AS CONCEPÇÕES DE ALUNOS DE PEDAGOGIA SOBRE A INTERAÇÃO ADULTO/CRIANÇA NA EDUCAÇÃO INFANTIL SCHIBELOSKE, Reggiane Amato – PIBIC/UTP [email protected] SILVA, Neyre Correia da – UTP [email protected] Eixo Temático: Educação da Infância Agência Financiadora: Universidade Tuiuti do Paraná – UTP Resumo Este trabalho apresenta pesquisa realizada a partir do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC) da Universidade Tuiuti do Paraná (UTP), no período de agosto de 2010 a julho de 2011, cujo principal objetivo foi identificar as concepções sobre a interação adulto/criança na Educação Infantil em discentes do terceiro período do curso de Pedagogia da Universidade Tuiuti do Paraná, que estavam começando a cursar os componentes curriculares relacionados, diretamente, à docência em educação infantil. A pesquisa foi realizada através de estudo bibliográfico acerca do tema, investigando os conceitos de interação adulto/criança e de seu papel no desenvolvimento infantil, a partir das teorias de Wallon e Vygotsky. Definiu-se como principal instrumento de coleta de dados um questionário constituído de sete perguntas abertas que foi aplicado a dez alunos do referido curso de Pedagogia, primeiro semestre do ano de 2011. Após a coleta realizou-se a transcrição, sistematização e análise dos dados obtidos mediante a identificação de categorias que sintetizassem significações quanto ao objeto em estudo. Considerou-se que os participantes da pesquisa concebiam a interação adulto/criança como relevante para os processos de desenvolvimento e aprendizagem infantis, embora possuíssem algumas noções, ainda em processo de construção, incoerentes com conhecimentos já construídos acerca do trabalho pedagógico com crianças pequenas. Palavras-chave: Interação adulto/criança. Desenvolvimento. Aprendizagem. Educação infantil. Introdução O tema desta comunicação, as concepções de alunos no início da formação em Pedagogia acerca da interação adulto/criança em educação infantil, mostra-se relevante à medida que o conhecimento sobre o papel da interação adultos/professores e crianças auxilia 6899 na promoção de um ambiente em que a qualidade das interações seja fator de desenvolvimento e aprendizagem das crianças nesse segmento educacional. Segundo Browne (2010), as primeiras experiências de interação de uma criança com os outros ajudam a estabelecer os fundamentos de suas futuras relações e o seu desenvolvimento emocional contínuo. Nesse sentido, o adulto/educador deve adotar uma postura a fim de oportunizar as crianças práticas educativas enriquecidas de diferentes interações. Esta comunicação apresenta pesquisa que foi realizada a partir do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC) da Universidade Tuiuti do Paraná (UTP), no período de agosto de 2010 a julho de 2011, cuja problemática central decorre da seguinte questão: qual é a concepção dos alunos do curso de Pedagogia sobre a interação adulto/criança na educação infantil? E desta questão surgiu como principal objetivo: identificar as concepções sobre a interação adulto/criança na educação infantil em discentes do terceiro período do curso de Pedagogia da UTP, que estão cursando as disciplinas de Pesquisa e Prática Pedagógica: Estágio Supervisionado em Educação Infantil I e Fundamentos da Educação Infantil I, e que, portanto, estão iniciando a formação em pedagogia, mais especificamente, em relação à docência (e gestão escolar) em educação infantil A pesquisa foi realizada através de estudo bibliográfico acerca do tema, investigando os conceitos de interação adulto/criança e de seu papel no desenvolvimento e aprendizagem infantil, a partir das teorias de Wallon e Vygotsky. Elaborou-se e definiu-se como principal instrumento de coleta de dados um questionário constituído de sete perguntas abertas a ser aplicado aos alunos do terceiro período do curso de Pedagogia da UTP, primeiro semestre do ano de 2011. Após a coleta realizou-se a transcrição, sistematização e análise dos dados mediante a identificação de categorias que sintetizassem significações quanto ao objeto em estudo. Neste trabalho, apresentar-se-á uma síntese dos pressupostos teóricos pesquisados; e abordar-se-ão os principais resultados encontrados, mediante a explicitação de categorias de análise, estabelecidas a posteori, buscando articulá-las à teoria. Ao final, tecer-se-ão considerações finais, a título de síntese e de circunscrever algumas reflexões significativas. 6900 A Interação Adulto/Criança na Educação Infantil O termo interação, segundo Ferreira (2004), origina-se das palavras inter e ação, significando: ações que se exercem mutuamente entre duas ou mais coisas, ou duas ou mais pessoas; ação recíproca. Etimologicamente, o termo interação já enuncia seu valor em todos os contextos, nas relações entre os seres humanos e entres estes e o meio, principalmente por representar “algo” que se processa entre pessoas, que se inter influenciam reciprocamente. Essa perspectiva de interação como fenômeno dialógico, de reciprocidade e interdependência, está presente no trabalho de alguns autores que serão abordados a seguir. A Interação Adulto/Criança – Abordagem Walloniana A psicogenética de Wallon (1975) atribui ao meio lugar central no desenvolvimento infantil. O conceito de meio inclui a dimensão das relações humanas, a dos objetos físicos e a dos objetos de conhecimento, todas elas inseridas no contexto das culturas específicas. No início a criança age diretamente sobre o meio humano e é por intermédio deste que tem acesso às outras dimensões de seu contexto social. A teoria walloniana afirma que o desenvolvimento é marcado pelas alternâncias entre cognição e afeto, entre razão e emoção. Durante o processo de constituição do psiquismo, cognição e afeto vão “construindo-se reciprocamente, num permanente processo de integração e diferenciação.” (GALVÃO, 1995, p.45). O conflito entre razão e emoção é evidente, a primeira situa-se entre reações automáticas e a vida intelectual. A emoção é um veículo para o afeto e, de acordo com a concepção walloniana, é um estado psíquico mais primitivo que a tomada de consciência de si mesmo e do mundo, e fornecerá as bases para a construção da cognição e a produção da personalidade: “a razão nasce da emoção e vive de sua morte.” (DANTAS, 1992, p.85). Para o autor, “as emoções diferenciam-se de outras manifestações da afetividade cuja gênese depende da representação simbólica, como os sentimentos e as paixões.” (GALVÃO, 2003, p. 72). A gênese das emoções está nas primeiras relações que o bebê estabelece com a mãe e com outras pessoas significativas, sendo que a primeira orientação de sua ação e de vigilância é para as pessoas e não para os elementos materiais de seu meio. Enfatizamos, entretanto, segundo Galvão (2003), que a interação social não deve se restringir ao conceito de cooperação entre pares, entre pessoas, em direção de um objetivo comum. Numa perspectiva ampla e abrangente deve-se incluir na ideia de interação social 6901 também as relações dos indivíduos com as produções culturais historicamente acumuladas, frutos das interações humanas e das interações dos homens com o meio. Mesmo na ausência de um parceiro concreto ocorre a interação indireta, mediada pela linguagem, pela representação do outro através das manifestações culturais. Porém, “essa interação só é possível num processo de desenvolvimento das capacidades de representação mental e com o aprendizado das linguagens produzidas socialmente.” (GALVÃO, 2003, p.73) Na perspectiva walloniana, o ser humano se constrói na interação com o outro. As crianças, como seres concretos, devem possuir, na família, no espaço educativo e nos outros espaços com os quais interagem, os meios de se constituírem enquanto seres humanos, conscientes de sua condição de produzidos e de produtores de história e cultura. Enfatizamos, portanto, o papel de co-participante e de co-responsável que as instituições educativas devem assumir no processo de formação dos indivíduos, possibilitando interações de qualidade entre as pessoas, e destas com o conhecimento e produtos da cultura. Para tanto, os profissionais da educação devem planejar oportunidades e espaços ricos em interações adulto/criança, de modo a criar um ambiente favorável à aprendizagem, buscando compreender as preferências das crianças como também os aspectos expressivos de seu comportamento e postura. Outro autor que colabora para a compreensão sobre interação social e sobre sua importância, principalmente em se tratando de adultos e crianças, é Vygotsky, como abordaremos a seguir. A Interação Adulto/Criança – Abordagem Vygotskyana Vygotsky (apud REGO, 2010) considera o desenvolvimento humano como um processo de apropriação pelo homem da experiência histórica e cultural. A importância da intervenção de um indivíduo sobre outros com o objetivo de promover o desenvolvimento articula-se com um postulado básico do autor: a aprendizagem é fundamental para o desenvolvimento desde o nascimento da criança. A cultura surge como parte essencial da constituição do ser humano, num processo em que o biológico transforma-se em sociohistórico. A concepção vygotskyana, sobre as relações entre o desenvolvimento e aprendizado, estabelece forte ligação entre o processo de desenvolvimento e a relação do indivíduo com seu ambiente sociocultural e com sua situação de organismo que não se desenvolve 6902 plenamente sem o suporte de outros indivíduos de sua espécie. É na zona de desenvolvimento proximal que a interferência de outros indivíduos é a mais transformadora. A intervenção de outras pessoas – educador e pares – é fundamental para a promoção do desenvolvimento do indivíduo (OLIVEIRA, 1997). Na atividade educativa é interessante destacar que a interação entre as crianças também pode configurar intervenções no seu desenvolvimento. Os grupos de crianças são sempre heterogêneos quanto ao conhecimento já adquirido nas diversas áreas e uma criança mais avançada num determinado assunto pode contribuir para o desenvolvimento das outras. Assim como o adulto, uma criança também pode funcionar como mediadora entre outra criança e às ações e significados estabelecidos como relevantes no interior da cultura. Pode-se afirmar, segundo Rego (2010), que na medida em que a obra de Vygotsky traz reflexões sobre o processo de desenvolvimento psicológico humano também identifica diretrizes e a formulação de alternativas no plano pedagógico. No entanto, enfatiza-se que não há especificamente práticas prontas de aplicação no campo educativo; sua teoria possibilita a análise psicológica de elementos relacionados ao ensino e sua constante avaliação. A leitura da obra de Vygotsky permite identificar, em várias passagens, a atenção especial que dedica à educação escolar. Sua preocupação com esse tema é coerente com a perspectiva histórica, que considera fundamental a análise das condições concretas para o desenvolvimento de um determinado tipo de cognição. (REGO, 2010, p.103) Ressaltamos que a simples presença da criança no espaço educativo não é suficiente para que o desenvolvimento ocorra da forma descrita anteriormente. Dependerá da qualidade do ensino oferecido, bem como, da forma como os conhecimentos são sistematizados no ambiente escolar (REGO, 2010). Para a autora, na perspectiva vygotskyana, a qualidade do trabalho pedagógico relaciona-se com a possibilidade de avanços no desenvolvimento do indivíduo, necessita-se da intervenção, da interação de sujeitos mais experientes da cultura, para se consolidar a construção de conhecimentos, o que apenas pode ocorrer numa ação compartilhada. O adulto/educador no contexto escolar deve assumir a função de elemento mediador das interações entre crianças e dessas com os objetos de conhecimento. Deve, portanto, colocar-se como “parceiro privilegiado, justamente porque tem maior experiência, informações” (REGO, 2010, p.115), e com a incumbência de tornar acessíveis às crianças 6903 elementos culturais formulados pelos homens, e desafiar os processos de aprendizagem e desenvolvimento infantil. Para Vygotsky (apud REGO, 2010), incentivar a curiosidade das crianças, possibilitar a troca de informações por meio de um planejamento que envolva observação, pesquisa, resolução de questões específicas, são elementos fundamentais nas propostas do profissional do processo educativo. E esses aspectos devem ser evidenciados na formação de professores e profissionais da educação. A partir de tais considerações, abordaremos a seguir a relevância da formação de professores e pedagogos para o reconhecimento da interação social como fundamental no processo de desenvolvimento e aprendizagem infantil. A Formação de Profissionais da Educação Infantil e as Interações Adulto/Criança Quando pensamos na formação dos profissionais da educação infantil precisamos refletir sobre que caminhos, conquistas e dificuldades constituem a história deste ofício. Kramer (2005), com base em entrevistas realizadas com profissionais da educação infantil no estado do Rio de Janeiro, apresenta histórias pessoais de formação, identificando os diversos caminhos que levam os profissionais a atuarem nessa área; sendo que alguns o fazem por opção, outros pela imposição das famílias e/ou pela falta de recursos e alternativas, gerando então, uma escolha forçada, mas que, em alguns casos, tornou-se prazerosa e estimulante. De acordo com a autora, na análise das entrevistas realizadas, compreende-se que ao realizarmos os cuidados básicos de higiene da criança, utilizando-se para isto dos recursos que dispomos em nossa cultura, já estamos procedendo sua educação. Quando o cuidar e o educar são vistos como processos independentes, referindo-se ao corpo e ao cognitivo, respectivamente, as práticas pedagógicas são pensadas de forma distinta umas das outras. O cuidar relacionado ao corpo é uma concepção imposta historicamente. Quando a educação infantil passa a ser considerada a primeira etapa da educação básica houve a necessidade de integrar práticas pedagógicas às atividades de assistência, surgindo assim esse binômio: cuidar e educar (NASCIMENTO et al. 2005) . Com esse debate, surge então a necessidade de formular políticas de formação de profissionais, além de se pensar em diversas concepções de currículo e diferentes alternativas práticas. O currículo deixa de ser considerado apenas definição de conteúdos, objetivos e metodologias estabelecidas por faixa etária, amplia-se e articula-se com a discussão sobre 6904 aspectos referentes à organização, funcionamento e relações, constituindo um conjunto de fatores essenciais para a prática pedagógica em uma instituição educativa, ou seja, o currículo passa a ser integrante da Proposta Político Pedagógica. Pensar em currículo na educação infantil pressupõe discussões sobre as possibilidades de descoberta, apropriação, transformação e produção de conhecimentos pelas crianças de 0 a 6 anos. A criança é um sujeito de direitos e produtor de cultura, portanto, um sujeito histórico cultural, e possui especificidades no seu desenvolvimento. De acordo com Faria e Salles (2008), a instituição de educação infantil deve concretizar ações no sentido de fazer com que as crianças sintam-se seguras e saudáveis; aprendam a respeitar a diversidade; se apropriem de forma crítica e autônoma de linguagens, valores e costumes da cultura, construam sua identidade e autonomia; sintam-se desfiadas em busca da compreensão do mundo; bem como, se desenvolvam na sua integralidade, em aspectos cognitivos, afetivos, físicos, sociais, éticos e estéticos. Portanto, devemos nos voltar para o processo de formação de pedagogos, desde as concepções construídas acerca de educação infantil até o seu olhar em relação à criança que deseja formar. Vejamos a seguir, a apresentação e análise de dados coletados em pesquisa com alunos em processo de formação em pedagogia acerca de suas concepções sobre a interação adulto/criança na educação infantil e sobre o papel desta interação no desenvolvimento da personalidade da criança pequena. Apresentação e Análise dos Dados Os principais instrumentos metodológicos de pesquisa constituíram-se em: estudo bibliográfico, a partir da revisão e reconhecimento da temática em publicações clássicas e atuais; e pesquisa de campo por meio da aplicação de questionário aos alunos do terceiro período do curso de Pedagogia da UTP, no mês de abril de 2011. Os questionários possuíam sete questões abertas e foram submetidos a dez discentes. Os dez participantes situavam-se na idade de dezoito a quarenta e dois anos, sendo que três estavam entre dezoito e dezenove anos; quatro, entre vinte e um a vinte e sete anos; e três situavam-se entre trinta e cinco a quarenta e dois anos. Dos dez pesquisados, três estavam atuando em educação infantil, com a faixa etária de oito meses a cinco anos, em instituições particulares. Nove participantes da pesquisa pertenciam ao sexo feminino e encontravam-se 6905 cursando a primeira graduação, e um dos participantes, o único do sexo masculino, é graduado em filosofia e possuía pós-graduação stricto sensu em educação. O questionário foi construído de modo a investigar, mediante perguntas abertas, a concepção sobre: a interação entre as pessoas; a interação entre adulto/criança; a interação do professor com crianças de 0 a 2 anos; a interação do professor com crianças de 3 a 5 anos; as consequências da interação adulto/criança para o desenvolvimento da personalidade da criança pequena (0 a 5 anos); e como observar a interação entre adultos e crianças na educação infantil. E uma das questões solicitava que os participantes descrevessem uma prática de educação infantil com crianças de 0 a 2 anos que propiciasse a interação adulto/criança. Aos submetermos os dados à análise no sentido de buscarmos núcleos de significados que revelassem como os pesquisados concebiam a interação adulto/criança, emergiram as seguintes categorias: 1) a concepção sobre o que é interação entre pessoas; 2) a concepção sobre o que é interação adulto/criança; 3) a concepção sobre a interação do professor com crianças de 0 a 2 anos; 4) a concepção de práticas educativas com crianças de 0 a 2 anos que propiciassem interação adulto/criança; 5) a concepção acerca da interação (e da prática educativa) do professor com crianças de 3 a 5 anos; 6) a concepção do papel da interação adulto/criança para o desenvolvimento da personalidade infantil; 7) a concepção dos participantes sobre quem é a criança; e 8) a concepção sobre como observar a interação adultos/crianças na educação infantil. A seguir apresentaremos cada uma dessas categorias, com os tipos de respostas que as caracterizaram. Em relação à primeira categoria, surgiram os seguintes tipos de significação sobre o que é interação entre pessoas: troca/compartilhar (em grupo); compreensão/conhecimento recíproco; relação/relacionamento; prática ativa entre pares; [algo] que transforma, que desenvolve, reciprocamente; convivência; vínculos; reciprocidade. Destaca-se nas respostas de alguns participantes a ideia de que a interação entre pessoas “favorece o desenvolvimento”, “um transforma o outro”, que é compatível com as perspectivas tanto de Vygotsky como de Wallon. Para o primeiro autor, a partir de Rego (2010, p.58), “as características individuais (modo de agir, de pensar, de sentir, valores, conhecimentos, visão de mundo etc.) dependem da interação do ser humano com o meio físico e social.” Assim, o indivíduo que é privado do contato com seres da sua espécie não se 6906 desenvolve como tal, ou seja, o desenvolvimento humano está relacionado com a inserção dinâmica da criança em um dado contexto sociocultural. Sobre a interação adulto/criança (alvo central deste trabalho), apareceram diversas respostas, cujas palavras-chave encontram-se destacadas a seguir com exemplos de respostas entre parênteses. Os participantes, portanto, afirmavam que a interação adulto/criança ocorria por meio: da afetividade; do contato físico; de brincadeiras; do trocar/dividir experiências em conjunto; do cotidiano (“a interação ocorre no dia a dia”, “a convivência contínua é o modo de agir do adulto com a criança”); da aprendizagem (“a partir do momento no qual tanto o adulto quanto as crianças possam aprender um com os outros”); de práticas educativas (“pode-se criar um processo de interação quando o adulto cria situações dirigidas, conta histórias”); do conhecimento da criança (“através do conhecimento da vivência e experiência da criança”); da linguagem (“através de diálogo de propostas onde ambos tenham uma prática ativa e proporcione aprendizado”). Os participantes deram ênfase à afetividade, às brincadeiras, às práticas educativas, e à linguagem como elementos centrais na definição das interações adulto/criança. Segundo Vygotsky (apud OLIVEIRA, 1997), no contexto educacional o adulto deve atuar como mediador das ações infantis de modo que as crianças constituam significados no interior da cultura. Para o autor, a fala exerce papel fundamental como organizadora da atividade prática e das funções psicológicas humanas. E o brinquedo é uma importante fonte de promoção do desenvolvimento, este exerce uma enorme influência na evolução infantil. Quanto aos conceitos relacionados a como ocorre a interação do professor com crianças de 0 a 2 anos (terceira categoria), aparecem as seguintes expressões, alguns já citadas anteriormente: na roda de conversa; na hora de cantar; no cuidar (“na higiene, na alimentação”; “devido à idade acho que o ‘cuidar’ prevalece ao ‘educar’ em algumas situações, porém ocorrem os dois”); nas brincadeiras/situações mais lúdicas (“até mesmo do brincar livre, o professor sentado brincando junto com as crianças”; “deve ocorrer pela linguagem lúdica, ou seja, estimulando as crianças pelos mais variados modos possíveis, brinquedos”); na afetividade (“coisas que propiciem o bem-estar da criança”); no convívio com as crianças; no planejamento e execução de práticas educativas (“através de estímulos adequados à faixa etária e ao desenvolvimento da criança com objetivos pré-estabelecidos ou não pelo professor”). 6907 Em algumas transcrições, percebe-se uma importante referência à afetividade como elemento definidor da interação do professor com crianças pequenas, principalmente com as de 0 a 2 anos. Isto é coincidente com a ênfase atribuída por Wallon (1975) ao aspecto emocional. Para o autor, o desenvolvimento deve ser compreendido como um processo de integração entre o ato motor, a afetividade e a inteligência, e do ponto de vista das relações que o indivíduo estabelece com o meio. A emoção é um estado primitivo e fornecerá as bases para a construção da cognição e da personalidade (DANTAS, 1992). Note-se também que, embora os participantes concebam as práticas educativas como forma de interação professor/criança de 0 a 2 anos, intencional e planejadamente propostas, afirmam que nessa faixa etária a interação professor/criança se dá mais pelas ações do “cuidar” (higiene, alimentação etc.), apresentando uma visão dicotômica entre o cuidar e educar. Isto, de certo modo, se confirma quando examinamos as respostas dos pesquisados à solicitação de que descrevessem uma prática educativa que propiciasse a interação do professor com a criança de 0 a 2 anos, a quarta categoria – a concepção de práticas educativas com crianças de 0 a 2 anos que propiciem interação adulto/criança: práticas de cuidar (“acredito que o próprio cuidar já é uma prática que propicie a interação entre o adulto e a criança”); técnicas de contação de histórias, dramatizações com fantoches, bonecos e música; brincadeiras dirigidas e livres e jogos cooperativos (“brincadeiras como imitar sons e movimentos dos animais, desde que estes sejam conhecidos e já façam parte do cotidiano deles”; “brincadeiras de roda”); brincadeiras com movimentos (“brincar de bola vai e boa vem, na qual a criança irá aprender os movimentos”; “construir um pequeno túnel de caixas de papelão com janelas e estimulá-los a passar”); priorizar o contato físico; a roda de conversa (“a criança participa, conta como foi o seu dia, os lugares que frequentou, atribuindo noções de tempo, espaço etc.”). Observe-se que os pesquisados descrevem várias atividades em que as brincadeiras (especialmente as motoras) e o contato físico aparecem como principal meio para favorecer a interação adulto/criança na educação infantil. No entanto, nesse item surgiram alguns conceitos que podem ser questionados, pois não são coerentes com os conhecimentos acerca do trabalho pedagógico com crianças dessa faixa etária, como é o caso da roda de conversa, da proposição de jogos cooperativos e, até mesmo, da contação de histórias, uma vez que tais atividades requerem que a criança tenha desenvolvido a linguagem, a função simbólica. 6908 Vygotsky (2000) afirma que a verdadeira essência do comportamento humano complexo se dá a partir da unidade dialética da atividade simbólica (a fala) e a atividade prática. Destaca-se que, para alguns participantes, a prática de cuidar identifica-se com interação, o que pode não se verificar no cotidiano educativo, pois ao cuidar, necessariamente, o adulto pode não estar “inter agindo”, “inter-atuando” com a criança. Sobre a quinta categoria, a concepção acerca da interação (e da prática educativa) do professor com crianças de 3 a 5 anos, obtiveram-se os seguintes tipos de respostas: com afeto; em brincadeiras, jogos e dinâmicas; no contato individual (“no momento individual”; “quando o professor faz mediação com a criança”); no planejamento e execução de práticas educativas (“através de estímulos adequados à faixa etária e ao desenvolvimento da criança com objetivo pré-estabelecido ou não pelo professor”); nas práticas educativas com a linguagem oral, corporal e escrita (“com situações dirigidas, onde o aluno pode ser ouvido dentro das próprias atividades”; “pela linguagem tanto falada como corporal, como atividades físicas mais elaboradas”; “deve ocorrer a educação sem adiantar a alfabetização”; “rodas de conversa, onde o aluno pode ser ouvido”); conhecendo cada criança. Note-se importante ênfase à compreensão de que a interação professor/criança de 3 a 5 anos deva acontecer por meio de práticas educativas que priorizem a linguagem, principalmente a oral. Isto, de certo modo, coincide com o que Brito (apud Barbosa, 2009) propõe a respeito da caracterização das ações realizadas com a linguagem por crianças de 4 a 5 anos e pelas professoras nos momentos de roda da creche, afirmando que este é um espaço pedagógico com papel importante no movimento discursivo das crianças. A autora discorre sobre as sutilezas que constituem esse movimento, como a ideia de que cada enunciado é único e concreto ou de que as falas desses sujeitos sempre têm em mente um auditório social. Na perspectiva walloniana, a estruturação do ambiente escolar, fruto do planejamento, deve conter reflexões sobre as oportunidades de interações sociais oferecidas. Wallon (1975) considera que a educação deve integrar aos seus objetivos as dimensões sociais e individuais, devendo atender simultaneamente à formação do indivíduo e da sociedade. Em relação à concepção do papel da interação adulto/criança para o desenvolvimento da personalidade da criança, sexta categoria, emergiram determinados conceitos: adulto como modelo/exemplo (“o adulto serve de modelo para a criança”); a ação do adulto deve ser cautelosa/responsável devido às suas implicações no desenvolvimento infantil (“na mediação o professor tem que ser cauteloso para que não cause nenhum trauma na criança”; “quando se 6909 trata de criança deve haver mais responsabilidade nas ações, cuidado, orientação, mediação etc.”); produtiva ou não, depende do tipo de interação do professor (“conforme ocorre a interação e o nível dela, pode ocorrer um maior ou menor grau de desenvolvimento”; “refletirá na formação da criança, no seu desenvolvimento, essa interação pode ser mais ou menos produtiva dependendo da concepção do professor e de sua práxis”). Tornou-se relevante nesse item a ideia de que a criança desenvolve-se e aprende por imitação ao adulto, tendo este um papel fundamental, do qual deve se conscientizar, como bastante ressaltado pelos pesquisados. Tal noção também aparece como central em algumas perspectivas teóricas. A imitação em Vygotsky, segundo Oliveira (1997), é a reconstrução individual daquilo que é observado nos outros, é balizada pelas possibilidades psicológicas da criança que realiza a imitação, e constitui, para ela, a criação de algo novo a partir do que observa no outro. Ao analisar, mais cuidadosamente, as respostas dos participantes ao questionário como um todo, observamos a emergência de uma categoria, a sétima, que se pode entrever nos enunciados implícitos: a concepção sobre quem é a criança. Dentro dessa categoria surgiram os seguintes conceitos, caracterizados pelos tipos de respostas transcritas abaixo: a) Sobre sua natureza: “brincar é da criança”. b) Conhecimentos Genéricos: “a fase do 0 aos 5 anos é delicada, porque tem implicações para o futuro da criança”; “as crianças às vezes falam todas juntas ao mesmo tempo”; “a criança precisa sentir confiança, para que você possa interagir com ela.” c) Desenvolvimento da personalidade e aprendizagem: “a criança desenvolve/organiza sua personalidade tomando como exemplo o adulto, aprende por imitação”; “a criança aprende imitando o adulto”. d) Conhecimentos sobre o faixa de 0 a 2 anos: “nesta fase elas se desenvolvem muito rápido”; “nesta fase a criança ainda está muito apegada com a mãe”. e) Conhecimento sobre o faixa de 3 a 5 anos: “nesta fase, a criança já tem uma noção um pouco maior” Essas noções e conceitos implícitos podem refletir conhecimentos em processo de construção acerca de quem é a criança de 0 a 5 anos e seu desenvolvimento psíquico, elemento fundamental para uma prática pedagógica consciente em educação infantil. A inserção do aluno-docente no campo educacional possibilita uma aventura pessoal, escolhas e reflexões. Ele deve aventurar-se a ir além dos hábitos de pensar e fazer. Ao entrar em contato 6910 com a instituição educativa, revela-se a sua frente um contexto de relações complexas e específicas – instituição, crianças, educadores, profissionais em geral – cada pessoa pode “se ver” e, dessa forma, aprender mais sobre si, “à medida que eu me vejo, posso melhor ver e compreender o outro.”(OSTETTO, 2008, p.129) Por fim, na oitava e última categoria, a concepção sobre como observar a interação adultos/crianças na educação infantil, identificaram-se os seguintes conceitos: [a observação deve se dar] mediante práticas (“nas atividades aplicadas em que o professor participe também”; “observando a prática – a didática e métodos utilizados – do professor e como se dá a relação adulto/criança”); mediante conversa (“que as crianças também tenham voz e sejam ouvidas, em suas expressões, sentimentos, desejos”); através de anotações (“a mais fidedigna possível”); e [a observação deve se dar em] momentos de manifestação de carinho/afeto e respeito (“uma maneira que o professor demonstre seu carinho, afeto, respeito a criança e faça seu trabalho com muito amor e dedicação aos pimpolhos”; “se houvesse demonstrações de carinho, cuidado, dedicação, preocupação, doação, vínculo”; “quando o adulto respeita o espaço da criança, seus limites”). Nota-se surgiu a afirmação de que a observação da interação adulto/criança na educação infantil deve acontecer mediante o uso de anotações. E, de fato, o registro escrito nos possibilita refletir sobre como nos relacionamos, seja com o conhecimento, seja com as crianças, com o trabalho educativo em geral, e sobre as demandas do cotidiano de ser professora. Permite a construção do processo de formação. Segundo Ostetto (2008), o aspecto essencial para a formação de professor é aprender a olhar, ampliando o foco de visão, mirando na diversidade por meio da sensibilidade que acolhe as diferenças. Ninguém poderá acolher o outro fora de si se não acolhe o outro interno. Trazer para o plano da análise sentimentos que perpassam o cotidiano compartilhado com as crianças é fundamental para o educador – é reconhecer sua condição humana. Considerações Finais Acredita-se que o objetivo inicial (identificar as concepções dos discentes em processo de formação em Pedagogia acerca da interação adulto/criança na Educação Infantil) foi cumprido na sua integralidade. Concluiu-se que os participantes da pesquisa concebem a interação adulto/criança como sendo troca, relação/relacionamento e conversa, por meio de afeto e de práticas livres (brincadeiras) ou dirigidas (práticas educativas), e como relevante 6911 aos processos de desenvolvimento e aprendizagem infantis. Evidenciam-se ainda conceitos que dissociam o cuidar do educar, e a identificação do cuidar com interação adulto/criança, além de se apresentarem algumas noções incoerentes com conhecimentos já construídos acerca do trabalho pedagógico com crianças pequenas. Este estudo oportunizou a reflexão sobre a necessária inserção dos alunos em formação nos espaços educativos concretos, creches e pré-escolas, como forma de aproximação e integração ao campo de estágio, de orientação do seu olhar para o contexto educativo, entrando em contato com o novo e desconhecido e com a possibilidade de se constituírem diferentes aprendizagens, sendo-lhes possível confrontar suas concepções iniciais com as que serão construídas mediante a vivência formativa. REFERÊNCIAS BARBOSA, S. “É tudo sorvete! – Enunciados e expressões das crianças na creche.” In: KRAMER, S. (org.) Retratos de um desafio. São Paulo, SP: Ática, 2009, p.65-81. BROWNE, N. O desenvolvimento social e emocional das crianças. In: PAIGE-SMITH, A; CRAFT, A. (orgs.) O desenvolvimento da prática reflexiva na educação infantil. Porto Alegre: Artmed, 2010, p.86-103. DANTAS, H. A afetividade e a construção do sujeito na psicogenética de Wallon. In: LA TAILLE, Y.; OLIVEIRA, M. K.; DANTAS, H. 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