento. O operador só deve se certificar de que o
balão passou completamente o canal cervical. Após instalado, é necessário encher o
balão até que o sangramento pare. A infusão de ocitocina deve ser mantida para a
manutenção do tônus uterino, e proflaxia antibiótica pode ser considerada. O balão
deve ser mantido por oito a 48 horas e gradualmente desinflado para retirada.
O empacotamento do útero com compressas exige maior habilidade técnica e
experiência para que a quantidade suficiente de compressas seja inserida para parar
o sangramento sem lesar a parede uterina. Há maior risco de infecção e de um
procedimento cirúrgico para retirada delas.
MÉTODOS RADIOLÓGICOS
A embolização arterial percutânea é uma opção na paciente com sangramento ativo e
hemodinamicamente estável antes de uma intervenção cirúrgica. Essa técnica preserva
o útero, os anexos e, assim, a fertilidade. Uma revisão observou 100% de sucesso
após partos vaginais e 89% após cesarianas. O procedimento exige disponibilidade
de radiologistas intervencionistas, que não estão disponíveis na maioria dos centros.
MÉTODOS CIRÚRGICOS
A ligadura das artérias ilíacas internas já era utilizada para o controle do sangramento
do câncer de colo de útero antes do seu uso na HPP. Pode ser utilizada no sangramento
por atonia uterina ou por lesão do trato genital. O momento para a realização do
procedimento é importante, antes que haja instabilidade hemodinâmica importante.
As suturas compressivas, descritas por B-Lynch e Cho, têm a vantagem de preservar o
útero. Ambas as técnicas envolvem a compressão externa do útero e suturas por dentro
e por fora dele amarradas de forma que a compressão seja mantida. É necessária a
histerotomia no segmento inferior para certificação de que não há restos placentários
que possam comprometer a contração eficaz do útero.
A histerectomia periparto é indicada quando a hemorragia maciça não responda
às manobras anteriores. Indicações mais frequentes incluem placenta acreta/prévia,
atonia, trauma, rotura e sepse. A desvantagem é a perda da fertilidade.
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
Leitura complementar
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
9.
10.
11.
12.
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106
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
Seção 3
Parto em situações especiais
O momento do parto representa notável marco para o binômio materno-fetal. Longe
de representar um final, o parto representa, para o feto, período de transição da vida
intrauterina para o mundo exterior, momento no qual a abordagem médica pode vir
a contribuir no incremento da qualidade de vida deste novo indivíduo por toda a sua
existência, bem como no futuro obstétrico da mãe e de seu bem-estar. No âmbito
perinatal, são necessárias ações bem estruturadas no sentido de garantir ao concepto
as melhores condições de vitalidade, dentro dos limites da bioética, aplicando os
preceitos da medicina baseada em evidências e assegurando a manutenção da fisiologia
do parto e o gradual retorno do organismo materno às condições pré-gravídicas, bem
como a promoção da lactação e dos cuidados básicos de puericultura.
Algumas condições obstétricas impõem cuidado adicional pelo maior risco atribuído;
cumpre salientar a necessidade da hierarquização de centros perinatais, na medida em
que estas pacientes de risco devam ser encaminhadas, ainda gestantes, a núcleos de
excelência no cuidado à grávida e ao recém-nascido. A transferência de um recémnascido clinicamente comprometido, mesmo em veículo com suporte de UTI, sempre
implica em aumento da morbidade.
Destacamos particularidades do parto em algumas situações especiais, como segue:
PARTO DO FETO COM RESTRIÇÃO DE CRESCIMENTO FETAL
O diagnóstico de RCF é definido por conceptos cujo peso estimado encontra-se abaixo
do percentil 10 para a idade gestacional, situação na qual perde o feto a capacidade de
atingir o tamanho compatível com sua programação genética. Neste momento, há que
salientar-se a imensa heterogeneidade das patologias que promovem fetos pequenos:
aneuploidias, infecções, uso de drogas (cocaína, tabaco) e insuficiência placentária.
Muitas vezes, o concepto é constitucionalmente pequeno, sem ter sofrido qualquer
tipo de hostilidade no ambiente intrauterino.
Monitorização eletrônica contínua é recomendada durante o trabalho de parto destes
fetos acima de 30 semanas, face à sua reduzida reserva oxigenativa. O estresse do
trabalho de parto não deve prejudicar ainda mais um feto que provavelmente já
mantém algum grau de hipoxemia. Deve haver neonatologista experiente na sala de
parto, para o adequado manejo de um concepto pequeno, que provavelmente irá
desenvolver hipoglicemia e ter dificuldades em controlar sua temperatura corporal,
dentre outros distúrbios metabólicos. A ultrassonografia craniana pós-natal tem seu
valor estabelecido na investigação de hemorragia intraventricular nestes fetos.
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
A cesariana não se mostra mais eficaz que o parto normal relacionando-se ao desfecho
perinatal. Casos selecionados podem beneficiar-se da via alta, como apresentação
pélvica em fetos pré-termo abaixo de 34 semanas e fetos muito comprometidos do
ponto de vista hemodinâmico (diástole zero e reversa na artéria umbilical com traçados
cardiotocográficos não tranquilizadores). Uma consideração importante envolve a
cesariana em fetos muito pequenos, especialmente os não cefálicos, uma vez que,
muitas vezes, a histerotomia praticada deverá ser segmentocorporal ou corporal. Este
procedimento aumenta a morbidade pós-operatória e pode vir a compromenter o
futuro obstétrico da paciente, devendo ser criteriosamente indicado e realizado por
obstetra experiente, posto que a própria extração fetal deve ser cuidadosa face ao risco
de tocotraumatismos.
No que diz respeito à via transpélvica, não existem evidências de que a realização de
episiotomia e uso rotineiro do fórcipe obstétrico nos conceptos com CIUR reduza a
prevalência de sangramentos de sistema nervoso central. A extração fetal a vácuo é
contraindicada em fetos com idade gestacional abaixo de 34 semanas em função do
risco aumentado de hemorragia intraventricular.
PARTO DO FETO MACROSSÔMICO
Definimos macrossomia fetal quando o peso estimado do concepto é superior a
4 mil gramas, independente de idade gestacional, sexo ou etnia. Como nem sempre
são diagnosticados no pré-natal, durante a avaliação clínica salientamos atentar para
biotipo avantajado dos pais (especialmente da mãe), gestação prolongada, história
obstétrica de feto macrossômico, multiparidade, obesidade, ganho ponderal excessivo
e diabetes materno sem vasculopatia.
Diante da suspeita de macrossomia, no mais das vezes relacionada à medida da altura
de fundo de útero acima do esperado, realizar ultrassom obstétrico para confirmação
diagnóstica. A estimativa de peso fetal não é parâmetro preciso na gestação próxima
ao termo, devendo o ultrassonografista atentar para a medida da circunferência
abdominal e a presença de depósitos de gordura (tecido subcutâneo), que exprimem
de maneira mais fidedigna o perfil metabólico do concepto, bem como a avaliação do
volume de líquido e massa placentária.
O feto macrossômico é duas vezes mais comum em gestantes com índice de massa
corporal superior a 30kg/m2 e conceptos do sexo masculinino, sendo quatro vezes
mais frequente em gestações acima de 40 semanas. Observa-se, além disso, elevada
prevalência de cesariana de emergência, hospitalização por tempo superior a três dias
e risco quatro vezes mais elevado de distócia de espáduas. Duplicam-se as necessidades
de reanimação e permanência em UTI neonatal.
Quanto à via do parto, prevalece a indicação obstétrica, sendo necessário estimar o
peso fetal por avaliação clínica e ultrassonográfica, bem como avaliar adequadamente
a pelve materna. Se o peso fetal estimado por ultrassom for maior ou igual a 4.500g,
considerar a via abdominal. Enfatizamos que a extração fetal na cesariana não
protege o feto macrossômico da ocorrência de tocotraumatismos, além de aumentar
a morbidade do procedimento (prolongamentos de histerotomia, hemorragia e
hipotonia uterina por sobredistensão).
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Durante o trabalho de parto, deve-se estar atento à evolução no partograma. A
presença de desacelerações da progressão podem ser os primeiros sinais de uma
desproporção fetopélvica, diminuindo-se o limiar para realização de cesariana para
minimizar a ocorrência de distócias. Em gestantes diabéticas sob mau controle
glicêmico, atentar para a possibilidade de distócia de espáduas, posto que o tronco do
feto é desproporcional às dimensões do polo cefálico. Nestas situações, a presença de
tocólogo experiente é fundamental, pois uma dificuldade de extração é sempre uma
emergência na qual a destreza nas manobras de liberação dos ombros pode influenciar
sobremaneira o resultado perinatal.
PARTO DO FETO PORTADOR DE MALFORMAÇÕES CONGÊNITAS
Determinadas questões fundamentais merecem atenção no parto de fetos malformados.
O primeiro aspecto envolve a necessidade de condições de suporte intraparto, bem
como a disponibilidade de cirurgia pediátrica para eventual encaminhamento. Nas
antecipações por via vaginal, devem as condições obstétricas estar favoráveis, com
vistas a maiores chances de sucesso. Devemos lembrar do apoio psicológico ao casal,
tão importante no desenrolar do processo de parturição. Outra questão muitas
vezes presentes é a necessidade de correção imediata da patologia, o que implica na
programação da data do parto.
Algumas anomalias beneficiam-se com eventual resolução antecipada do parto
(aqui entendendo-se o período de 34 e 37 semanas). Presentes neste grupo estão
as patologias fetais cuja evolução progressiva deteriora muito a sua vitalidade e/ou
tende a comprometer o futuro obstétrico da paciente. Listamos, assim, a onfalocele
rota, a gastrosquise, os fenômenos isquêmicos intestinais (volvo, íleo meconial),
arritmias cardíacas descompensadas (cursando no mais das vezes com hidropsia),
lesões que comprometam a deglutição de líquido amniótico (ocasionando a formação
de polidrâmnios importantes), algumas ventriculomegalias/hidrocefalias de rápida
deterioração e alguns casos seletos de obstruções do trato urinário.
No caso dos defeitos da parede abdominal anterior, a via de parto abdominal não
demonstra melhor desfecho que a via transpélvica. Nos fetos com gastrosquise e sinais
de sofrimento de alças (edema de mucosa, diâmetro superior a 18mm), a antecipação
do parto deve ser proposta, idealmente entre 34 a 36 semanas. Fetos portadores de
onfalocele devem ser exaustivamente examinados à através de ultrassonografia no
intuito de verificar eventuais associações com outras malformações, além do risco
intrínseco elevado de aneuploidia.
Alguns defeitos estruturais estão comumente associados ao parto distócico, no qual,
muitas vezes, a via abdominal deve ser a preferida, em face das alterações do volume
do feto, que causam obstáculos à insinuação e progressão no canal de parto. Exemplos
incluem o teratoma sacrococcígeo, teratomas cervicais, higroma cístico, volumosas
hidrocefalias e quadros de gemelidade imperfeita. Ressaltamos a importância de obstetra
experiente presente na cesariana destes fetos, pois, não raro, a extração fetal pode vir
a comprometer o resultado perinatal, mercê do nível de dificuldade do procedimento.
No que diz respeito à via de parto nas malformações do sistema nervoso central, é
importante salientar que estudos multicêntricos não conseguiram evidenciar melhor
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resultado perinatal da cesariana sobre a via transpélvica. Contudo, muitas vezes o
parto abdominal planejado de um feto com meningomielocele pode lograr desfecho
ideal na medida em que, havendo ou não ruptura do saco herniário, a equipe de
neurocirurgia já estará preparada para imediata intervenção.
Os fetos portadores de malformações cardíacas, não raro de difícil diagnóstico
anteparto, devem nascer em centros terciários com UTI neonatal de alta complexidade.
A via de parto é de indicação obstétrica, aguardando-se o trabalho de parto a termo,
excluindo-se apenas os casos de insuficiência cardíaca e/ou arritmias fetais refratárias
a tratamento, como comentado previamente.
PARTO DO FETO PÓS-TERMO
Conceituamos gestação pós-termo aquela que se estende até ou vai além de 42
semanas, ou 294 dias, a contar do primeiro dia da última menstruação. As causas não
são conhecidas, mas os grupos de maior risco incluem as primigestas e gestantes com
parto pós-termo prévio.
Na gestação pós-termo, a mortalidade perinatal é duas vezes maior do que nas
gestações a termo (quatro a sete versus duas a três por mil partos). Boa parcela
da morbidade materna e neonatal está relacionada a complicações advindas de
macrossomia. O líquido amniótico meconial, muitas vezes presente no pós-termo,
responde por elevada morbidade neonatal. Por outro lado, cerca de 20% dos fetos
pós-termo têm características de fetos malnutridos. Nestes casos, observa-se aumento
do risco de fenômenos compressivos de cordão em face da oligodramnia, padrão
cardiotocográfico não tranquilizador, síndrome de aspiração de mecônio, hipoglicemia
e síndrome de angústia respiratória, além do risco aumentado de sequelas neurológicas.
Acima de 41 semanas, preconizamos indução do parto ao invés de manejo
conservador (evidência grau 2A), independentemente das condições do colo, pela
menor mortalidade perinatal associada. Em gestações de baixo risco, eventualmente o
casal pode optar por aguardar até 42 semanas, opção válida desde que mantenhamos
estrita análise da condição fetal, através da propedêutica biofísica (volume de líquido
amniótico e traçado cardiotocográfico a cada 48 horas). Lembramos que a avaliação
dopplerfluxométrica da artéria umbilical não demonstra utilidade neste período por
não refletir agudamente a condição fetal e sua reserva oxigenativa.
Nas pacientes com colo ainda desfavorável, a indução deve contemplar o uso de
agentes farmacológicos específicos para preparação cervical. Na ausência deles, boa
prática recomenda o descolamento digital das membranas do colo a cada 48 horas até
deflagrar o trabalho de parto.
O manejo intraparto dos fetos pós-data deve incluir sempre monitorização
cardiotocográfica, pelo risco aumentado de hipoxia aguda (eventos compressivos de
cordão, líquido meconial e feto grande, no mais das vezes acarretando progressão
mais lenta do parto).
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Amnioinfusão pode ser utilizada no trabalho de parto para diluição de líquido
meconial e redução dos eventos compressivos de cordão umbilical (melhora do
traçado cardiotocográfico e redução de cesarianas indicadas por “sofrimento fetal”).
Verificamos benefício perinatal com este procedimento apenas nos locais onde existem
limitados recursos neonatais.
PARTO NA GESTAÇÃO GEMELAR
Cerca de metade dos partos gemelares termina antes do termo, por início espontâneo ou
por indicação médica. Assim, prematuridade e gemelidade assumem estreita associação.
Para gestações diamnióticas não complicadas, sugerimos o parto entre 38 e 40
semanas (evidência grau 2C). Havendo intercorrências fetais (oligodramnia, restrição
de crescimento) ou maternas (diabetes, hipertensão), podemos induzir o parto antes
das 38 semanas. Observa-se que após 39 semanas o risco de morte fetal excede o
risco de morte neonatal para gemelares. Em gestações monocoriônicas/diamnióticas,
sugerimos a resolução do parto em torno de 34 a 36 semanas.
Gestações gemelares monoamnióticas estão associadas à elevada mortalidade
perinatal, no mais das vezes, resultado de enrolamento dos cordões umbilicais. Assim,
devemos planejar a antecipação do parto entre 32 e 34 semanas.
A via de parto dos gemelares vai estar relacionada principalmente à apresentação dos
fetos e, em alguns casos, à idade gestacional. Secundariamente, o peso estimado dos
fetos e a paridade estão também implicadas. Não existem estudos até o momento que
mostrem a superioridade do parto cesáreo sobre o vaginal em gêmeos. A resolução
por cesariana eletiva ocorre apenas em monoamnióticos, gemelares de alta ordem
(três ou mais fetos), gemelidade imperfeita ou transfusão fetofetal grave. Em fetos
extremamente prematuros, também não existem evidências de que a cesariana possa
reduzir a incidência de hemorragia intraventricular.
Quando o primeiro gemelar é não cefálico, optamos por cesariana, pela redução do
risco de mortalidade perinatal (evidência grau 2C). Ambos cefálicos, irá prevalecer
a indicação obstétrica. Importante assinalar que, em até 20% dos casos, pode o
segundo feto, antes cefálico, alterar sua apresentação após o nascimento do primeiro;
assim, deve o obstetra estar preparado para realizar manobra no sentido de não
aumentar o risco perinatal do parto do segundo gemelar. Quando o primeiro é cefálico
e o segundo não cefálico, para pesos estimados abaixo de 1.500 gramas, sugerimos
cesariana. Nas situações em que os fetos são maiores que 1.500 gramas e menores que
3.500 gramas, preconizamos via vaginal com extração pélvica do segundo gemelar.
Quando o segundo feto tiver peso estimado acima de 20% maior do que o primeiro,
também está indicada via alta. Lembramos que a cesariana do segundo gemelar
tende a ensombrecer o prognóstico perinatal, ocorrendo em 6% a 25% dos partos.
Anestesia epidural deve ser encorajada, pela possibilidade de cesárea de emergência
ou manobras obstétricas (versões). A ultrassonografia deve estar disponível na sala de
parto, ajudando a nortear o obstetra a respeito das apresentações fetais encontradas.
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ANESTESIA: EFEITOS SOBRE O CONCEPTO
Atualmente, perante o conhecimento da fisiologia da dor no parto e da farmacocinética
de múltiplas drogas, bem como de técnicas diversas de administração, podemos iniciar
analgesia a qualquer momento no transcurso do trabalho de parto com excelentes
resultados e mínimo efeito sobre o feto. O agente analgésico ideal seria aquele capaz
de proporcionar rápido alívio de sintomas, com baixa incidência de efeitos colaterais,
propriocepção e motricidade preservadas e mínima capacidade de promover efeitos
adversos ao compartimento fetal e à dinâmica da contratilidade uterina.
Sabe-se que a saturação de oxigênio no feto permanece semelhante durante o
primeiro e segundo estágio do trabalho de parto, independente de realização de
analgesia. Estudos recentes não demonstraram relação entre administração de drogas
analgésicas e queda na pO2 do feto, mesmo em vigência de traçado cardiotocográfico
não tranquilizador.
Os cuidados da paciente com analgesia incluem rigorosa manutenção da pressão
arterial, evitando-se queda da perfusão uteroplacentária secundária à hipotensão. A
pressão do útero sobre a veia cava inferior causa redução do retorno venoso e débito
cardíaco, causa mais comum de queda dos níveis tensionais durante o trabalho de
parto. Dessa forma, a gestante, quando no leito, deverá manter o decúbito lateral
esquerdo sempre que possível. Importante assinalar também o uso judicioso de
ocitócicos, no sentido de evitar-se hipercontratilidade uterina, responsável, muitas
vezes, pelo gradual esgotamento das reservas oxigenativas da placenta.
A anestesia neuraxial (epidural, espinhal ou combinadas) deve ser a técnica de eleição
para o parto (vaginal ou cesárea), devendo-se evitar bloqueio motor no caso do parto
vaginal. Na cesariana, em que o risco de hipotensão é maior, preconiza-se expansão
de volume adequada.
Apesar de o uso da analgesia epidural estar potencialmente relacionado à possibilidade
de efeitos indesejados, estes fatores adversos parecem estar amplamente superados
pelos benefícios causados ao equilíbrio acidobásico do feto, além do conforto e
bem-estar propiciados à parturiente e a seu companheiro, tornando a experiência da
parturição um evento emocionalmente muito positivo, no qual os esforços maternos
se amplificam na dissociação da dor, muitas vezes promovendo o encurtamento do
primeiro e segundo estágios do parto.
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FEBRASGO - Manual de Perinatologia
Leitura complementar
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8.
9.
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Seção 4
Ética em perinatologia
ASPECTOS IMPORTANTES DA ÉTICA EM PERINATOLOGIA
Todos os componentes da equipe perinatal têm obrigações éticas com a gestante,
diretamente relacionadas às diferentes funções e responsabilidades profissionais. O
conceito de se encarar o feto como um paciente é muito recente. Foi somente no ano
de 1963 que se realizou a primeira intervenção invasiva fetal, correspondente a uma
transfusão intrauterina para o tratamento da incompatibilidade Rh. Em 1974, se realizou
a primeira fetoscopia e, somente em 1982, a primeira intervenção cirúrgica (derivação
vesicoamniótica) em uma uropatia obstrutiva.
Na prática clínica, no entanto, são mais frequentes os conflitos que surgem quando os
desejos e as intenções das gestantes não coincidem com as necessidades, os interesses e
os direitos dos fetos, tal como percebido pela equipe de saúde.
Outra forma de conflito entre a gestante e seu concepto, que pode ocorrer sem a participação
de um terceiro, corresponde aos atos de “omissão” (não comparecer às consultas da
assistência pré-natal, mau controle do diabetes etc.) ou ao consumo de substâncias tóxicas
para o feto (álcool, cigarro, drogas etc.). Nestas situações, há que se considerara até que
ponto se pode forçar uma gestante a realizar um determinado procedimento ou a alterar
um hábito de vida para defender os direitos do feto. Nesse sentido, o American Congress of
Obstetricians and Gynecologists (ACOG) se pronunciou em um consenso em 1987, cujos
pontos centrais foram: é eticamente inaceitável pressionar uma gestante a realizar uma
cesariana ou outro procedimento; deve-se evitar realizar procedimentos não desejados
pela gestante; recorrer a autoridades judiciais para autorizar uma terapia destinada a
proteger o feto é uma violação da autonomia da gestante; e a intervenção de autoridades
judiciais em questões médicas pode conduzir a consequências sociais indesejáveis, por
exemplo, criminalizar o não cumprimento de uma indicação médica.
Em linhas gerais, se os postulados éticos básicos (beneficência, não maleficência, justiça
e autonomia) forem observados, conseguiremos cumprir as responsabilidades éticas em
perinatologia. É essencial, no entanto, que a gestante receba todas as informações possíveis
em relação aos riscos dos procedimentos propostos, os benefícios de sua realização e as
consequências nos casos de não efetuá-los. É importante também transmitir, sempre que
possível, o prognóstico após o nascimento, na infância e vida adulta.
Especial atenção deve ser dada aos casos de malformação fetal. Tanto a atitude paternalista
quanto a imposição do sistema de valores por parte dos médicos devem ser evitadas. Cabe
à equipe a orientação da gestante na identificação de seus próprios valores e a ajuda para
alcançar uma decisão consistente com eles.
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Algumas recomendações são essenciais para se prevenir potenciais conflitos éticos:
1. Avaliar o problema e identificar as melhores alternativas.
2. Informar a paciente de maneira mais objetiva e imparcial possível.
3. Certificar-se de que a gestante compreendeu todos os elementos envolvidos.
4. Permitir uma decisão livre sobre a situação que se apresenta.
5. Respeitar a decisão.
INTERRUPÇÃO ELETIVA DA GESTAÇÃO
Este é o ponto mais polêmico, do ponto de vista ético, porque envolve princípios
morais e valores de cada sociedade, além de fatores religiosos e emocionais de cada
indivíduo. Algumas sociedades, quando diante de falha no método da contracepção
ou de malformação fetal, têm, no abortamento, um caminho a ser seguido. No Brasil,
essa conduta é, no mais das vezes, proscrita com bases não só legais como também
nos conceitos morais, éticos e religiosos. A indicação de abortamento, à luz da
perinatologia, só é permitida por lei em situações de risco de morte materna.
FETO MALFORMADO
Do ponto de vista ético, e à luz da lei brasileira vigente, a equipe médica deve se opor
à interrupção da gestação diante da insistência de pais de uma criança malformada
por só desejarem uma criança se esta for perfeita. Cabe ao obstetra, pelo uso pleno de
métodos diagnósticos e pré-natais, explicar e discutir com os pais, com a máxima precisão
possível, a natureza da malformação, sua evolução e as possibilidades de tratamento
de cada caso. Pode se considerar uma exceção a esta regra os casos de malformação
incompatível com a vida, cuja interrupção se encontra em via de regulamentação. A
jurisprudência tem andado de acordo com os avanços da medicina fetal, impondo-se
à atualização das leis, possibilitando aos médicos agir em conformidade com estas.
GESTAÇÃO MÚLTIPLA
Gestações com dois ou mais embriões sucedem com elevada possibilidade de morbidade
materna e morbiletalidade perinatal, relacionada à prematuridade extrema. A redução
embrionária pode ser vista como uma forma de evitá-la e é utilizada em diversas partes
do mundo, inclusive no Brasil, à margem da lei. Quando presentes cinco ou mais
embriões, na maioria das vezes, o resultado é catastrófico. Nestes casos, a redução
embrionária visa à manutenção da vida de um ou mais embriões, que possivelmente
não teriam chance de chegar à viabilidade se deixados à própria sorte, justificando-se
a redução do ponto de vista racional. Porém, aspectos éticos, legais, morais e religiosos
devem ser levados em conta, respeitando-se a autonomia do casal.
CIRURGIA MATERNA DE URGÊNCIA
As cirurgias não obstétricas são, por vezes, necessárias durante a gestação, porém
não existem dados na literatura médica que suportem recomendação específica.
Desta forma, a consultoria obstétrica para confirmar a idade gestacional e determinar
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a melhor maneira de monitorar o feto é recomendada e deve ser individualizada
considerando a idade gestacional e o tipo da cirurgia. As gestantes que necessitam
de cirurgias não obstétricas são mais bem conduzidas se houver comunicação ampla
entre as especialidades envolvidas, incluindo-se obstetra, anestesista, cirurgião e
neonatologista.
PREMATURIDADE EXTREMA – LIMITE DA VIABILIDADE
O conceito de limite da viabilidade é muito vago e muito simplista do ponto de vista
ético. É importante conhecermos nossa realidade e nos lembrarmos de que prematuros
extremos impõem grandes desafios para os pais e outros profissionais de saúde. O
empreendimento tecnológico nos seduz porque encarna o sonho da imortalidade,
mas questões como até onde aplicar o artificial na vida humana sem pôr em risco a
integridade de sua natureza e os limites éticos para a ação médica e tecnocientíficas
precisam ser consideradas. É necessário que seja observado o esforço de se preservar
a vida, mas não se pode correr o risco de alterar de maneira inaceitável a qualidade de
vida que resta a alguém.
A medicina perinatal vem apresentando grandes avanços que se refletem na sobrevida
de bebês prematuros e/ou extremamente doentes, sem, no entanto, apresentar
grande impacto na redução da morbidade a médio e longo prazo. A incidência de
inacapacidades neuromotoras moderadas e graves, avaliadas entre 18 e 30 meses em
bebês nascidos entre 23 e 25 semanas sobreviventes, é alta (30% a 50%).
O investimento neonatal em crianças cada vez menores repercute em aumento da
morbidade e comprometimento da qualidade de vida. Os cuidados intensivos não
devem ser considerados, necessariamente, um benefício ou sempre justificáveis apenas
por possibilitarem uma mínima chance de sobrevivência, pois envolvem riscos, custos
e sofrimento. Os valores, e a autonomia dos pais, os custos e a qualidade de vida da
criança devem ser prioritariamente considerados. Exemplo desta situação é a ruptura
prematura de membranas antes de 24 semanas, com oligodramnia acentuada, pois
apresenta elevado risco de morbidade e a mortalidade maternofetal, principalmente
relacionado à infecção e septicemia. Alguns autores julgam que tal condição deveria
ser considerada como abortamento inevitável. O esvaziamento do útero antes de este
se infectar prevenirá a histerectomia, o choque séptico e a morte materna.
O nascimento de uma criança no limite da viabilidade requer várias decisões médicas
complexas, além de éticas e sociais. O Textbook of Neonatal Resuscitation, em sua
quarta edição, sugere não iniciar ressuscitação em um recém-nascido com menos de
23 semanas de idade gestacional e/ou 400g de peso ao nascimento.
PROCEDIMENTOS INVASIVOS PARA TRATAMENTO OU DIAGNÓSTICO MATERNO
E/OU FETAL DURANTE A GESTAÇÃO E CONFLITOS ÉTICOS
Numerosas intervenções fetais são propostas periodicamente em todo o mundo, sendo
tema de discussão no meio médico e de difusão massiva. A há que se considerar, no
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entanto, que as cirurgias fetais para a terapêutica de malformações congênitas – tais
como a hérnia diafragmática congênita, uropatias obstrutivas, teratoma sacrococcígeo,
transfusão fetofetal e mielomeningocele – se encontram, geralmente, em estado
experimental. As gestantes devem ser informadas sobre a existência da opção, mas, ao
mesmo tempo, sobre a real evidência sobre sua utilização.
Das centenas de tratamentos para malformações fetais descritas, a maioria é realizada
após o nascimento, com prognóstico melhor ou pior, a depender da malformação.
A primeira medida a ser preconizada diante de uma malformação fetal é pesquisar a
existência de outras, devido à alta frequência de malformações associadas. A análise
do cariótipo fetal faz parte desta investigação.
A cirurgia fetal envolve dilemas éticos únicos, pois, embora a mãe e o feto estejam
intimamente interligados, os interesses podem conflitar. Algumas questões controversas
são: os tipos de cirurgias permitidos, qual entidade decide sobre tal autorização,
quais as cirurgias que devem ficar restritas a centros especializados, qual o nível de
autoridade da mãe na decisão, quais as mães que se encontram aptas a decidir, quais
as mães que precisam de maior proteção quanto à interferência de outros membros da
família e qual o papel da equipe médica na orientação da decisão.
À medida que a cirurgia fetal passa a ser considerada para condições não letais, os
problemas éticos se ampliam. Os benefícios ao feto são sempre avaliados em relação
aos riscos da técnica para ele próprio, à prematuridade e à própria gestante. Bastante
ênfase também tem sido dada na proteção das gestantes contra as pressões de outros
familiares. O desejo da mãe tem sido cada vez mais respeitado, principalmente após
algumas publicações na área de neurociências terem revelado que a interdependência
entre mãe e bebê é maior do que podemos estimar.
O maior envolvimento da sociedade nas decisões das questões éticas é bastante
desejado. A comunidade é importante no apoio aos pais, no direcionamento da decisão
e na reflexão sobre quais são os padrões de qualidade de vida aceitáveis para uma
determinada patologia. Um deficiente físico será tanto melhor sucedido quanto maior
for a aceitação da sociedade. Além disso, a cirurgia fetal deve ser acessível a todas as
classes; uma vez que a sociedade custeie este procedimento, é de vital importância
estabelecer as prioridades entre a cirurgia fetal e outras necessidades sociais.
Em capítulo à parte, no que se refere à ética, estão a dor e o estresse fetal. Não se sabe
se o feto sente dor, mas já é possível detectar a sua resposta ao estresse. Essas respostas
causam alterações a curto e longo prazo no sistema nervoso central e podem afetar, no
futuro, sua compreensão da dor. Reduzir a resposta ao estresse em crianças e adultos
é sabidamente um benefício ao tratamento, e algumas evidências sugerem que esta
verdade também é válida para o feto. Entretanto, a dose adequada para a supressão
da dor e/ou estresse e o melhor método para fazê-la (opioides ou anestesia regional)
permanecem desconhecidos. Prevenir e tratar a dor são direitos humanos básicos e
independem da idade. As pesquisas para evolução na técnica cirúrgica precisam estar
acompanhadas por outras que permitam maior compreensão da propriocepção fetal e
da sua resposta ao estresse.
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Leitura complementar
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
9.
10.
11.
12.
13.
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GADOW, EC; FIORILLO, AE. Obstetricia en esquemas. Buenos Aires: El Ateneo; 2004, p.
420-424.
American Academy of Pediatrics; American Congress of Obstetricians and Gynecologists.
Guidelines for Perinatal Care. United States: March of Dimes, 2007.
GONÇALVES, MM; PÉRET, FJA. Dilemas Éticos em Perinatologia. In: ALVES FILHO, N;
CORRÊA, MD (eds.). Perinatologia Básica. 3 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006,
p. 672-674.
PESSINI, L. Distanásia: Até quando investir sem agredir? Bioética. 1996; 4: 31-43.
BHERING, CA. Bioética na Prática Neonatal: Uma Abordagem Geral. In: ALVES FILHO, N;
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