III SEMINÁRIO POLÍTICAS SOCIAIS E CIDADANIA
AUTOR DO TRABALHO: Isabel Cristina Chaves Lopes
Avaliação técnica de programas/projetos sociais para a infância e adolescência
como processo educativo para o exercício democrático
Introdução: O referido artigo apresenta de forma breve, algumas reflexões realizadas
pela autora, acerca da utilização da avaliação como instrumento pedagógico, na
educação para o exercício democrático. Estas são desenvolvidas, considerando
experiências da mesma, na condição de assistente social e docente do curso de
graduação em Serviço Social da Universidade Federal Fluminense1, em processos de
avaliação técnica de programas e projetos governamentais e não-governamentais,
financiados pelo Fundo Municipal da Infância e Adolescência do Conselho Municipal de
Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMPDCA), do município de Campos
dos Goytacazes2, no Estado do Rio de Janeiro, nos anos de 2002, 2004 e 2008.
O trabalho, realizado, caracterizou-se por assessorias à Comissão de Fiscalização,
Avaliação e Monitoramento deste Conselho.
Estas tiveram por objetivos básicos:
1-Instrumentalizar a Comissão de Avaliação do CMPDCA, para o processo
de tomada de decisões acerca dos projetos que melhores impactos
pudessem vir a provocar no bem-estar do público infanto-juvenil do
município, a partir de demandas já diagnosticadas pela entidade.
2- Organizar critérios que servissem de indicadores de avaliação do nível
de eficiência e de eficácia dos projetos apresentados, a partir das linhas de
ação prioritárias previstas pelo CMPDCA.
Ao final de cada avaliação, no decorrer destes três anos, foram elaborados
relatórios técnicos, que foram utilizados pela Comissão, na realização da seleção dos
projetos encaminhados por instituições cadastradas no CMPDCA. Tais relatórios, além de
apresentarem pareceres com recomendações de aprovação ou não dos projetos, também
tiveram um tom propositivo, envolvendo sugestões para as ações interventivas
apresentadas nos mesmos, que visavam contribuir no tratamento de problemas comuns
a vários deles e recorrentes em vários deles. Outro componente dos relatórios, que
achamos importante destacar aqui, foram às reflexões sobre o sentido político-filosófico
do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) 3, quer dizer, reflexões acerca do
significado da “Doutrina da Proteção Integral” 4.
1
Pólo Universitário Campos dos Goytacazes
Instituído pela Lei Municipal.145/90
3
Amplo leque de direitos e não mais deveres, para a infância e adolescência brasileira, como um
todo, garantido pela Constituição Federal, através dos artigos 204 e 227, criados a partir das
emendas “Criança Constituinte” e “Criança Prioridade Nacional”.
2
4
Tal doutrina defende que é responsabilidade da família, da sociedade e do Estado, a garantia de
direitos a indivíduos em fase peculiar de desenvolvimento bio-psico-socio-cultural. Esta concepção,
contraponto a do paradigma do Menor em Situação Irregular, é originada em concomitância ao
julgamento do conceito de menor, enquanto preconceituoso e consequentemente excludente,
devendo ser substituído pelo conceito de criança e adolescente.
Como a materialização de tais pressupostos demandava a alteração na relação Estado/sociedade
civil, no tratamento das questões que envolvem particularidades da vida das crianças e dos
adolescentes, agora prioridade absoluta das políticas sociais, a Constituição Federal e
A postura propositiva, em relação à avaliação dos projetos e elaboração dos
pareceres sobre os mesmos, resulta de uma opção, por uma pedagogia não punitiva.
Nosso interesse era usar o momento da avaliação, para gerar contribuição a um maior
envolvimento dos profissionais responsáveis pela elaboração dos projetos, com questões
fundamentais à aplicação de uma política de atendimento à criança e ao adolescente,
com caráter democrático e capacidade de promoção de impactos substantivos em suas
realidades e na de seus familiares e respectivas comunidades.
Partimos do pressuposto de que, os processos de avaliação técnica de
programas/projetos sociais, comportam mediações importantes à educação para o
exercício da democracia e mais especificamente, no caso em questão, para o exercício da
compreensão e aplicação da Doutrina da Proteção Integral. Portanto são um item
importante na afirmação do sentido de existência dos Conselhos de Direitos da Criança e
do Adolescente. Seus procedimentos, no entanto, antes de tudo, devem se sintonizar
com a filosofia que embasa o Estatuto da Criança e do Adolescente.
Os Conselhos de Direito da Criança e do Adolescente e o trabalho de
avaliação técnica de programas/projetos sociais
Refletir sobre procedimentos e significados, do processo de avaliação técnica de
programas/projetos sociais na área da infância e adolescência, requer antes de tudo uma
recorrência ao contexto mais geral e ao específico em que estes se realizam. No caso
deste artigo, em função do espaço de que dispomos, tentaremos uma breve retomada do
contexto mais geral.
Para tanto, vamos considerar a década de 80 do século passado no Brasil. Isto
porque, na década que não pode ser considerada pelos brasileiros como perdida, viveuse um processo de busca de autonomias e maior participação política, desencadeado a
partir da segunda metade dos anos 70, por movimentos sindicais, de bairros e populares,
a partir do qual, e expresso em movimentos específicos, é criado e sancionado o Estatuto
da Criança e do Adolescente, assim como, estabelecida à obrigatoriedade da implantação
dos Conselhos de Direitos das Crianças e dos Adolescentes.
Ou seja, as conquistas, originárias das referidas demandas emancipatórias, foram
consagradas na Constituição de 1988, conhecida como Constituição Cidadã, onde o
princípio da descentralização, e não da desconcentração 5 político-administrativa, destacase, garantindo à sociedade o direito de “formular e controlar políticas, provocando um
redirecionamento nas tradicionais relações entre Estado e sociedade” (STEIN,1997,
p.75). Tal processo assegura legalmente “maior autonomia financeira e política aos
estados e municípios, aliada às novas atribuições conferidas a estas unidades federadas,
em particular no campo das políticas públicas” (ibid., p. 78)
Os Conselhos de Direitos das Crianças e dos Adolescentes são expressão do
processo de descentralização, estabelecido pela atual Constituição Federal, e são criados
por lei federal6, estadual e municipal. Caracterizam-se como formas básicas de
posteriormente o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), introduziram em seus artigos a
obrigatoriedade da implantação dos Conselhos de Promoção dos Direitos das Crianças e dos
Adolescentes, cujas funções deliberativas e fiscalizadoras pressupõem o estabelecimento do
processo de descentralização administrativa.
5
A desconcentração é entendida como “[...] delegação de competência sem deslocamento de
poder decisório, ou como um processo de dispersão físico-territorial de instituições governamentais
inicialmente localizadas de forma concentrada.” (JOVCHELOVITCH, 1998, p.39)
6
Instituídos pela lei federal 8069/90.
mediação, entre a sociedade civil e o poder executivo. São órgãos colegiados, paritários e
deliberativos, quer dizer, devem ser compostos por um mesmo número de entidades
governamentais e não-governamentais, que formularão, fiscalizarão e avaliarão a
implantação das políticas de atendimento a crianças e adolescentes.
Eles inovam sobre o formato de gestão, em vigência até a época de sua
aprovação, garantindo à população, chamada a participar apenas da execução das ações,
a participação, em espaços de decisões, até então privativos dos dirigentes políticos. A
população, através de suas organizações representativas, pode e deve participar na
formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis, destinadas a este
público.
O processo de descentralização, diante disto, tem que atender alguns princípios,
como os de autonomia e participação, necessários às práticas políticas redefinidoras das
relações de poder autoritárias e concentradoras. A partir desta ótica, o município passa a
ser visto como a esfera de poder mais próxima da população, garantindo a esta um
exercício mais concreto de realização do controle social. Por incorporar internamente
aspectos econômicos, sociais e políticos, o processo de descentralização necessita de
administrações fortes, eficientes e que se vejam livres dos vícios da centralização.
As ações do Executivo, do Legislativo e de organizações comunitárias, voltadas à
garantia de melhoria nas condições de vida dos cidadãos, são importantes sendo o
executivo municipal um valioso protagonista, dentre as instâncias governamentais, na
tarefa de responsabilizar-se “pelos serviços e equipamentos públicos que compõem o
contexto no qual os cidadãos enfrentam o seu dia-a-dia” (ibid, p.43), de forma a garantir
a estes à obtenção de maiores possibilidades na assunção de compromissos voltados à
organização e participação popular.
A partir deste aspecto, temos que, o efetivo controle da sociedade, reivindica
injunções, como uma democracia representativa, articulada a canais de legitimação da
democracia direta, onde os interesses setoriais possam expressar-se, a partir das
organizações/representações dos mesmos, de forma pluralista e livre, o que nos remete
à questão do exercício de poder7 e da participação.
Porém, “[conservando] as marcas da sociedade colonial escravista, a sociedade
brasileira caracteriza-se pelo predomínio do espaço privado sobre o público” (CHAUÍ,
2006, p.353), o que demanda, a recorrência à educação dos indivíduos, para o pensar e
agir coletivos e por conseqüência, para o enfrentamento de um processo de privatização
da esfera pública.
Para a realização deste processo educativo (formal ou não-formal), a criatividade,
a ousadia, o olhar atento e comprometido, são importantes elementos na identificação e
exploração de instrumentos acessíveis que possam ser utilizados este fim.
Considerando a temática particular abordada neste artigo, compreendemos que a
avaliação é um destes instrumentos e o trabalho de avaliar programas/projetos
governamentais e não-governamentais, voltados ao atendimento da realidade da infância
e adolescência, uma importante mediação de caráter democrático. Através deste,
reunimos representantes da sociedade civil e do governo para debater analisar critérios
de aprovação ou não de projetos, assim como encaminhamentos futuros à luz do ECA.
7
A partir de Sader (apud SILVA, 1996, p.30) pode ser entendido “enquanto atributo, o que
significa [dizer] que numa dada sociedade existe poder das diferentes forças e elementos sociais.
[Assim, trata-se] de ver como esse poder está distribuído, ou melhor, desigualmente distribuído”.
A efetiva participação da sociedade, pela via dos Conselhos de Direitos da Criança
e do Adolescente, principalmente na afirmação de uma perspectiva democrática8 de
sociedade, requer conhecimento e exploração do que o caracteriza e afirma como um
instrumento para a democracia.
Tal participação, demanda a observação e a análise para a forma como o poder é
distribuído na sociedade, ou seja, como ele é desigualmente distribuído nela, pois não se
deve perder de vista, que poder é uma relação, que como qualquer outra deve ser
construída e trabalhada, para ser mantida na forma em que se avaliar necessária e
possível.
Considerando esta análise, torna-se indiscutível, o papel protagonista da
sociedade civil (a partir de suas diversas formas de inserção e de expressão), nas
discussões e acompanhamentos dos processos de avaliação de programas e projetos
sociais, como forma de exercício de poder, no caso, poder democrático, que tem por
finalidade ética, a busca pela eliminação das desigualdades sociais, e a afirmação e
elevação da cidadania a patamares mais próximos de uma dimensão humano genérica
mais emancipada.
Os momentos de deliberação, estruturação e efetivação das avaliações de
programas/projetos sociais, conformam mediações políticas importantes, posto serem
entrecortadas por interesses econômicos e políticos, locais e não locais, variados.
Portanto, atendem a motivações classistas e podem, por conseguinte, atender estímulos
de ordem preconceituosa. Isto significa que tal instrumento não deve ser utilizado por
ações mecânicas, inspiradas por relações utilitaristas, que nada de novo trazem para a
cultura, para a história e para o crescimento da sociedade, nos moldes mais éticos aqui
referidos.
Consideramos este aspecto muito relevante, por entendermos, que os processos
de consolidações democráticas9, na América Latina contemporânea, são frágeis em suas
capacidades de provocar mudanças de ordem política, econômica e social.
Isto fica claro de ser observado, quando dirigimos nosso olhar para os territórios
locais, para os municípios. Nestes encontramos instituições municipais
[despreparadas] para operar a gestão das ações locais; [com]
ausência de recursos humanos qualificados nos municípios de
menor porte; fragilidade do poder local para gerir, dada à tradição
de um Estado centralizador que infantilizou prefeitos e vereadores
e excluiu a participação popular; ausência de clareza e preparo dos
níveis federal e estaduais para direcionarem o processo de
municipalização; enorme fragmentação dos programas, ações e
recursos existentes; tamanho dos municípios e a fragilidade das
administrações locais. (JOVCHELOVITCH,op.cit., p. 34)
8
Conforme Chauí (1995), a democracia é a única sociedade e o único regime que considera o
conflito legítimo. Não só trabalha politicamente os conflitos de necessidades e de interesses
(disputas entre os partidos políticos e eleições de governantes pertencentes a partidos opostos),
mas procura instituí-los como direitos e, como tais, exige que sejam reconhecidos e respeitados. Mais do que isso. Na
sociedade democrática, indivíduos e grupos organizam-se em associações, movimentos sociais e populares, classes se
organizam em sindicatos e partidos, criando um contra-poder social que, direta ou indiretamente, limita o poder do Estado;
[...] a sociedade democrática não está fixada numa forma para sempre determinada, ou seja, não cessa de trabalhar suas
divisões e diferenças internas, de onde orientar-se pela possibilidade objetiva e pela liberdade, de alterar-se pela própria
práxis.” (ibid., p.433).
9
Sendo que “também possa se caracterizar como uma forma de reforço ao aparelho de dominação, encobrindo a face obscura
de um regime autocrático e fechado” (STEIN, ibid., p.84)
Os municípios são unidades políticas importantes numa federação, no entanto, no
Brasil, segundo Jovchelovitch (ibid., p. 37) “no decorrer de sua trajetória e busca de
autonomia, esteve sempre presente o binômio centralização/descentralização”, visto que,
na sua gênese e desenvolvimento, os mesmos tiveram forte influência clientelista e
paternalista por parte do poder central, gerando um “caráter distorcido e assimétrico de
nossa federação.” (ibid.)
Muitas demandas de variados setores sociais, diante disto, são absorvidas pelos
particularismos e clientelismos das práticas políticas torpes. Estas práticas concebem o
processo de descentralização como uma forma de instrumentalização das políticas
sociais, onde a descentralização política e administrativa é identificada com privatização,
sendo utilizada em processos de enxugamento dos gastos públicos, para atendimento de
interesses não públicos e até não publicizáveis.
Tais procedimentos vão de encontro com os requisitos necessários à constituição
de uma esfera pública democrática que devem estar articulados dinamicamente ao
movimento de sua construção. Segundo Raichelis (2000, p.42), estes seriam:
-Visibilidade social. As ações e os discursos dos sujeitos devem
expressar-se com transparência, não apenas para os diretamente
envolvidos, mas também para aqueles implicados nas decisões
políticas. Supõem publicidade e fidedignidade das informações que
orientam as deliberações nos espaços públicos de representação.
-Controle Social. Significa acesso aos processos que informam as
decisões da sociedade política. Permite participação da sociedade
civil organizada na formulação e na revisão das regras que
conduzem as negociações e a arbitragem sobre os interesses em
jogo, além do acompanhamento da implementação daquelas
decisões, segundo critérios pactuados.
-Representação de interesses coletivos. Implica a constituição de
sujeitos sociais ativos, que se apresentam na cena política a partir
da qualificação de demandas coletivas, em relação às quais
exercem papel de mediadores.
-Democratização. Remete à ampliação dos fóruns de decisão
política
que,
extrapolando os
condutos
tradicionais
de
representação, permite incorporar novos sujeitos sociais como
protagonistas e contribui para consolidar e criar novos direitos.
Implica a dialética entre conflito e consenso, de modo que os
diferentes e múltiplos interesses possam ser qualificados e
confrontados, daí resultando a interlocução pública capaz de gerar
acordos e entendimentos que orientem decisões coletivas.
Dentro de um contexto, que por ser neoliberal, é configurado por uma sociedade
civil fraca, pouco politizada, onde os sindicatos e trabalhadores vêem-se confusos com
suas identidades de classe, onde o Estado opta por um enfrentamento frágil dos reflexos
da questão social, posto, comprometido com o atendimento dos interesses dos países
capitalistas centrais, a disputa pela esfera pública torna-se uma tarefa extremamente
difícil, mas que pode ser ainda realizada em momentos como este que aqui estamos
tratando.
A defesa da avaliação das políticas de atendimento à infância e adolescência, via
processo de seleção de programas/projetos sociais, é uma forma de participação nesta
disputa. Está em jogo à forma como a verba do fundo público destinada ao
financiamento destas políticas está sendo empregada. Ou seja, se é para atender
interesses democráticos de ampliação da participação popular ou se é para atender
interesses clientelísticos e mantenedores da situação de estigmatização e exclusão de
muitos indivíduos ao acesso a determinados bens públicos, principalmente os de maior
qualidade.
Os fundos públicos municipais, estaduais e nacional (Artigo 88 ,inciso IV do ECA)
ligados aos Conselhos e denominados Fundo da Infância e da Adolescência, são parte do
processo de constituição dos mesmos.
Tal fundo que pode ser definido como uma reserva de recursos voltada para o
financiamento das ações de programas e projetos direcionados ao público aqui tratado,
visando à garantia de seus direitos constitucionais.
No entanto, ele pode ser
transformado de um instrumento democrático em um instrumento de ações
centralizadoras e autoritárias na gestão dos recursos públicos.
Diante desta
possibilidade, a avaliação técnica de programas/projetos sociais (dimensão executiva das
políticas públicas e sociais) tem uma função de relevância na afirmação de uma cultura
realmente pública, e para tanto deve assentar-se em bases científicas e em princípios
democráticos.
A avaliação de políticas, deste modo, não é um processo neutro. Sua
operacionalização é algo complexo. Esta implica como afirma Silva (1997:75), no
estabelecimento de critérios a partir da atribuição de valores às conseqüências das ações
planejadas ao aparato institucional, para realização das políticas, e aos atos em si, que
procuram realizar algum tipo de modificação na realidade em foco. Envolve ainda no
universo dos critérios, a identificação de princípios políticos fundamentais relativos a
alguma concepção de bem-estar humano (ibid), não restringindo-se, no entanto, a mero
tratamento conceitual de princípios, mas também aos produtos gerados a partir do
mesmos e dos impactos produzidos (ibid.,p.77).
Estes, podem ser de ordem objetiva, subjetiva e substantiva e o planejamento de
qualquer mudança advinda da previsão de qualquer um deles, demanda avaliação do
nível de sustentabilidade econômica, ideológica e cultural das ações a serem
implementadas.
A partir deste entendimento, uma avaliação de políticas/programas sociais, deve
buscar na sua aplicação, um equilíbrio entre o ideal e o viável, flexibilizando o tratamento
de seus critérios a partir da contextualização da realidade local e do momento histórico.
Considerações finais
Ao final deste artigo, queremos afirmar a importância do momento da avaliação
das ações desenvolvidas no que tange a operacionalização das políticas sociais no Brasil,
com destaque no nosso texto, às dirigidas a crianças e adolescentes, cujas orientações
constam no Estatuto da Criança e do Adolescente, como um importante momento de
educação para exercício do poder democrático.
Os princípios que embasam o ECA, somente podem ser firmados nos espaços
concretos da realidade, através de sujeitos históricos. Os programas e projetos sociais
(que expressam as políticas sociais) são instrumentos eficazes para este objetivo, mas
para tanto, têm que ser avaliados e monitorados a partir de diagnósticos sociais
atualizados.
É importante entendermos, que as políticas sociais nos quadros da totalidade
social da qual fazem parte, são resultado da articulação de interesses econômicos e
políticos, dos protagonistas, Estado, classes hegemônicas e grupos subalternos
(PASTORINI, 1997). Tal articulação desenvolve-se partir do binômio concessão-
conquista, como trata Pastorini (ibid), como um processo “conflitivo atravessado pelas
lutas de classes, onde os diferentes grupos têm ganhos e perdas, ao mesmo tempo em
que lutam e pressionam, „conquistam‟ e „concedem‟ alguma coisa aos demais sujeitos
envolvidos.” (ibid., p.97).
No contexto conjuntural que se desenha a partir dos anos de 1970, pelo advento
do neoliberalismo, e em função do processo conflitivo anteriormente mencionado, nos
deparamos com um perfil de políticas sociais no Brasil, frágeis, insuficientes,
descontínuas e com traços meramente compensatórios.
Ao protagonista Estado é exigida, pelos organismos internacionais, uma
intervenção mais restrita “a ações focalizadas na extrema pobreza, buscando a
complementação da filantropia privada e das comunidades” (ibid:27). Portanto, se o ECA
assenta-se na defesa de uma participação mais politizada e um Estado mais forte e mais
ampliado, no que tange aos interesses da classe trabalhadora, a conjuntura política e
econômica atual vai exigindo direção oposta.
Não há, portanto, como negar, que um processo de avaliação de políticas sociais,
deva compreender um olhar que considere a existência do conflito, da contradição, da
luta política na constituição das políticas sociais, entendendo que não há lugar para
neutralidades junto ao mesmo. Temos, neste sentido, de nos lançarmos no aprendizado
da lida com as contradições e da construção do poder contra-hegemôncio.
Pelos princípios do ECA, a sociedade é histórica, aberta ao tempo, às
transformações, ao possível, ao novo (ibid.). O ECA entende que uma sociedade
democrática não se sustenta somente com suportes legais, mas demanda cultura
democrática, para cujo alcance os processos avaliativos e de monitoramento de
programas/projetos sociais, apresentam-se como valiosos instrumentos táticos.
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