O PERCURSO HISTÓRICO DO SERVIÇO SOCIAL
Amanda dos Santos de Andrade*
Eliana Delphino*
Juliana Sandy*
Michele Karina Franco*
Valéria Natalina de Aguiar*
Marisa Souza**
Resumo: O objetivo deste artigo é refletir sobre o surgimento do Serviço Social, desde a
emergência da profissão na sociedade como uma especialização do trabalho coletivo que se
desenvolve a partir do processo de industrialização no Brasil em meados dos anos 30 até a
contemporaneidade. Busca uma reflexão sobre momentos importantes da profissão, desde seu
surgimento no seio da Igreja Católica, passando pela influência Europeia e Norte Americana,
perpassando o processo de superação dos preceitos cristãos com a introdução do pensamento
marxista, considerando o desafio contínuo de sua história, na tentativa de romper com o
conservadorismo e a herança das correntes de pensamento positivistas e tecnicistas.
Palavra-Chave: Serviço Social, história e exercício profissional.
“Tanto hoje como sempre: somos quase tentados a dizer “hoje mais
que nunca”. E mais, a maior parte da ação humana consciente,
baseada em aprendizado, memória e experiência, constitui um vasto
mecanismo para comparar constantemente passado, presente e
futuro. As pessoas não podem evitar a tentativa de antever o futuro
mediante alguma forma de leitura do passado.”
Eric Hobsbawn
INTRODUÇÃO
O presente artigo trata-se de um trabalho acadêmico, tendo como objetivo a análise do
desenvolvimento histórico do Serviço Social, que surge com o fortalecimento do sistema
capitalista, inserido no modo de produção, permeando as relações sociais, e que hoje pautado
na teoria social crítica de Marx, continua em movimento na tentativa de dar respostas as
mazelas da sociedade. Iniciamos tratando do surgimento da profissão nas décadas de 30/40,
dentro da arena das Igrejas Católicas, passando pela introdução de correntes filosóficas que
fizeram parte do processo de amadurecimento da profissão, seguindo no percurso das
transformações societárias em conjunto com as mudanças políticas, econômicas, sociais e
*
Dicentes do 5° Semestre do Curso de Serviço Social do Centro Universitário Nossa Senhora do Patrocínio.
Profª da disciplina Núcleos de Estudos Temáticos I.
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culturais da sociedade, na busca constante da ruptura com o pensamento conservador,
pensamento esse que dificultam o amadurecimento da profissão. Finalmente analisamos os
desafios da contemporaneidade em manter a base teórica metodológica capaz de oferecer
suporte na construção e defesa do projeto-ético-político na busca de uma práxis profissional
hegemônica.
1. O SURGIMENTO DO SERVIÇO SOCIAL NO BRASIL
O Serviço Social surge no Brasil na década 40 com forte influência Europeia e
tradições Cristãs, a profissão tem no seu bojo histórico essa ligação com as doutrinas e
apostolados da Igreja Católica, e foi nesse contexto que o Serviço Social brasileiro
fundamentou e formulou seus primeiros objetivos, balizados num pensamento dogmático e
conservador.
Os pensamentos que dominavam o Serviço Social naquele período tinham fonte na
Doutrina Social da Igreja, no tomismo e neotomismo – “no ideário franco-belga de ação
social e no pensamento de São Tomás de Aquino (séc. XII)” (YAZBEK, 2009, p 146).
No início da profissionalização o Serviço Social se valia da filantropia existente para
dar suporte, era uma profissão formada apenas por mulheres, ligadas de alguma maneira à
Igreja Católica. No aspecto conceitual o homem era visto como único culpado pela situação
de pobreza que se encontrava, buscava-se por meio do trabalho profissional a superação das
dificuldades materiais, tendo como objetivo atingir a perfectibilidade, não havia a
preocupação de analisar a sociedade e as relações dos homens, as questões eram tratadas no
contexto da moralidade, na busca do ajustamento do homem conforme preceitos das doutrinas
da Igreja.
No inicio da década de 30, acelera a mobilização da igreja através de movimentos
católicos, que se configurava como uma instituição social de caráter religioso, no qual o
Serviço Social se apresentava como um departamento especializado da ação social. Inicia-se a
reformulação das suas atividades política religiosa, com intuito de recuperar os privilégios e
prerrogativas perdidas com o fim do império1. Com a mobilização do proletariado,
aumentava-se a intensidade dos movimentos reivindicatórios, a igreja era chamada novamente
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Com o fim do império a laicização do Estado começa o processo de separação entre a igreja e o estado.
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a intervir na dinâmica social, na reabertura de espaços para a recuperação de seus privilégios,
passando assim a definir e legitimar suas posições na sociedade.
Naquele período, a igreja e o Estado se unem para resguardar e consolidar a ordem e
a disciplina social, ficando a cargo da Igreja Católica a tarefa de harmonizar as classes em
conflito na tentativa de manter o controle sobre o proletariado. A igreja também tinha o papel
de ordenar as relações de produção, a partir de costumes cristãos, exigindo da classe burguesa
o comunitarismo, criando movimentos católicos e ações integralistas, se tornando desta forma
a porta voz do povo. “Os relatos existentes sobre as tarefas desenvolvidas pelos primeiros
Assistentes Sociais demonstraram uma atuação doutrinaria e eminentemente assistencial.”
(IAMAMOTO, 2011, p.200).
As profissionais tinham o objetivo de promover a adaptação e a transformação desses
grupos na sociedade, pois o que se enxergava, era a necessidade de intervir na formação
moral, intelectual e social das famílias. As condições de moradia, as precariedades das
condições sanitárias eram consideradas problemas de desajustamento do lar, numa tentativa
de reformar o homem, de ajustá-lo e reeducá-lo. A visão sobre o mundo dos profissionais
pioneiros de Serviço Social recebia a influência europeia, o discurso desses pioneiros
demonstrava que os agentes envolvidos na missão de apostolado legitimavam a forma
paternalista e autoritária de sua intervenção.
Passado à primeira fase das grandes mobilizações do movimento laico, quando a
igreja já reconquistava privilégios, as organizações que formam o bloco católico perderam seu
dinamismo inicial, passando a ter um novo tipo de demanda. Os novos alunos que se
formavam eram em sua maioria funcionários de grandes instituições sociais, as Assistentes
Sociais deviam ser pessoas dotadas de varias qualidades, ter amor ao próximo, ter um
sentimento pela situação penosa de seus irmãos, pela injustiça social, pela miséria, ter
simpatia era critério, além de senso prático, saber influenciar e convencer.
As primeiras escolas de Serviço Social apresentavam alguns critérios para
matricular-se no curso:
 Estar na faixa etária entre 18 e 40 anos.
 Comprovação de conclusão do curso secundário.
 Apresentação de referencias de 3 pessoas idôneas.
 Submeter-se a exame médico.
 Ter boa saúde, ausência de defeitos físicos.
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 Ter um bom convívio em sociedade
A formação dos(as) Assistentes Sociais se pautava em quatro aspectos fundamentais:
cientifico, técnico, moral e doutrinário, os aspectos científicos e técnicos possuíam extrema
carência de objetividade, já a formação moral e doutrinaria se apresentavam essenciais, pois
na falta de uma formação moral com base nos princípios cristãos a ação seria falha, era
necessário se preparar para reeducar as classes subalternas.
A situação de vulnerabilidade vivida pelos proletários era vista como uma patologia,
uma deformidade na sua formação moral, era dessa maneira que se dava o julgamento,
sobrepondo as reais causas da miséria, “[...] ao pretender atuar sobre a questão social, negarão
as transformações econômicas, e sociais, isto é, a ação sobre as causas materiais da questão
social para atuar sobre os efeitos” (IAMAMOTO, 2011, p.245). Assim nesse contexto, a ação
dos(as) Assistentes Sociais passa a ser uma ação ideológica, com o objetivo de fazer o
ajustamento sem levar em conta as bases materiais e a correlação de forças existentes na
sociedade.
Na sequência histórica, o Serviço Social na década de 50 entra em contato com o
modelo americano de formação, introduzindo na sua construção o pensamento conservador e
positivista, ainda longe da ideologia libertária marxista, como nos mostra a autora abaixo:
É, pois, na relação com a Igreja Católica que o Serviço Social
brasileiro vai fundamentar a formulação de seus primeiros objetivos
político/sociais orientando-se por posicionamentos de cunho
humanista conservador contrários aos ideários liberal e marxista na
busca de recuperação da hegemonia do pensamento social da Igreja
face à “questão social”. (YAZBEK, 2009, p. 146)
A partir da década de 50, o Serviço Social brasileiro começa a repensar suas funções
ao adotar um modelo de cunho conservador, de um país onde o capitalismo se fortalecia.
Assim, o Serviço Social passa a inserir em seu discurso humanista cristão, conceitos técnicocientíficos, inspirados na teoria social positivista, reiterando o pensamento conservador na
profissão. A autora explica que “nem o doutrinarismo, nem o conservadorismo constituem
teorias sociais” (p.146)
Serviço Social, baseada na matriz positivista é analisada pelo seu caráter
manipulador e instrumental. Estabelece mudanças apenas dentro da ordem, mas sua
intencionalidade visa manter a manipulação e expansão do capitalismo, burocratizando e
tecnificando a profissão. Dessa forma a profissão se vê diante da necessidade de intensificar
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seus conhecimentos e buscar uma nova reorientação profissional, a fim de acompanhar o
desenvolvimento do sistema que começava a implementar políticas no campo social.
A essa prática de matriz positivista, para maior compreensão, passamos a palavra
para MARTINELLI (2010) quando apresenta que o exercício profissional naquela época:
Além de levar a produção de práticas esvaziadas de realidade política
e social, distanciadas das demandas da classe trabalhadora, acaba por
gerar uma des-solidarização da própria categoria profissional, entre si
e com as demais categorias. (p.131)
Essas insatisfações fazem com que a partir dos anos 60, esse referencial fosse
questionado no contexto de mudanças econômicas, políticas, sociais e culturais. A profissão
insatisfeita com sua atuação começava a rever suas práticas, e dentro de um movimento global
surgiu a necessidade de uma renovação dentro da profissão. “A ausência de identidade
profissional, de projeto profissional específico, produzia uma grande fragilidade em termos de
consciência política, de consciência social.” (MARTINELLI, 2010 p.131)
É no bojo destes questionamentos que são impostos aos Assistentes Sociais latinoamericanos a construção de um novo projeto profissional, comprometido com as demandas
dos subalternizados. Este projeto configura-se com o marxismo, e tem sua revisão em níveis
teórico, metodológico, operativo e político, que em tese, configura-se na matriz teórica social
de Marx.
Nas décadas de 1964 a 1985, o Brasil enfrentou um longo período ditatorial que se
instaurou no país, as Ciências Sociais em muitos países latino-americanos que atravessaram
períodos de ditaduras, passaram por um momento de longo silêncio em suas produções
teóricas. O Serviço Social brasileiro se vale desse recuo para repensar os objetivos da
profissão e se aprofundar na teoria social crítica marxista, conforme retrata YAZBEK (2009):
Sem dúvida, as ditaduras que tiveram vigência no continente deixaram
suas marcas nas ciências sociais e na profissão, depois de avançar em
uma produção crítica nos anos 60/70 (nos países onde isso foi
permitido) é obrigada a longo silêncio. ( p.148-149)
É no chamado Movimento de Reconceituação da profissão que se fundamenta o
exercício e os posicionamentos teóricos do Serviço Social, tendo sua análise nas seguintes
vertentes:
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 A vertente modernizadora norteada pela busca da produção de conhecimento e
intervenção profissional. É voltada para uma modernização conservadora e na
perspectiva de integração da sociedade, alcançados numa construção tecnocrática e
relações interpessoais.
 A vertente fenomenológica que prioriza as concepções de pessoa e comunidade,
diálogo e transformação social dos sujeitos, para NETTO (apud YAZBEK, 2009
p.149) “é analisada como uma forma de reatualização do conservadorismo presente no
pensamento inicial da profissão.”
 A vertente marxista que foi a aproximação com o marxismo, da consciência e
sociedade de classes, porém sem o se aprofundar na essência ao pensamento de Marx.
2. OS DESAFIOS DO SERVIÇO SOCIAL CONTEMPORÂNEO
A adesão à vertente marxista não se deu de forma fácil, porém o Serviço Social se
posicionou na obtenção de seus objetivos, e do ponto de vista sócio político continuou a
questionar sua prática. Mesmo partindo de um marxismo “vulgar”, reducionista, com
influência cientificista, foi a partir dessa aproximação que o Serviço Social começa a
questionar sua prática institucional e objetivos, aproximando-se dos movimentos sociais e
dando início assim, a uma vertente comprometida com a ruptura do Serviço Social
tradicional.2
Nessa seqüencia, no início dos anos 80, a teoria social de Marx é introduzida na
formação profissional. Nessa mesma época, o Serviço Social apropria-se de vários pensadores
que permeiam as produções teóricas e as reflexões dos profissionais da tradição marxista.
É com IAMAMOTO (1982) que o marxismo se introduz de maneira mais aprofundada
no Serviço Social, contribuindo para revisão de práticas conservadoras arraigadas na
profissão, passando a incorporar uma teoria mais crítica, trazendo um olhar do homem como
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Conhecido como o Movimento de Reconceituação já explicado por José Paulo Netto, inserido num processo de
intenção de ruptura com o Serviço Social conservador e dogmático. “Este momento, [...] atesta a plena cidadania
da perspectiva da intenção de ruptura no cenário do Serviço Social no Brasil. Abrindo-se por volta de 19821983, favorecido pela conjuntura da transição democrática, ele assinala a inserção e o protagonismo das posições
vinculadas à perspectiva de que nos ocupamos em toda as instâncias da vida profissional [...] Numa palavra: a
partir de meados dos anos oitenta, patenteia-se que a perspectiva da intenção de ruptura não é apenas um vetor
legítimo do processo de renovação do Serviço Social no Brasil – evidencia-se o seu potencial criativo, instigante
e, sobretudo, produtivo” (NETTO, 2010 p. 267).
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integrante da sociedade e suas relações articuladas com a totalidade, essa nova visão passa a
contribuir para uma análise mais crítica e profunda do contraditório que permeia as relações
dentro do sistema capitalista.
É no âmbito da adoção do marxismo como referência analítica, que se
torna hegemônica no Serviço Social no país, a abordagem da profissão
como componente da organização da sociedade inserida da dinâmica
das relações sociais participando do processo de reprodução dessas
relações. (IAMAMOTO apud YAZBEK, 2009 p.151)
Naquele momento, o Serviço Social se encontrava num significativo processo
de amadurecimento teórico, produções importantíssimas vieram contribuir para um novo
olhar da profissão, para um novo traduzir da sociedade a partir do pensamento marxista,
tornando assim, a profissão mais hegemônica em sua base teórica social e crítica. Houve
também a influência de outros importantes pensadores, que contribuiram com a pluralidade de
conhecimento na profissão, como Gramsci, Lukács, Eric Hobsbawn, E.P.Thompson, Agnes
Heller, “e tantos outros cujos pensamentos começam a permear nossas produções teóricas,
nossas reflexões e posicionamentos ideopolíticos”. (YAZBEK, 2009 p.151).
Impulsionado a partir da década de 70, o Serviço Social avançou em suas produções
teóricas, grandes contribuições advindas de artigos, teses de doutorados, encontros, debates,
congressos, vieram fomentar a produção contínua e pesquisas nas mais variadas questões da
sociedade, desvelando seu caminhar histórico social, econômico, político e cultural, além da
relação homem - Estado - sociedade. E cabe salientar que essa maturação presente no Serviço
Social dos anos 80 para os 90, não significou o rompimento total com o conservadorismo
tradicional da profissão (NETTO, 2010).
Ainda que o pensamento conservador esteja presente até os dias atuais - posto que a
ruptura com o conservadorismo não se deu por completa - a herança conservadora ainda
permanece no Serviço Social e ganhou maturidade em suas atuações. Isso ganha visibilidade
na sociedade brasileira, visto que o Assistente Social intervém através de seus organismos
representativos em vários processos.
Os anos 80 e 90 foram marcados pela construção de um projeto profissional que se
deu como processo de ruptura, tendo sua direção sócio-política entendida na conjuntura do
país a partir dos acontecimentos ocorridos como: as lutas sociais nos anos 80 e a
implementação do neoliberalismo. Essa direção sócio-política dirige-se ao enfrentamento da
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ofensiva do capital, na luta pela emancipação humana dentro do contexto de hegemonia do
grande capital.
É nesse contexto histórico, pós Constituição de 1988 que os
profissionais de serviço social, iniciam o processo de ultrapassagem
de condição de executores de políticas sociais, para assumir posições
de planejamento e gestão dessas políticas (YAZBEK . 2009 p.153).
Nesse período (1990), o Brasil adentra num momento de forte pressão, entre acordos
políticos/econômicos internacionais, instalação do neoliberalismo no país, aumento da
miséria, privatizações, “erosão do sistema público de proteção social” (YAZBEK , 2009
p.153) e é assim nesse contexto que o Brasil institui seu sistema de seguridade social.
O sistema neoliberal instalado, veio dificultar a efetivação dos direitos e acesso aos
bens públicos conquistados através da Constituição Federal de 1988, ideologicamente
difundida como “constituição cidadã”, na qual acordos pautados em interesses internacionais
diminuíram o cuidado com o social no Brasil.
É na conjuntura das privatizações, sucateamento dos espaços públicos, corte de
repasses, fragmentação das políticas sociais, miséria e desigualdade crescente no país, que
surge um novo momento para o Serviço Social, profissão atuante entre as relações de
dominantes e dominados, governantes e governados, que se vê desafiado a buscar a tal
democracia, garantir o acesso à cidadania e efetivação de direitos aos cidadãos necessitados e
excluídos.
Em pleno processo contínuo de acumulação e fortalecimento do capital, o Serviço
Social nos anos 90, adentra-se num momento de enfraquecimento das políticas sociais, que se
encontram estas subordinadas ao sistema econômico. A profissão depara-se com políticas
seletivas e excludentes, vivendo desta forma a refilantropização e o apelo da solidariedade à
sociedade civil, despolitização e enfraquecimento dos movimentos sociais, e tudo isso se
torna desafios para o Assistente social, que se vê inserido numa lógica mercantilizada de vida.
A profissão nesse momento busca fortalecer sua base teórica, produzindo
continuamente grande material acadêmico, com importantes contribuições reflexivas como: a
importância da defesa do Código de Ética profissional (permeado também de significativas
alterações na tentativa de acompanhar as mudanças da sociedade, se atualizando e norteando
as demandas do Serviço Social) e a defesa do projeto- ético-político da profissão, que inserido
nesse contexto neoliberal, tenta se posicionar na correlação de forças, saindo em busca de
uma nova sociabilidade, defendendo princípios como a liberdade, justiça e equidade social.
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Inserido neste processo contraditório o Serviço Social da década de
90, se vê confrontado com este conjunto de transformações societárias
no qual é desafiado a compreender e intervir nas novas configurações
e manifestações da “questão social”, que expressam a precarização do
trabalho e a penalização dos trabalhadores na sociedade capitalista
contemporânea. (YAZBEK, 2009 p.155)
O Serviço Social amadurecido no seu processo de formação e consolidação, vive uma
nova realidade, contraditória, diante das desigualdades persistentes, da riqueza acumulada nas
mãos de poucos, se depara com novos reflexos da questão social, que cada vez mais necessita
da intervenção profissional; o desemprego crescente, desvalorização do trabalhador, altos
índices de violência contra a mulher, idosos, crianças, pessoas doentes, em situação de rua,
dentre outras tantas demandas oriundas da miséria instalada no país, onde políticas públicas
focalistas e excludentes não dão conta de resolver tamanha degradação social.
Nesse contexto histórico, o Serviço Social na condição de profissão institucionalizada
e assalariada, faz com que os profissionais ainda enfrentem um ranço presente desde o inicio
da profissão: o assistencialismo, e essa herança reverbera diretamente nos espaços de trabalho
do profissional, que uma vez reconhecida a profissão, o(a) Assistente Social é um/uma
profissional
que
vende
sua
forca
de
trabalho,
sujeitando-se
às
ordens
do
empregador/contratante, este por sua vez, determina quais são suas limitações. Apesar de sua
relativa autonomia, ao vender sua força de trabalho, o profissional se depara com uma
autonomia tencionada3.
Cabe resgatar, que mesmo na condição de assalariado, o Serviço Social é
regulamentado como profissão liberal e portanto, subordinado ao Código de Ética, essa
realidade adversa pode levar o profissional a um estado de extrema alienação, refletida no
atendimento à coletividade no âmbito de sua atuação cotidiana.
Na virada do milênio, o Serviço Social reafirma seu compromisso com a teoria
marxista. Reconhece que a forma de produção social é a causa prioritária das desigualdades,
sustentadas na estrutura de dominação de classes; reconhece a assistência como um direito e a
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Autonomia tensionada está condicionada a escolha do empregador “[...] Os empregadores determinam as
necessidades sociais que o trabalho do Assistente Social deve responder [...], interferem nas condições em que
operam os atendimentos assim como os seus efeitos nas reproduções sociais [...]”. (IAMAMOTO, M.V, 2011,
p.215).
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necessidade de fortalecer os movimentos sociais, na garantia protagonista dos indivíduos.
Ainda assim, podemos afirmar que há um distanciamento dos textos de Marx, apesar da
contemporaneidade, segundo IAMAMOTO (2011)
[...] a profissão na divisão social e técnica do trabalho foi largamente
incorporada pela categoria profissional, tornando-se domínio publico,
o mesmo não ocorrendo com seus fundamentos referentes ao processo
de produção e reprodução das relações sociais, o que justifica as
necessidade de sua retomada e aprofundamento, com foco
privilegiado no trabalho e na sociabilidade na ordem do capital, como
subsidio para pensar o exercício profissional na atualidade (p. 213).
O Serviço Social nesse momento contraditório sente a necessidade de maior
reconhecimento profissional, possível por meio do fortalecimento de sua base, ancorado na
teórica social crítica, no Código de Ética e reafirmando a defesa ferrenha de seu projeto-éticopolítico. Tem como ferramentas na busca da efetivação de seus propósitos, bens e serviços
públicos conquistados através da Constituição Federal de 1988, como a LOS, LOAS, CNAS,
PNAS, SUAS, ECA, e outras, a materialização do tripé da seguridade social – saúde,
previdência e assistência social, são recursos a serem utilizados pelos profissionais na luta
pela efetivação dos direitos conquistados.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Consideramos, após essa reflexão, que o Serviço Social convive com os desafios para
o seu enfrentamento, portanto, se faz necessário o exercício de análise constante da atuação
profissional dentro do sistema capitalista. O reconhecimento de traços do conservadorismo
ainda presente na profissão em tempos pós-moderno, pede reflexão diária e consulta do
pensamento marxista, que tanto contribui para o fortalecimento da profissão. Em tempos de
constante crise do capital, nesse viver contraditório, o(a) Assistente Social precisa se valer das
ferramentas conquistadas democraticamente, numa luta diária pela concretização da
democracia e cidadania no país, na defesa de acesso igualitário e justo para o cidadão. O
profissional dispõe de mecanismos consolidados e por consolidar nas esferas públicas e
privadas, de políticas que irão contribuir para uma prática profissional consciente e
transformadora da sociedade.
A participação em fóruns de debates que trate da questão social torna-se
imprescindíveis na vida profissional, contribuir no fortalecimento dos conselhos,
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conferências, que estimule a participação da população no controle social, apoio aos
movimentos sociais, são caminhos necessários a serem percorridos pelo Serviço Social
brasileiro na consolidação das políticas públicas.
O Serviço Social precisa estar inserido nos meios de discussões, planejamento,
organização, gestão das políticas, contribuindo assim pela expansão da assistência e
reconhecimento dos serviços. A profissão historicamente contribuiu e vem contribuindo pela
efetivação da democracia e na diminuição da desigualdade no país.
Portanto, vale lembrar que essas ferramentas conquistadas, a política social que vem
sendo implementada, ainda não são capazes de reverter o quadro degradante que se vive
atualmente, os desafios são árduos e diários para consolidação da cidadania.
Assim sendo, o Serviço Social precisa se fortalecer hegemonicamente de suas bases:
teórico-metodológico, técnico-operativo e ético-político, seguir na busca da efetivação do seu
projeto-ético-político, dialogar com outras correntes sociais, centrando-se sempre na tradição
marxista, na luta e defesa de seus princípios libertários e transformadores na sociedade.
BIBLIOGRAFIA
ABRAMIDES, Maria Beatriz Costa. Desafios do Projeto Profissional de ruptura com o
conservadorismo. Revista Serviço Social e Sociedade. São Paulo: Cortez, 2007, n. 91, p. 3447.
IAMAMOTO, Marilda Villela. Serviço Social em Tempo de Capital Fetiche: Capital
financeiro, trabalho e questão social. 6°. São Paulo: Cortez, 2011.
__________, Marilda Villela. Relações Sociais e Serviço Social no Brasil. 34° ed. São
Paulo: Cortez, 2011.
MARTINELLI, Maria Lúcia. Serviço Social: Identidade e Alienação. 15 Ed. São Paulo:
Cortez, 2010.
NETTO, José Paulo. Ditadura e Serviço Social. 15° ed. São Paulo, Cortez, 2010.
YAZBEK, Maria Carmelita. Direitos e Competências Profissionais: Fundamentos
Históricos Metodológicos do Serviço Social. Brasília: In CFESS/ABEPSS, 2009.
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