Formação de professores: demandas do passado e desafios do presente
Anamaria Gonçalves Bueno de Freitas
O convite para organizar este número, que versa sobre a formação docente,
muito me honrou, tendo em vista não só a temática, vinculada às minhas pesquisas
desde a década de 1990, como também a comemoração, neste ano de 2015, dos 180
anos de institucionalização da primeira Escola Normal brasileira, na Província do Rio
de Janeiro, em 04 de abril de 1835.
Ao aceitar a proposta, no entanto, não imaginava o desafio que me colocava, no
sentido de selecionar textos que pudessem contemplar questões relacionadas à formação
de professores, tanto no campo da História da Educação – meu espaço de atuação e, de
certa forma, minha zona de conforto –, quanto de outras ciências e áreas investigativas
que se dedicam a problematizar a questão. A fim de atender ao critério de referir textos
disponíveis on-line, busquei, nos sites de Revistas de Educação 1, artigos que pudessem
inspirar a reflexão e indicar marcos importantes nesses quase dois séculos de demandas,
legislações e normas, iniciativas governamentais, projetos pedagógicos, propostas
inovadoras, tentativas de padronização e controle, entre outras perspectivas relacionadas
com a necessidade formar professores 2.
1
Priorizei as seguintes revistas: Revista Brasileira de Educação (Associação Nacional de Pós-Graduação
e Pesquisa em Educação), Revista Brasileira de História da Educação (Sociedade Brasileira de Educação),
Revista História da Educação (Associação Sul Rio-Grandense de Pesquisadores em História da
Educação), Cadernos de História da Educação (Universidade Federal de Uberlândia), Educação e
Pesquisa (Universidade de São Paulo), Educação & Sociedade (Centro de Estudos Educação e Sociedade
– Universidade Estadual de Campinas), Educação em Questão (Universidade Federal do Rio Grande do
Norte), Revista da FAEEBA (Educação e Contemporaneidade – Revista da Universidade Estadual da
Bahia – UNEB).
2
Sobre as produções do final do século XX, relacionadas com a temática, verificar, por exemplo, André
et. al. (1999).
Pensar a Educação em Revista, Curitiba/Belo Horizonte, v. 1, n. 3, p. 5-19, out-dez/2015
Desde a década de 1980, observa-se que as pesquisas em História da Educação,
no Brasil, diversificaram-se e, por meio do diálogo com a História Cultural, permitiram
a emergência de novas temáticas, bem como de abordagens teóricas e metodológicas
que valorizaram não apenas a legislação e os aspectos macropolíticos e sociais, mas
também agentes, instituições, currículo, disciplinas, dispositivos materiais (arquitetura
escolar, manuais, cadernos, quadros de giz, canetas, tinteiros, etc.), culturas escolares,
práticas, fontes orais, memórias, literatura, entre outros 3. Assim, na busca de melhor
compreensão acerca da História da Profissão Docente, diversos pesquisadores se
dedicaram a investigar os processos formativos, as instituições formadoras, as
disciplinas, as práticas instituídas e instituintes, os critérios de seleção, as avaliações, as
leituras, os estágios, o acesso à carreira docente, as formas de promoção, as associações
docentes, o uso de tecnologias no processo de formação e os desafios da atualidade.
A formação dos professores e as pesquisas em História da Educação
Percebe-se, na década de 1990, o aumento de estudos sobre escolas normais em
diferentes Estados e Municípios do Brasil. Instituições públicas e privadas foram alvos
prioritários de grupos de investigadores que puderam identificar as diversas propostas
formativas vivenciadas no Brasil desde o século XIX. No final dessa década e no início
do século XXI, o estudo sobre os intelectuais da educação (VIEIRA, 2015) recebeu
novos contornos e os investimentos de pesquisa sobre formação vincularam-se de forma
mais direta à atuação docente.
As trajetórias de professores e professoras, os escritos de autoria docente
(memórias, livros didáticos, poesia, prosa), as associações profissionais, os impressos
pedagógicos, os concursos, as formas de seleção e de fiscalização, assim como as lutas e
conquistas da categoria tornaram-se objetos relevantes para a História da Educação.
O processo de criação das escolas normais brasileiras, iniciado nas décadas de
1830 e 1840 do século XIX 4, teve um caráter de consolidação mais evidente a partir de
1890 e das primeiras décadas do século XX. A importação de materiais didáticos para
laboratórios de ciências naturais e de carteiras escolares, a tradução e a produção de
3
Sobre as produções no campo da história da educação, consultar, entre outros: Vidal e Faria Filho
(2003), Catani e Faria Filho (2002), Bastos (2006), Galvão et. al. (2008), Carvalho et. al. (2011).
4
Sobre o trabalho docente no século XIX e a implantação das escolas normais no Brasil, verificar, entre
outros: Schueler (2004; 2005), Soares (2004), Villela (2005), Lopes e Martinez (2007), Araújo et. al.
(2008), Chaves e Lopes (2009), Werle (2010), Barra (2011).
6
Pensar a Educação em Revista, Curitiba/Belo Horizonte, v. 1, n. 3, p. 5-19, out-dez/2015
manuais de formação para os professores, a monumentalidade arquitetônica das escolas
normais e o requinte dos rituais de formatura 5 noticiados pela grande imprensa e pela
imprensa pedagógica são alguns dos indícios da produção de novas exigências para o
exercício do magistério.
A intensificação da urbanização e a industrialização, principalmente nas capitais,
a organização das Diretorias de Instrução Pública e a implantação dos Serviços de
Inspeção Escolar, a ampliação do acesso ao ensino primário, o movimento da Escola
Nova, a difusão do higienismo associado às práticas educativas favoreceram a produção
de reformas educacionais em diferentes Estados, que se preocuparam em modernizar e
racionalizar a formação e o trabalho docente, nas primeiras décadas republicanas,.
A implantação das escolas graduadas tem uma relação importante com
a
consolidação das escolas normais no início do século XX, assim como a difusão do
ensino ativo e da racionalidade pedagógica, a complexidade do cotidiano escolar, a
necessidade de fixação de regras e normas de comportamento e convivência, a difusão
de valores (tais como higiene, família, pátria, trabalho), como podem ser percebidos nos
estudos realizados por Diana Gonçalves Vidal (2006), Rosa Fátima de Souza (2009),
Maria Elisbeth Blanck Miguel, Diana Gonçalves Vidal e José Carlos de Souza Araújo
(2010), Eliane Peres (2010), Heloísa Helena Pimenta Rocha (2010), José Gonçalves
Gondra e Aline de Morais Limeira (2012).
O processo de feminização do magistério primário, iniciado na segunda metade
do século XIX e permanente até a atualidade, também foi objeto de investigação de
diferentes pesquisadores, assim como a análise das memórias docentes. Dentre os
estudos que abordam essa temática, identificam-se: Denice Barbara Catani, Belmira
Oliveira Bueno, Cynhtia Pereira de Sousa e Maria Cecilia C. Campos Souza (1997);
Eliane Marta Teixeira Lopes (2003); Maria Christina Siqueira de Souza Campos e Vera
Lúcia Gaspar da Silva (2002); Ana Chrystina V. Mignot e Maria Teresa Santos Cunha
(2003); Elizeu Clementino de Souza e Ana Chrystina V. Mignot (2008), Vera Lucia
Gaspar da Silva e Dilce Schueroff (2010) e Charliton José dos Santos Machado e Maria
Lúcia da Silva Nunes (2011).
O currículo de formação, as instituições formadoras, erigidas de forma
diferenciada em cada um dos estados brasileiros e as múltiplas configurações da
5
Sobre os rituais de formatura e as vivências das normalistas, verificar, entre outros: Cunha (2002a;
2002b) e Freitas (2003).
7
Pensar a Educação em Revista, Curitiba/Belo Horizonte, v. 1, n. 3, p. 5-19, out-dez/2015
profissão docente se fazem presentes, para mencionar apenas algumas publicações, em
duas coletâneas: uma, organizada por José Carlos Souza Araújo, Antônio de Pádua
Carvalho Lopes e Anamaria Gonçalves Bueno de Freitas (2008), que se dedicou a
investigar a criação e a implementação das escolas normais brasileiras do Império à
República; e outra, que foi publicada por Elomar Tambara e Berenice Corsetti (2008),
dedicada às escolas normais no Rio Grande do Sul.
Denice Barbara Catani (2003), Paula Perin Vicentini e Rosário Genta Lugli
(2010) têm oferecido contribuições significativas para problematizar a profissão docente
e os processos de associativismo onde as celebrações e rituais comemorativos 6 são
produzidos e produzem o campo educacional, demarcando espaços de legitimação e
resistência. As relações entre a formação e a atuação dos professores no Brasil e em
Portugal também sido um tema explorado por alguns estudiosos, que, em sua produção,
evidenciam diálogos e intercâmbios férteis entre os dois países 7.
Passado e presente na formação docente
No século XIX, a preocupação com a sistematização da formação docente no
ensino público brasileiro tem um marco significativo com a Lei de 15 de outubro de
1827, que determinava a criação de escolas de primeiras letras em povoados, vilas e
cidades. Além de estabelecer o uso do método mútuo e o currículo diferenciado para
meninos e meninas, essa lei recomendava que os professores que não dominavam tal
método deveriam se preparar às próprias custas 8.
A partir da implantação das escolas normais, inicialmente, nas capitais de cada
uma das províncias e, depois, em cidades do interior, o processo de formação docente
ganha novos contornos, e esse modelo tem uma vigência temporal de mais de um
século. A Lei Orgânica do Ensino Normal (1946) reforça a existência das escolas
normais, diversifica-as com cursos específicos para a zona rural (escolas normais rurais)
6
Sobre as associações docentes e as comemorações do dia do professor, verificar: Catani (2003);
Vicentini (2004); Leon (2011).
7
Sobre a formação e atuação docente no Brasil e em Portugal, consultar, entre outros: Silva (2004),
Cardoso (2014); Dossiê publicado na Revista Brasileira de História da Educação (set./dez, 2007) e
organizado por Ana Waleska Pollo Mendonça e Jorge M. Nunes Ramos do Ó (2007), Dossiê publicado
na Revista Sísifo – Universidade de Lisboa, organizado por Ana Waleska Pollo Mendonça (2010).
8
Para mais informações sobre a lei de outubro de 1827 e a implantação do método mútuo, consultar:
Faria Filho e Vidal (2000), Bastos (2005).
8
Pensar a Educação em Revista, Curitiba/Belo Horizonte, v. 1, n. 3, p. 5-19, out-dez/2015
e cria os Institutos de Educação, que, além do curso normal, deveriam também oferecer
formação superior e continuada aos professores primários.
A formação dos professores se divide nas primeiras décadas do século XX: os
docentes do ensino secundário deveriam procurar as Faculdades de Filosofia, Ciências e
Letras, que começavam a ser estabelecidas, durante as décadas de 1930 e 1940, na
maioria dos estados brasileiros. Aos poucos, alguns Institutos de Educação passam a ser
incorporados às instituições de ensino superior e se transformam em Faculdades de
Educação, em sua grande maioria, nas décadas de 1950 e 1960. Nestas, o Instituto
Nacional de Estudos Pedagógicos também visava a uma Política Nacional de Formação
Docente, que, inclusive, tinha uma vinculação com cada uma das regiões brasileiras e
suas especificidades sociais e culturais. Com a Ditadura Militar e a Lei 5.692/71, que
reformou o ensino de 1º e 2º graus, a formação docente deixou de ter lugar nas escolas
normais e nos Institutos de Educação, transformando-se em uma Habilitação Específica
para o Magistério.
No final da década de 1980, foi instaurado um movimento de revitalização das
escolas normais em alguns estados brasileiros, o que fez com que a década seguinte
servisse de palco para a instalação dos Centros de Formação e Aperfeiçoamento do
Magistério (CEFAM´s). Estes ofereciam formação em tempo integral, com bolsas para
os alunos que, em um turno, assistiam a aulas teóricas e, em outro, eram acompanhados
na prática. Essa dicotomia, que dividiu os professores da educação infantil e do ensino
fundamental entre uma formação para a docência, obtida no ensino secundário, e a
formação universitária, atravessou o século XX.
As Faculdades de Educação e os cursos de Pedagogia se multiplicaram na
segunda metade do referido século. Entretanto, as demandas defendidas pelo Manifesto
dos Pioneiros da Educação Nova (1932), que advogavam não apenas pela formação
superior para os professores, mas também por outras garantias, ainda estão apenas na
“letra da lei”. Penso que vale a pena relembrar os ideais daqueles que nos antecederam:
Todos os professores, de todos os graus, cuja preparação geral se adquirirá
nos estabelecimentos de ensino secundário, devem, no entanto, formar seu
espírito pedagógico, conjuntamente, nos cursos universitários, em faculdades
ou escolas normais, elevadas ao nível superior e incorporadas às
universidades. A tradição das hierarquias docentes, baseadas na diferenciação
dos graus de ensino, e que a linguagem fixou em denominações diferentes
(mestre, professor e catedrático), é inteiramente contrária ao princípio da
unidade da função educacional, que, aplicada às funções docentes, importa na
incorporação dos estudos do magistério às universidades, e, portanto, na
9
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libertação espiritual e econômica do professor, mediante uma formação e
remuneração equivalentes que lhe permitam manter, com a eficiência no
trabalho, a dignidade e o prestígio indispensáveis aos educadores (O
Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova (1932), 1984, p.418. Grifos da
autora).
Dignidade, prestígio, remuneração adequada e eficiência são elementos que
fazem parte do desejo de todos aqueles e aquelas que se preparam, hoje, para o
exercício docente, bem como daqueles e daquelas que estão no cotidiano das
instituições de ensino. A Constituição Federal de 1988 e a Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional de 1996 (Lei 9.394/96) estabelecem os princípios defendidos pelo
Manifesto dos Pioneiros, mas, na prática, o que temos assistido na mídia e temos
presenciado em relação ao modo como os gestores federais, estaduais e municipais
tratam os professores muito se distancia da realidade proposta.
A formação dos professores, no Brasil, além dos saberes especializados, do
conhecimento das ciências da educação, das práticas formativas e do estudo da
organização do trabalho pedagógico, precisa de lições de esperança e de engajamento. O
atual Plano Nacional de Educação (Lei 13.005/2014), recentemente aprovado,
estabelece:
Meta 15: garantir, em regime de colaboração entre a União, os Estados, o
Distrito Federal e os Municípios, no prazo de 1 (um) ano de vigência deste
PNE, política nacional de formação dos profissionais da educação de que
tratam os incisos I, II e III do caput do art. 61 da Lei no 9.394, de 20 de
dezembro de 1996, assegurado que todos os professores e as professoras da
educação básica possuam formação específica de nível superior, obtida em
curso de licenciatura na área de conhecimento em que atuam.
Meta 16: formar, em nível de pós-graduação, 50% (cinquenta por cento) dos
professores da educação básica, até o último ano de vigência deste PNE, e
garantir a todos (as) os (as) profissionais da educação básica formação
continuada em sua área de atuação, considerando as necessidades, demandas
e contextualizações dos sistemas de ensino.
Meta 17: valorizar os (as) profissionais do magistério das redes públicas de
educação básica de forma a equiparar seu rendimento médio ao dos (as)
demais profissionais com escolaridade equivalente, até o final do sexto ano
de vigência deste PNE.
Meta 18: assegurar, no prazo de 2 (dois) anos, a existência de planos de
Carreira para os (as) profissionais da educação básica e superior pública de
todos os sistemas de ensino e, para o plano de Carreira dos (as) profissionais
da educação básica pública, tomar como referência o piso salarial nacional
profissional, definido em lei federal, nos termos do inciso VIII do art. 206 da
Constituição Federal (Lei 13.005/2014).
Formação adequada, plano de carreira, incentivo para a formação continuada e
titulação acadêmica, além de remuneração digna são metas a serem alcançadas,
10
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juntamente com respeito, consideração e dignidade. No entanto, não apenas no Brasil,
mas em outros países, a questão da formação docente na atualidade 9 tem sido
problematizada, tendo em vista a diminuição da procura pela carreira, em alguns casos,
acrescida de outros desafios, tais como aqueles trazidos pela introdução das novas
tecnologias nas salas de aula, pela exigência de novos parâmetros para a relação
professor(a)-aluno(a), pelas novas formas de organização do trabalho pedagógico, pelos
processos de inclusão, pela violência escolar ou, ainda, pelas expectativas em relação ao
exercício da profissão.
Textos selecionados
Infelizmente, apenas dez artigos puderam ser selecionados, tal como solicitado.
No entanto, procurei indicar, nas referências, outras possibilidades de aprofundamento
da temática, tendo em vista a diversidade de possibilidades de reflexões e
problematizações sobre a formação docente. Tomei como base para a organização dos
textos o critério cronológico e a pretensão de indicar pesquisas com fontes documentais
diferenciadas, com objetos de investigação construídos em contextos históricos e
geográficos específicos, que pudessem favorecer o diálogo entre o local, o regional e o
nacional.
O primeiro estudo, de autoria de Leonor Maria Tanuri, “História da formação de
professores”, permite-nos um olhar panorâmico sobre a temática desde o século XIX até
a década de 1990. As legislações, as reformas, os diversos projetos desenvolvidos no
Brasil para formar os professores em diferentes momentos nacionais são analisados de
forma instigante.
Heloísa de O. S. Villela (2004), em “Do “saber fazer” a profissionalização
docente na Escola Normal na Província do Rio de Janeiro” revela o processo de
profissionalização docente na província do Rio de Janeiro no século XIX, percebendo
os elementos da institucionalização do “saber docente” e as disputas entre os
diplomados na Escola Normal e os outros mestres.
9
Sobre a formação e atuação dos professores brasileiros na atualidade, consultar, entre outros: Gatti e
Barretto (2009). Sobre o diálogo entre as propostas de formação docente e o Brasil, verificar: Lüdke et. al.
(1999) e Dossiê organizado pela Revista Educação em Foco (Juiz de Fora) sobre formação de Professores
e Políticas Educacionais na América Latina e Caribe (set. 2007/fev. 2008).
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Maria Cristina Gouveia (2001) também toma o século XIX como recorte
temporal para sua pesquisa, “Mestre: profissão professor(a)”. Seu olhar recai sobre a
província de Minas Gerais e a transformação lenta e gradual do ofício de ensinar em
profissão. Naquele contexto, evidencia-se a expectativa do Governo de que o
profissional formado pudesse ser um agente na difusão de práticas de civilidade, porém,
para tanto, o controle da vida privada e pública dos docentes ganhou novos
instrumentos e dimensões.
Em “A Educação como sacerdócio”, Felipe Tavares de Moraes e Rafaela Paiva
Costa (2014) dedicam-se a compreender o processo de formação docente, no Pará, no
período Republicano. A reforma na escola normal e as prescrições do impresso
pedagógico “A Escola”, analisadas pelos referidos autores, indicaram as novas
características esperadas dos professores formados.
O processo de educação pelo rádio e as escolas normais rurais do Rio Grande do
Sul, no período de 1940 a 1960, são investigados por Flávia Obino Corrêa Werle
(2010), no artigo “O rádio e a educação rural no Rio Grande do Sul (1940-1960)”. O
contexto do Governo Vargas e as perspectivas da radiodifusão educativa são analisadas
com base na indicação das dinâmicas construídas entre a formação de professores e o
ruralismo.
As ações do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos e do Ministério da
Educação em relação à formação docente, nas décadas de 1950 e 1960, foram
evidenciadas por Ana Waleska Pollo Campos Mendonça (2008), que destacou, no texto
“Formar o “magistério nacional”’, a gestão de Anísio Teixeira e seu empenho na
qualificação docente.
Em “Histórias de vida e autobiografias na formação de professores e profissão
docente (Brasil, 1985-2003)”, temos um mapeamento extenso da produção de estudos, a
partir de registros de histórias de vida de professores, que tratam da questão da
formação, atuação e identidade profissional. Belmira Oliveira Bueno, Helena Coharik
Chamlian, Cynthia Pereira de Sousa e Denice Barbara Catani (2006) indicam, nesse
estudo, a importância da abordagem biográfica na elucidação de elementos
significativos da História da Profissão Docente.
Helena Costa Lopes Freitas (1999), em “A reforma do Ensino Superior no
campo da formação dos profissionais da educação básica: As políticas educacionais e o
movimento dos educadores” dedica-se a evidenciar o cenário das políticas de formação
12
Pensar a Educação em Revista, Curitiba/Belo Horizonte, v. 1, n. 3, p. 5-19, out-dez/2015
docente nas décadas de 1980 e 1990, a partir das reformas do ensino superior
estabelecidas pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional Lei 9.394/96.
O Curso de Pedagogia e a formação dos profissionais da educação foram
abordados, em artigo que leva o mesmo título, por Leda Scheibe e Márcia Ângela
Aguiar. As autoras retomam aspectos históricos da criação do Curso de Pedagogia e as
perspectivas frente ao contexto político e legislativo do final do século XX.
Para finalizar, Libânia Nacif Xavier (2014) demonstra o esforço de reflexão
produzido nos últimos trinta anos em torno da pesquisa sobre “A construção social e
histórica da profissão docente”, dialogando com autores nacionais e internacionais. No
final do seu estudo, Xavier (2014) enfatiza a urgente necessidade de repensar o papel da
escola e do trabalho docente:
1) a importância de reconhecer que a escola e o professor são construções
históricas e que, portanto, nem sempre foram vistos ou se fizeram perceber da
forma como são vistos hoje em dia; 2) a percepção de que a escola é
responsável pela permanente criação de um público, ou seja, pela
socialização dos indivíduos, que, cada vez mais, dependem da experiência
escolar e, portanto, da intervenção do professor para se tornarem pessoas
capazes de se inserir e de conviver em sociedade; 3) a constatação de que,
nos dias atuais, a escola e o professor estão assumindo uma importância cada
vez maior e, ao mesmo tempo, tendem a se tornar alvo de críticas que
extrapolam os limites de seu preparo profissional e de suas condições de
trabalho, sendo, frequente e injustamente, responsabilizados pelos insucessos
escolares (XAVIER, 2014, p. 845).
Estudar a formação de professores no passado e no presente tem gerado
reflexões significativas, revelando o aprofundamento teórico e metodológico das
análises, a busca por fontes diferenciadas e a elucidação de contextos ainda
desconhecidos. Todavia, a dimensão social e histórica do exercício docente não pode ser
apagada, como ressalta o estudo de Xavier (2014). A visibilidade na imprensa – no
passado, nos jornais impressos e, no presente, nas redes sociais e nas diferentes mídias –
, bem como a crítica à formação e ao trabalho docente precisam ser relativizadas e
contextualizadas, pois os professores e professoras são sujeitos do seu tempo, com
ideais e limitações, agentes formados para responder ao seu contexto, mas também
transformados pelo cotidiano das práticas de ensinar.
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