A To g a
CENTRO ACADÊMICO ANDRÉ DA ROCHA
Avenida João Pessoa, 80 - térreo
(51) 3308.3598
[email protected]
Jornal dos estudantes da Faculdade de Direito da UFRGS
www.ufrgs.br/caar
Porto Alegre, dezembro de 2010 - Nº 1 - Ano LXII - Tiragem: 1.000 exemplares
João Pessoa, 80:
endereço
centenário
Distribuição gratuita
PESQUISA
SIC na
Faculdade
de Direito
p. 3
CONTRAPONTO
Polêmica do
ficha limpa
p. 5
ENTREVISTA
Juiz Federal
Fausto de
Sanctis p. 10
ARTIGO
Movimento
estudantil
e partidos
políticos p. 6-7
CULTURA
Concluído em 1910, o prédio
histórico da Faculdade de Direito da Universidade Federal
do Rio Grande do Sul com-
pletou, em 2010, 100 anos.
Em sua homenagem, e também àqueles que entre essas
paredes passaram cinco anos
de suas vidas, o jornal A Toga
publica nesta edição matéria
especial com entrevistas de ex-alunos e imagens de arquivo,
recontando um pouco da história que ajudamos a construir
todos os dias.
Páginas 8, 9 e 10.
Semana
Cultural
p. 11
Faculdade de Direito UFRGS
João Pessoa, nº 80
Cel: 9122.3184
pela manhã 3366.2987
[email protected]
A TOGA - Dezembro de 2010
2
EXPEDIENTE
EDITORIAL
A Toga
Jornal dos estudantes da Faculdade de Direito da
UFRGS - Nº 1 - Ano LXII - Dezembro de 2010
Comissão Editorial: Eduardo Halperin, Francisco Ponzoni Pretto, Guilherme Seibert, Gustavo Sanseverino, Laura Marazita Lotti, Mariana
Medeiros Lenz, Nathalia Beduhn Schneider.
Diagramação: Mariana Medeiros Lenz
Tiragem: 1.000 exemplares
A Toga é uma publicação de responsabilidade do Centro
Acadêmico André da Rocha (CAAR). Os textos assinados são de responsabilidade de seus autores.
Fundado por Nicanor Luz e José J. Dall-agnol,
em maio de 1949.
DIRETORIA EXECUTIVA DO CENTRO
ACADÊMICO ANDRÉ DA ROCHA
Gestão Concretizando Ideias
Presidência: Francisco Ponzoni Pretto
Vice-Presidência: Pedro da Silva Moreira
Secretaria-Geral: André Silva Gomes
Secretaria Acadêmica: Elis Marina Barbieri
Tesouraria: Dóris Amaral Kümmel
Coordenação da Revista Res Severa Verum Gaudium: Raíssa Jeanine Nothaft
Secretaria de Ensino, Pesquisa e Extensão:
Emília Malacarne, Tássia Cividanes Pazinato,
Mariana Kuhn de Oliveira
Secretaria de Eventos Acadêmicos: Guilherme Seibert, Laura Lotti, Mariana Padilha, Fernando Eick, Ezequiel F. dos Santos
Secretaria de Cultura: Cássio Rocha de Macedo, Gustavo Saling dos Santos, Eduardo Fernandes “Bera”, Luíza Leão Soares Pereira, Guilherme dal Castel
Secretaria de Comunicação: Fernanda Bonotto, Arthur Amaral Reis
Secretaria de Integração: Felipe Russomano,
Fernando Polidori Rios, Lucien Pires, Guilherme
Queirolo Feijó, Luiz Edmundo Kielbovicz
Secretaria de Esportes: Rafael Xavier “TAGA”,
Vitor Arthur Correa Lima, Eduardo Gutierrez,
Morgan Adami, André Giordani, Henrique Buhl
Richter
Colaboraram nesta edição:
Arthur P. Bedin
Bruno Hermes Leal
Bruno Irion Coletto
Eduardo Halperin
Eduardo K. M. Carrion
Elis Marina Barbieri
Fausto de Sanctis
Francisco Ponzoni Pretto
Guilherme Jantsch
Guilherme Seibert
Gustavo Sanseverino
José Artigas Leão
Ramminger
Judith Martins-Costa
Laura Marazita Lotti
Lucas do Nascimento
Marcelo de Azambuja
Marco Aurélio Moreira de
Oliveira
Maria Izabel Noll
Mariana Medeiros
Lenz
Maurício Licks
Museu da UFRGS
Nathalia Beduhn
Schneider
Nico Fagundes
Raíssa Nothaft
SAJU/UFRGS
Sérgio José Porto
Tatata Pimentel
Thiago Calsa Nunes
Thiago Aguiar
Simim
Vitor Lourenço
Simão Castro
• FRANCISCO PONZONI PRETTO
Presidente do CAAR
Gestão Concretizando Ideias (2009/2010)
Ao final de um ciclo, de uma jornada,
nada mais natural do que olhar para trás e
refletir sobre o que aconteceu. Os erros, os
acertos, as mudanças, os crescimentos. É a esta
nossa pequena jornada, a Gestão Concretizando Ideias do Centro Acadêmico André da Rocha e os reflexos que esta trouxe a este jornal,
que gostaria de dedicar este Editorial.
Acredito, portanto, que esta edição do
Jornal “A Toga” – minha última ação enquanto Presidente do CAAR – bem representa a
caminhada que tivemos neste ano de 2010. De
certa maneira, as matérias aqui escritas abordam muito da maneira de pensar que tivemos
ao longo do ano, muitas das áreas de atuação
que este Centro Acadêmico deve ocupar, muito da maneira como enxergamos uma entidade
representativa como o CAAR.
Este jornal não foi feito apenas pela sua
Comissão Editorial. Tivemos contribuições de
diversos estudantes, tanto de nossa Faculdade como de fora dela. Em realidade, tivemos
até mesmo duas Comissões: uma que deu o
primeiro passo (e que, por razões que não
cabe aqui discutir, não o encerrou) e outra que,
renovada e turbinada com o gás de calouros,
praticamente reinventou o conceito de “A
Toga” que tínhamos.
Importante frisar, ainda no tocante às
duas Comissões, que houve um importante
crescimento, por parte da gestão, ao trabalhar
com quem fora oposição nas outras eleições.
Percebeu-se, nesta comparação direta, quem
realmente estava disposto a trabalhar por um
CAAR melhor, mesmo não sendo, formalmente, gestão.
Mas esta edição traz à Faculdade muito
mais. Adentramos na seara das discussões
políticas – que devem sim ser pautadas por
um Centro Acadêmico –, publicando o artigo
“Interstícios: movimentos estudantis e partidos políticos”, de autoria de um estudante da
UFMG, a exemplo do que já havíamos feito
durante o ano, sendo a única entidade estudantil do estado a organizar um debate entre os
candidatos ao senado e ao organizar eventos
que discutiam a história política de nossa
Faculdade.
Na página 5, oferecemos aos estudantes
importante discussão jurídico-política, que
foi tema de inúmeras e infindáveis discussões
durante o ano. Os professores Marco Aurélio
de Oliveira e Eduardo Carrion iluminam o
assunto “Ficha Limpa” de maneira ímpar, que
só quem cumula anos de experiência e estudo
poderia proporcionar. Esta discussão jurídico-política se mostrou durante todo o ano, ao,
por exemplo, organizarmos em conjunto com
outras entidades, o VI Fórum Mundial de
Juízes, que contou com o português Boaventura de Souza Santos, entre outros renomados
mestres.
É consenso que uma correta formação
do estudante de Direito não deve ser restrita
apenas às discussões afeitas a este ramo do
conhecimento. Por isso, durante o ano, foi organizada a I Semana Cultural da Faculdade de
Direito da UFRGS, o II Minicurso de Criminologia Avançada e Rock e outros eventos que
buscavam a transdisciplinaridade, que busca-
vam discutir o Direito em conjunto com outras ciências.
Também esses diálogos encontram reflexos no jornal,
seja no texto sobre a Semana Cultural, seja na resenha
escrita pelo discente Bruno Leal, seja no poema escrito
pelo Acad. Arthur Bedin, seja no artigo escrito pela Profa.
Izabel Noll.
Também merece destaque a matéria sobre o centenário do prédio da Casa do Velho André. Reunimos acadêmicos de diferentes épocas, com diferentes histórias, para
nos apresentarem seus relatos e impressões, como forma
de valorizar nossa história e dar novo ânimo àqueles que
hoje passam grande parte de sua vida dentro dos muros
do nosso castelinho.
Não podemos, ainda, olvidar o espaço disponibilizado ao maior e mais antigo projeto de extensão de nossa
Universidade, exemplo a ser seguido pelo Brasil afora e
que temos a honra de acolhermos em nossa Faculdade. O
SAJU, em iniciativa nova e que – esperamos – seja seguida
pelas próximas edições do “A Toga”, recebe espaço de
destaque, permitindo que este lindo projeto tenha mais
um espaço de divulgação de sua atuação.
A tão falada e buscada excelência acadêmica, por
óbvio, também não poderia ser excluída. Em que pese
todo este texto, de uma maneira ou de outra, versar sobre
ela, é no tripé universitário (ensino, pesquisa e extensão)
que ela se faz mais clara. E, para o tripé completar-se, não
esquecemos da pesquisa. Este ano, esta entidade estudantil organizou o Salão de Iniciação Científica da Faculdade,
que contou com a presença, dentre outros, do Min. Ruy
Rosado, e, pela primeira vez, foram publicados os resumos dos trabalhos apresentados. Manteve-se e ampliou-se, também, a grande conquista obtida neste quesito na
gestão passada: a Res Severa Verum Gaudium, Revista Científica dos Estudantes da Faculdade de Direito, teve suas
duas edições anuais publicadas, mantendo este importante
meio de publicação à disposição dos discentes.
Essencial para que se legitimidade perante seus
representados, uma gestão de uma entidade representativa
deve, sempre, primar pela transparência. Essa transparência se dá em vários âmbitos: no financeiro, pela primeira
vez nos últimos anos, publicamos a prestação de contas
dos primeiros seis meses de gestão e, neste jornal, publicamos a completa da gestão passada; no político, é deliberar antes e trazer a discussão e os resultados depois de
cada encontro de entidades estudantis; na política interna,
é estar sempre disposto a ouvir o estudante e a defendê-lo, é melhorar a comunicação, através de um novo sítio
eletrônico e um CAARInforma reformulado.
Poderia eu, aqui, enumerar muitas outras conquistas e
avanços, mas creio que não disponho de tantos caracteres.
Porém, acredito que, nestes onze parágrafos sobre o que
foi feito, consegui, explícita ou implicitamente, enumerar
algumas características e ações que, após este ano, vejo
como essenciais a uma gestão do CAAR: trabalhar junto
com o estudante, mesmo que ele tenha sido oposição
nas eleições passadas; disposição para fazer um Centro
Acadêmico melhor; proposição de debates (i) políticos,
(ii) acadêmicos, (iii) interdisciplinares, (iv) culturais, (v)
político-acadêmicos; transparência; legitimidade, que só
se obtém quando se está aberto a ouvir o que o estudante
tem a dizer e estar disposto a defendê-lo.
Por fim, agradeço, como não poderia deixar de ser,
a todos aqueles, discentes ou não, membros da gestão
ou não, que de alguma forma contribuíram para que este
texto tivesse todo este conteúdo. Obrigado a todos que
criticaram, com ou sem razão; obrigado às Comissões
Editoriais (a nova e a antiga) do jornal; obrigado àqueles
docentes que, no dia-a-dia, mostraram que a docência é
uma virtude; obrigado aos servidores técnico-administrativos, que diariamente ensinam o significado da palavra
“dedicação”; obrigado aos demais membros da gestão,
que, muitas e muitas vezes, mostraram o caminho onde
antes só havia muros.
A TOGA - Dezembro de 2010
3
Produção científica valorizada
Bancas
• LAURA MARAZITA LOTTI
Acadêmica do 2º ano manhã
Coordenadora do XII SIC da
Faculdade de Direito
DIREITO INTERNACIONAL E ARBITRAGEM
Prof. Eugênio Battesini, Prof.ª
Camila Vicenci, Prof. Augusto
Jaeger
Destaques:
“A normatividade do soft law:
discrepâncias nas normas de
Comércio Internacional e de
Direitos Humanos”, (Luíza
Leão Soares Pereira)
“A regulação do momento
translativo da propriedade no
âmbito do Comércio Internacional” (Henrique de David)
Mariana Lenz
O Salão de Iniciação Científica
tem papel indispensável na construção de uma Faculdade fundada
nos princípios basilares da pesquisa,
ensino e extensão, uma vez que é
o fomentador da pesquisa em nível de graduação na Faculdade de
Direito da UFRGS, possibilitando
ao acadêmico apresentar a sua pesquisa a uma banca preparada e conhecedora do tema, visando ao enriquecimento do trabalho que vem
sendo desenvolvido. O objetivo do
XII Salão de Iniciação da Faculdade
de Direito da UFRGS é estimular a
pesquisa e o debate acerca da importância do conhecimento científico dentro da nossa comunidade
acadêmica, contextualizando-a na
realidade da nossa Universidade
e do Direito brasileiro. A iniciação científica é um instrumento
de apoio teórico e metodológico à
realização de projetos de pesquisa,
permitindo ao aluno não apenas
o contato com a doutrina, com as
teses já estabelecidas, mas também
garantindo-lhe o seu próprio processo ativo de produção de conhecimento.
Neste XII Salão, promovido
pelo Centro Acadêmico André da
Rocha e a Faculdade de Direito da
UFRGS, não foi diferente. Realizado entre os dias 4 e 8 de outubro,
com 37 participantes, o SIC permitiu que o pesquisador entrasse em
contato com sua comunidade acadêmica, apresentasse sua pesquisa e
estimulasse outros a pesquisarem. Divididas em quatro áreas de atuação, as bancas foram
formadas por linhas de pesquisa e compostas por três professores e profissionais atuantes,
conhecedores dos temas.
A pesquisa científica tem
como pilar da sua existência a
hipótese, a tese. Duvidar é por
em cheque todo o conhecimento o desenvolvido até então
e desconstruí-lo em busca de
novas respostas, novas explicações para determinados fa-
tos. Em um Salão de Iniciação
Científica, tem-se por estimular
a essas pesquisas, para criticá-las e vê-las desenvolverem-se.
O objetivo maior de um Salão
como esse é o contínuo estímulo
aos pesquisadores, que possam
desenvolver seus projetos sempre da maneira mais adequada e,
cada vez mais, transformando a
Faculdade de Direito da UFRGS
em um espaço para a apresentação, divulgação e aprimoramento
dos trabalhos concretizados pelos
acadêmicos da nossa graduação.
DIREITO CONSTITUCIONAL E FILOSOFIA DO DIR.
Prof.ª Anelise Schüler, Prof. Felipe X. Oliveira, Prof.ª e Des.
Maria Isabel de Azevedo Souza
Destaques:
“O Controle de Constitucionalidade do Reino Unido” (Rafael
da Silva)
“A judicialização da política no
Rio Grande do Sul: uma análise das ações diretas de inconstitucionalidade julgadas pelo
Tribunal de Justiça Gaúcho
(2007-2010)” (Marcio Camargo
Cunha Filho)
DIREITO PENAL E PROCESSO PENAL
Des. Umberto Sudbrack, Dr.
Agenor Casaril, Prof. Pablo Alflen
Destaques:
“A compreensão do fenômeno
violência doméstica e a aplicação da Lei Maria da Penha pelo
Intercâmbio em uma metáfora e uma analogia
• MAURÍCIO LICKS
Acadêmico do 2º ano manhã,
atualmente em intercâmbio estudantil em Grenoble (França)
Descrevo a situação: estou em uma cama há algumas
horas, resultado de um violento lance esportivo, e conto o
tempo não em horas, mas em
vezes em que abro a geladeira.
Abro minha caixa de e-mails e
me deparo com a proposta de
escrever algo sobre a experiência de quatro meses vivendo
em francês.
Uma metáfora e uma analogia.
Digamos que a vida seja
um esboço, para o qual não se
pode usar borracha ou qualquer técnica que permita apagar o risco de lápis e refazê-lo de alguma outra forma. A
maior parte do trajeto do grafite é esperada e, mesmo que
interessante, dificilmente cha-
SIC do Direito ocorreu em outubro,
com a apresentação de 36 trabalhos
ma a atenção novamente. Às
vezes, porém, a beleza do rastro
do grafite é tanta, que a memória não hesita em fotografá-lo
para fazer dele algum quadro
ou coisa do gênero. A maioria
destes momentos é inesperada:
só se vê a beleza quando o grafite já desenha outras formas.
Existem outros, no entanto, em
que se sabe que cada vestígio
do grafite, mesmo os que ainda são só possibilidade, será tão
marcante e tão belo que, não
importa quantas obras-primas
ainda forem desenhadas sobre
a superfície da folha, não se
poderá deixar de apreciá-los
nunca.
É o caso, por exemplo –
e me desculpem os namoros
posteriores –, de um primeiro namoro. Um intercâmbio é
definitivamente comparável ao
primeiro namoro, à diferença
de que ele não se passa com
uma mulher ou com um ho-
mem, mas com um país – ou
mesmo um mundo – inteiro.
Como em um primeiro namoro, faz-se coisas novas: esqui,
degustação de vinho, anda-se
de tram, viaja-se pela Ryan Air.
Descobre-se que a comida não
brota na geladeira e que o primeiro bom prato será posterior
à massa com molho de queijo
Roquefort coalhado e ao arroz
com sardinha que cheira a lixo.
Como em um primeiro
namoro, continua-se a fazer as
mesmas coisas. Vê-se e anota-se
a aula – elas são estilo Alfredo
–, abre-se um livro e se estuda,
letras pretas e folha branca. Há
insônia nas vésperas de dias esperados e vontade de dormir
mais no domingo. 99% dos homens continuam falando sobre
futebol durante muito tempo.
Quanto às mulheres, dizem que
elas também fazem amigas nos
banheiros das festas. Menos do
que em terras brasileiras, é cla-
Poder Judiciário da cidade de
Porto Alegre”
(Adriana Marques Strohaecker)
“O alcance dos laudos psiquiátricos na verificação da (in)
imputabilidade penal: da necessidade de adequação do perito
ao Código de Ética Médica”
(Bruna Rossol)
DIREITO PRIVADO E
PROCESSO CIVIL
Dr. Guilherme Lippert, Dr.
Daniel Ustarroz, Dr. Felipe
Lamb
Destaque:
“Aplicação prática de programas de mediação no cenário
brasileiro: O PI 447” (Andressa
Santos Michel)
Banca final
Prof. Carlos Zanini, ex-ministro
Ruy Aguiar Jr. e Prof. Manoel
André da Rocha
Destaque:
“O Controle de Constitucionalidade do Reino Unido” (Rafael
da Silva)
Menções honrosas:
“A normatividade do soft law:
discrepâncias nas normas de
Comércio Internacional e de
Direitos Humanos” (Luiza
Leão Soares Pereira)
“O alcance dos laudos psiquiátricos na verificação da (in)
imputabilidade penal: da necessidade de adequação do perito
ao Código de Ética Médica”
(Bruna Rossol)
Um intercâmbio é definitiva-
ro, já que a maioria mente comparável ao primeiro
dos banheiros france- namoro, à diferença de que ele
ses é unisex.
não se passa com uma mulher
Como em um
ou com um homem, mas com
primeiro namoro, fazum país – ou mesmo um
-se as mesmas coisas,
mundo – inteiro.
mas de uma forma
completamente diferente. As pessoas vão em bares nho francês, acho que o que se
beber, mas a cerveja é belga, a pode dizer sobre um intercâmpessoa logo à direita é grega e o bio universitário é que, como
garçom, seu colega brasileiro de um primeiro namoro – mas de
quarto. Todos falando francês – uma forma mais intensa, porou inglês. Faz-se uma curta vi- que se vê o dia em que se romsita àquele seu amigo siciliano, perão os laços – morar um ano
o que mora na Sicília. Nas ma- em um novo país, com pessoas
nhãs, depois de incontáveis “so- desconhecidas, em uma outra
necas”, veste-se e se vai para a língua e cultura é um modo de
aula não de ônibus ou de carro, conhecer um desenho absolumas de bicicleta. As conversas tamente inédito, irrepetível e
com a família ainda existem du- fascinante. Uma possibilidade
rante o almoço, mas a webcam única de contemplar uma bela
pode travar e um cachorro ja- obra-de-arte na galeria da memais aceita comida virtual como mória enquanto ela ainda não
moeda de troca para dar a pata. foi finalizada, vivendo anteciEnfim, apesar de ainda só ter padamente as nostalgias que te
rabiscado um terço do dese- aguardam em dias futuros.
4
A TOGA - Dezembro de 2010
Res Severa Verum Gaudium
CAAR protagonista da construção de uma tradição científica
• RAÍSSA NOTHAFT
Acadêmica do 3º ano manhã
Coordenadora-Geral da Res Severa
Verum Gaudium
• ELIS MARINA BARBIERI
Acadêmica do 3º ano manhã
Secretária Acadêmica
A Res Severa Verum Gaudium Revista Científica dos Estudantes de
Direito da UFRGS foi criada no ano
de 2009 pela Gestão Construindo
o Caminho do Centro Acadêmico
André da Rocha – CAAR, entidade
representativa dos estudantes de
Direito da Universidade Federal do
Rio Grande do Sul. A Revista foi elaborada com o intuito de valorizar os
trabalhos acadêmicos dos estudantes
de Direito, oferecendo um espaço
para publicação, hoje escasso, principalmente em relação aos estudantes
da graduação.
A gestão Construindo o Cami-
O lançamento da
revista científica dos
estudantes de Direito
da UFRGS marca conquista histórica por
parte do CAAR
nho, logo após a sua posse, começou
a trabalhar para que esse sonho se
concretizasse. Após muita pesquisa,
a revista tornou-se uma realidade
possível. Montou-se um Conselho
Administrativo com participantes da
gestão e estudantes da Faculdade,
que, já no primeiro semestre de 2009,
começou a receber os trabalhos.
No dia 09 de setembro de 2009,
nas dependências da nossa biblioteca,
ocorreu o lançamento da Res Severa
Verum Gaudium. O evento contou
com a presença de autoridades e dos
acadêmicos da Faculdade de Direito,
que lotaram a biblioteca. A cerimônia
marcou também o momento em que
o site da Revista foi disponibilizado
na internet.
Como forma de reconhecimento, foram feitas homenagens às
bibliotecárias Maria da Graça Lima
Conselho Administrativo da revista Res Severa Verum Gaudium em 2009
Corrêa e Celina Leite Miranda, as
toda sua gestão, engrandecer e difundir
quais, cada qual a seu tempo, fizeram a Revista, tornando objetivos os critérios
de seu trabalho uma forma de ende avaliação, aumentando seu Conselho
grandecimento desse local histórico
Editorial e buscando artigos de ilustres
de nossa Faculdade. Foram monprofessores para ampliar sua divulgação
tados também dois quadros com
no meio jurídico. A primeira edição de
reportagens do jornal A Toga que,
2010 contou com um artigo do profespor várias gestões do CAAR, serviu
sor dessa Casa, Dr. Salo de Carvalho.
de veículo para denunciar a precária
Pela primeira vez, o espaço que a
situação da biblioteca e mostrar sua
Revista prevê para prestigiar eventos da
evolução. Um deles foi presenteado
Faculdade de Direito será aproveitado,
à bibliotecária Celina e o outro está
com a 1º Edição do Livro de Resumos
exposto na sede do CAAR.
do Salão de Iniciação Científica da
Em novembro de 2009, a
Faculdade de Direito. Dessa forma, amRevista já contava com duas publica- pliamos e valorizamos o debate jurídico
ções, totalizando 18
oriundo dos estuartigos de alunos da Gestão Concretizando
dantes da graduação,
graduação, pós-gra- Ideias publica a 1ª
ao reunir os resumos
edição do Livro de Reduação e inclusive
de suas pesquisas
de nomes relevantes sumos do Salão de
e divulgá-los para
Iniciação Científica da
do mundo jurídico
toda a comunidade
como o professor
jurídica.
Faculdade de Direito
Dr. Humberto
Outra iniciativa
Theodoro Junior.
inovadora dessa CoA Res Severa Verum Gaudium
ordenação foi convidar os palestrantes
conquistou, ainda no ano de 2009,
da Semana Cultural, realizada, com grano ISSN (2176-3755), que a tornou
de destaque, pela primeira vez esse ano,
uma revista científica reconhecida
para publicar suas palestras na segunda
nacionalmente.
edição da Res Severa Verum Gaudium, que
A gestão Concretizando Ideias
está por vir. Desse modo, esse importanpriorizou, desde seu início, a mete evento ficará documentado.
lhoria da Revista, demonstrado pela
Conheça a revista e tenha acesso
inclusão do cargo Coordenador da
aos trabalhos através do site www.
Revista em sua nominata, de forufrgs.br/ressevera. Participe dessa
ma a centralizar o compromisso de
construção, envie você também seu
melhora da mesma. Buscou, durante
artigo para publicação.
Artigos publicados na
última edição:
SUBSTITUTIVOS PENAIS NA ERA
DO GRANDE ENCARCERAMENTO
Salo de Carvalho
A TUTELA JURÍDICA DO
PATRIMÔNIO CULTURAL
BRASILEIRO
Chiavelli Facenda Falavigno
A PRIVATIZAÇÃO DOS PRESÍDIOS
COMO ALTERNATIVA AO CAOS
PRISIONAL
Fábio Maia Ostermann
A DIRETIVA DO RETORNO NO
CONTEXTO DAS POLÍTICAS
MIGRATÓRIAS CONTEMPORÂNEAS
Ana Paula da Cunha
O MANDADO DE SEGURANÇA
COLETIVO: DA LACUNA NO DIREITO POSITIVO À SEGURANÇA
JURÍDICA
Nathalie Kuczura Nedel
Tatiana Dibi Schvarcz
O CONTRATO DE MANDATO COMO
PROCESSO: Ensaio sobre o princípio da boa-fé objetiva e sua aplicação no contrato de mandato do
Código Civil de 2002
Bruno Hermes Leal
O PENSAMENTO DE JAMES BOYD
WHITE E A LINGUAGEM COMO O
CERNE DA ATIVIDADE JURÍDICA
Laila Maia Galvão
OS DIREITOS SEXUAIS MEDIANTE
O DIÁLOGO COM OS DIREITOS
HUMANOS: DESAFIOS E PERSPECTIVAS
Luana Borba Iserhard
O site da Revista foi inaugurado durante a cerimônia de lançamento, que lotou a Biblioteca da Faculdade de Direito em setembro de 2009
A TOGA - Dezembro de 2010
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CONTRAPONTO
Aplicação da lei da ficha limpa divide STF e opiniões
Lei da denominada ficha limpa ou
ficha suja
Em defesa da ficha limpa
• MARCO AURÉLIO MOREIRA DE OLIVEIRA
• EDUARDO K. M. CARRION
Professor e desembargador aposentado
Professor Titular de Direito Constitucional e ex-diretor da Faculdade de Direito da UFRGS
No dia 27 de outubro
deste ano de 2010, o Supremo
Tribunal Federal julgou recurso
interposto por político eleito
para o Senado da República em
que postulava o reconhecimento da inaplicabilidade, para as
eleições deste ano, da Lei Complementar nº 135 que inovava
matérias referentes a casos de
inelegibilidade de candidatos a
postos eletivos.
A decisão de nossa corte
maior, destinada a reconhecer
matéria constitucional, acabou com igualdade de votos
conflitantes, cinco a cinco,
pois a décima primeira vaga do
Supremo não estava preenchida, como cabia, por indicação
do Sr. Presidente da República,
disso decorrente o empate nos
dez votos proferidos. Assim, o
STF não decidiu nem a favor
nem contra a aplicabilidade
dessa lei complementar. Após
a proclamação do resultado,
entendeu a maioria, ante a falta
de solução no seio do STF,
manter a decisão do TSE que,
por maioria, acolhera a aplicabilidade da lei nas eleições
deste ano.
A posição pela inaplicabilidade
da Lei Complementar nº 135
decorria do disposto no art. 16
da Constituição Federal que
determinava a aplicabilidade de
lei nova apenas para eleições
que se ferissem além de um
ano, contado de sua entrada
em vigor. Assim, decidiram
cinco ministros do Supremo,
por entenderem vigente esse
período (a lei vigorara a contar
do dia 6/06/2010), pois incidia, no caso, a condição de a lei
nova “alterar o processo eleitoral”. Sem dúvida, em nosso
entendimento, a referida lei
complementar alterava profun-
Com respeito à denominada Lei da
Ficha Limpa (Lei Complementar nº 135
de 04/06/10, que alterou a Lei Complementar nº 64 de 18/05/90, a chamada Lei
das Inelegibilidades), parece ter finalmente prevalecido o interesse público à
moralidade eleitoral.
Antes de tudo, o STF afirmou, por
larga maioria, a constitucionalidade das
alterações introduzidas pela nova lei.
Dividiu-se o Pleno, entretanto e sobretudo, com relação à constitucionalidade ou
não da aplicação da lei já nas eleições de
2010 e também para casos pretéritos, ou
seja, para fatos ocorridos anteriormente à
sua promulgação. Em face do empate na
deliberação do STF, passou a prevalecer,
pelo momento, a convicção majoritária do
TSE, exatamente pela constitucionalidade
da aplicação da lei em ambas as hipóteses.
Mesmo antes da decisão judicial, a
Lei da Ficha Limpa já vinha produzindo efeitos. Muitos possíveis candidatos
haviam pura e simplesmente desistido
da disputa eleitoral, em consequência do
novo regramento. Mesmo também que a
decisão tivesse sido adversa com relação a
sua aplicação imediata e a fatos pretéritos,
a lei já representaria um grande avanço
institucional.
Era de se esperar que os partidos
políticos exercessem um efetivo papel
de seleção qualificada de seus candidatos
a cargos eletivos. Dispensando, assim, a
necessidade de uma legislação restritiva.
A omissão dos partidos nesse particular
levou, em grande parte, à inevitabilidade
da lei. Chame-se a atenção, porém, para o
fato de ter se tratado de um projeto de lei
de iniciativa popular, nos termos de previsão constitucional (Artigo 61, “caput”
e § 2º). Esse mecanismo de democracia
direta, de participação popular cidadã,
favoreceu a aprovação da lei, em face das
resistências corporativas.
damente o processo eleitoral, dispondo
sobre novos casos de inelegibilidade,
bem como por haver alterado, para mais,
prazos de inelegibilidade. Ademais, a Lei
Complementar nº 95 já dispunha sobre
a necessidade de serem as leis especiais
submetidas a um maior prazo de vacatio,
a fim de se permitir um tempo razoável para o exame de suas condições de
validade.
Além disso, o fato sobre o qual se
discutia a restrição imposta pela lei nova
(ocorrido no longínquo ano de 2001),
não apresentava nenhuma ilicitude ao
tempo de seu “cometimento”, não
podendo, pois, em relação ao fato velho
incidir norma nova, qualificada como
restritiva de direito; notadamente, em
se tratando de direito de cidadania, a
restrição não prevista ao tempo do fato
não podia aplicar-se retroativamente. As restrições a direitos de cidadãos são
incompatíveis com a principiologia de
nossa Constituição, pois afetam o direito
à segurança jurídica.
O argumento de que a lei fora
aprovada em decorrência de iniciativa
popular, pois participou da proposta
legislativa mais de um milhão e oitocentas mil pessoas, em nada pode validar
uma lei com vício de inconstitucionalidade. Se a iniciativa popular fosse
bastante para sanar uma lei, bastaria que
se imaginasse essa iniciativa em favor da
pena de morte, da prisão perpétua ou de
abolição da norma proibitiva de tortura.
Toda e qualquer lei, sobre a qual se argua
inconstitucionalidade, deve ser submetida, no sistema de exame concentrado de
constitucionalidade, ao julgamento por
nosso Tribunal Constitucional.
Nas últimas décadas, desde a redemocratização, houve
inúmeros avanços: antes de
tudo a estabilidade democrática ou, finalmente, a consolidação democrática; também
a estabilidade econômica,
outorgando maior previsibilidade ao processo econômico e
favorecendo os investimentos.
Em decorrência da estabilidade econômica, passaram a
fazer parte da agenda política
projetos de desenvolvimento,
seja no âmbito nacional seja
no plano regional. Um grande
avanço está representado pelo
fato de a agenda social ter sido
definitivamente incorporada
em nossa realidade. Fica ainda
em aberto a equação ambiental,
como problema a ser efetivamente enfrentado.
Talvez um dos problemas mais persistentes e que
dificultam ou impedem nossa
maioridade como nação moderna e civilizada seja o “déficit
republicano”. Não só a corrupção, mas também a incúria
e a ineficiência na utilização
dos recursos públicos, que
comprometem a agenda social
e, em grande parte, hipotecam
nosso futuro, além de atingirem
as bases da sociabilidade. A denominada Lei da Ficha Limpa
pode seguramente contribuir
para a superação do “déficit
republicano”.
6
A TOGA - Dezembro de 2010
MOVIMENTO ESTUDANTIL
Interstícios:
• THIAGO AGUIAR SIMIM
movimentos estudantis
e partidos políticos
Acadêmico do 10º semestre de Direito da UFMG
e bolsista FAPEMIG de iniciação científica
Algumas das atuais relações entre os movimentos estudantis e os partidos políticos
criaram um problema nas finalidades e na atuação do movimento estudantil. O artigo
pretende analisar este problema
através da nuance criada nos
espaços que tradicionalmente
são ocupados pelo movimento estudantil na esfera pública.
Partir-se-á da análise dos movimentos estudantil enquanto um
movimento social, para traçar
de forma geral a sua configuração e papel na esfera pública.
O conceito de movimento
social está em constante debate, mas, para que se tenha uma
compreensão geral do que se
trata, é importante evocar as
definições de alguns autores.
Maria da Glória Gohn define movimentos sociais como
ações sociopolíticas construídas por atores coletivos
de diferentes classes sociais,
numa conjuntura específica
de relações de força na sociedade civil (GOHN, 2004).
Para Ilse Scherer-Warren os
movimentos sociais ainda podem ser definidos como ação
grupal para a transformação,
voltada para a realização dos
mesmos objetivos, sob orientação mais ou menos consciente de princípios valorativos comuns (ideologia) e sob
a organização diretiva mais ou
menos definida (a organização
e sua direção) (GOHN, 2004).
Friedmann define movimento
social a partir do conceito de
auto-organização e da busca
da emancipação. Já para Alain
Touraine “os movimentos sociais pertencem aos processos
pelos quais uma sociedade cria
a sua organização a partir do
seu sistema de ação histórica,
através dos conflitos de classe e dos acordos políticos”
(BOBBIO, 1998, p. 789). O
dicionário de política de Norberto Bobbio, Nicola Matteucci e Ginfranco Pasquino
traz uma definição razoável
para os movimentos sociais:
Referências
[O]s comportamentos coletivos
e os movimentos sociais constituem tentativas, fundadas num
conjunto de valores comuns, destinadas a definir as formas de ação
social e a influir nos seus resultados. Comportamentos coletivos
e Movimentos sociais se distinguem pelo grau e pelo tipo de mudança que pretendem provocar
no sistema, e pelos valores e nível
de integração que lhes são intrínsecos (BOBBIO, 1998, p.789).
Pensando na idéia de que
os movimentos sociais devem
ter identidade, um problema comum e um projeto, a identidade
que haveria no movimento estudantil é a própria condição de
estudante, seja no movimento
secundarista ou os de universidades, seja daqueles que representam um especifico grupo
de estudante em determinada
região – como são os Centros
Acadêmicos – ou daqueles que
representam os estudantes dos
mais diversos cursos em um território vasto – como é a União
Nacional dos Estudantes.
Essa identidade pautada
na condição de estudante é que
traz demandas comuns tanto
dentro da estrutura das instituições de ensino, quanto fora
dela. As escolas e universidades
nunca foram os limites da atuação dos movimentos estudantis, que se envolve em diversas
causas e tensões sociais ligadas
à luta pela democracia, por
exemplo, como ocorreu no fim
do regime de ditadura militar
no Brasil, na década de 80. Em
1992 houve uma ampla atuação
do estudante e do movimento
estudantil no processo de impeachment do então presidente Fernando Collor. A atuação
política estudantil não acabou,
mas se voltou a questões mais
pontuais e a problemas locais.
Os movimentos sociais
têm em vista a emancipação,
são sustentados por uma cole-
tividade autônoma e se ligam
objetivos particularistas. Já a
política partidária têm em vista
a representação, atuam no institucionalismo estatal, devendo
praticar uma política universalista1. Entre partidos políticos e
movimentos sociais o ideal, portanto, é que haja uma distância.
Fato é que hoje o que há
é uma grande aproximação dos
movimentos estudantis aos
partidos políticos, principalmente nos movimentos mais
amplos de representação estudantil – Diretórios Centrais,
Uniões Estatuais de Estudantes e a própria União Nacional
dos Estudantes. E essa aproximação traz os problemas
que serão apontados abaixo.
Os movimentos sociais podem levantar as mesmas bandeiras e combater os mesmo problemas que os partidos políticos,
mas os meios utilizados devem
ser distintos. A finalidade de
um partido político é adentrar
na estrutura do poder estatal,
alcançando seus objetivos pela
implementação de políticas, planos de governo, pela atividade
legislativa e outras formas que
constituem o governo. Eles almejam, portanto, participar da
tomada de decisões políticas.
Por outro lado, os movimentos sociais têm objetivos
específicos ligados à sua luta,
mas que se situam sempre em
oposição ao Estado ou a uma situação social. “O projeto de um
movimento social não se define
pelo horizonte para onde avan-
AZEVEDO, Paulo Roberto. A Democracia
Comunicativa: uma exposição da idéia de
democracia em Jürgen Habermas a partir da
análise dos volumes da obra ‘Direito e De-
mocracia, entre facticidade e a validade’. In:
Tempo da Ciência (14) 27:135-156, 2007.
BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Ginfranco. Dicionário de
ça, mas pela sua capacidade de
repelir toda a ordem social e de
ser o instrumento das dialéticas
da ação histórica.” (TOURAINE, 1975 apud BOBBIO, 1998,
p.790). Ele exerce seu papel sem
ultrapassar a fronteira que há
entre a periferia e o centro da
esfera pública. Os movimentos
sociais, estando na periferia do
poder político, têm como papel
a produção de debates, opiniões e a reivindicação, trazendo
uma tensão, mas não atuam na
decisão política. São para Niklas Luhmann como “os cães
que latem”. Sobre a esfera pública tem-se a seguinte noção:
Habermas define tal esfera (pública) como uma rede comunicativa que é formada por – ao
mesmo tempo que possibilita
– um cruzamento de discursos
justificados por razões. Trata-se
de uma instância de choque de
argumentos em público, sendo
que a publicidade deve garantir
não apenas a circulação desses
argumentos, mas também o seu
escrutínio de modo que prevaleça a força do melhor argumento.
Concretizada em várias arenas
temáticas que se atravessam, a esfera pública é o locus em que se
processa o bem comum e o esclarecimento recíproco dos cidadãos
(MENDONÇA, 2007, p.131).
Política. 11°ed. Brasília: Editora UNB, 1998.
GOHN, Maria da Glória. Teoria dos movimentos sociais: paradigmas clássicos e contemporâneos. 4°ed.
A decisão política é realizada no centro da esfera pública,
pelo agentes do governo, sendo
o principal objetivo de um partido político a participação nesse processo de decisão. A noção
desses fluxos entre o centro e a
periferia, que se remete a uma
concepção habermasiana, mostra que essa comunicação deve
haver, mas a tendência é que o
centro se feche, para que a decisão ocorra com mais facilidade
e sem percepção da produção
de demanda da periferia. O fluxo entre periferia e centro do
poder sofre restrição também
quando há esse relacionamento estreito entre os movimentos e os partidos. Substitui-se
o fluxo por uma continuidade.
São Paulo: Edições Loyola, 2004.
GOSS, Karine Pereira; PRUDENCIO, Kelly. O conceito de movimentos sociais revisitado. In: Revista Ele
A TOGA - Dezembro de 2010
7
Este é o primeiro interstício que se pretende apontar: o
espaço vazio que deveria haver
entre os partidos políticos e os
movimentos estudantis. Esse
espaço é preenchido pela relação promiscua entre eles e faz
com que não exista, entre centro e periferia, uma descontinuidade necessária para o funcionamento e processamento
das opiniões e das decisões. A
fundo cria-se de um problema
na distinção entre Estado e Sociedade Civil – não na concepção tradicional de que o Estado
está na esfera pública e a Sociedade Civil está na esfera privada, mas na compreensão de que
a Sociedade Civil também participa da esfera pública, na for-
ma dos fluxos de comunicação
entre centro e periferia, como já
comentado acima. Esse problema criado na distinção entre esses dois lados da esfera pública
acontece justamente por causa
do vício na intermediação realizada pelos partidos políticos.
A atuação do movimento
estudantil como uma antítese
deixa de existir e, em lugar de
uma síntese, tem-se a supressão de uma demanda social pela
vontade e projeto de um partido político. Os movimentos
estudantis que se relacionam
nessa intensidade com os partidos políticos já não se importam mais com o segmento que
representa, pois se tornaram
um braço do próprio partido.
Essas relações são permeadas normalmente, por trocas de favores: para o partido
trata-se de uma maneira de angariar pessoal e votos em seu
benefício e para os movimentos estudantis é uma maneira
de conseguir financiamentos e
verbas, normalmente desviadas
das finalidades a que se prestam
esses movimentos, mas que trazem benefícios diretamente aos
atores deles. A troca de favores,
na verdade, é entre os partidos
políticos e os atores dos movimentos estudantis, pois os movimentos propriamente ditos
se tornam somente um instrumento na mão desses partidos.
Assim aparece o segundo
interstício aqui apontado, o que
não deveria haver, qual seja: o
intervalo que se abre na representação dos movimentos estudantis. A relação viciada entre
eles e os partidos políticos leva
a uma distância entre os interesses do segmento estudantil
e a real atuação dos movimentos através de seus atores. Eles
passam a se atrelar aos objetivos
pessoais e dos partidos políticos, deixando de lado a representação estudantil. O prejuízo
ocorre inclusive na atuação do
movimento estudantil nas questões internas das instituições de
ensino. Os interesses estudantis
não chegam à esfera pública,
que é o locus do discurso público, pois quem deveria representá-los no debate não está
vinculado àqueles objetivos.
O problema aqui apontado ocorre principalmente em
razão da percepção pelos partidos políticos das lideranças
carismáticas nos movimentos
estudantis. Os partidos tentam
se apropriar dessas lideranças
carismáticas ou construí-las
nos movimentos estudantis,
dando a elas um cargo ou a
possibilidade de vida política
no partido em troca dos votos
que aquela liderança carismática pode trazer, juntamente com
a possibilidade de utilizar do
movimento como extensão de
sua atuação política partidária.
A cooptação que ocorre
nos movimentos estudantis pelos partidos políticos traz para a
discussão a questão da liderança
carismática, como um problema central. Esse problema da
liderança carismática existe em
menor escala no movimento
estudantil, até mesmo pela rotatividade que há dos seus atores,
mas não deixa de ser um problema da estrutura do movimento.
A liderança leva, por vezes, ao
deslumbramento com o poder
e torna o movimento um alvo
fácil de cooptação. Este é um
dos desafios atuais dos movimentos sociais como um todo.
Deve-se admitir que o desvio dos objetivos dos representados em relação às ações do
representante é um problema
da própria representação – seja
ela vista como delegação, como
uma relação de confiança ou
até mesmo como um espelho
da vontade dos representados
– e tem relação também com
a institucionalização do movimento social. Mas esse é outro
desafio que também não diz
respeito somente aos movimentos estudantis, mas de todos os
movimentos sociais institucionalizados: a solução deve vir de
dentro dos próprios movimentos, a partir de uma mudança
estrutural que vise, entre outras
coisas, relações mais democráticas entre eles, para que o movimento não tenha a cara somente de um ou poucos indivíduos.
É em razão dessa liderança que aparece o ultimo interstício aqui apontado: o da visão
de que o movimento estudantil
é o intervalo, ou a escada para
se chegar a uma vida política.
Como se do início da atuação
no movimento estudantil até a
entrada na vida política ligada
aos partidos políticos houvesse apenas um lapso temporal.
A atuação no movimento estudantil seria um degrau da escada para se chegar à política.
O interstício nesse caso é o
próprio movimento estudantil.
Justamente porque os partidos políticos se utilizam dos
movimentos estudantis como
estratégia política é que muitos
vêem neles uma porta aberta de
entrada para os partidos políticos e, por conseguinte, para a
estrutura estatal. Não convêm
aqui, citar os exemplos de políticos que se utilizaram dos movimentos estudantis em prol de
um partido político ou para a
promoção de sua imagem pessoal, adentrando posteriormente em uma vida pública, através
de cargos eletivos ou não. Isso
ocorreu e até hoje ocorre com
freqüência, o que trouxe uma
visão pejorativa do atores que
atuam no movimento estudantil.
Concluindo, a utilização
dos movimentos estudantis
pelos partidos políticos como
estratégia de se angariar votos
acaba com um espaço que há
entre um e outro, que deveria
ser vago, mas é completado nessa proximidade. Retira-se, pois,
um interstício que deveria haver
entre movimentos estudantis
e partidos políticos, quando
se acaba com essa distância e
uma relação estreita é criada, o
que confunde inclusive a atuação de um com a de outro nos
seus diferentes modos de agir:
o movimento estudantil parece
um representante do partido
político no lugar em que atua,
seja pelo financiamento que
recebe, seja pelas trocas de favores políticos. Ao mesmo tempo, cria-se um interstício, um
espaço vago na representação
estudantil, que não deveria haver tendo em vista o sentido do
instituto da representação. E,
por fim, o movimento social se
torna o próprio interstício para
a entrada no centro do poder.
trônica dos Pós-Graduandos em Sociologia Política da UFSC, vol. 2, nº
1 (2), janeiro-julho 2004, p. 75-91.
MENDES JÚNIOR, Antônio. Mo-
vimento estudantil no Brasil. 2°
ed. São Paulo: Brasiliense, 1982.
MENDONÇA, Ricardo Fabrino. Movimentos sociais como acontecimen-
tos: linguagem e espaço público. In: Lua
Nova, São Paulo, 72: 115-142, 2007.
REPOLÊS,
Maria
Fernanda.
Habermas e a desobediência civil. Belo
Horizonte:
Mandamentos,
2003.
SANTOS, Boaventura de Sousa. Pela mão
de Alice: o social e o político na pós-modernidade. 12° Ed. São Paulo: Cortez, 2008.
SCHERER-WARREN, Ilse; KRISCHKE,
Paulo J.(orgs). Uma revolução no cotidiano?
Os novos movimentos sociais na América
Latina. São Paulo: Editora brasiliense, 1987.
8
A TOGA - Dezembro de 2010
ESPECIAL
História para contar
Por fora, a construção que abriga a Faculdade de Direito da UFRGS é a mesma, hoje mais
discreta atrás de árvores crescidas. Por dentro,
mudanças percorreram os corredores com as
cerca de 100 turmas de estudantes, desde 1910.
• NATHALIA BEDUHN SCHNEIDER
O prédio em que hoje
assistimos às aulas do curso de
Ciências Jurídicas e Sociais da
UFRGS foi inspirado no Palais du Rhin, casa de verão do
Imperador Guilherme II da
Alemanha, da cidade de Estrasburgo, França. Sua construção
teve início em 13 de junho
de 1908; dois anos e um mês
depois, em 15 de julho de 1910,
teve sua obra concluída, quando
seu engenheiro responsável,
Rodolpho Ahrons, entregou o
prédio pronto para o funcionamento da Faculdade.
Até então, as aulas da Faculdade Livre de Direito eram
lecionadas em salas cedidas
pelo Estado, na antiga Escola
Normal, Liceu Dom Afonso,
na esquina da Rua Duque de
Caxias com a Rua Marechal Floriano. Com grande incentivo do
diretor da época, Manoel André
da Rocha, para a construção
de sede própria, a Faculdade
estava, agora, em sua casa para
sempre.
O prédio, que foi pago
com auxílios, doações e participação dos professores com
parte de seus vencimentos, foi
construído em terrenos cedidos
pelo Estado. Todo o espaço requerido tinha como destino não
apenas um prédio com salas
de aula e com biblioteca, mas
também um espaço para comodidade e recreio dos alunos,
bem como para o jardim.
De 1910 a 1985, o prédio
sofreu aumentos complementares e obras de conservação,
como a substituição de todo o
telhado e a repintura interna
de todo o prédio, em 1919. A
ampliação do prédio, estendendo a construção para o lado
leste, onde encontramos hoje
o Salão Nobre e a Biblioteca,
foi planejada e construída em
1951.
A partir de 1954, o “Castelinho” foi remodelado. Em
1959, foram inaugurados, na
parte térrea, o espaço do Centro
Acadêmico André da Rocha, o
Bar e as salas do SAJU.
Em 2000, houve a restauração das pinturas decorativas
dos tetos e paredes internas
e dos vitrais. Em 2002, com
a lei 8.313/91 – que institui o
Programa Nacional de Apoio
à Cultura (Pronac) –, e a Lei de
Incentivo à Cultura do RS, foi
iniciada a restauração completa
da “Casa do Velho André”,
finalizada em 2005.
Acervo Museu da UFRGS
Acadêmica do 3º ano manhã
Tatata Pimentel
estas “face to face” com presa maior me aguardaria. O
o arguidor. Uma tradução nível dos professores. Todos
sem dicionário deveria ser eram sumidades jurídica, culAluno de 1960 a 1964
Comunicador e professor, apresenta o feita pelo candidato de uma turais e filosóficas. O escritor
passagem da Eneida de consagrado Darcy Azambuja
programa “Gente da noite”
Virgílio, e para a literatura dava aula com uma humilda“No princípio dos anos 60
latina, um ponto sorteado de impressionante. Leitão de
estava eu com o segundo grau
com cartões ensebados e Abreu com toda sua sapiência
completo no Júlio de Castilhos
numerados retirados de um jurídica esta sempre acessível.
e deveria fazer um vestibular.
saquinho mais ensebado Elpídio Paes era o terror dos
Como venho de família de proainda. Depois da tradução alunos, no direto romano as
fessores e de leitores, escolhi o
me veio a literatura Ovídio, leis eram escritas no quadroCurso de Letras Neolatinas da eno autor que eu mais havia -negro em latim e com uma
tão URGS. Fatalmente seria prolido e que conhecia mui- caligrafia que data de século
fessor. A única possibilidade era
to. Aprovação. Festa com de Augusto. Edgar Schneider
realizar junto com o vestibular de
no curso de finanLetras e o de Direito, pois a banca
ças tratava os aluPrimo francês (ou alemão?)
“Aulas começam em um
e os conteúdos eram os mesmos.
ambiente assustador, um pé nos como iguais,
Herança prussiana
mudou de nacionalidaNum terrível verão lá ia eu de fadireito imenso e, nas paredes, Ruy Cirne Lima e
da época em que a atual
de após o Tratado de
tiota completa e gravata também.
seu charuto eterquadros de formaturas dos
Alemanha dominou a reVersalhes, ganhando
Alguns milhares de candidatos
namente apagado
últimos 50 anos”
gião da Alsácia-Lorena,
o nome francês Palais
se aglomeravam em uma sala
pontificava, e por
o Kaiserpalast (Palácio
du Rhin (Palácio do
sem ventilador. Literatura, língua
fim, na filosofia
do Kaiser) têm história.
os colegas do Júlio. Aulas do direito, Armando Câmara,
Reno), para finalmente
portuguesa, francês e inglês não
Foi concluído em 1888
começam em um ambien- que perguntava aos alunos em
servir de escritório da
me assustavam. MAS (com letras
para abrigar o imperador
te assustador, um pé direi- língua que queriam a aula: laComissão Central de
maiúsculas) era o Latim com Elalemão Guilherme II,
to imenso e, nas paredes, tim alemão, francês ou inglês.
Navegação no Reno,
pídio Ferreira Paes, já quase mitoserviu de hospital militar
quadros de formatura dos
função que exerce no
lógico pela exigência nos exames.
Todos estes professores
na I Guerra Mundial,
últimos 50 anos. Todas as eram o que se ainda diz hoje
momento.
As provas eram escritas e orais,
alegorias possíveis fundi- sumidades. Todos donos de
Mariana Lenz
Guilherme Seibert
das em bronze: A Justiça um saber enciclopédico, com
de olhos sempre vendados, livros publicados e atuantes
Fé, Esperança, Caridade e políticos no Estado. Se não
outras crendices maiores.
me tornei um advogado é que
Nunca havia eu pen- ser professor tinha um apelo
sado em carreira jurídica, mais alto, mas convivi com
não havia nenhum advo- o fim de uma época onde os
gado sequer na família nos professores sabiam tudo. E
últimos cem anos. O que é neles que me espelhei para
era um curso de Direito? ser durante 40 anos profesEu estava ali para ter uma sor. Acertei na escolha. Não
chance de entrar na Uni- podia querer o mundo, fiquei
versidade. De guloso passei com a literatura. Os professonos dois vestibulares e a fa- res da Faculdade de Direito
mília exigiu que cursasse as me mostraram o caminho: De
João Pessoa, nº 80, Porto Alegre, Brasil
Place de la République, nº 2, Estrasburgo.
duas faculdades. Uma sur- um pouco entendas tudo.”
A TOGA - Dezembro de 2010
9
Nico Fagundes
Aluno de 1960 a 1965
Poeta e compositor tradicionalista, apresenta o Galpão Crioulo
com a gente.
O CTG se tornou tão importante na época, tão famoso,
“(...) tive a ideia de
criar, onde ficava o
Centro Acadêmico
André da Rocha, um
CTG, que chamamos
de CTG Galpão Universitário”
que conseguimos realizar, no
Salão de Atos da Reitoria, o
2º Congresso Internacional de
Tradicionalismo, em 1962. Vieram a Porto Alegre grandes nomes, companheiros da Argentina, do Uruguai, CTGs de todo
o Brasil e, é claro, de todo o Rio
Grande do Sul. As prendas mais
bonitas foram duas das nossas
colegas de turma do Direito.
Esse evento ficou na memória
daqueles alunos que fizeram
com que ele acontecesse, mas
as nossas reuniões mesmo, de
todos os dias, aconteciam no
porão dessa Faculdade. Tempos
maravilhosos aqueles.”
Acervo Museu da UFRGS
“Entrei na Faculdade de Direito da UFRGS
em 1960, no primeiro vestibular que fiz. Comigo
ingressaram muitos tradicionalistas, colegas que
vinham da Campanha, do
interior do Estado. Companheiros de bombacha.
Foi a partir desse encontro que tive a ideia de criar,
no porão da Faculdade,
onde ficava o Centro Acadêmico André da Rocha,
um CTG, que chamamos
de CTG Galpão Universitário. Lá tivemos reuniões
belíssimas, em que foram
discutidas teses importantes para o tradicionalismo.
Acima de tudo, porém,
eram tardes de canção e
poesia entre amigos. Cheguei a ensaiar muito por
lá. Entre os participantes,
estava o professor Darcy
de Azambuja, nosso ídolo, amigo e padrinho do
CTG. Até o reitor da
Universidade, Dr. Eliseu
Paglioli, comparecia para
tomar cachaça e conversar
Estacionamento da Faculdade de Direito na decáda de 80, em frente à atual entrada mais utilizada.
Sérgio José Porto
Aluno de 1965 a 1970
Direito da Faculdade de Direito
da UFRGS
O período em que estudei na Faculdade de Direito da
UFRGS coincidiu com o auge
da ditadura militar, que começou com o golpe militar de 64.
Era um período extremamente
difícil, porque havia se institucionalizado uma violência de
estado, onde todos os oponentes do regime, todos que
criticavam a quebra da ordem
constitucional, eram considerados inimigos, e não apenas
adversários.
Havia os que se opunham
ao regime mediante palavras
(mas não havia liberdade de
expressão); outro resolveram
se opor mediante a luta armada. Estes eram alguns poucos,
porque o próprio presidente
deposto – e esta Faculdade
teve dois ex-alunos presidentes depostos (Getúlio Vargas
e João Goulart) –, Jango, havia
pedido publicamente que não
houvesse resistência armada.
Além disso, é preciso convir que a maioria da população
era a favor do golpe militar,
porque temia o que nós chamávamos de “reformas de base”.
Pichações na fachada da Faculdade de Direito evidenciam ebulição
política durante o ano de 1986, período imediatamente após o final da
ditadura militar, em que foram conduzidas eleições para governadores,
deputados estaduais e deputados federais constituintes, estes últimos
responsáveis pela elaboração da Constituição de 1988.
Acervo Museu da UFRGS
Acervo Museu da UFRGS
Se as paredes falassem...
que nós, estudantes da turma
de 1970, aqui vivemos durante
5 anos.
No campo jurídico propriamente dito (por razões
óbvias), prevalecia a Teoria
Pura do Direito de Kelsen,
que reduzia os estudos jurídicos à análise das normas
jurídicas, independentemente
de suas razões históricas e de
sua valoração jurídica. Prevalecia, também pelas mesmas
razões, o que se chama de “a
jurisprudência dos conceitos”
ou Pandectística, que consiste
na análise e na depuração dos
conceitos jurídicos, de modo a
aproximar o direito das ciências físico-matemáticas.
Os expoentes desta doutrina eram os autores alemães
do século XIX e, entre nós,
resplendia a figura
de Pontes de MiDitadura militar: “Foi nesse
randa.
clima de completa escuridão
Com
essa
que nós, estudantes da turma
orientação
predode 1970, aqui vivemos durante
minante, toda a
5 anos”.
discussão política
era naturalmente
afastada, independentemente
Ato Institucional nº 5), que
da repressão.
fechara o Congresso NacioO estudo do direito era
nal, entre outras incontáveis
puramente normativo, sem
arbitrariedades. Foi nesse
nenhuma análise crítica.
clima de completa escuridão
Essas reformas de base, se
tivessem sido feitas à época,
teriam como resultado um
país diferente daquele que
nos foi entregue em 85, mais
precisamente em 88 (uma
vez que estes períodos se
contam por Constituições),
que se caracterizava pela
corrupção, pelo empreguismo (basta dizer que Paulo
Maluf era o candidato da
ARENA), por uma inflação
incontrolável, dívida externa
impagável e uma desigualdade social inencontrável em
outros países do mundo civilizado.
Os períodos mais violentos da repressão política
se verificaram justamente
em 64 (com o Ato Institucional nº 1) e em 68 (com o
A TOGA - Dezembro de 2010
10
ESPECIAL
ENTREVISTA
Fausto de Sanctis
Prédio
passou por
reformas
ao longo
dos anos
• GUSTAVO SANSEVERINO
Acadêmico do 1º ano manhã
Aluno de 2002 a 2006
Advogado, mestrando em Direito
Privado pelo PPGD/UFRGS, expresidente do CAAR na gestão
de 2006
O bar, hoje com entrada embaixo da escada que dá acesso ao primeiro
andar, estava localizado no atual espaço da Biblioteca da ONU
A execução da reforma
teve início em 2004, com obras
de recuperação estrutural e da
fachada do prédio ao longo do
primeiro semestre. No segundo
semestre do mesmo ano, foi necessário o deslocamento de todos os estudantes para salas fora
do prédio histórico. Aliás, não
só as turmas saíram do prédio,
como também o antigo bar (no
espaço que hoje é ocupado pela
Biblioteca da ONU) e o SAJU,
que passou a utilizar o espaço
junto ao Posto do JEC na Faculdade de Economia; a biblioteca permaneceu fechada (!); e
a secretaria e os departamentos
passaram a (realmente) funcio-
no Anexo I da Reitoria
e na cúpula do Instituto
Parobé, onde funciona a
Faculdade de Engenharia
Mecânica. É bem verdade que, ante a precariedade das estruturas, não
raras vezes víamos aulas
nos corredores do prédio da Escola Técnica, ou
no pátio da Faculdade de
Direito; algumas provas
eram aplicadas no Salão
Nobre, pois era o único
local em que se podia alocar uma turma completa.
No primeiro semestre de 2005, o prédio foi
devolvido aos estudantes e à comunidade,
ainda sem a abertura
“(...) havia a previsão de
da biblioteca (o que
redução do espaço do
ocorreu apenas após
SAJU à metade (pois a
mais de 1 ano de seu
outra seria destinada à
fechamento – e que
construção de banheiros
foi devidamente copara os funcionários), bem memorado na ocacomo a retirada de uma
sião). No entanto,
das salas de aula”
o retorno ao prédio
demonstrou que tão
nar na Sala Alberto Pasqualini. somente a estrutura haAs aulas foram ministradas nas via sido reformada, pois
minúsculas salas localizadas no a história da centenária
antigo prédio da Escola Técni- faculdade – e seus conheca, que ficava atrás da Faculda- cidos problemas – conde de Economia e foi recente- tinuam na memória de
mente derrubado, bem como todos...
Mariana Lenz
Espaço do CAAR já foi bem diferente. Na foto acima, uma porta o
separa do pátio; à direita, a porta deu lugar a uma janela.
algemas pode nos proporcionar
uma satisfação imediata de justiça,
mas temos de considerar sempre
as vias da legalidade para a apuração dos fatos que conduzirão
ao julgamento do caso. Boa parte
da opinião pública brasileira admirou a firme e corajosa atuação
de De Sanctis em processos de
grande repercussão. No entanto,
a completa adesão do magistrado
às apurações policiais, forjando a
figura do “juiz-investigador”, e o
descumprimento de decisão do
STF provocaram questionamentos a respeito da imparcialidade
de algumas decisões. Possíveis
divergências não excluem a importância de Fausto de Sanctis no
atual cenário jurídico do Brasil,
pois seus posicionamentos recrudesceram o debate a respeito da
independência do Judiciário e do
papel do juiz em casos com um
amplo impacto na sociedade brasileira.
Qual o seu conceito de justiça?
Acredito que justiça seja bom-senso. É
a capacidade de vislumbrar com quem
está a razão. Não basta a erudição, o
apego à jurisdição e à doutrina, ou seja,
o teorismo. Todos esses são elementos
válidos, obviamente, mas a justiça só
se faz com a sensibilidade dos fatos.
Assim, justiça se referindo aos que
são julgados pelo juiz que utiliza sua
sensibilidade para saber com quem
está a razão.
assim por diante. Ou seja, cada
um tem um papel relevante para
fazer uma sociedade melhor. Foi
nesse sentido que eu falei que eu,
na minha qualidade de juiz, tenho
um papel relevante na história
e para o aperfeiçoamento da
comunidade.
Por que o senhor considera que
a investigação tradicional não é
suficiente para combater crimes
econômicos?
Bom, não sou só eu quem considera.
Existe uma compreensão mundial de
que para combater a nova criminalidade – essa que se vale de recursos
tecnológicos, de subterfúgios e profissionais qualificados – não há como
chegar a sua revelação apenas com o
uso de um inquérito que foi utilizado
no passado. Sendo assim, a utilização
de técnicas especiais de investigação é
recomendada mundialmente, pois sem
eles não chegamos a lugar nenhum.
Museu da UFRGS
A reforma do prédio histórico da Faculdade de Direito
era uma necessidade vislumbrada há algum tempo e realizada
após a obtenção do patrocínio
necessário através da campanha
de resgate do patrimônio histórico da UFRGS. Em que pese a
elaboração do projeto original
de reforma não ter contado com
a participação dos estudantes, a
pró-atividade destes foi essencial para que não fossem perdidos espaços conquistados há
décadas. Isso porque, no projeto original apresentado ao final
do ano de 2003 pela Comissão
de Reforma – já aprovado para
execução – havia previsão de
redução do espaço do SAJU
à metade (pois a outra metade
seria destinada à construção
de banheiros para os funcionários), bem como a retirada de
uma das salas de aula (e, consequentemente, de uma turma em
cada turno) do prédio histórico,
a fim de privilegiar os cursos pagos e a burocracia universitária.
À época, a grande mobilização
dos estudantes para não perder
esses espaços foi determinante
para a modificação do projeto
original de reforma, resultando
na execução do projeto com as
modificações sugeridas e hoje
conhecidas por todos.
Museu da UFRGS
Vitor Lourenço
Simão Castro
No alto da Avenida Paulista, considerada um dos principais centros financeiros do mundo, Fausto de Sanctis
julga polêmicos crimes do colarinho
branco e de lavagem de dinheiro. De
Sanctis, juiz da 6ª Vara Criminal Federal de São Paulo, foi responsável pelas
prisões do banqueiro Edemar Cid Ferreira, do empresário Ricardo Mansur e
do traficante colombiano Juan Carlos
Ramirez Abadia; também participou
como magistrado da Operação Castelo de Areia e da MSI/Corinthians.
Nesse contexto, o grande destaque na
imprensa nacional deve-se à Operação
Satiagraha, em que decretou duas vezes
a prisão do banqueiro Daniel Dantas e
não se subordinou à ordem do então
Presidente da Corte Suprema, Ministro
Gilmar Mendes.
Num país com um sentimento
de impunidade à flor da pele no que
diz respeito à prisão de pessoas ricas
e influentes, a doce vontade de trocar
o Rolex de um operador financeiro ou
de um político corrupto por um par de
Quando o senhor diz que o seu
objetivo é fazer história, o que tem
em mente?
Houve uma má compreensão da mídia
sobre o que eu disse. Eu não quis
falar nesse sentido egocêntrico. O que
queria dizer é que cada pessoa tem um
papel perante o seu núcleo comunitário. Um pai, por exemplo, é importante
à sua família, à sua vizinhança, aos seus
colegas de trabalho, à unidade religiosa
que ele eventualmente frequenta e
O senhor considera a atuação
do juiz (no chamado ativismo
judicial) uma forma correta,
segundo os princípios democráticos, para correção de problemas como a impunidade?
Nunca refleti sobre essa questão
específica. O que eu sei que existe é o juiz que trabalha. A atuação
jurisdicional de um juiz que não
é acomodado existe mesmo sem
que se considere um ativismo
judicial e, se assim é feita, acredito
que ela exista mesmo sem extrapolar os limites constitucionais.
E esse ativismo, possui então
uma função importante para
corrigir a impunidade?
Bom, é importante dizer o que
diria a Hungria: “justiça de olhos
vendados se transforma em um
jogo de cabra-cega”. Então um
juiz, enxerga, é uma pessoa e
precisa tomar suas decisões de
acordo com os fatos. O que não
pode acontecer é um juiz inerte,
de alma gélida e que não se indigna com a realidade social. É preciso agir e, ao fazê-lo, obviamente, estar dentro dos princípios
democráticos constitucionais.
Entrevista: Raíssa Nothaft (3M)
Transcrição: Marcelo Azambuja (2M) e Thiago Calsa Nunes (4M)
A TOGA - Dezembro de 2010
11
Semana cultural
CULTURA
O Projeto CUIC: uma
outra perspectiva para
“aprender Direito”
Tradição e ruptura políticas na Faculdade de
Direito da UFRGS
• LUCAS DO NASCIMENTO
Acadêmico do 4º ano manhã e Coordenador
Geral Discente do Círculo Universitário de Integração e Cultura (CUIC/UFRGS)
• JUDITH MARTINS-COSTA
Livre Docente e Doutora pela Universidade de São Paulo (USP)
Até outubro de 2010, Professora da Faculdade de Direito da UFRGS, onde lecionou Direito Civil e coordenou
seminários sobre Teoria Geral do Direito Privado, Fundamentos Culturais do Direito Privado e Direito e Literatura,
dentre outros. Foi coordenadora do Círculo Universitário de Integração e Cultura (CUIC) entre novembro de 2009 a
outubro de 2010. É autora de livros de doutrina jurídica.
Um livro lido quando iniciava minha vida como professora da UFRGS, El aprendizaje
del aprendizaje, de Juan Ramón
Cappela, ajudou-me a compreender que há várias formas de
aprendizagem: dentre as não-patológicas (que infelizmente,
existem, e não são raras) estão
a de mera manutenção, que nos
ajuda na sobrevivência básica; a de atualização, praticada
comumente na universidade; e
a de inovação que consiste em
aprender a enfrentar problemas e situações distintos dos
conhecidos por quem ensina,
dando-lhes soluções inéditas,
pois aprender não é repetir
nem recordar e, muito menos,
decorar.
O difícil, porém, é que a
aprendizagem inovadora nem
pode ser ensinada diretamente
nem depende exclusivamente
da atividade de investigação
e pesquisa, embora esteja a
esta vinculada. A atividade
dos professores apenas pode
contribuir para a aprendizagem
inovadora, diz ainda Cappela,
se consegue transmitir não
apenas os resultados de sua
investigação, mas, fundamentalmente, a problemática que
esses resultados colocam, ou,
dito de outro modo, as perguntas para as quais quem ensina
não tem respostas.
Fui encontrar reflexo prático dessa concepção já quase
ao final do período de minha
docência na UFRGS, por
meio do CUIC, essa sigla que
se transfigura e concretiza no
corpo, alma, voz, inteligência e
entusiasmo imbatível de cada
um dos estudantes decididos a
romper o círculo de giz que encapsula os juristas e transforma
as faculdades de Direito, modo
geral, no massificado locus de
“aulários” (Capella), preparatórios – e, muitas vezes, mal
preparatórios – de burocratas
do pensamento.
A palavra ‘entusiasmo’ não
foi acima empregada por acaso.
Nas suas raízes
gregas está o adjetivo entheos, isto
é, ‘inspirado por
um deus’. É, certamente, o deus
da cultura que
inspira o CUIC
em cujo Estatuto está o escopo
‘precípuo’ de
‘proporcionar a
interdisciplinaridade e o estudo
das diferentes
espécies de Artes, sempre sob
o viés crítico’.
O escopo vem
sendo cumprido desde os
finais de 2009.
Realizou-se, então, o I Ciclo de
Cinema em História do Direito,
discutindo -, com Laura Beck
Varela e Daniel Mitidiero e
com o auxílio dos filmes Le
Retour de Martin Guerre e A
última viagem do juiz Feng –, o
funcionamento da Justiça no
Antigo Regime, pois sabem
os integrantes do CUIC não
existir projeto intelectual digno
deste nome se afastadas as
exigências da historicidade e da
interdisciplinariedade. Seguiu-se seminário sobre Crime,
Processo e Pena, presentes
Kathrin Rosenfield, Danilo
Knijnik, Alexandre Wunderlich, Moysés da Fontoura Pinto
Neto Tupinambá Pinto de
Azevedo, Salo de Carvalho e
Alexandre Costi Pandolfo a
discutir questões suscitadas por
As bruxas de Salem; Doze homens
e uma sentença; Seção Especial de
Justiça; e Julgamento em Nuremberg
e, ainda, mais recentemente,
o encontro Aborto: questões
éticas e jurídicas, o filme O
Aborto dos Outros, sendo o fio
condutor de um debate com
José Roberto Goldim e Salo
de Carvalho, e a mediação de
RGS
UF
CUIC/
2010
Lucas do Nascimento, Dóris
Amaral Kümmel e Clarissa de
Baumont, integrando, exemplarmente, CUIC, CAAR e
Grupo de Pesquisa em Ciências
Criminais (GCrim/UFRGS).
Para um ano, foi bastante
– e não foi tudo. Conquanto
verdadeiramente entusiasmante, o Projeto Cinema em Cena
(CiCe) não esgota as atividades do CUIC. Seus membros
também atuaram em debates
do seminário MalEstar na
Cultura, coordenado, em
2010, por Kathrin Rosenfeld e estiveram presentes na
Semana Cultural da Faculdade
de Direito, sempre buscando a
integração entre os diferentes
cursos universitários, único
modo de dar sentido à palavra
“universidade”. E, sobretudo,
têm suas atividades ensinado
a professores e alunos que
uma aprendizagem inovadora
não apenas desvela a relatividade das nossas certezas:
dá-se fundamentalmente
quando, mudando a perspectiva, habilitamo-nos a fazer
perguntas para as quais não
temos respostas.
De 17 a 20 de agosto de
2010, ocorreu a Semana Cultural da Faculdade de Direito da
UFRGS: Tradição e Ruptura na
Formação Política Brasileira, um
evento organizado pelo Círculo Universitário de Integração
e Cultura da UFRGS (CUIC/
UFRGS) e pelo Centro Acadêmico André da Rocha (CAAR).
Durante quatro noites, diversos
temas foram abordados, dentre
os quais: história política da Faculdade de Direito da UFRGS;
figuras ilustres formadas pela
Casa e sua trajetória na história
do Brasil; Machado de Assis e
suas análises sobre o Império
e República brasileiros; Raymundo Faoro e sua vasta obra
sobre o “estamento burocrático”; Glauber Rocha, o Cinema Novo e o Golpe Militar de
1964; possibilidades da democracia brasileira; papel político
do Juiz no Estado Democrático de Direito, dentre outros.
Neste pequeno texto, gostaria de ressaltar a relevância de
tal evento para o enriquecimento de nosso meio universitário.
Sendo esta a primeira semana
cultural já realizada na Faculdade de Direito da UFRGS, cumpre incitar os demais colegas a
darem continuidade ao evento,
consolidando a ruptura política
alcançada com sua realização e
reforçando uma nova e profícua
tradição na Casa: a de promover atividades interdisciplinares pertinentes a um refletir e
atuar cidadãos, para a comunidade universitária e sociedade.
Como um dos organizadores, cabe escrever que a jornada
foi longa, os meses de trabalho
muitos. Penamos, passamos dias
na frente do computador, manhãs e noites em reunião, nos
locomovemos como adoidados,
conversamos com muitas pessoas, criamos diversos contatos, algumas amizades, abrimos portas
e demos primeiros passos para a
(re)aproximação entre o Direito
e os cursos de Graduação e Pós-Graduação em Letras, Ciência
Política, Sociologia, Cinema,
História, Filosofia, ressaltamos
o valor de nossa Faculdade, relembramos a importância que
outrora o cenário jurídico representava em termos de personalidades de atuação política regional e nacional, refletimos muito
sobre teoria política e acerca das
possibilidades da democracia
brasileira, mas, mais importante
do que tudo, criamos uma outra
realidade e novas perspectivas
para aqueles que ingressaram
há pouco na Faculdade de Direito da UFRGS, conforme era
nosso objetivo. Onde estamos?
Qual o nosso papel nesse topos?
Queiramos ou não, mais
do que falar de política, fizemos
política. Quebramos muralhas
de um castelo que seria inexpugnável, se não fosse a atuação
e companheirismo de alunos
protagonistas como o são os de
Direito da UFRGS. Provocamos
dores de cabeça, tiramos pessoas da passividade, inovamos,
demos início a uma tradição, tratamos de revolução glauberiana
ou faoriana, e vivemos uma. O
estamento burocrático brasileiro
vigora, e muito, no seio universitário, principalmente no meio
jurídico e em uma Universidade
Pública. Podemos ver e viver, dia
a dia, o como esse estamento utiliza o Estado ou suas autarquias,
no caso, a nossa Faculdade, para
fins particulares. O que são concursos a portas fechadas? O que
são professores que tratam a Faculdade como coisa sua? Aprendamos com Faoro, não de forma a nos satisfazermos com um
mundo que se perfectibilizou,
porque se compreendeu, mas de
maneira a que, compreendendo
a “mutabilidade constante” dos
negócios humanos e conscientizando-nos do espaço e tempo em
que vivemos, saibamos transformar o mundo, e fazer História.
Fizemos História, a Semana Cultural, que, maior do
que qualquer grupo político
da Faculdade, espero tenha
tão longa vida quanto a do rei.
A TOGA - Dezembro de 2010
12
Quando Glauber encontrou Faoro
• MARIA IZABEL NOLL
Professora do Departamento de Ciência Política da UFRGS
Mais de 40 anos depois de
Terra em Transe ser realizado,
ser proibido, ser liberado, ser
premiado e ter provocado um
grande debate nacional, principalmente entre as esquerdas,
assisti-lo nos provoca uma série
de reflexões cujo olhar, hoje, à
distância, nos permite um entendimento mais claro, mas
principalmente a constatação
do quanto é difícil para o artista compreender o seu tempo, o
momento presente, ainda mais
quando se trata de um tempo de transição – em transe.
Glauber sempre afirmou
que Terra em Transe não é uma
obra política, mas uma obra
sobre a política. Mais: essa política não é qualquer política,
mas aquela que se dá num espaço determinado – Eldorado – um país metafórico que
identificamos facilmente como
o Brasil mas que pode ser qualquer país da América Latina.
Costuma-se dizer que o filme é
barroco, é exagerado, é radical,
é alegórico. E é. A imagem trabalha com o claro/escuro, luz/
sombra. O barroco é o estilo
do Brasil colonial. Há no filme
a forma do barroco tradicional mas há o barroco moderno, retomado pela arquitetura
revolucionária dos anos 60.
Estabelecendo sua leitura
política dentro da radicalidade,
mesmo numa síntese propositadamente caótica, Glauber define
com clareza sua visão do Brasil:
há uma elite (Estado + Igreja)
que se perpetua num processo
civilizatório destrutivo, há os intelectuais (esquerdas, estudantes,
poetas) que mediam o contato
com o povo, massa amorfa e fraca,
à mercê do jogo maior dos interesses políticos ou das idéias daqueles que pretendem libertá-los.
Esquematicamente
podemos ver três personagens
que aparecem como síntese
dos vínculos com o poder:
Diaz – que permite uma primeira possibilidade de participação dos intelectuais, dos estudantes, da esquerda, mas traz
em si – de forma encoberta – a
tradição (a Igreja+ o Estado+a
civilização do colonizador);
Fuentes – o empresário nacional (chamaríamos hoje a mídia?), que no jogo do poder
procura estar ligado a quem
lhe abre mais portas, lhe proporciona mais ganhos. O
medo do povo e da perda dos
bens lhe define as escolhas.
Vieira – o líder populista. (Paulo, o intelectual, diz: “precisamos de um líder”). Neste
líder são depositadas as esperanças da mudança, Vieira responde: “a praça é do povo”.
Os intelectuais (o poeta), os estudantes, as lideranças populares, as lideranças de esquerda lhe
garantem a base eleitoral, mas
Vieira/o populista vai priorizar
os compromissos de campanha,
a ordem, o não derramamento de sangue (dos inocentes)
– o poeta questiona: “quem
são os inocentes?”
O povo é servil,
é fraco. Frente à
morte as mulheres
rezam, numa revolta que busca respostas no misticismo.
A culpa não é do povo
dizem as lideranças
intelectuais mas, ao
mesmo tempo, são
os intelectuais que dizem quem é o povo.
Jerônimo – líder sindical que se diz representante do povo tem
sua boca fechada pelos grupos de esquerda. “Já pensaram num
Jerônimo no poder?”
Chega o personagem
de Flavio Migliaccio
e afirma/grita que o
povo é ele – pobre,
sem casa, sem terra,
sem trabalho – o pária
por excelência. É chamado de extremista e,
logo em seguida, assassinado.
Quem é realmente o povo?
Glauber parece se decidir pelo
sertanejo - o excluído absoluto.
Ele já havia dito no manifesto Eztetyka da Fome datado de
1965: “A violência não é um
simples sintoma, é um desejo de
transformação” é “a mais nobre
manifestação cultural da fome”.
Sua estética vai buscar a violência telúrica. “Para explodir, a revolução tem que ser precedida
por um crime, um massacre.”
Nada mais próximo de Euclides da Cunha. A dicotomia sertão
versus litoral, barbárie versus civilização. Quem realmente é bárbaro?
O poeta do filme rompe
com todos e prega a luta: – “temos que unir as massas”. Mas o
preço dessa opção é a morte. O
ditador Diaz olha o expectador
nos olhos e diz: “a luta de classes
existe – o povo no poder, nunca!”
Entende-se, então, os
motivos do filme ter desencadeado um grande debate na
esquerda (ou esquerdas) que
já então se dividia entre uma
oposição ao regime de 64 dentro da “institucionalidade” ou
a luta armada. É compreen-
sível a reação do governo ditatorial proibindo a exibição
de Terra em Transe. Desmascarava-se o conteúdo do golpe.
Mas onde então Glaub e r e n c o n t r a Fa o r o ?
Quando vemos a cena de
Diaz (o líder do início - o ditador coroado do final), junto
ao colonizador português (Estado) e um padre (Igreja) chegando à praia e indo ao encontro de um índio, não há como
não lembrar de Faoro que,
em Os Donos do Poder, nos diz:
De D. João I a Getulio Vargas,
numa viagem de seis séculos, uma
estrutura político-social resistiu a
todas as transformações fundamentais, aos desafios mais profundos, à travessia do oceano largo.1
O capitalismo politicamente
orientado, o centro da aventura,
da conquista, da colonização foi o
elemento fundamental da realidade estatal. O capitalismo moderno
foi incorporado, mas não elidiu
os traços da formação anterior.
A comunidade política conduz,
comanda, supervisiona os negócios, como negócios privados
seus, na origem, como negócios
públicos depois, (...) Dessa realidade se projeta, em florescimento
natural, a forma de poder, institucionalizada num tipo de domínio:
o patrimonialismo, cuja legitimidade assenta no tradicionalismo
– assim é porque sempre foi.2
A imutabilidade histórica
fascina Faoro como modelo
analítico. Mas desespera Glauber. Faoro vê no Estado e na
dominação patrimonial o vértice e o vórtice de uma sociedade que não é uma sociedade de
classes (daí não haver nem luta
de classes), mas um estamento.
O estamento privilegia a desigualdade e o particularismo.
Essa camada se organiza e se
define politicamente por suas
relações com o Estado. O estamento patrimonial é intrinsecamente personalista desprezando a distinção entre as esferas
pública e privada. Na sociedade
patrimonial, o poder pessoal faz
do favoritismo o mecanismo
por excelência de ascensão social. Mesmo a justiça, em todas
as suas manifestações, veicula
o poder particular e o privilégio
em detrimento
do universal e
do formal-legal.
A referência arquetípica
da dominação
tradicional patrimonial é a
autoridade patriarcal. O poder
atávico, primordial, compassivo
e arbitrário do
patriarca. Poder
instável, pessoal,
subjetivo, que
sai da comunidade doméstica
e, sem perder
suas raízes na
tradição e no
arbítrio, chega à
esfera política.
Os fundamentos personalistas do poder, a
ausência de uma esfera pública
que se contraponha à privada, o
casuísmo jurídico, a irracionalidade burocrática, a tendência à
corrupção, tudo leva ao circulo
vicioso da ineficiência. A sociedade estamental se constrói
no prestigio social, nos monopólios sociais e econômicos,
num estilo de vida diferenciado
que se traduz em privilégios de
consumo ostentatório. Aí se
abriga o vírus da desigualdade.
Glauber vê a corrupção –
associada, no filme, às festas, às
orgias sexuais, à bebida, numa
visão quase puritana - como
o câncer que corrói a todos
os que chegam ao poder ou
dele se aproximam. A proximidade com o estamento (poder) traz o risco da cooptação.
A quem defender?
As bases que levaram Vieira ao poder ou os interesses
daqueles com quem os acordos econômicos foram feitos?
Para Faoro, o estamento é
constituído “à ilharga do Estado”. O Estado é seu pa-
Notas
trimônio e assim é usado.
E o povo? Nos Donos do Poder
a ausência do povo no mundo
político é afirmação reiterada.
Glauber vê o povo. Mas este é
constantemente enganado. O
povo de Glauber é euclidiano: é
sobrevivente, é um forte dentro
da miséria do deserto do sertão, é um esquecido, é um perseguido por aqueles que dizem
querer salvá-lo ou “civilizá-lo”.
Faoro vê o povo ausente: “E o
povo, palavra e não realidade (...)
que quer ele? Este oscila entre o
parasitismo, a mobilização das
passeatas sem participação política, e a nacionalização do poder” 3
Confinado na base da pirâmide social “o povo espera,
pede, venera, formulando a
sua política, expressão primária
de anseios e clamores, a política de salvação” 4. No topo da
estrutura estão os “manipuladores olímpicos do poder”.
Confundindo as súplicas religiosas com as políticas, o desvalido,
o negativamente privilegiado,
identificado ao providencialismo
do aparelhamento estatal, com o
entusiasmo orgiástico dos supersticiosos, confunde o político com
o taumaturgo, que transforme
pedras em pães, o pobre no rico.5
Sairá dessa massa uma revolução?
Nos anos 90, Faoro diria
que nossa elite “dissidente”
– nos perguntaríamos: os intelectuais de Glauber? – continuava conduzindo o Brasil de
forma patrimonial, conservadora, desconhecendo profundamente o Outro. Faltava-lhe
um componente ético em sua
conduta, pautada pelo sonho
de ter acesso aos padrões de
consumo do primeiro mundo,
na defesa intransigente de seus
privilégios. Faltava-lhe alteridade. A construção da cidadania e a defesa da coisa pública
eram ornamentos discursivos.
Seria interessante saber qual
seria o comentário de Glauber
ao ver que um Jerônimo chegou
ao poder em 2002. Neste sentido, podemos apenas especular.
Já Faoro, ao receber a visita de
“Jerônimo”/Lula” no hospital, pouco antes de sua morte
em 2003, – numa compreensível ansiedade pelo rompimento
do circulo vicioso da dominação – teria puxado um pouco
as orelhas do agora presidente
pela demora em pôr em prática
algumas medidas no sentido de
republicanizar e democratizar o
Estado e, finalmente, construir
uma sociedade mais igualitária.
1
FAORO, Raymundo. Os Donos do Poder.
Porto Alegre: Globo, 1976. p. 733-34.
2
3
Idem
Idem. p. 748
4
5
Idem
Idem. p. 740
A TOGA - Dezembro de 2010
RESENHA
13
POESIA
Relendo as margens
do Direito
Não fales
• ARTHUR P. BEDIN
Acadêmico do 3º ano manhã
• BRUNO HERMES LEAL
Acadêmico do 5º ano manhã
atestando a insuficiência da
ciência jurídica, por si só, para
“desentranhar a realidade
do fato jurídico”, procede à
análise orgânico-biológica do
Mariana Lenz
A lógica recomenda que
não se comece pelo fim, mas
abordar a obra de Pontes de
Miranda é encarar, de pronto,
o paradoxo lógico em que
À margem do direito: ensaio de psicologia jurídica - Pontes de Miranda.
Na Biblioteca do Direito: 340.12 M672m 2005
consiste a realização de um
trabalho de humanidades
no tempo de uma só vida,
razão pela qual me permito
iniciar citando a frase final
do primeiro livro escrito pelo
grande tratadista brasileiro:
“O direito é, em verdade, um
produto social de assimilação
e desassimilação psíquica”.
O livro “À Margem do
Direito”, escrito em 1911,
encerra os traços característicos da primeira fase do
pensamento ponteano, vincada pelos avanços científicos
subsequentes desde o final do
século XIX e pelo positivismo
científico-naturalista. Neste
escrito de pouco mais de cem
páginas, autointitulado “ensaio
de psicologia jurídica”, um jovem Pontes de Miranda lança
as bases do que seria a tônica
de sua vasta produção: a interdisciplinaridade, observando
a ciência jurídica de forma
integrada, pretendendo “uma
explicação homogênea, sistemática, estribada em outros
ramos, com uma bem revelada
preocupação realista”.
O provocativo título da
obra é explicado no primeiro capítulo, quando o autor,
destacada conotação individualista
–, e do elemento
social, ensejadores dos “fatos
psicojurídicos”.
Nessa senda, o
autor exemplifica
com o instituto da
prescrição aquisitiva, anotando
que “a prescrição
não é causa, mas
conseqüência,
como todos os
fatos jurídicos
invariavelmente
o são. É mister
procurar o fator
psíquico, que a
produz, quando
se combina com
o fator social [...]
Não é o tempo,
esfinge aldravada
com rouparias
fantásticas, que
traz a morte à
relação de direito
[...] mas a suposta renúncia, a
presunção legal da
pena executada,
ou, melhormente,
Direito, de forma a considerá-lo “organismo vivo”, o qual
merece análise tripartite: (a)
anatomia jurídica, em que se
hão de
Neste escrito de pouco mais de
classificar
cem
páginas,
autointitulado “ensaio
os direitos,
conforde psicologia jurídica”, um jovem
me cada
Pontes de Miranda lança as bases
um dos
do que seria a tônica de sua vasta
elementos
produção: a interdisciplinaridade,
anatômiobservando a ciência jurídica de
cos (titular,
forma integrada(...), pretendendo
objeto e
“uma explicação homogênea, sistesujeito
mática, estribada em outros ramos,
passivo);
(b) fisiologia com uma bem revelada preocupação
realista”.
jurídica,
estudo das
relações
a lei psicológica
existentes entre eles, como
do esquecimento,
a proteção, coação e pretenque a experiência
são; e, por fim, (c) a psicologia
pessoal foi lentajurídica, cuja missão é examimente revelando
nar cientificamente os atos
ao homem”.
psico-jurígenos dos titulares e
A formação
sujeitos passivos, para a qual,
da
norma
juríenfim, dedicou o autor esta
dica
como
mero
obra.
desdobramento
Diversas páginas da obra
da interação entre
são dedicadas à análise do eleos dois elementos
mento psíquico-volitivo – fundansuprarreferidos é
te das primeiras noções de diobjeto do sereito subjetivo e das pioneiras
gundo capítulo,
sistematizações jurídicas, de
Eu tenho um grande medo de me perder pelos
teus olhos escuros. De me perder perdidamente, sem
clemência ou remissão. Porque nos teus olhos noturnos
eu te vejo calada e ausente. E eu não escuto a tua voz
nos murmúrios das árvores no vento que traz a primavera. O teu silêncio é a minha distância.
Eu te peço, não cantes, não fales, não movas.
Deixa-me perceber teu íntimo silencioso e guardá-lo no
meu. Deixa-me abraçar a tua imóvel solidão na minha
solidão, a tua imóvel presença na minha presença. E
lentamente a tua ausência irá morar no meu interior
profundo, e o teu silêncio habitará a minha poesia.
E eu te peço novamente, não fales, não fales, não
fales. Nem sequer suspires.
Porque ausente eu te vejo.
Porque calada eu te beijo. http://blogdobedin.blogspot.com
remetendo à origem
costumeira do Direito,
para consolidar a importância deste enquanto
processo de adaptação
social através da cristalização daquilo que regularmente se pratica, e não
como produto cerebrino
de um legislador abstrato.
O costume, que é lastro basilar na formação
da lei, observa Pontes
de Miranda, explica-se
psicologicamente: o fato
mental que se repete ganha em energia social, de
modo que as sociedades
se reservam forças pela
repetição sucessiva, que se
alonga e se vigora e se expande, dando ao costume
poderio e obrigatoriedade
(Rechtsgefühl).
O viés psicológico adotado por Pontes
de Miranda alcança sua
praticidade imediata no
terceiro e último capítulo,
quando aborda institutos
jurídicos correntes através
dessa perspectiva. No que
toca ao Direito Público,
genericamente considerado, o autor perscruta a
natureza da personalidade
jurídica do Estado, vista
como criação sociológica
e psicológica, vez que advém da continuidade dos
fenômenos mnemônicos
e volitivos dos indivíduos,
nivelando a psique geral
ao reconhecimento da
autoridade.
No que tange ao Direito Privado, genericamente
considerado, Pontes de
Miranda desloca, assimilando a hermenêutica filológica
de Nietzsche – que explorara a ambigüidade semântica contida no vocábulo
Schuld, a designar tanto a
dívida, em sentido jurídico,
como a culpa, em sentido
psicológico –, a análise dos
institutos privatísticos para
a observância da manifestação
de vontade, considerando-a
como fluxo psicojurídico
autovinculante “que busca
reprodução entre os seres
capazes”.
A obra, conquanto date
do século passado, expande
sua importância muito além
dos limites cronológicos
da “Era dos Extremos” de
que falava Eric Hobsbawn,
senão que é objeto de atualização histórica, estando
presente nos debates do
fim desta primeira década
de século XXI. As discussões jurídicas atuais, como
são a interdisciplinaridade
(e.g., Law and Economics,
multiculturalismo) e a
imparcialidade psicológica
do juiz (mormente na seara
do direito processual penal)
reavivam a matéria sobre a
qual se debruçou Pontes de
Miranda.
A TOGA - Dezembro de 2010
14
Da natureza à civilização
Breves apontamentos sobre a culturalização humana e seus reflexos
• LUCAS DO NASCIMENTO
Acadêmico do 4º ano manhã
Conta o mito grego que da
união entre o Céu (Urano) e a
Terra (Gaia) nasceram a Justiça
Familiar (Thémis) e a Memória (Mnemosyne). Ambas, entre
umas e outras, uniram-se com
a Autoridade Política (Zeus),
do que nasceu da Memória
as nove musas culturais; e da
Justiça Familiar a Justiça pela
Igualdade da Lei (Diké).1
A genealogia expõe duas
idéias principais. A primeira
é a de que a Memória tanto é
precedida pelos fatores naturais,
quanto é requisito para a Cultura.
A segunda consiste em que o
ponto de contato entre a Justiça
pela Igualdade da Lei e a Cultura
está em seu ascendente comum,
a Autoridade Política, caracterizada no mundo grego antigo pela
idéia-resultado de bem constituir
e compartilhar aquilo que diz
respeito a todos os cidadãos (o
comum, koinon). Neste texto,
pretende-se embasar as duas
percepções de mundo e traçar
alguns breves comentários sobre
as relações entre a Natureza, a
Memória, a Cultura e a Justiça
pela Igualdade da Lei.2
Compreende-se aqui a natureza como fato preexistente
ao, em relação com e existente
no homem. Explica-se: este,
mais do que ser racional, é
física e quimicamente estruturado, ente com corpo orgânico
e sujeito às leis biológicas de
hereditariedade e seletividade,
dentre outras. A natureza está,
pois, no homem, condicionando seu agir e pensar, inclusive
desde momento anterior ao seu
nascimento, como através da
lei da hereditariedade.
Ao mesmo tempo, o
homem está inserido em um
meio no qual interferem fatores
naturais e, conseqüentemente,
compõe um organismo maior
do que sua individualidade, seja
ele um grupo humano qualquer
ou a Terra globalmente considerada.3 Fator físico inofensivo
ocorrido na Inglaterra, como
o bater de asas de borboleta,
pode causar tufão em território
chinês quando em conjunto
com diversos outros pequenos
fatores. Portanto, além de o
homem não escolher as condições nas quais inicialmente se
insere, escolhe apenas em parte
as condições nas quais passará
a se inserir. Os atos humanos
escapam a avaliações consequêncialistas.
Daí o porquê de compreender-se que o atuar humano
é efeito condicionado pelos
estímulos circunstanciais do
mundo (ente natural no qual
se insere o homem) e pelos
estímulos provocados pelo próprio ser humano nesse mundo
e noutros homens, pois, além
de se inserir no mundo natural
e ser, portanto, natureza, ele é
capaz de criar novas realidades,
ora através do trabalho, na
criação de artifícios, ora através
da ação (fruto de sua liberdade
e exercida diretamente entre os
homens), condicionando outros seres, inclusive humanos, e
a si mesmo.4
A terra tem seus limites
cantados em comunidades
primitivas justamente porque
essas coletividades vivem a
complementaridade natureza-humano. Essa relação é garantida seja pela adequação do
homem à terra, graças aos limites que a natureza impõem ao
exercício da liberdade humana,
seja pela conformação da terra
ao homem, através de artifícios
por esse criados para com ela
se harmonizar, como a utilização do fogo e de vestimentas.
Ora, sabe-se que quanto
maior for a ligação entre o
homem e a terra à qual perten-
Notas
1
Sobre a teogonia grega, vide HESÍODO. Teogonia. 6. ed., trad. de J. A. A.
Torrano. São Paulo: Iluminuras, 2006.
Filme ímpar no qual nos inspiramos é
Narradores de Javé (BRA, 2003), de Eliane Caffé. Nele, construção de represa
ameaça destruir a pequena cidade de Javé.
Para que os moradores impeçam o desaparecimento de seu povoado, precisam
provar ao governo que na cidade existe
valor cultural, “patrimônio histórico”.
Por isso, decidem relatar a história de
Javé, dando forma escrita às narrações
orais dos citadinos e, por conseguinte,
dando vida à memória política local.
3
Importante para uma compreensão
sociológica que releve os saberes da
física, química, biologia e das ciên2
cias humanas, é PONTES DE MIRANDA. Introdução à sociologia geral.
2. ed.. Rio de Janeiro: Forense, 1980.
4
Vide ARENDT, Hannah. A condição
humana. 10. ed., trad. de Roberto Raposo.
Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2009.
5
Em crítica a divisão do mundo, promovida por Descartes e introjetada pelo
homem moderno, entre res cogitans e res
extensa, não é outra a conclusão a que
se chega em BALLESTEROS, Jesús.
Postmodernidad: decadencia o resistencia. 2. ed. Madrid: Tecnos, 2000.
6
LAFER, Celso. Da dignidade da
política: sobre Hannah Arendt. In:
ARENDT, Hannah. Entre o passado e o
futuro. 6. ed., trad. de Mauro W. Barbosa. São Paulo: Perspectiva, 2007, p. 12.
ce e mais vasta for a vinculação
de sua vida a determinados
fatores naturais, maior será
sua dependência frente a eles,
visto que construída relação na
qual a identidade deste sujeito
se conforma pelas características de suas terras: ao correr
dos riachos, à robustez dos
arbustos, aos rigores do tempo,
ao crescer da plantação e ao
procedimento da colheita.
Lembremos de que há um trabalho constante de significação
dos fatos por parte do homem,
processo que chamamos de
memorização, tornar lembrado,
matéria-prima de todas as atividades culturais. Em contato direto com a natureza, a memorização se dá sobre fatos naturais
brutos, e, em decorrência, a
identidade pessoal do sujeito
produz-se sobre o resultado da
seletividade e significação pela
memória sobre essa espécie de
fatos. Nessa realidade, a compreensão do eu está próxima
da compreensão da coisa (res).
Compreender o mundo natural
está muito próximo do compreender parte de si.
Esta proximidade, entretanto, gera dependência do
homem frente a fenômenos
que não controla: a morte do
amigo, a praga nos frutos, a
seca das terras, a fome, etc. A
inconformidade em relação ao
mundo e o desejo de aperfeiçoamento da condição humana
levam-no à busca pelo domínio
dos fenômenos naturais através
da racionalidade técnica. Daí
advém, em parte, o surto da
produção de artifícios, utensílios construídos pelo trabalho
humano que possibilitam um
domínio sobre os fenômenos
naturais, hoje, inconcebível
há séculos e até mesmo há
décadas atrás. Em um crescente de diferenciação, o homem
não mais se compreende como
incluído no mundo, mas, sim,
como seu dominador. Não é
coincidência que o pensamento
mais ilustrativo da diferenciação homem-natureza provenha
de filósofo que viveu em época
na qual o surto científico era
tremendo, Descartes, expoente
da Modernidade filosófica que
dividiu o universo cognoscível entre a res extensa (o todo
externo a mim, homem) e a res
cogitans (eu, homem, que penso
e existo). Como se percebe,
Homem e Natureza passam a
ser conceitos antagônicos.5
É óbvio que quanto mais
força tiverem tais artifícios para
o domínio do homem sobre os
fenômenos naturais e quanto
maior for a utilização desses
utensílios, mais o seu universo
se torna um local de artifício. Do trabalho que quebra
demasiadamente a identidade
conformada à natureza, se gera
uma identidade condicionada à
subjugação da natureza e pelos
instrumentos criados para esse
domínio. A significação pela
memorização passa a se dar sobre artificialidades e, portanto,
também o próprio entendimento de mundo.
Um dos resultados de tal
processo é que, com o surto
dessa racionalidade e suas repercussões, passa-se à negação
de todo aquele entendimento que compreenda o outro
ser humano sob uma mesma
humanidade que a minha. Se
o que me torna humano é
a vericabilidade individual e
incompartilhável de que penso
(“Penso, logo existo”), e não
mais a percepção compartilhada e objetiva de que nos aproximamos uns dos outros por
meio de uma natureza comum,
considero o outro tão res extensa
(externo a mim) quanto qualquer artifício. Assim, corre-se
o risco de tornar os demais em
objetos-meio para nossos fins,
criando-se a impossibilidade de
qualquer vivência política além
da arbitrária e coercitiva.
Outro dos efeitos é que,
se me relaciono com artifícios,
procurarei os que acredito serem de valia a fim de, em nossa
convivência e em sua posse,
significá-los em sua relação
para comigo e, pelo processo de memorização, incluir a
experiência em minha história
de vida pessoal, de forma a
enriquecê-la. Portanto, vê-se
que no mercado também se
busca o preenchimento de um
vazio existencial. O problema
está em não compreender que,
através desse meio, o sucesso
no preenchimento do referido
vácuo pode ser no máximo
parcial, pelo fato de que o
homem, “quando se confronta
com a ‘realidade objetiva’, não
encontra mais a natureza mas
se desencontra consigo mesmo,
isto é, com objetos que criou
e processos que desencadeou,
que funcionam, mas que não
entende por que não é capaz
de explicá-los em linguagem
comum.”6
Em um mundo de artifícios, no qual, portanto, a pessoa
condiciona-se por artifícios, pois
é com eles que interage, deve-se
tomar o cuidado para não se
visualizar os outros como artifícios (sob o risco de enxergá-los
como meio), mas sim em parte
natureza e em parte construção
a partir dessa. Um fortalecimento de nossa vivência da Justiça
pela Lei, consubstanciando a
igualdade jurídica (isto é, uma
proteção efetiva da dignidade do
próximo), só nasce do reconhecimento de que mantemos um
koinon, um fundo comum: pela
igualdade de instrumentos para
a apreensão dos fenômenos, por
todos nos enquadrarmos sob
os mesmos condicionamentos e
sujeições provocados pelo meio;
pela semelhança nas potencialidades; ou ainda pela isonomia dos limites, como o do
conhecimento. Cabe, por tudo
isso, refletirmos sobre o nosso
estar-no-mundo, no intuito,
inclusive, de preocupando-nos
com quem somos (com nossos
limites, necessidades e potencialidades) vivermos adequadamente com aquilo/aqueles com
que(m) lidamos.
A TOGA - Dezembro de 2010
ACONTECE NO SAJU
Em 2010, o Serviço de
Assessoria Jurídica Universitária da UFRGS (SAJU-UFRGS)
comemora 60 anos de história.
Fundado em 1950, o SAJU passou por inúmeras transformações ao longo das décadas no
sentido de vir a melhor cumprir
O SAJU nos seus 60 anos
seus principais objetivos, quais
sejam: efetivar o acesso à justiça e os direitos humanos, bem
como fomentar um estudo crítico do Direito. Visa-se, assim,
a prestar um serviço importante
à sociedade, a complementar a
formação universitária e a forta-
Lançamento do sexto volume
da Revista do SAJU
No dia 21 de maio, ocorreu
na Biblioteca da Faculdade de
Direito o lançamento do volume 6 da Revista do SAJU – Para
uma visão crítica e interdisciplinar
do Direito. A cerimônia, prestigiada por sajua­no(a)s, professore(a)
s e acadêmico(a)s do curso de
Direito, contou com as falas do
Coordenador Discente do SAJU,
Guilherme Jantsch, do Coordenador do programa à época da
publicação do edital de chamada de artigos em 2007, Márcio
Cunha Filho, do membro da comissão editorial da revista, Lucas
do Nascimento, e da Bibliotecária Chefe, Celina, que recebeu
um exemplar da revista doado à
Faculdade.
A Revista do SAJU é um
meio de divulgação e valorização
da assessoria jurídica universitária no meio acadêmico, visando
trazer para a Faculdade de Direito e para além dela debates,
reflexões, objetivos e desafios
vividos e pensados pelo(a)s extensionistas. A próxima edição
será publicada ainda neste ano.
A revista está à venda na sede do
SAJU. Adquira já a sua!
Artigos selecionados para a próxima edição
• Crianças e adolescentes: uma análise da
dignidade e da cidadania no ECA - Alice
Girardi Canesso
• Políticas urbanas em Paraisópolis (São
Paulo): conflitos de direitos e contradições
da democracia - Ana Carolina N. M. F.
Cunha, Paulo César de Abreu Paiva
Jr., Renata Gomes da Silva, Táygara
Martinez Martins
• O Direito pela “Mão” do Educador: O
Diálogo de Paulo Freire com a Assessoria
Jurídica Popular Universitária - José
Humberto de Góes Junior
• O Direito Fundamental à Moradia no
Brasil: Conteúdo Material e Alguns Obstáculos à sua Efetivação - Marília Passos
Apoliano Gomes
• Da violência doméstica e familiar contra a
mulher - Matheus Muller
• Da internalização da decisão da Corte
Interamericana de Direitos Humanos: caso
Blanco Romero e outros versus Venezuela
- Natália Scalabrini e Daniel Barile da
Silveira
• Assistência e Assessoria Jurídica Universitária em Direitos da Mulher e de Gênero:
um Novo Fazer Interdisciplinar - Patrícia
Vilanova Becker
• O Sonho da Assessoria - O Princípio
Dramático da Horizontalidade - Rafael
Graebin Vogelmann
O SAJU no Jornal do Comércio
O SAJU foi objeto de
matéria no Jornal do Comércio, na edição do dia 23
de agosto. Intitulada “Justiça
ao Alcance de Todos”, a reportagem, que ocupou uma
folha inteira do jornal, destacou o papel desempenhado pelo SAJU na efetivação
do acesso à justiça e na sua
consequente democratização. Foram entrevistados,
para a elaboração da matéria, o Coordenador Geral
do SAJU, um assistente do
SAJU, e uma pessoa assistida pelo SAJU. A reportagem
destacou, além dos serviços
atualmente prestados pelo
SAJU à sociedade, projetos
recém surgidos no programa,
dentre os quais se destaca o
emergente grupo de mediação. Enfatizou-se, ainda, a
comemoração dos 60 anos
15
de história do SAJU.
Leia um trecho da matéria:
E foi para tentar resolver um problema de regularização da luz elétrica no
bairro em que mora que Jair Dias, de
33 anos, procurou o Saju.
Morador da comunidade Jardim Vila
Verde, na zona Sul de Porto Alegre, ele
foi em busca de auxílio. Não tínhamos
energia regular e eu tentei conversar
com a concessionária, mas nunca obtive
resultado, diz ele. Depois de esperar por
dois anos o auxílio público sem
sucesso, buscou apoio no serviço disponibilizado pela Ufrgs. Dias,
que é presidente da Cooperativa
Habitacional Jardim Vila Verde, conta
que rapidamente foi atendido pelo Saju,
entrou com uma ação judicial e, depois
de um ano e meio, conseguiu regularizar
a situação da localidade. Tudo aconteceu
dentro do prazo e da forma correta. Na
prática, eles resolveram o problemal,
diz ele.
lecer a própria Universidade por
meio da prática extensionista.
O desenvolvimento percebido
ao longo dos anos permitiu que
o SAJU se firmasse como um
programa de extensão universitária cada vez mais reconhecido
na Universidade e na sociedade.
O SAJU conta, hoje, com mais
de 180 integrantes, que se reúnem em 14 grupos, atendendo
a centenas de pessoas durante o
ano, assessorando-lhes judicial
e extrajudicialmente, e atuando,
ainda, em diversas comunidades
de Porto Alegre.
Cerimônia de aniversário
No dia 1º de Outubro,
ocorreu, no Salão Nobre da
Faculdade de Direito, evento
comemorativo referente aos 60
anos do SAJU.
Fizeram-se presentes, dirigindo a palavra aos presentes,
o Vice Pró-Reitor de Extensão,
Ângelo Ronaldo Pereira da Silva, o Coordenador Geral do
SAJU, Guilherme Jantsch, os
ex-sajuanos Armando Farah,
Domingos da Silveira, Lucas
Jost, Luiza Moll, Paulo Caliendo
e Waldyr Barrili. Prestigiaram a
cerimônia, além do Diretor da
Faculdade de Direito, professor
Sérgio Porto, dezenas de sajuanos, ex-sajuanos e estudantes
dessa Faculdade.
Durante o evento, foram
apresentadas as novas camisetas
do SAJU e a sua recém lançada
revista, cuja venda não se restringe aos membros do SAJU.
Após a cerimônia, foi servido,
na Sala dos Professores, coquetel aos presentes.
II Semana de Direitos Humanos
De 26 a 30 de
abril de 2010 aconteceu no Salão Nobre
da Faculdade de Direito a II Semana de
Direitos Humanos,
Cidadania e Acesso
à Justiça promovida
pelo SAJU. A Semana
de Direitos Humanos
nasceu com a proposta de levar
à comunidade acadêmica e à
comunidade em geral questões
que por vezes ficam restritas
ao âmbito sajuano. Com esse
viés, temáticas que trazem uma
abordagem do Direito enquanto
instrumento de emancipação
social foram trazidas ao debate, mobilizando cerca de 150
pessoas. O público, composto
por estudantes, profissionais e
agentes populares, refletiu sobre
questões como: A Criminalização da Homofobia, Alienação
Parental, Menores em Conflito
com a Lei, Políticas Migratórias,
e Regulamentação Fundiária.
Deixamos um agradecimento a todo(a)s que contribuíram para o sucesso desse
evento!
Nesse ano comemorativo,
dentre as diversas atividades
levadas a cabo pelo SAJU na
Universidade – que se somam
àquelas desenvolvidas junto à
comunidade, não abordadas
aqui devido à sua quantidade –,
destacam-se as seguintes:
SAJU no UFRGS
Portas Abertas
Neste 15 de maio, o SAJU
esteve presente no UFRGS
Portas Abertas realizando uma
apresentação no Salão Nobre
acerca do papel e da importância da assessoria jurídica
universitária.
Essa apresentação, realizada pelo coordenador-geral
discente Guilherme Jantsch,
trouxe ao público os principais
aspectos que tornam este programa de extensão um lugar de
transformações e de constante
aprendizagem. Foi ressaltado,
ainda, que o SAJU representa
uma porta permanentemente
aberta para a sociedade, constituindo um canal de troca de
saberes entre Universidade e
comunidade. Além disso, pelo
segundo ano consecutivo, o
grupo de Direitos da Mulher
e de Gênero do SAJU (G8-Generalizando) realizou no
UFRGS Portas Abertas uma
exposição que toma a forma de
um Varal Fotográfico nas janelas do nosso prédio histórico. A
mostra trouxe duas narrativas
intituladas “Mulheres em Atos,
Fatos e Retratos” e “Heteronormatividade e Sexismo: uma
construção invisível”.
Além da Mostra Fotográfica, o grupo realizou a exibição
do documentário “Marias do
Brasil” no Salão Nobre da
Faculdade, abordando com
o público de que maneira as
Ciências Jurídicas podem se
relacionar com temáticas como
a Violência Contra a Mulher,
assumindo um caráter humano
e transformador.
Quer conhecer
melhor o SAJU?
• Acesse www.ufrgs.br/saju
• Visite o SAJU durante a
tarde
• Ligue para 3308.3967
• Envie um email para
[email protected]
A TOGA - Novembro de 2010
16
Prestação de contas do CAAR: Gestão 2008/2009
Resumos
• BRUNO IRION COLETTO
RECEITAS
Receitas do Caixa
(menos) Impressões da Gestão
(menos) Saques na Conta-corrente
(menos) Ajustes Contábeis
R$
-R$
-R$
-R$
(ex-)Presidente do CAAR
Gestão Construindo o Caminho 2008/2009
70.153,52
564,80
2.450,00
3.210,00
R$
Receitas da Conta-corrente
(menos) Depósitos em Conta-corrente
R$
-R$
-R$
10.371,80
R$
46,87
R$
-R$
R$
R$
R$
63.928,72
R$
Resultados produzidos
74.347,39
CURIOSIDADES
70.971,58
564,80
39.364,72
3.210,00
-R$
R$
49.229,58
2.450,00
-R$
46.779,58
-R$
11,82
-R$
74.623,46
159 unidades (média: 13/mês) R$ 795,00
Copos descartáveis
20.100 unidades (média:
1.675/mês)
R$ 471,30
Copos retráteis
170 unidades ((R$ 2,90 cada)
130 unidades (quantidade vendida
R$ 492,90
R$ 223,00
(este controle da quantidade de impressões
não foi feito desde o início da gestão)
15.500 folhas
10.221 impressões
Resultado: R$ 321,91
R$ 1.729,92
R$ 2.051,83
Máquina de café
Resultado: R$ 1.097,60
R$ 4.237,15
R$ 5.334,75
Copa do Direito
Resultado: R$ 21,41
R$ 2.712,59
R$ 2.734,00
Direitão
Resultado: R$ 624,00
R$ 5.680,00
R$ 6.304,00
Olimpíadas Sedentárias
Resultado: R$ 32,90
R$ 202,12
R$ 235,02
Camisetas e baby looks
Resultado: R$ 243,25
R$ 1.625,75
R$ 1.869,00
Bolsas, pastas, mochilas e
pastas para Notebook
R$
R$
R$
731,44
8.675,20
823,24
-R$ 318,04 (mais o “estoque” que
R$ 5.794,04
R$ 5.476,00
R$
10.229,88
Representação estudantil
-R$ 1.097,07
R$ 4.587,07
R$ 3.490,00
Eventos acadêmicos
R$ 10.083,85
R$ 13.718,15
R$ 23.802,00
TRI EPTC
R$ 2.105,55
R$ 193,45
R$ 2.299,00
Jornal
R$ -850,00
R$ 1.200,00
R$ 350,00
Impressões
sobrou)
Revista eletrônica
R$ 1.740,29
Manual do Calouro
R$ 134,40
Taxas Banrisul
R$ 445,10
Bolsistas
R$ 5.520,00
Prestação de contas ainda pendente de aprovação pela Comissão Fiscal.
Despesas do Caixa
(mais) Impressões da Gestão
(mais) Depósitos na Conta-corrente
(mais) Ajustes Contábeis
27.832,06
Bombonas de água (20 L)
aos alunos)
(ex-)Tesoureiro do CAAR
Gestão Construindo o Caminho 2008/2009
DESPESAS
49.736,52
39.364,72
Receitas da Conta de Investimentos
• JOSÉ ARTIGAS LEÃO RAMMINGER
Despesas da Conta-corrente
(mais) Saques na Conta-corrente
Despesas da Conta de Investimentos
Despesas efetuadas
Recebido da gestão “Novos Horizontes”
Saldo no caixa 01/dez/08
Saldo na Conta-corrente 02/dez/08
Saldo na Conta de Investimentos 31/out/08
R$
R$
R$
1.549,50
8.168,26
788,19
R$
10.505,95
R$
R$
-R$
10.505,95
74.347,39
74.623,46
Recebido da gestão anterior
Receitas produzidas
Despesas efetuadas
R$
10.229,88
Entregue para a gestão seguinte
Entregue para a gestão “Concretizando ideias”
10/nov/09
10/nov/09
31/out/09
Saldo no caixa
Saldo na Conta-corrente
Saldo na Conta de Investimentos
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Dezembro