ESTUDO DE CASO PSICOPEDAGÓGICO Autora: Suellen Viviane Lemos Fernandes Co-autora: Maria Irene Miranda Bernardes Universidade Federal de Uberlândia [email protected] Introdução O presente trabalho aborda o estudo de caso de um garoto de oito anos que possui dificuldade de aprendizagem, seguida da queixa de TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade), aluno de uma Escola da rede Municipal de Uberlândia. O estudo foi realizado por meio do uso dos seguintes instrumentos de coleta de dados: 1) Entrevista com a criança 2) Anamnese com o pai da criança 3) Entrevista com a professora 4) Atividade de desenho livre e auto-retrato com a criança 5) Conversa informal com o psicopedagogo da escola. O estudo de caso como metodologia Quando se fala em estudo de caso vem logo à mente a ideia do uso de casos como tentativa da reprodução da realidade para o ensino, o que se conhece por método do caso. O estudo de caso é uma vertente da pesquisa qualitativa. Não há preocupações com tratamento de quantificação e estatístico e não está direcionado a obter generalizações. O estudo de um caso permite a descoberta de relações que não seriam encontradas de outra forma, sendo as análises e interferências em estudos de casos feitas por analogia de situações, respondendo principalmente as questões “por que?” e “como?” Como descreve Yin (2005, p.19) em geral, os estudos de caso representam a estratégia preferida quando se colocam questões do tipo “como” e “por que”, quando o pesquisador tem pouco controle sobre os acontecimentos e quando o foco se encontra em fenômenos contemporâneos inseridos em algum contexto da vida real. Diante da elaboração dessa metodologia de pesquisa, o presente trabalho teve como 1 objetivo central investigar as dificuldades de aprendizagem através do estudo de caso de uma criança e suas interações sociais entre família e escola. Foi possível evidenciar a realidade de um estudo de caso, que teve como objetivo analisar e conhecer os problemas de aprendizagem além de sugerir a intervenção de forma para sanar essas dificuldades. Identificação Nome: E. G. M. Data de nascimento: 21/11/2002 Sexo: Masculino Série que estuda: 2º ano Novato ou repetente: Novato Escola: Escola da Rede Municipal de Uberlândia Outras informações: • Nasceu com 6 meses e meio de gestação; • Mora com os pais, possui 2 irmãos com idade de 10 e 16 anos; • O pai tem 30 anos de idade e estava desempregado; • A mãe tem 31 anos e trabalhava como camareira; • Os médicos diagnosticaram comprometimento na fala; • Iniciou sessões de Psicomotricidade; • Briga constantemente com os irmãos. Justificativa (História da Queixa) Problematização A queixa trazida pela professora foi de que a criança teria sido diagnosticada como portadora de Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH). O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade é um dos distúrbios que podem ocorrer em crianças refletindo fortemente em sua aprendizagem. Trata-se da desordem comportamental mais comum na infância, seus sintomas mais característicos são níveis de atenção, concentração, atividade e impulsividade inapropriada ao desenvolvimento. Considerando que todo trabalho de pesquisa pretende responder algumas questões 2 problematizadoras, após conhecer a queixa da escola foram levantados os seguintes questionamentos: A criança realmente apresenta TDAH? Que fatores desencadeiam a dificuldade da aprendizagem de E. G. M.? Até então, não havia certeza sobre a presença do TDAH na criança. Dessa forma optamos por acompanhá-la em sala de aula por alguns dias e buscar informações concretas sobre a queixa, observando o seu comportamento durante as aulas, com os colegas e a professora. A preocupação dos pais é com a aprendizagem, principalmente no que se refere a leitura. Afirmavam que a criança briga muito com seu irmão de 10 anos e tem ciúmes do pai. Na escola é muito dependente e qualquer brincadeira consegue distraí-lo no momento das atividades propostas. A criança não se relaciona positivamente com seus colegas. Segundo a professora, os pais frequentam sempre as reuniões da escola com responsabilidade. Olham os cadernos diariamente, supervisionam as tarefas, lembram os horários, ensinam como fazer as atividades. A professora relatou que houve avanços em relação ao início do ano. A criança não gosta de formar palavras, devido à dificuldade de leitura, mas gosta das atividades de matemática. O material escolar é desorganizado. Tem problemas de faltas. Segundo o pai, a criança gosta de brincar, suas brincadeiras preferidas são jogar futebol e vídeo game. Com relação à fala, a criança começou a falar melhor e ser entendido primeiramente pela família aos três anos, aproximadamente. Atualmente não fala corretamente, troca algumas letras como por exemplo: o “r” pelo “l”. Objetivos do Estudo Este trabalho tem como objetivos: • analisar as dificuldades de aprendizagem e a pertinência em relação a queixa de TDAH; • apontar questões relevantes que podem estar influenciando negativamente no processo de ensino e aprendizagem; • Apresentar propostas para a “cura” dos sintomas. 3 Processo de Diagnóstico Psicopedagógico O que é o Diagnóstico O Diagnóstico Psicopedagógico é o processo investigativo que tem como objetivo embasar uma proposta de ação e analisar o processo de aquisição de conhecimento; ele busca verificar quais são as noções, representações, conceitos, operações e relações que validam as condições iniciais do sujeito para a construção de novas concepções. O Diagnóstico Psicopedagógico é um momento fundamental do trabalho psicopedagógico, tornando possível planejar uma intervenção de acordo com as necessidades de cada caso. Objetivos do diagnóstico Embasar a busca de caminhos ou recursos para sanar a dificuldade de aprendizagem, propondo uma intervenção que envolva a família e a escola. Instrumentos do diagnóstico O estudo foi realizado por meio dos seguintes instrumentos de coleta de dados: 1) Entrevista com a criança 2) Anamnese com o pai da criança 3) Entrevista com a professora 4) Atividade de desenho livre e auto-retrato com a criança 5) Conversa informal com o psicopedagogo da escola. A anamnese foi realizada com o pai, entrevista com o aluno e a professora, conversa informal com o psicopedagogo da escola, laudos que revelam a falta (parcial) de audição da criança, além de observação da criança em sala de aula e dos materiais escolares e desenho. Foi possível a realização da observação em sala de aula durante o Estágio (90 hs) para a disciplina de Estágio do 3º ano de Pedagogia da Universidade Federal de Uberlândia. Desenvolvimento do diagnóstico Fizemos o contato e mediação com a escola para conseguirmos as informações, atividades e anamnese. As entrevistas com o aluno e a professora aconteceram em horários de aula; com o pai, o contato foi feito após o período de aula. Conforme a entrevista com a professora, o aluno aceita as suas regras e têm melhorado 4 em vários aspectos como a postura (em sala) e a leitura, apesar de ser uma criança muito sensível (chora por qualquer motivo). Em conversa com a criança ela afirmou que não gosta da professora porque ela é brava demais, quanto aos colegas de sala, disse não gostar de interagir com a maioria. Considera que alguns batem nele sem motivo. Pela observação percebemos que ele realmente se relaciona mais intensamente com quatro colegas da sala, mostrando dificuldade de socialização com os demais. Não apresentou violência com os colegas, a não ser quando provocado. Durante as atividades propostas em sala de aula, o aluno se dispersou, fazendo os exercícios propostos quando a professora tem disponibilidade de supervisioná-lo ou acompanhá-lo individualmente. Segundo a docente, o menino seria aprovado para a série seguinte (terceiro ano), pois já conseguia formular palavras com aproximação da escrita correta, consegue escrever o nome, apesar de ainda apresentar muita dificuldade. Análise do diagnóstico Na análise do diagnóstico são ressaltadas as estruturas cognitivas, disponíveis a aquisição de novos conhecimentos e as potencialidades, as diferenças individuais devem ser respeitadas. A proposta de ação corresponde às características da criança em relação ao seu pensamento e a aspectos de seu desenvolvimento. O resultado das várias atividades comprovou que o menino apresenta dificuldade de aprendizagem e que necessita de intervenção psicopedagógica. A criança apresenta traços de personalidade infantilizada, se decepciona por qualquer motivo, se irrita a todo o momento nas brincadeiras com o irmão e qualquer brincadeira tira sua atenção no horário de estudo em sala de aula. Não se deve dizer que ele possui alguma deficiência, mas um grande potencial cognitivo. Assim vemos que para Fonseca (1995), a criança com dificuldade de aprendizagem não deve ser “classificada” como deficiente. Trata-se de uma criança normal que aprende de uma forma diferente, a qual apresenta uma discrepância entre o potencial atual e o potencial esperado. Não pertence a nenhuma categoria de deficiência, não sendo sequer uma deficiência mental, pois possui um potencial cognitivo que não é realizado em termos de aproveitamento educacional. 5 Não se pode afirmar que a criança tenha TDAH, pois o diagnóstico desse transtorno é muito complexo e deve ser realizado por uma equipe multidisciplinar. Por outro lado é preciso evitar os rótulos que em nada contribuem para o sucesso escolar. Processo de Intervenção Psicopedagógica Para o aluno: Trabalhar através do uso de material concreto, histórias, fichas, objetos, gravuras, recortes, jogos de memória, ordenar e narrar fatos exercitando a oralidade. Fazer acompanhamento com fonoaudiólogo. Para a família: A criança requer atenção, carinho, acompanhamento para que possa desenvolver suas habilidades, ela terá uma melhor evolução ser for acompanha e se sentir o apoio da família. A família deve ser constantemente presente para um melhor desenvolvimento da criança. É o que nos mostra Fernández (2001) a importância da família, que por sua vez, também é responsável pela aprendizagem da criança, já que os pais são os primeiros educadores e os mesmos determinam algumas modalidades de aprendizagem dos filhos. Para a escola: A alfabetização está atrelada a outras questões desestruturadas em sua realidade. Ensinar as atividades também em grupo para que ele aprenda a socializar melhor, aumentando a sua relação com os colegas e irmãos (escola e casa). Continuar o acompanhamento do aluno no AEE (Atendimento Educacional Especializado) trabalhando o processo de construção do saber ortográfico, bem como o melhor desenvolvimento da fala. Considerações Finais Temos a expectativa de que as intervenções realizadas proporcionem sucesso do aluno no desenvolvimento da aprendizagem, embora não seja a única responsável por ele. Como um fator facilitador da aprendizagem, a intervenção almeja desenvolver as capacidades do aluno, bem como eliminar ou diminuir obstáculos e dificuldades postas 6 a aquisição do conhecimento, enfim prepara- o para aprender a aprender. O psicopedagogo assume papel relevante na abordagem e solução dos problemas de aprendizagem e não procura culpados. De acordo com Bossa (2000, p. 14), “é comum, na literatura, os professores serem acusados de si isentarem de sua culpa e responsabilizar o aluno ou sua família pelos problemas de aprendizagem”, mas há um processo a ser visto, às vezes, os métodos de ensino precisam ser mudados, o afeto, o amor, a atenção, pois influenciam o processo. A psicopedagogia não lida diretamente com o problema, lida com as pessoas envolvidas. Lida com as crianças, com os familiares e com os professores, levando em conta aspectos sociais, culturais, econômicos e psicológicos, contribuindo assim para o processo de ensino e aprendizagem. Referências: BOSSA, Nadia A. A psicopedagogia no Brasil: contribuições a partir da prática. Porto Alegre, Artes Médicas, 2000. DOCKRELL, Julie, MCSHANE, John. Crianças com Dificuldades de Aprendizagem. FERNANDES, Alícia. A inteligência Aprisionada. Porto Alegre: Artmed, 1990. FONSECA, V. da. Introdução às dificuldades de aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995. PAÍN, S. Diagnóstico e tratamento dos problemas de aprendizagem. Artes Médicas, 1985. RAPPAPORT, Clara Regina. Psicologia do desenvolvimento. São Paulo: EPU, 1981. SCOZ, B. Psicopedagogia e Realidade Escolar: O Problema Escolar e de Aprendizagem, Petrópolis, R.J.: Vozes, 2002. YIN, Robert K. Estudo de Caso: Planejamento e Métodos. 3 ed. Porto Alegre: Bookman, 2005. 7 8