Compreendendo o Consumidor Através do Interacionismo Interpretativo Autoria: João Felipe Rammelt Sauerbronn, Eduardo André Teixeira Ayrosa Resumo: O interacionismo interpretativo é uma proposta metodológica voltada para os problemas vividos pelos indivíduos no mundo das experiências e seus contextos sociais. A partir da perspectiva da interação simbólica de Blumer, aliada à fenomenologia hermenêutica de Heidegger, o interacionismo interpretativo propõe a observação das interações entre indivíduos em momentos críticos (epifanias) e a busca da compreensão da construção dos significados individuais a partir da interpretação destas interações. Tal perspectiva pode ser interessante para a pesquisa acadêmica em marketing, especialmente para os estudos que procuram levar em consideração o ponto de vista do consumidor e a sua formação de significados e valores de consumo. O presente artigo se dedica a apresentar a perspectiva do Interacionismo Interpretativo, conforme desenvolvida por Denzin (1989) e procura demonstrar como esta metodologia pode ser utilizada na pesquisa acadêmica em marketing. 1. Introdução O desafio de se compreender o consumidor e as experiências de consumo tem despertado em muitos pesquisadores da área de marketing o desejo de partir para novas configurações de pesquisa. Vários pesquisadores têm reiteradamente mencionado a predominância do positivismo hipotético-dedutivo na área de marketing (HIRSCHMAN, 1986; VIEIRA, 2000 e 2003), predominância esta justificada pela tentativa de construção de uma ciência do marketing (HUNT, 1991). O dilema do estudioso da área de marketing reside na relativa limitação do seu repertório de soluções metodológicas, fruto dos esforços de construção de uma carreira acadêmica num ambiente predominantemente positivista. Aceitar que existe algo que jamais será colocado em uma escala e faz sentido para a pesquisa em marketing não faz parte do credo de muitos acadêmicos da área de marketing. Para a resolução de alguns problemas de marketing, a visão positivista e os métodos quantitativos parecem bastante adequados. Problemas relacionados a variações em quantidades de vendas frente a deslocamentos de preços, por exemplo, podem ser entendidos muito precisamente a partir desta visada, como apontam Ayrosa e Sauerbronn (2004). Entretanto, a visão dominante carece de uma revisão, já que se mostra pouco funcional em muitos casos. Uma vez que a produção acadêmica adota majoritariamente a perspectiva positivista, os modelos construídos dentro desta orientação axiológica serão consolidados dentro dos preceitos alinhados ao positivismo. As limitações intrínsecas destes modelos excluem fatores aos quais as representações da realidade propostas não foram programadas para captar.Como conseqüência, estes fatores deixam de existir e a disciplina continuamente deixa de lado vários aspectos que podem ser importantes para a compreensão adequada dos problemas relacionados às trocas entre compradores e vendedores e sobre o que há por trás destas trocas (ZINKHAM e HIRSCHEIM, 1992; CHUNG e ALAGATARATNAM, 2001). As abordagens interpretativistas (e qualitativas) ganharam grande suporte a partir da orientação pós-moderna (BROWN, 1994), uma vez que esta condição fez com que alguns temas passassem a ser interessantes à pesquisa acadêmica em marketing. Desta forma, muitos trabalhos com temas novos e estranhos ao paradigma dominante passaram a ser conduzidos sem o grande temor de não serem aceitos na academia (HOLBROOK e HIRSCHMAN, 1982). A partir da observação alternativa dos problemas de marketing pôde surgir espaço para diversas formas de se entender e realizar pesquisa em comportamento do consumidor. A utilização de pontos de vista alternativos permitiu que diversas relações que não poderiam ser percebidas (ou aceitas) no passado fossem pesquisadas e trouxessem novas possibilidades para a compreensão do marketing. Conseqüentemente, novos problemas de pesquisa em 1 marketing surgiram e isto tornou possível a consolidação da visão interpretativista dos problemas de consumo. O objetivo deste artigo é apresentar uma metodologia que pode ser interessante para a observação do consumidor e suas experiências de consumo e para o desenvolvimento de novas teorias sobre consumo. Dentro deste contexto, exploramos o Interacionismo Interpretativo como proposta metodológica interessante para a observação de problemas de consumo. Como veremos adiante, as características intrínsecas do método podem colocar esta proposta metodológica como uma forma de superar eventuais obstáculos para a pesquisa em marketing, mais notadamente aquela preocupada com os problemas que podem surgir das ações de marketing. 2. Estabelecendo o Espaço Interpretativo na Pesquisa Acadêmica de Marketing Dentro do campo da pesquisa qualitativa, é reconhecido que não há uma única maneira de se representar experiências de consumo (GOULDING, 2003) e os debates estabelecidos no campo do marketing confirmam esta característica plural. A pesquisa acadêmica em marketing lançou mão da utilização de métodos qualitativos há tempos e perspectivas alternativas às pesquisas tradicionais têm surgido com força cada vez maior nas academias internacional e brasileira, mesmo que com alguma timidez se comparado com outros campos das ciências sociais, inclusive administrativas. Mesmo que a aventura por caminhos alternativos dentro da pesquisa acadêmica em marketing já não seja mais tão perigosa e não demande mais tanta “auto-proteção” do pesquisador, dedicamos esta seção à breve apresentação dos pressupostos da pesquisa de caráter interpretativo. Estes pressupostos incluem crenças sobre a natureza da realidade, dos seres sociais e sobre o que constitui conhecimento, como vemos a seguir. No tocante à natureza da realidade (ou verdade), em contraste à visão positivista que propõe a realidade objetiva e tangível, a perspectiva interpretativa assume a realidade como essencialmente mental e percebida. Desta forma, múltiplas pesquisas tendem a não convergir para uma única realidade porque há múltiplas realidades e estas realidades são dinâmicas (HUDSON e OZANNE, 1988). A realidade é construída por sistemas que são dependentes de outros sistemas para gerarem significados e sentidos (LINCOLN e GUBA, 2000; mais especificamente na disciplina do marketing: MOORMAN, 1987). A realidade é socialmente construída, múltipla e contextual. Desta visão da natureza da realidade resulta a própria visão de ser social que não apresenta um comportamento determinado (reativo) ou formado unicamente a partir do processamento racional de informações que forma crenças, atitudes e intenções (causalidade). Os interpretativistas assumem que os indivíduos criam sentidos e interagem ativamente a partir de suas interações com o mundo de forma a moldar seu ambiente (HUDSON e OZANNE, 1988). O objetivo maior de uma pesquisa de caráter hipotético-dedutivo é apresentar uma explicação que gere subsídios para a predição, a partir de leis universais para o comportamento dos indivíduos e, no caso do marketing, previsão de comportamentos de consumo. Esta perspectiva epistemológica prioriza perguntas de pesquisa baseadas em “porquê”. Para o interpretativista o objetivo principal é compreender o comportamento, não prevê-lo. Faz mais sentido para o interpretativista perguntar “como”, e não “porquê”. Esta compreensão é radicalmente diferente da visão positivista: compreender é um processo e não um produto final, nunca tem fim (ARNOULD e FISCHER, 1994). Não existe a interpretação, existe uma interpretação: a interpretação é pré-requisito, mas não é suficiente. Esta perspectiva está relacionada por alguns pesquisadores ao que Weber chama de verstehen (SCHWANDT, 2000), uma compreensão completa do mundo do outro a partir dos termos do pesquisador. Dentro da abordagem interpretativa, em adição ao conhecimento dos significados culturais compartilhados, é necessário perceber os significados 2 pessoais/individuais. Desta forma, compreender o consumidor significa entender também a interação entre os significados sociais e culturais compartilhados por ele e seus significados pessoais (THOMPSON, 1997). Como os processos social e cultural são dinâmicos, os significados de consumo são continuamente criados e recriados durante o ato da vida. Ao mesmo tempo em que possibilita alguma compreensão do universo do outro, o verstehen, contudo, guarda limitações na compreensão de manifestações de culturas estranhas ao pesquisador, pois os termos da interpretação serão sempre relativos ao universo cultural do pesquisador. A perspectiva interpretativa adota uma abordagem mais histórica e particularista à pesquisa e se preocupa em estudar um fenômeno específico em um tempo e em um lugar específicos. Ao invés de procurar leis determinísticas, a pesquisa interpretativa busca determinar motivos, significados, razões e outras experiências subjetivas que são ligadas a tempo e contextos (MCCRACEKN, 1981). Assim, não há preocupação com generalizações ou leis abstratas e gerais que possam ser aplicadas a um número infinitamente grande de fenômenos de consumo, consumidores, condições e tempos (HUDSON e OZANNE, 1988). Para os interpretativistas o mundo é tão complexo e dinâmico que é impossível distinguir causa e efeito. A instância interpretativa pressupõe molde simultâneo e mútuo entre as entidades (HOLBROOK e GRAYSON 1986). Segundo esta perspectiva, presumir que um fenômeno seria causado por outro seria, portanto, cientificamente inocente. As distinções ontológicas, axiológicas e epistemológicas da perspectiva interpretativa têm implicação na forma de encarar a pesquisa: o pesquisador e os consumidores investigados interagem e surge uma pesquisa cooperativa (GOULDING, 2000). Se a realidade social é baseada nas percepções individuais e grupais, então, para entendermos suas percepções, os indivíduos/consumidores devem estar envolvidos na criação de um processo de pesquisa. O consumidor estudado se torna um participante na pesquisa, guiando o processo assim como proporcionando informações. Para os interpretativistas, o cientista é membro da realidade social, não havendo nenhuma posição privilegiada (HUDSON e OZANNE, 1988). Desta forma, surgem desenhos de pesquisa que requerem adaptação da parte do pesquisador durante todo o processo de pesquisa. Uma característica marcante da abordagem interpretativa é o desenho de pesquisa em evolução contínua (continually evolving research design). Os interpretativistas procuram descrever várias realidades percebidas que não podem ser conhecidas a priori porque eles são específicos de um tempo e de um contexto. A pesquisa é um processo emergente e, assim como as realidades percebidas mudam, o desenho da pesquisa se adapta. Diversas pesquisas que compartilham da perspectiva interpretativa já foram desenvolvidas dentro do campo da pesquisa de consumo, mesmo que ainda não de forma preponderante dentro da área tanto em nosso academia, como na academia internacional (HIRSCHMAN, 1986; VIEIRA, 2000 e 2003). A busca pela compreensão do consumidor e das experiências vividas em situações de consumo acaba levando os pesquisadores de consumo a novas fronteiras da pesquisa social e, assim, as limitações metodológicas da disciplina do marketing são forçosamente superadas. Como uma abordagem qualitativa distinta na pesquisa social, o interacionismo interpretativo procura trazer de forma acessível ao leitor o mundo da experiência vivida pelo indivíduo. Conforme propõe Denzin (1989), o foco deste método interpretativo se coloca sobre as experiências de vida que radicalmente afetam ou dão forma aos significados que os indivíduos dão a si mesmos e aos seus projetos de vida, intimamente ligados ao consumo (BAUDRILLARD, 1991). 3. A Proposta do Interacionismo Interpretativo 3 O interacionismo interpretativo é uma proposta metodológica voltada para os problemas vividos pelos indivíduos no mundo das experiências e seus contextos sociais. A sua denominação exibe seus antecedentes: o argumento do interacionismo interpretativo parte do interacionismo simbólico de Blummer e procura conciliar esta proposta à perspectiva interpretativa da fenomenologia associada à hermenêutica de Heidegger, criando, assim, estudos que fazem sentido para o mundo pós-moderno da experiência humana (DENZIN, 1989). Seu desenvolvimento parte do pressuposto que as ações humanas se dão em direção ao outro, com o outro e a partir do outro, em processos mútuos que resultam nas experiências interacionais mediadas por símbolos e pela linguagem. A partir das interações entre indivíduos passam a surgir relações entre os objetos e seus significados e estes significados sobrepostos passam a compor um repertório de sentidos para os objetos de acordo com os contextos das interações. Existem muitas abordagens interpretativas relevantes para a pesquisa social e, por conseqüência, para a pesquisa de marketing. O Interacionismo Interpretativo pode ser mais uma opção para o pesquisador da área na medida em que opera sobre determinadas condições que podem ser interessantes para alguns problemas de pesquisa da disciplina. As características deste método são muito bem desenhadas por Denzin e cabe a esta seção apresentar as origens e particularidades desta proposta metodológica. 3.1 A Perspectiva Metodológica do Interacionismo Simbólico Para que possamos entender a proposta de Denzin para o Interacionismo Interpretativo e cumprir a proposta deste trabalho é necessário que analisemos seus antecedentes. Como podemos perceber, até mesmo pela forma com a qual Denzin deu nome a sua proposta, as interações entre indivíduos são a base de sua proposta metodológica e o interacionismo simbólico serve como principal elemento constitutivo do interacionismo interpretativo. Nesta seção desenvolveremos a perspectiva do interacionismo simbólico, conforme proposto por Blumer (1998), e destacaremos as contribuições mais sólidas à proposta do interacionsimo interpretativo. Seguindo o trabalho de outros teóricos da Escola de Chicago, Blumer foi o responsável pela posição metodológica adotada pelo interacionismo simbólico e se tornou figura central para o desenvolvimento de ações empíricas baseadas nesta perspectiva. O princípio básico do interacionismo simbólico propõe que qualquer esquema social humano orientado empiricamente deva respeitar o fato de que, em primeira e última instâncias, a sociedade humana é constituída de pessoas engajadas em ações. O interacionismo simbólico dá conta da natureza da sociedade humana e da vida humana em grupo e dentro desta perspectiva, os grupos humanos são formados por seres humanos engajados em ações. Estas ações consistem em múltiplas atividades que os indivíduos realizam em suas vidas enquanto se encontram uns com os outros e lidam com a sucessão de situações a que são confrontados. Assim, os grupos humanos ou sociedades existem em ação e devem ser observados em termos de suas ações. A vida em grupo pressupõe necessariamente as interações entre membros do grupo ou, posto de outra forma, uma sociedade consiste de indivíduos interagindo. A conformação da proposta metodológica do interacionismo simbólico surge do desconforto de Blumer frente ao modo com o qual as ciências sociais e a psicologia social tratavam as interações humanas. Para ele, as interações sociais desempenhadas pelos indivíduos detinham importância fundamental para a compreensão dos fenômenos sociais e deveriam ser contempladas pelas ciências sociais. Assim, Blumer considerou três premissas básicas para sua proposta: 1) os seres humanos agem sobre os objetos com base nos significados que aqueles objetos têm para eles; 2) os significados dos objetos originam-se na interação social que o indivíduo tem com outro; e 3) os indivíduos lidam com os significados e os modificam através de um processo interpretativo utilizado pela pessoa ao lidar com as 4 coisas que encontra. Parece claro como este processo de ressignificação acontece no mundo do consumidor, afinal, um produto como o automóvel pode assumir diversos significados para os consumidores, desde o simples meio de transporte até a explicitação de uma opção de vida. De certo o universo de consumo é um universo eminentemente simbólico que guarda importância fundamental para os significados de vida dos indivíduos (BELK, 1985; BAUDRILLARD, 1991). As ciências sociais e a psicologia social tendem a tratar o comportamento humano como o produto de vários fatores que têm papéis sobre o indivíduo: a preocupação está centrada no comportamento e nos fatores relacionados a estes comportamentos. As explicações estão centradas em estímulos, atitudes, motivações (conscientes ou inconscientes), percepção, cognição, no caso da psicologia, ou em classes sociais, status, papéis, e prescrições culturais dadas por normas e valores, para as ciências sociais. Em ambos os casos, os significados das coisas para os seres humanos que estão agindo deixam de ser levados em consideração em detrimento dos fatores utilizados para compreensão dos comportamentos. O significado dos objetos desaparece ao ser fundido aos fatores iniciais ou causais de um comportamento, ou se torna um mero canal transmissor que pode ser ignorado em favor destes fatores iniciais. A perspectiva de Blummer surgiu como uma alternativa às perspectivas correntes àquele tempo tanto no campo das ciências sociais, quanto no campo da psicologia social. Estas perspectivas teórico-metodológicas consideravam o significado dos objetos como dado, colocando-o de lado como pouco importante ou considerando-o como uma ligação neutra entre os fatores responsáveis pelo comportamento humano e este comportamento enquanto produto de tais fatores. De forma alternativa, a perspectiva do interacionismo simbólico considera os significados que os objetos adquirem a partir dos indivíduos como ponto central. Ignorar o significado dos objetos sobre os quais as pessoas agem é visto como falsificar o comportamento estudado (BLUMER, 1998, p. 3). Assim, o pesquisador não deve negligenciar o papel do significado na construção do comportamento. O interacionismo simbólico contraria ainda a perspectiva do realismo filosófico que sustenta o significado como intrínseco aos objetos, como uma parte natural destes. Dentro da perspectiva realista, o significado emana apenas do objeto e não há processo algum envolvido em sua formação, sendo assim, tudo que é necessário é reconhecer o significado que há neste objeto. De forma distinta ao realismo, a psicologia propõe que o significado é adicionado fisicamente ao objeto pelo indivíduo e é tratado como uma expressão dos elementos constituintes da psique, da mente ou da organização psicológica do indivíduo, tais como: sensações, sentimentos, idéias, memórias, motivos e atitudes. Desta forma, o significado é uma expressão dos elementos psicológicos que são colocados em ação quando da percepção do objeto: a explicação do significado se dá a partir do isolamento de elementos psicológicos que produzem os significados. Os interacionistas não consideram o significado intrínseco ao objeto nem como originado de uma fusão de elementos psicológicos pessoais. Dentro da perspectiva interacionista, os significados emergem do processo de interação entre pessoas. Assim, o significado de um objeto se constrói a partir das ações de outros indivíduos sobre um indivíduo que considera o objeto: as ações dos demais definem a coisa para o indivíduo (BLUMER, 1998). Isto que dizer que os significados dos objetos são produtos sociais formados a partir das atividades executadas pelas pessoas em suas interações com outros indivíduos. Enquanto o significado das coisas é formado no contexto das interações sociais e deriva da pessoa envolvida nesta interação. O uso do significado pela pessoa envolve um processo interpretativo dividido em duas etapas: a indicação do indivíduo a si mesmo das 5 coisas sobre as quais ele age; e a interpretação. A primeira etapa envolve um processo social internalizado onde o ator interage consigo mesmo. Durante a interpretação o ator seleciona, checa, reagrupa e transforma os seus significados a luz da situação em que está inserido e da direção de sua ação. Este é um processo formativo no qual os significados são usados e revisados como instrumentos de formação e direcionamento das ações. O interacionismo interpretativo procura conciliar a proposta do interacionismo simbólico com os trabalhos interpretativos e fenomenológicos de Heidegger e a tradição associada à hermenêutica e, assim, propor estudos que façam sentido dentro do período pósmoderno (DENZIN, 1989). Na seção seguinte realizamos a conciliação destes conceitos e encerramos a constituição do conceito do interacionismo interpretativo a partir da análise da fenomenologia de Heidegger. 3.2 Os Constituintes Fenomenológicos do Interacionismo Interpretativo A fenomenologia surgiu no final do século XIX, como uma tentativa de desvelamento do inexplicável, do subjetivo e do irracional, tendo o filósofo Husserl como fundador. Para Husserl, ontologicamente, o mundo é experiencial e o subjetivo é a fonte de todas as objetividades (BURRELL e MORGAN, 1982). Assim, o fenomenologista não deve se preocupar com as realidades factuais, mas sim com a questão central do significado, da essência do fenômeno. Desta forma, julgamentos e pressupostos são colocados de lado, permitindo que o pesquisador possa descrever e clarificar a estrutura essencial do mundo “real” através da meditação sobre a essência da experiência (CARVALHO e VERGARA, 2002; GOULDING, 1999). A fenomenologia Husserliana é baseada no questionamento do senso-comum e das atitudes pré-concebidas, em busca das essências dos fenômenos. Dois movimentos são a base da fenomenologia: redução e construção. A redução fenomenológica (epoché), como propõe Thiry-Cherques (2004), consiste em explicitar o objeto tal como manifesto (noema) de uma determinada forma (noese). Assim, a realidade é colocada entre parênteses, as crenças, preconceitos ou suposições sobre o objeto são suspensos. A epoché provê os meios de se entrar no reino da subjetividade fenomenológica (BURRELL e MORGAN, 1982). O pensamento visa o objeto e possibilita desvendar o sentido que o leva ao significado do objeto para o indivíduo. A construção é um retorno à fundação das realidades colocadas inicialmente em suspenso, quando surge sentido para a consciência. O interacionismo interpretativo adota a posição de Heidegger e não parte de considerações sobre um eu abstraído do mundo externo e da comunidade humana, mas sim a partir da experiência cotidiana: a vida cotidiana é a vida do indivíduo. A fenomenologia suspende, assim, o exame dos determinantes subjacentes às crenças das pessoas, para procurar descrever as implicações, as intenções e os efeitos daquilo que os indivíduos dizem, fazem e acreditam que seja verdadeiro (GOULDING, 1999). Como forma de instrumentalização do método fenomenológico, Heidegger propôs a abordagem interpretativa, ou hermenêutica, e o círculo hermenêutico para (re)criação do conhecimento: (1) compreensão; (2) interpretação / ação; e (3) nova compreensão. A interação entre sujeitos, então, é compreendida a partir da linguagem e a redução do sentido cotidiano das palavras faz com que os significados implícitos sejam revelados. Os elementos essenciais da linguagem são a expressão e a significação, mas a expressão por si só pode ser insuficiente como qualificação: o significado é associado aos fonemas da palavra (ANDRADE e TANAKA, 2001). Por conseguinte, é através da linguagem que a vida cotidiana ganha significado para o indivíduo: a linguagem marca as coordenadas da vida do indivíduo na sociedade e enche esta vida de objetos dotados de significação (BERGER e LUCKMAN, 2004). Conforme propõem Berger e Luckman (2004), o indivíduo apreende a realidade da vida diária como uma realidade ordenada, com fenômenos previamente dispostos em padrões independentes da apreensão que o indivíduo tem deles e que se impõem a sua 6 apreensão. A realidade da vida cotidiana aparece já objetivada, independente da participação do indivíduo. É neste ponto que a linguagem ganha importância, pois é utilizada na vida cotidiana como fonte dos significados dos objetos e determinante da ordem em que os objetos adquirem sentidos. Na seção seguinte trataremos da operacionalização da proposta do interacionismo interpretativo, intimamente ligada ao programa fenomenológico e suas características. 4. Operacionalização do Método Transformar a proposta metodológica em instrumento de pesquisa envolve alguns desafios para o pesquisador. O primeiro deles envolve a preparação do pesquisador e sua familiaridade com a proposta metodológica. Todos os pesquisadores têm suas convicções sobre o mundo e sobre as relações de pesquisa e não necessariamente devem abandoná-las. Na verdade a pesquisa interpretativa exige um pesquisador treinado e capaz de se relacionar com o mundo à sua volta de forma particularmente crítica: os conceitos e questões básicos que o investigador traz ao estudo são parte da pesquisa. Estes conceitos e questões determinam a forma com a qual teremos uma compreensão antecipada sobre o objetoproblema. Todo questionamento é guiado antecipadamente pelo o que é observado. A pesquisa interpretativa começa e termina com a biografia e o self do pesquisador (DENZIN, 1989) e depende de suas habilidades de participação, entrevista e escuta. A preparação do pesquisador é necessária para o processo interpretativo, mas não é suficiente para a construção de uma pesquisa de caráter interpretativo uma vez que cada perspectiva metodológica possui características próprias. A operacionalização metodológica do interacionismo interpretativo compreende seis etapas, que são interdependentes. O primeiro passo é a formulação do problema de pesquisa e é determinante para a adequação e o sucesso do processo de pesquisa. Ao formular o problema de pesquisa o pesquisador tem de considerar as características do problema, da forma que lhe é revelado e suas convicções científicas. O interacionismo interpretativo tem uma proposta direta de atuação: examinar como (e não porque) experiências problemáticas são organizadas, percebidas e construídas pelos indivíduos em interação e como são construídos os significados associados a estas experiências. O pesquisador procurará descobrir como a ação problemática (ou evento) em questão age sobre a organização e a construção de significados para as pessoas estudadas (DENZIN, 1989). A utilização da proposta do interacionismo interpretativo pode ser interessante para os estudos de consumo desde o começo, não por ser “nova” (inédita) no campo, mas por ser uma nova forma de ver os problemas de consumo. Quando alteramos a nossa perspectiva de entendimento do mundo do consumo, e mais especificamente o consumidor, surgem problemas diferentes que exigem visadas diferentes. Assim, ao nos depararmos com novas perpectivas de pesquisa, poderemos contar com um suporte metodológico para estudar como os consumidores se apropriam dos significados sociais das mercadorias e simultaneamente os constroem. Tal proposta pode levar a uma expansão da compreensão sobre o consumidor e resultar em novas teorias do consumidor, mais adequadas inclusive à realidade (relacional) brasileira. Adotemos como exemplo: Como a mulher brasileira constrói a imagem de produtos esportivos? Depois de formulado o problema de pesquisa, o pesquisador deve analisar criticamente a forma com a qual este problema tem sido apresentado, estudado e analisado em outras pesquisas existentes e como as teorias relativas a este problema foram construídas. Esta desconstrução servirá para que o pesquisador desvende os vieses e os pré-conceitos envolvidos e consiga localizar o seu estudo em contraste a este corpo de trabalho existente. A pesquisa interpretativa utiliza o círculo hermenêutico ao colocar o pesquisador e o sujeito da pesquisa no centro do processo. Um círculo interpretativo (ou duplo-hermenêutico) 7 é implicado, já que o sujeito que apresenta uma história pessoal está no centro da vida que é contada e o pesquisador, que lê e interpreta esta história, está no centro de sua interpretação. Duas estruturas interpretativas, deste modo, interagem uma com a outra. Cada círculo sobrepõe o nível que o pesquisador é capaz de vivenciar a seu modo a experiência do sujeito e suas histórias particulares. Estes círculos nunca estarão completamente superpostos, uma vez que as experiências do sujeito nunca serão as mesmas que a do pesquisador: a expectativa se dá em torno da compreensão. A desconstrução lida com o que foi feito com o fenômeno no passado, mas é necessário que o pesquisador trate do fenômeno na situação presente para que seu estudo tenha sentido. Desta forma, o pesquisador precisa localizar e situar o que está sendo estudado dentro do mundo natural e capturar o fenômeno em questão. A captura envolve a coleta de casos múltiplos e histórias pessoais que incorporem o fenômeno em questão e a localização das crises e epifanias nas vidas das pessoas estudadas. Assim, devem ser obtidas dos sujeitos em questão múltiplas histórias pessoais e auto histórias que envolvam o tópico investigado. Alguns momentos experienciados pelos indivíduos são únicos, marcam suas histórias de vida e atuam na configuração de seus arranjos de compreensão do mundo, suas racionalidades e emoções. Estes momentos colocam o individuo frente a seu mundo, reconstruindo-o e dando-lhe novos formatos a partir das novas interações presenciadas e suas relações com os resultados das interações anteriores. Tais momentos são as epifanias. A seguir, transcrevemos um relato longo que demonstra este momento de tomada de consciência. Nele, a entrevistada fala sobre a sua relação com o remo, o barco, os prazeres da prática, e as responsabilidades associadas a essa prática. “O barco na Lagoa foi legal também porque você treina primeiro num tanque, você corre, você se prepara para aquele momento e aí quando você entra num barco, é a primeira vez que você entra num barco sozinha... ...apesar de ser um barco horroroso, você olha e fala: ‘pô, responsabilidade!’ Esse barco está na minha mão, estou começando mesmo, agora é pra valer entendeu? Na verdade, eu sempre tive vontade de fazer remo, eu gosto de estar ao ar livre, do ambiente ao ar livre, eu não consigo entender como eu fiz tanto tempo de musculação, eu estou até procurando um esporte pra fazer hoje em dia e uma das coisas que eu pensei é que tem que ser ao ar livre. É algo que me faz bem. Eu olhava pro remo, e falava: – ‘cara, isso deve ser muito gostoso’. Você estar lá no barquinho, no meio da Lagoa Rodrigo de Freitas de manhã cedo, aquele sol fraquinho ainda, isso é uma baita forma de você começar bem o seu dia. Era bom estar na Lagoa, mas levantar da cama era triste. E depois do treino era ótimo, parecia que você tinha malhado horrores, que você estava linda, maravilhosa, vinte quilos mais magra, que você podia comer tudo o que você tinha direito pra ir pra aula. E até os perigos do esporte é algo que marca muito também. Eu lembro que um dia a gente pegou uma tempestade no meio da Lagoa, a gente estava no meio da Lagoa, quando o céu ficou cinza, o tempo virou, começou a chover muito. Entrava água dentro do barco e estávamos as três no meio da Lagoa. A gente olhava uma pra cara da outra apavoradas: - ‘vamos levar o barco de volta!’. Porque a prioridade no remo é o barco, se você cair, você pega o remo bota em cima do barco e pode ir nadando, levando o barco de volta pra não perder o barco. Eu achei que ia virar, aquele negócio ia virar: ‘cara eu vou fazer de tudo pra não virar entendeu? Se virar eu não vou conseguir voltar pra dentro do barco!’. Então a gente: - ‘vamos levar o barco, vamos levar!’ Olhando e dando instrução errada uma para outra. Depois a gente parou pra conversar com o treinador sobre aquilo ali e ele já estava vindo de longe atrás da gente já que a gente demorou pra chegar porque a gente estava longe pra caramba.” (mulher, 28 anos). 8 O termo epifania denomina as festas cristãs do Dia de Reis, quando a santidade de Deus é celebrada e a vida é abençoada. Denzin (1989) pega emprestado de James Joyce o significado que este último construiu para as epifanias, ao descrever momentos de interação que deixam marcas positivas ou negativas nas vidas das pessoas. Freqüentemente estes momentos marcantes são experienciados como problemas pessoais que se tornam assuntos públicos posteriormente. Com a constituição de uma sociedade baseada no consumo e não mais na produção, como propõem Douglas e Isherwood (2004) e Baudrillard (1991), as experiências individuais ou coletivas que ocorrem em situações de consumo passaram a ter importância central na vida dos indivíduos. Ora, parece claro que poderíamos buscar compreender o consumo, os consumidores e as estruturas daí formadas a partir da interpretação das epifanias de consumo. Assim, durante a captura o pesquisador deve conduzir suas entrevistas de forma a extrair dos indivíduos entrevistados estas epifanias. O pesquisador tem de ser capaz de construir uma descrição densa das experiências coletadas junto aos indivíduos. Conforme proposto por Denzin (1989), a partir do conceito de Geertz (1989), a descrição densa procura resgatar os significados e experiências que ocorreram em situações no campo e capturar as interpretações que as pessoas dão aos eventos que foram registrados. Seu objetivo é reportar as interpretações da forma com que elas foram apresentadas durante a interação e assim, estabelecer as bases para uma interpretação densa. Muito mais do que descrever uma situação acessada, os elementos participantes e os interesses envolvidos nos fenômenos, a descrição densa procura deixar explícito todas as estruturas superpostas, referências e implicações, através das quais o pesquisador pode compreender o fenômeno de forma mais completa. No caso do exemplo apresentado, observamos algumas questões marcantes para a entrevistada, no tocante à sua inserção em um ambiente novo e, geralmente, restrito ao consumidor masculino. Os efeitos sobre o corpo, que serão observados por todos em seguida, durante a aula. Observamos a maneira com a qual ela expõem a sua satisfação com o resultado do exercício e com as experiências vividas neste novo ambiente, o desafio imposto pela tempestade e a sua superação, o medo e suas responsabilidades para com suas companheiras (superar a adversidade), seu treinador (mostrar sua capacidade) e seu clube (devolver o barco inteiro). Esta descrição permite uma série de interpretações sobre esta experiência de consumo e sobre o universo esportivo e social da mulher. A interpretação densa procura descobrir os meios que formam e estruturam as experiências dos sujeitos e leva o leitor ao coração da experiência que está sendo interpretada. Assim, o pesquisador deve assumir que todo o significado é simbólico e operar tanto na superfície quanto nas profundezas, em nível micro e macro: a tarefa é produzir descrições ricamente detalhadas que dêem conta das experiências vivenciadas pelos indivíduos. Uma vez construídas estas descrições detalhadas das experiências vividas, o fenômeno é tratado como texto (ou como documento) e é confrontado em seus próprios termos, distante dos termos em que é interpretado na literatura existente. Neste momento, o fenômeno é retirado do mundo no qual está inserido e dissecado, de forma que seus elementos e estruturas essenciais sejam reveladas, definidas e analisadas. Como um fotógrafo que, não ter certeza sobre qual a melhor regulagem de sua câmera para a obtenção de uma foto, estabiliza o aparelho e saca diversas fotos do mesmo objeto ou cenário. Cada foto, contudo, é tirada com uma configuração diferente da máquina, o que resultará em diversas leituras diferentes daquele objeto ou cenário. Ao comparar os resultados obtidos, o fotógrafo encontra a foto que melhor reproduza o cenário real, e pode até combinar várias fotos para obter os contrastes reais da imagem. Esta figura serve para definir o bracketing, ou epoché, como define Husserl, o momento em que o pesquisador coloca o fenômeno sob séria inspeção. O bracketing permite que o pesquisador liste os elementos constituintes de um fenômeno e proponha uma (re)construção do fenômeno. O pesquisador classifica, ordena e 9 rearranja o fenômeno de forma coerente. Durante a construção os elementos enquadrados do fenômeno são listados e ordenados da maneira em que ocorrem dentro do processo experiencial. O pesquisador indica como cada elemento afeta e se relaciona a cada outro elemento no processo estudado e propõe uma forma de construção do fenômeno em sua totalidade. O objetivo desta etapa é recriar a experiência vivida em termos de seus elementos constituintes analíticos. Ao interpretar as estruturas do fenômeno, o pesquisador lhe dá significado dentro do mundo social. A contextualização traz o fenômeno para os ambientes social e pessoal das pessoas estudadas. A contextualização objetiva mostrar como o mundo da experiência vivida altera e forma o fenômeno estudado, uma vez que as estruturas das experiências serão alteradas e formatadas na medida em que forem vividas, descritas e atribuídas de significados por seus participantes. 6. Considerações Finais Utilizando a perspectiva da interação simbólica de Blumer, aliada à fenomenologia hermenêutica de Heidegger, o interacionismo interpretativo propõe a observação das interações entre indivíduos e a busca da compreensão da construção dos significados individuais a partir da interpretação destas interações. O foco no indivíduo em ação, suas interações e experiências vividas possibilita ao pesquisador uma aproximação do ponto de vista do indivíduo pesquisado. Por mais que seja difícil a apropriação completa do universo simbólico do indivíduo por parte do pesquisador, o interacionismo interpretativo aponta um caminho de aproximação ao mundo do indivíduo e de suas construções de significados. Como propõem Zinkham e Hirscheim (1992), não é difícil perceber a inserção do consumo em um mundo social e as possibilidades que podem surgir do uso de propostas metodológicas alternativas como o interacionismo interpretativo. Uma vez que os atores do mundo do consumo interagem a todo o momento, os significados de produtos passam a ter conformações diferentes a cada instante, de acordo com o que ocorre em volta dos indivíduos. Ao nos aproximarmos dos consumidores podemos buscar condições para entender como estas configurações de siginificados de consumo se originam e se modificam e são reconfiguradas durante as experiências de consumo vividas pelo indivíduo. O interacionismo interpretativo oferece o exame de como experiências problemáticas são organizadas percebidas e construídas pelos indivíduos em interação. Desde a formulação do problema de pesquisa, a proposta de Denzin (1989) já oferece uma oportunidade para a pesquisa acadêmica em marketing. O método pode auxiliar na compreensão da construção de significados de consumo associados a experiências de consumo vividas por consumidores e desta compreensão poderemos entender melhor como os consumidores constroem valores de consumo. Assim, baseado principalmente no processo hermenêutico de Heidegger, Denzin (1989) propõe seis etapas para operacionalização do método. A cada etapa é reforçado o caráter interpretativo desta proposta e a necessidade de o pesquisador se prepara para a condução correta de cada passo. O pesquisador treinado precisa ser capaz de se relacionar como mundo à sua volta de forma crítica e ter em mente que ele próprio é parte da pesquisa. Ao investigar momentos críticos para o consumidor (epifanias) novas compreensões podem surgir para eventos de consumo. Contudo, somente ao perceber sua compreensão antecipada sobre os objetos o pesquisador será capaz de ter consciência sobre seus preconceitos e poderá desvendar o significado mais essencial deste objeto. Esta desconstrução tornará possível que o pesquisador realize observações úteis para as múltiplas visadas sobre o material coletado e dará sentido à (re)construção do objeto dentro de um contexto. A partir de uma conformação de mundo mais complexa e, por conseqüência, de relações de consumo muito mais complexas, o acadêmico de marketing se encontra em 10 posição incômoda: ao mesmo tempo em que encontra soluções para alguns problemas de consumo descobre outros tantos em que não consegue penetrar. O limitado repertório metodológico se reflete em sua produção e no descompasso entre o desenvolvimento da disciplina e os problemas aos quais se depara (HUDSON e OZANNE, 1988; BROWNLIE et al. 1999 , no Brasil CASOTTI, 1998). Ao incorporar novas propostas metodológicas em seu repertório, a pesquisa acadêmica em marketing pode alcançar novos horizontes, tornando-se capaz de gerar um corpo teórico próprio. Isto posto em perspectiva do desenvolvimento de teorias de consumo nacionais próprias ganha ainda mais relevância. Assim, este trabalho buscou apresentar uma perspectiva metodológica, baseada no paradigma interpretativo, que pode ser incorporada ao acervo da pesquisa acadêmica em marketing e pode auxiliar o pesquisador a compreender melhor o mundo do consumo e desenvolver novas teorias. Figura 01: Etapas do Processo Interpretativo Formulação do Problema de Pesquisa Desconstrução Captura Bracketing (Re)Construção Contextualização Fonte: Adaptado de DENZIN, 1989. 7. Referências Bibliográficas ADELMAN, M. Mulheres atletas: re-significação da corporalidade feminina. Estudos Feministas, v. 11, n. 2, pp.445-465, 2003. ANDRADE, S. M. O.; TANAKA, O. Y. Interacionismo interpretativo: uma nova perspectiva teórica para as pesquisas qualitativas. Ensaios e Ciência, v. 5, n.3, pp.55-72, 2001. ARNOULD, S.; FISCHER, E. Hermeneutics and Consumer Research. Journal of Consumer Research, v.21, p. 55-70, 1994. 11 AYROSA, E. A. T.; SAUERBRONN, J. F. R. Uma introdução ao uso de métodos qualitativos de pesquisa em comportamento do consumidor. In: VIEIRA, M. M. F. e ZOUAIN, D. M. Pesquisa Qualitativa em Administração. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2004. BAUDRILLARD, J. A Sociedade de Consumo. Lisboa: Edições 70, 1991. BAUER, M. Fenomenologia: a Filosofia Aplicada à Pesquisa em Administração. In: ASSEMBLÉIA DO CONSELHO LATINO-AMERICANO DE ESCOLAS DE ADMINISTRAÇÃO, 37., Porto Alegre. Anais... Porto Alegre: Cladea, 2002. BELK, R. W. Materialism: trait aspects of living in the material world. Journal of Consumer Research. v.12, pp. 265 - 280, 1985. BENTON JR., R. Work, consumption and the joyless consumer. In: FIRAT, A. F.; DHOLAKIA, N.; BAGOZZI, R. P. Philosofical and Radical Thought in Marketing. Massachussets: Lexington, 1987. BLUMER, H. Symbolic Interactionism: Perspective and Method. Berkeley: University of California Press, 1998. BROWNLIE, D.; SAREN, M.; WENSLEY, R.; WHITTINGTON, R. (eds.) Rethinking Marketing – Towards Critical Marketing Accountings. London: Sage, 1999. BROWN, S. Marketing as multiplex: screening postmodernism. European Journal of Marketing v.28, n.8/9, pp. 27 – 51, 1994. BROWN, S. Postmodern Marketing. London: Thomson Learning, 1999. BURRELL, G. e MORGAN, G. Sociological Paradigms and Organisational Analysis. London: Heinemann, 1982. CARVALHO, J. L. F.; VERGARA, S. A Fenomenologia e a Pesquisa dos Espaços de Serviços. Revista de Administração de Empresas, v. 42, n. 3, p. 78-91, jul./set, 2002. CASOTTI, L. Marketing Moderno e Consumidor Pós-Moderno? . In: ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓSGRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO, 22., 1998, Foz do Iguaçu. Anais... Foz do Iguaçu: Anpad, 1998. CHAUÍ, M. Convite à Filosofia. 12. ed. São Paulo: Ática, 2001. CHUNG, E.; ALAGARATNAM, S. “Teach a thousand stars how not to dance”: a survey of alternative ontologies in marketing research. Qualitative Market Research: An International Journal, v.4 n.4, pp.224-234, 2001. DARTIGUES, A. O Que É Fenomenologia. Rio de Janeiro: Eldorado, 1973. DOUGLAS, M.; ISHERWOOD, B. O Mundo dos Bens: para uma Antropologia do Consumo. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ, 2004. 12 FIRAT, A. F.; DHOLAKIA, N.; BAGOZZI, R. P. Philosofical and Radical Thought in Marketing. New York: Rowman & Littlefield, 1987. FLICK, U. Uma Introdução à Pesquisa Qualitativa. 2ª ed. Porto Alegre: Bookman, 2004. GARFINKEL, H. Studies in Ethnomethodology. Englewood Cliffs, NJ: Prentice-Hall, 1967. GEERTZ, C. A Interpretação das Culturas. Rio de Janeiro: LTC. 1989. GOFFMAN, E. The Presentation of Self in Everyday Life. Edinburgh: University of Edinburgh, 1958. GOULDING, C. Consumer research, interpretive paradigms and methodological ambiguities. European Journal of Marketing, v.33, n. 9/10, p.859-873, 1999. GOULDING, C. Grounded theory methodology and consumer behaviour, procedures, practice and pitfalls. Advances in Consumer Research, v.27, p.261-266, 2000. GOULDING, C. Issues in representing the postmodern consumer. Qualitative Market Research: An International Journal. v. 6, n. 3, pp.152-159, 2003. HIRSCHMAN, E. C. Humanistic inquiry in marketing research: philosophy, method and criteria. Journal of Marketing Research. v. 23, pp.237 – 249, 1986. HOLBROOK. M. B.; HIRSCHMAN, E. C. The experiential aspects of consumption, feelings, and fun. Journal of Consumer Research. v.9, p. 132 -140, 1982. HUDSON, L. A.; OZANNE, J. Alternative ways of seeking knowledge in consumer research. Journal of Consumer Research, v. 14, pp. 508-521, 1988. HUNT, S. D. Modern marketing theory: critical issues in the philosophy of modern marketing science. Cincinnati: South-Western Pub., 1991. LINCOLN, Y. S.; GUBA. Paradigmatic Controversies, Contradictions and Emerging Confluences. In: DENZIN, N. K. & LINCOLN, Y. S. Handbook of qualitative research. 2ª ed. Thousand Oaks: Sage, 2000. MCCRACKEN, G. Culture and consumption: a theoretical account of the structure and movement of the cultural meaning of consumer goods. Journal of the Consumer Research, v.13, n.1, p.71-84, 1986. MERLEAU-PONTY, M. Fenomenologia da Percepção. São Paulo: Martins Fontes, 1999. MOORMAN, C. Marketing as technique: The influence of marketing on the meanings of consumption. In: FIRAT, A. F.; DHOLAKIA, N.; BAGOZZI, R. P. Philosofical and Radical Thought in Marketing. Massachussets: Lexington, 1987. MOUSTAKAS, C. Phenomenological Research Methods. Thousand Oaks: Sage, 1994. 13 SAUERBRONN, J. F. R.; BARROS, D. F. Mulheres emocionadas – perspectives sociais dos antecedentes emocionais e a construção de significados e valores de consumo femininos de esporte. In: XXIX ENCONTRO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO - ENANPAD. (2005: Brasilia). Anais... Rio de Janeiro: ANPAD, 2005. SCHEFF, T. J. Microsociology: Discourse, Emotion and Social Structure. Chicago: The University of Chicago Press, 1990 SCHWANDT, T. A. Three Epistemological Stances for Qualitative Inquiry: Interpretivism, Hermeneutics, And Social Constructionism. In: Norman K. Denzin & Yvonna S. Lincoln. Handbook of Qualitative Research. 2ª ed. Thousand Oaks: Sage, 2000. SHERRY JR, J. F. Postmodern Alternatives: The Interpretive Turn in Consumer Research, in: ROBERTSON T. and KASSARJIAN H. (eds.): Handbook of Consumer Behavior, Englewood Cliffs, NJ: Prentice Hall, 1991 STERN, B. (ed.) Representing Consumers. Routledge Interpretative Marketing Series, Londres: Routledge, 1999. THIRY-CHERQUES, H. R. Programa para aplicação às ciências da gestão de um método de caráter fenomenológico. In: Vieira, M. M. F.; ZOUAIN, D. M. (orgs.). Pesquisa Qualitativa em Administração. Rio de Janeiro: Editora FGV. 2004. THOMPSON, C. J. Interpreting consumers: a hermeneutical framework for deriving marketing insights from the texts of consumption stories. Journal of Marketing Research, v.34, p.438- 455, 1997. VIEIRA, F. G. D. Panorama Acadêmico-Científico e Temáticas de Estudos de Marketing no Brasil. In: XXIV ENCONTRO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO - ENANPAD. (2000: Florianópolis). Anais... Rio de Janeiro: ANPAD, 2000. VIEIRA, F. G. D. Narciso sem Espelho. Revista de Administração de Empresas, vol. 43, n. 1, p. 81-90, 2003. ZINKHAM, G. M.; HIRSCHEIM, R. Truth in marketing theory and research: an alternative perspective. Journal of Marketing, v.56 n.2, pp.80-88, 1992. 14