2017
um novo começo
Itinerários Formativos dos Educadores Sociais Maristas
maristas
Itinerários
Formativos dos
Educadores
Sociais
Maristas
O currículo com enfoque
em direitos na
Educação Integral
Itinerários
Formativos dos
Educadores
Sociais
Maristas
Este livro, ou parte dele, pode ser reproduzido por qualquer meio sem autorização
escrita do Editor, desde que mantida a referência e respeitados os direitos de autoria
e edição de acordo com as Leis Brasileiras.
I88
Itinerários formativos dos educadores sociais Maristas: o
currículo com enfoque na educação integral. -- Brasília, DF :
UMBRASIL, 2015.
129 p. ; il. ; color
ISBN: 978-85-8563200-32-7
1. Educação integral. 2. Política de educação. 3. Educação
inclusiva. 4. Ensino religioso. 5. Marista – Ensino –
Formação.
CDU: 2-75
União Marista do Brasil (UMBRASIL)
SCS – Quadra 4 – Bloco A – 2º Andar
Edifício Vera Cruz – Asa Sul – Brasília – DF – 70304-913
Telefax: (61) 3346-5058
www.umbrasil.org.br – [email protected]
Expediente
Presidente do Conselho Superior
Ir. Wellington Mousinho de Medeiros
Diretor-Presidente
Ir. Claudiano Tiecher
Secretário-Executivo
Ir. Valter Pedro Zancanaro
Comissão de Solidariedade (2012 - 2014)
Alair Bento dos Santos
Arlete Dias de Moraes
Bárbara Pimpão Ferreira
Cláudia Laureth
Deysiane Farias Pontes
Eliane Guedes Gassen
Gustavo Balbinot
Ir. Davi Nardi
Ir. Jorge Gaio
Ir. Pedro Vilmar Ost
Ir. Ivonir Antonio Imperatori
Juliana Kuwano Buhrer
Leila Regina Paiva de Souza
Viviane Aparecida da Silva
Comitê Científico
Bárbara Pimpão Ferreira
Eulália Maria Sombra Pinheiro
Karina Amâncio Rodrigues
Mércia Maria Silva Procópio
Sônia Maria de Souza Bonelli
Projeto gráfico e diagramação
Válvula Agência Interativa
www.valvulainterativa.com.br
Os projetos, os conceitos, os textos assinados e as
opiniões aqui expressas compõem esta publicação a
título de contribuição ao debate e são de responsabilidade exclusiva dos autores.
Sumário
APRESENTAÇÃO
6
ITINERÁRIO FORMATIVO VIVIDO
8
PARTE I – A PROPOSTA DE FORMAÇÃO DE EDUCADORES
SOCIAIS NA PERSPECTIVA DA SOLIDARIEDADE E INTERSETORIALIDADE DAS POLÍTICAS DE EDUCAÇÃO E ASSISTÊNCIA SOCIAL
13
A FORMAÇÃO DE EDUCADORES E A ARTICULAÇÃO DAS PROPOSTAS DE
EDUCAÇÃO INTEGRAL E ASSISTÊNCIA SOCIAL EM DESENVOLVIMENTO NO
BRASIL MARISTA
Bárbara Pimpão Ferreira
Eulália Maria Sombra Pinheiro
Gláucia Martins Schneider
14
AÇÃO SOCIOEDUCATIVA: CONCEPÇÕES E PRÁTICAS NO PROCESSO
PEDAGÓGICO
Gillys Vieira da Silva
Neuzita de Paula Soares
Paulo Fioravante Giareta
28
PARTE II – A SISTEMATIZAÇÃO DA PRÁXIS
39
TEMÁTICA 1 - INFÂNCIAS, ADOLESCÊNCIAS E JUVENTUDES
40
FORMAÇÃO DE VALORES: REFLEXÕES E POSSIBILIDADES
Giovanna Cristina Gomes de Melo Viol Suzuki
41
REFLEXÕES E PRÁTICAS PARA EDUCAÇÃO INFANTIL
Valeria Terezinha dos Santos
52
TEMÁTICA 2 - EDUCADORES SOCIAS MARISTAS
58
EDUCADOR SOCIAL: LIMITES E POSSIBILIDADES PARA A PRÁTICA SOCIOEDUCATIVA
Lucirene Mikoski
59
A ATUAÇÃO DO EDUCADOR NA EDUCAÇÃO INCLUSIVA
Eliane Teresinha Eismann Vivian
67
TEMÁTICA 3 - AÇÃO SOCIOEDUCATIVA MARISTA
76
A PRÁTICA PEDAGÓGICA DO EDUCADOR SOCIAL: A IMPORTÂNCIA DE
ENSINAR DE UM JEITO DIFERENTE
Darlla Barbosa Spínola
77
O PAPEL DA AFETIVIDADE NA CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO
Patrícia da Costa Santos Rosado
85
TEMÁTICA 4 - EDUCAÇÃO INTEGRAL E APOIO SOCIOEDUCATIVO
92
EDUCAÇÃO INTEGRAL COMO TEMPO INTEGRAL
Anna Karolina Soares
93
ARTES VISUAIS NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO INTEGRAL: CONTRIBUINDO PARA O PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO DO SER HUMANO
Juliana Silva Menecucci
100
EDUCAÇÃO INTEGRAL: DESAFIOS PARA O CENTRO SOCIAL MARISTA
CAÇADOR
Bibiane Baldassari das Neves
110
O USO DE CADERNOS DE REGISTROS COMO ESTRATÉGIA PARA TRABALHAR A ESCRITA E A LEITURA COM CRIANÇAS E ADOLESCENTES:
RELATO DE EXPERIÊNCIA DA OFICINA DE EDUCOMUNICAÇÃO
Claudia Aparecida dos Santos Azevedo
120
PALAVRAS FINAIS
130
Educadores Sociais Maristas
6
APRESENTAÇÃO
A Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) afirma que toda pessoa
tem direito à educação. Partindo desse pressuposto, precisamos propiciar às
pessoas uma educação que vise à liberdade, à partilha e à autonomia. Na urgência de dar sentido à vida, os educadores têm papel preponderante na sociedade. Sendo a educação uma prioridade, assumimos a responsabilidade
pelo mundo.
É importante que os educadores, antes de tudo, em âmbito da educação destinada às nossas crianças, adolescentes e jovens, sejam testemunhas de amor e
coragem, pois vivemos em constante aprendizagem e acolhemos os diferentes
saberes como composição de uma educação que privilegia a inclusão de todos. Por ela, a formação de educadores e educandos promove pessoas como
um ser crítico, agente do mundo e capaz de transformar este mundo num lugar
melhor.
A privação absoluta das pessoas, inclusive da educação, implica diretamente
a privação relativa na participação democrática. O dilema das distorções sociais, por meio das desigualdades socioeconômicas, se configura extremado
em nossa atual sociedade. O que se acirra ainda mais por meio da ilusão da
liberdade e da igualdade como pressupostos para legitimar uma democracia
participativa.
No rastro de termos uma sociedade mais justa, acreditamos que pela educação aprimoramos a vida humana, pois olhamos as relações que estabelecemos
com os outros, com o mundo e com os olhos da fé; nos relacionamos com o
transcendente, nos remetendo, assim, às condições para a criação da existência. Por isso, a educação implica a ética por buscar humanizar o mundo. É da
natureza dela ser mais, o que demarca radicalmente a nossa presença no mundo. Conscientes de que não estamos sós neste mundo, a educação pode nos
tornar pessoas de escolhas, de decisões, tornando-nos presença no mundo.
Pode-se, por meio dela, romper com o já estabelecido, cultivar a esperança de
novos começos, promovendo uma sociedade galgada na cultura de Direitos.
Nesse sentido, o conjunto de textos aqui abordados nos inspira a sermos mais;
das reflexões aqui registradas, frutos do Curso de Educadores Sociais Maristas, inferimos uma série de leituras que poderão nos enriquecer para qualificar
nossas propostas educativas.
Ir. Lúcio Gomes Dantas
APRESENTAÇÃO
7
Educadores Sociais Maristas
8
ITINERÁRIO
FORMATIVO VIVIDO
O Brasil Marista, por meio de suas Províncias e da União Marista do Brasil (UMBRASIL), desenvolve projetos e ações articuladas com o objetivo de potencializar a presença e a ação Marista no país. Esses projetos respondem, em âmbito
nacional, a uma demanda da comunidade educativa em capacitar por meio de
formações específicas as lideranças responsáveis pelo atendimento a crianças,
adolescentes e jovens nos espaços educativos de educação básica, assistência
social e educação ensino superior.
A oportunidade de desenvolver um Programa de Formação para Educadores
Sociais presente nos centros educacionais, sociais e escolas Maristas do Brasil
mobilizou a Comissão de Solidariedade e as áreas de gestão das unidades administrativas do Brasil Marista, em 2010, a desenvolver e ofertar um curso na
modalidade a distância, relacionando as políticas públicas de Educação Básica
e Assistência Social e o currículo com enfoque em direitos, proposto nos espaços educativos Maristas de educação básica e assistência social com atendimento gratuito a crianças, adolescentes e jovens.
O curso Educadores Sociais Maristas, desenvolvido entre o segundo semestre
de 2012 e o primeiro do semestre de 2013, teve como objetivo formar profissionais que atuem nas realidades de maiores vulnerabilidades, especialmente na área dos direitos de crianças e adolescentes, visando a vitalidade e a
sustentabilidade da Missão Marista por meio da formação institucional e profissional continuada dos educadores. O curso ofertou 150 vagas para educadores
sociais Maristas de todas as regiões do país, em modalidade de educação a
distância (EaD), pelo ambiente virtual de aprendizagem MOODLE 2.0, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS1. Com carga horária
de 130 horas, o curso organizado em seis módulos centrou suas reflexões em
temas emergentes das práticas dos educadores.
O primeiro módulo teve como objetivo a apresentação da plataforma aos
participantes no sentido de criar familiaridade junto ao ambiente virtual de
aprendizagem. O segundo módulo Infâncias, Adolescências e Juventudes
teve como objetivo destacar o conceito e as possíveis leituras para a realidade
dos educandos. O terceiro módulo Educação Integral e Apoio Socioeducativo
considerou a relevância entre a intersetorialidade das políticas e os programas
de educação básica e assistência social em desenvolvimento nos municípios e
as organizações que compõem os territórios em que vivem os educandos.
O quarto módulo Ação Socioeducativa Marista apresentou em seu programa a
contribuição das províncias Maristas na educação das infâncias e juventudes; a
Educação Popular como chave da ação socioeducativa; a mediação pedagógica e
1 http://www.pucrs.br/portal/
ITINERÁRIO
FORMATIVO VIVIDO
9
Educadores Sociais Maristas
10
sua relação nas atividades com o projeto educativo do Centro Social e Educacional e Escola Marista; as rotinas e convivência nos espaços socioeducativos;
ética e epistemologia e desenhos possíveis para pensar boas práticas. O quinto
módulo Metodologia de Projetos destacou as especificidades entre programas, projetos e serviços sociais; o trabalho com projetos na prática socioeducativa, sua elaboração e a construção de indicadores de resultados e impactos;
o monitoramento e a avaliação e as parcerias e gestão compartilhada. O sexto
módulo Educadores Sociais Maristas centrou nos estudos sobre perfis e identidade do educador social; os marcos legais da profissão, bem como a pedagogia Marista nos espaços educativos.
A conclusão do curso foi a elaboração de artigos e ensaios produzidos pelos educadores participantes da formação, para sistematização das práticas e
experiências vivenciadas durante os estudos realizados e as reflexões sobre o
cotidiano.
Ao proporcionar a reflexão compartilhada em diferentes regiões do país, bem
como a sistematização de experiências das práticas cotidianas e das aprendizagens por meio da educação continuada dos educadores, a Rede Marista de
Solidariedade do Brasil Marista apresenta nesta trajetória qualificar um projeto
de excelência acadêmica e de educação integral aos educandos.
Participaram do curso 149 educadores de todas as regiões do país em que há
presença Marista, sendo 66% mulheres e 34% homens. Do total de participantes, 72 artigos e ensaios foram produzidos.
Esta publicação apresenta a trajetória de educadores Maristas no percurso
reflexivo de suas práticas fundamentadas pelo posicionamento institucional
frente à educação e à defesa dos direitos de crianças, adolescentes e jovens.
Os estudos, diálogos e reflexões que permearam os espaços educativos durante a realização do curso permitiu a sistematização das práticas pelos autores que, cotidianamente, estão junto às infâncias e juventudes, criando novas
oportunidades de conhecimento na troca de vivências e saberes por meio do
registro de suas práticas.
11
Desejamos ao leitor que esta publicação fomente novos acenos e práticas nas
comunidades educativas e possibilite a construção de currículos com enfoque
em direitos, na formação integral dos sujeitos nas propostas e nas práticas
cotidianas.
ITINERÁRIO
FORMATIVO VIVIDO
Boa leitura!
1
PARTE I
A PROPOSTA DE
FORMAÇÃO DE
EDUCADORES SOCIAIS
NA PERSPECTIVA DA
SOLIDARIEDADE E
INTERSETORIALIDADE DAS
POLÍTICAS DE EDUCAÇÃO E
ASSISTÊNCIA SOCIAL
Recordemo-nos de Maria e José fugindo rapidamente
para o Egito a fim de proteger o Menino Jesus. Esta imagem nos inspira a converter-nos em peritos e defensores dos direitos das crianças e jovens de maneira valente
e profética, nos espaços onde são definidas as políticas
públicas. Sentimo-nos levados a desafiar as políticas sociais, econômicas, culturais e religiosas que oprimem as
crianças e os jovens.
(XXI Capítulo Geral, p. 23)
14
Educadores Sociais Maristas
A FORMAÇÃO DE EDUCADORES
E A ARTICULAÇÃO DAS
PROPOSTAS DE EDUCAÇÃO
INTEGRAL E ASSISTÊNCIA
SOCIAL EM DESENVOLVIMENTO
NO BRASIL MARISTA
Bárbara Pimpão Ferreira2
Eulália Maria Sombra Pinheiro3
Gláucia Martins Schneider4
RESUMO
Este artigo tem como objetivo apresentar os fundamentos internacionais e
nacionais que fundamentam a proposta de formação de educadores sociais
Maristas que desenvolvem suas práticas educativas nos Centros Sociais e Edu2
Pedagoga pela Universidade Estadual de Maringá/PR; Mestre em Educação pela Unesp/SP; Especialista em Violência Doméstica pela USP/
SP; Especialista em Proteção Integral de Crianças e Adolescentes pela PUCPR. Gerente do Centro Marista de Defesa da Infância do Grupo
Marista, Curitiba/PR. E-mail: [email protected]
3
Assistente Social pela Universidade Católica de Brasília. Pós-Graduada em Gestão da Política Nacional de Assistência Social. Especialista em
Elaboração de Projetos e Mobilização de Recursos. Analista Social Sênior na Superintendência Socioeducacional/Gerência Social/Província
Marista Brasil Centro-Norte, em Brasília/DF. Perita Social. E-mail: [email protected]/ [email protected]
4
Assistente Social pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul; Especialista em Planejamento do Trabalho Social – em desenvolvimento, Perita Social pela Projeto/RS. E-mail: [email protected]
15
cacionais Maristas no Brasil. Apresenta os cenários das legislações que respondem às novas organizações curriculares para a construção de uma educação
de qualidade com crianças e adolescentes brasileiros na perspectiva da defesa
dos direitos humanos. Ressalta a necessidade da participação dos educandos
nos processos educativos e destaca as opções do Brasil Marista para fortalecer
a intersetorialidade das políticas de educação e assistência social, bem como
na oferta de itinerários formativos que promovam a ação reflexiva dos educadores em suas propostas educativas.
Palavras-chaves: Educação; Assistência Social; Direitos Humanos; Formação
de Educadores; Rede Marista de Solidariedade.
A Rede Marista de Solidariedade tem como missão promover os direitos das
crianças, adolescentes e jovens, empenhando todos os âmbitos do Instituto
na defesa desses direitos, ante os governos, as organizações não-governamentais e outras instituições públicas5. Presente em todas as regiões do país,
a Instituição Marista contribui para a formulação das políticas ao integrar o
Sistema de Garantia de Direitos, por meio dos Centros Sociais e Educacionais
Maristas, na oferta de serviços de educação básica e assistência social em contextos empobrecidos economicamente.
A articulação dos Centros Sociais e Educacionais Maristas nos territórios em
que estão inseridos permite que a proposta socioeducativa em desenvolvimento observe as especificidades da cultura local e avance na gestão compartilhada dos itinerários formativos com educadores, educandos, suas famílias e
outras instituições do entorno.
A Formação para Educadores Sociais Maristas está intrinsecamente vinculada à missão da instituição na defesa dos direitos das crianças, adolescentes
e jovens, com o propósito de construir um currículo com enfoque em direitos
humanos e na ação reflexiva sobre os Projetos Políticos Pedagógico Pastorais
em desenvolvimento.
5
XXI Capítulo Geral, 2009, p. 41. http://www.champagnat.org/shared/21Capitolo/documentos/DOCXXI_PT.pdf
PARTE I
1 INTRODUÇÃO
Educadores Sociais Maristas
16
O curso Educadores Sociais do Brasil Marista integra os itinerários formativos
das diversas regiões brasileiras como uma oportunidade de aproximar os contextos culturais, trocar experiências em desenvolvimento e refletir sobre o cenário educacional brasileiro que exige das escolas e outros espaços educativos
a oferta de Educação Integral em Tempo Integral.
Este artigo tem por objetivo apresentar os cenários internacional e nacional
que caminham na construção de políticas e propostas à luz dos princípios da
defesa dos direitos humanos de crianças, adolescentes e jovens, bem como
na construção de novos itinerários formativos e de currículos que permitam
novos acenos na qualidade da educação e na participação das crianças em
seus projetos formativos por meio de uma educação básica em tempo integral,
articulados aos seus contextos culturais e políticos.
2 CENÁRIOS INTERNACIONAL E NACIONAL NA DEFESA DOS
DIREITOS DAS CRIANÇAS
Os tratados e legislações, em âmbito internacional e nacional, garantem o direito a uma educação de qualidade a toda criança, adolescente e jovem, e, portanto, sujeitos de direitos, reconhecidos em sua universalidade, indivisibilidade
e exigibilidade aos demais direitos.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos de 19486, em seu artigo 26.2,
a Convenção Internacional dos Direitos da Criança de 19897, no artigo 29,
e o Estatuto da Criança e do Adolescente de 19908, no artigo 53, tratam do
direito à educação, considerando-a necessária e integrada às categorias do
interesse superior da criança; do direito ao desenvolvimento; do direito a não
discriminação; e do direito à participação. Nesta perspectiva, faz-se necessária
a construção de um olhar holístico sobre o sujeito (crianças, adolescentes e
jovens), bem como sobre a intrínseca relação dos direitos que exige um olhar
holístico e de reconhecimento dos direitos sociais, econômicos, políticos, civis
e culturais a eles integrados.
6 http://portal.mj.gov.br/sedh/ct/legis_intern/ddh_bib_inter_universal.htm
7 http://www.unicef.org/brazil/pt/resources_10120.htm
8 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm
17
A inclusão da Assistência Social no tripé da Seguridade Social é um importante
marco histórico, em especial no rol das conquistas por direitos sociais, conforme
o art. 20410 da Constituição Federal de 1988. O art. 203 define que a assistência social deverá ser prestada a quem dela necessitar, independentemente de
contribuição à seguridade social, e tem por objetivos: I - a proteção à família, à
maternidade, à infância, à adolescência e à velhice; II - o amparo às crianças e
adolescentes carentes; III - a promoção da integração ao mercado de trabalho;
IV - a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária; V - a garantia de um salário mínimo de
benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem
não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua
família. A Política Nacional de Assistência Social11passa a estabelecer uma ampla parceria entre o Poder Público e a Sociedade Civil. Hoje, com o Sistema Único de Assistência Social – SUAS12, ampliam-se as possibilidades de promover a
inclusão social de pessoas e famílias, colocando-as como centro da atenção, valorizando sua função protetiva em especial para crianças, adolescentes e idosos.
O Plano Nacional de Educação13 aprovado em junho de 2014 estabelece metas
para os próximos dez anos da educação brasileira, e tem como foco a quali9 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm
10
Art. 204 – As ações governamentais na área da assistência social serão realizadas com recursos do orçamento da seguridade social
11
http://www.mds.gov.br/assistenciasocial/arquivo/Politica%20Nacional%20de%20Assistencia%20Social%202013%20PNAS%202004%20
e%202013%20NOBSUAS-sem%20marca.pdf
12 http://www.mds.gov.br/assistenciasocial/suas
13 Lei n° 13.005, de 25 de junho de 2014: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/2014/lei-13005-25-junho-2014-778970-norma-pl.html
PARTE I
No Brasil, a publicação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional9,
em 1996, define os Princípios e Fins da Educação Nacional, em seus artigos 2
e 3, como dever da família e do Estado com a finalidade do pleno desenvolvimento do educando. O direito à igualdade de condições para o acesso e a
permanência, a liberdade, o pluralismo de ideias e concepções pedagógicas,
a tolerância, a coexistência de instituições públicas e privadas, a garantia de
padrão de qualidade, a valorização da experiência extraescolar, a vinculação
entre educação, escola, trabalho e práticas sociais e a consideração à diversidade étnico-racial são princípios intrínsecos aos projetos curriculares e se
desvelam no cotidiano das relações entre gestores, educadores e educandos
na construção e efetivação das políticas.
Educadores Sociais Maristas
18
dade, o acesso e o investimento na Educação Básica. O referido plano destaca atenção necessária ao número de crianças, adolescentes e jovens fora dos
espaços educativos, revelando nossas fragilidades e desafios no que se refere
à garantia de direitos. Entre as diretrizes propostas, o novo Plano Nacional
de Educação do país ressalta “a necessidade de superação das desigualdades
educacionais, com ênfase na promoção da cidadania e na erradicação de todas as formas de discriminação e a promoção dos princípios do respeito aos
direitos humanos, à diversidade e à sustentabilidade socioambiental”. Dentre
as metas previstas para a educação brasileira, destacamos a meta 6 “oferecer
educação em tempo integral em, no mínimo, 50% (cinquenta por cento) das
escolas públicas, de forma a atender, pelo menos, 25% (vinte e cinco por cento)
dos (as) alunos (as) da educação básica”, por ser nosso objeto de reflexão na
proposta de formação que trataremos neste artigo.
Os contextos políticos, sociais, educacionais e econômicos no mundo – Unesco14, Flacso15 – indicam o quanto a sociedade brasileira está distante dos índices
referentes para o reconhecimento de uma população com acesso e garantia
aos direitos humanos. Ao observarmos os índices de educação e de desigualdade social, o Brasil está posicionado em números bastante expressivos no
que se refere aos tímidos resultados em educação para todos e, em destaque,
em desigualdade social.
A competência do Sistema de Garantia de Direitos16 – observando a intersetorialidade de políticas – revelam, neste contexto, desafios demonstrados nos
estudos de especialistas em organismos internacionais sobre como os estados
respeitam crianças e adolescentes como sujeitos de direitos e em condição
peculiar de desenvolvimento. O Comitê de Direitos Humanos das Crianças na
ONU – instrumento internacional de controle e monitoramento das normas da
Convenção dos Direitos das Crianças – reconheceu, em 2006, durante os estudos realizados no Dia de Debate Geral sobre o direito à participação17, que
14
Educação de Qualidade para todos: um assunto de direitos humanos, 2008. http://www.unesco.org/ulis/cgi-bin/ulis.pl?catno=150585&set=524097B0_2_281&gp=1&lin=1&ll=1
15
Mapa da Violência, 2014. http://www.mapadaviolencia.org.br/index.php
16
CONANDA. Resolução nº 113 de 19 de abril de 2006: Art. 2°. Compete ao Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente promover, defender e controlar a efetivação dos direitos civis, políticos, econômicos, sociais, culturais, coletivos e difusos, em sua integralidade,
em favor de todas as crianças e adolescentes, de modo que sejam reconhecidos e respeitados como sujeitos de direitos e pessoas em condição peculiar de desenvolvimento; colocando-os a salvo de ameaças e violações a quaisquer de seus direitos, além de garantir a apuração
e reparação dessas ameaças e violações.
17
Recomendações do Dia do Debate Geral, de 2006, sobre o direito da criança de ser escutado: HTTP://www2.ohchr.org/english/bodies/crc/
19
determinados grupos de crianças, como àquelas que pertencem a grupos marginalizados e desfavorecidos, enfrentam obstáculos específicos a partir dos
contextos em que estão inseridas e como têm seus direitos implementados
nos estados.
Em relação à questão da violência contra a infância, em 2001, foi solicitado
um estudo pela Assembleia Geral da ONU. A Comissão de Direitos Humanos
sugeriu a nomeação de um especialista para o estudo deste tema. Paulo Sérgio Pinheiro, professor da Universidade de São Paulo, foi indicado pelo Secretário-Geral da ONU como especialista independente. Em 2003, para preparar
um estudo em profundidade sobre violência contra crianças Pinheiro, visitou
50 países. A apresentação do estudo ao Comitê – World Report on Violence
Against Children18 – foi realizada em 2006, e Paulo Sérgio Pinheiro seguiu avaliando as recomendações do relatório até o final de 2007.
al dar a los niños e niñas, a sus progenitores y a las comunidades el
conocimiento y las habilidades necessárias para comunicarse, negociar y
resolver conflitos de manera más constructiva. Sin embargo, los patrones
de violência a menudo están arraigados em la cultura de la escuela, a veces
incluso como política, apoyados y promovidos por ciertas teorias acerca del
desarollo y aprendizaje em la niñez. (2006, p. 112)19
Este estudo conclui que as escolas devem ter como princípio o reconhecimento de que todos os meninos e meninas têm direito à educação em ambientes livres de violência, e que uma das funções da educação é produzir
adultos que tenham interiorizados valores e práticas não violentas.
Los principios básicos de una escuela “basada en derechos” y “amigable” son
que ésta debe ser: 1. Proactivamente inclusiva; 2. Académicamente efectiva
y pertinente; 3. Sensible al género; 4. Saludable y protectora; 5. Relacionada
con la familia y la comunidade (2006, p. 138-9)
docs/discussion/Final_Recommendations_after_DGD.doc
18
http://www.unicef.org/violencestudy/I.%20World%20Report%20on%20Violence%20against%20Children.pdf
19
Pinheiro, Paulo Sérgio. Informe mundial sobre la violência contra los niños e niñas, 2006. In: http://www.unviolencestudy.org/spanish/index.htm
PARTE I
O Informe Mundial sobre a Violência contra meninos e meninas apresentado
na ONU, em 2006, reconhece a escola e outros ambientes educativos em uma
posição importante para romper com os padrões e círculos de violência:
Educadores Sociais Maristas
20
O estudo destaca a relevância do apoio a educadores na educação de crianças, adolescentes e jovens ao indicar que são, aproximadamente, 43 milhões
de educadores no Ensino Fundamental em todo o mundo, sem considerar ainda os educadores que estão em outros ambientes educativos, reconhecendo a
importância destes para o desenvolvimento e mudança social.
Su potencial para actuar como modelos de comportamiento es inmenso.
Los educadores están entre los agentes de desarrollo y cambio social más
importantes de cualquier país ya que hacen aportes esenciales al desarrollo
emocional y cognitivo de las generaciones actuales de niños y niñas y por tanto,
a las generaciones futuras de ciudadanos maduros y responsables. Incluso
cuando los niños y niñas sufren violencia en sus hogares y comunidades, los
educadores pueden ofrecerles y enseñarles modelos no violentos desde muy
pequeños. (2006, p. 142)20
A continuidade das atividades de Paulo Sérgio Pinheiro na avaliação das recomendações do Informe Mundial resultou em outro relatório, publicado em
2011 – Cinco Años después: una puesta a punto a nivel mundial sobre la
violencia contra niños y niñas21. Este documento, ao tratar sobre pontos
importantes para a mudança das manifestações indicadas nos estudos,
destaca a relevância da formação dos educadores na perspectiva dos direitos humanos.
Cuando se forma a los profesores en lo que respecta a los derechos de los
niños, niñas y adolescentes y as estrategias no violentas y respetuosas de
manejo de una clase, las tasas de violencia escolar descienden. (2011, p. 25)
Diante dos cenários nacionais e internacionais indicados, ressaltamos a relevância dos educadores na construção de um currículo com enfoque em direitos, em resposta às urgências das infâncias e juventudes e aos resultados de
nossos projetos políticos para essa população. A formação dos educadores
com enfoque em direitos humanos destaca-se ao analisarmos a necessidade
de constituir projetos políticos e pedagógicos nos ambientes educativos que
respeitem os direitos das crianças, dos adolescentes e dos jovens.
20
Pinheiro, Paulo Sérgio. Informe mundial sobre la violência contra los niños e niñas, 2006. In: http://www.unviolencestudy.org/spanish/index.htm
21 http://www.crin.org/docs/GGUU-violencia-web_Spanish.pdf
21
3 ITINERÁRIOS FORMATIVOS PARA OS EDUCADORES DO
BRASIL MARISTA
A proposta de formação de educadores da Rede Marista de Solidariedade responde às necessidades identificadas pelos gestores e educadores sobre a ampliação da visão política e educacional das políticas públicas para as infâncias
e juventudes em desenvolvimento no país.
A decisão de destacar na formação dos educadores a Educação Integral em
Tempo Integral pressupõe a percepção da comunidade educativa como integrante do Sistema de Garantia de Direitos e, portanto, articulada às demais
políticas do território em que se encontra.
A instituição Marista, com a missão de promover uma educação integral, responde a esse apelo com a perspectiva de valorizar os educadores Maristas, proporcionando, por meio da formação contínua, o crescimento pessoal, profissional e
espiritual. Ao desenvolver itinerários formativos que contemplem as propostas
locais e nacional para educadores com o objetivo de ampliar as reflexões sobre
educação de qualidade e educação em tempo integral, a instituição se posiciona em defesa dos direitos de crianças, adolescentes e jovens, e proporciona
espaço de reflexão da comunidade educativa sobre os currículos que temos e os
currículos que queremos para as infâncias e juventudes brasileiras.
Na comunidade educativa, os espaçotempos educativos, o currículo e a
arquitetura educam23. A contribuição dos educadores – docentes, educadores sociais, gestores, colaboradores – educandos e comunidade é fundamental para o avanço do projeto político-pedagógico-pastoral-marista e
para a construção de um currículo com enfoque em direitos humanos pois,
22
Moll, Jaqueline. Caminhos da educação integral no Brasil: direito a outros tempos e espaços educativos. Porto Alegre: Penso, 2012.
23
Projeto Educativo do Brasil Marista, 2010, p. 72.
PARTE I
Para além da necessária ampliação do tempo diário da escola, coloca-se o
desafio de qualidade desse tempo que, necessariamente, deverá constituir-se
como um tempo reinventado que compreendendo os ciclos, as linguagens,
os desejos das infâncias e juventudes que acolha, modifique assimetrias
e esterilidades que ainda são encontradas na prática pedagógica escolar.
(MOLL, 2012 p. 28-9) 22
Educadores Sociais Maristas
22
Incorporar nos currículos de formação docente e pedagógica, análises
sociológicas avançadas, que existem, com foco nas questões sociais que
afetam de maneira tão radical o viver a infância-adolescência-juventude
popular dos sujeitos humanos com que lidamos? Em que novos contextos
socioespaciais são obrigados a sobreviver, a aprender e a exercer a liberdade,
obrigados a formar-se sujeitos pensantes, éticos, culturais, humanos?
(ARROYO, 2012, p. 39)24
A oportunidade de organizar uma formação contínua para Educadores Maristas possibilitou que as questões apresentadas até o momento fossem consideradas e articuladas com a política nacional de educação ao estabelecer a meta
para a implantação da educação integral em tempo integral. Dentre as metas
previstas no Plano Nacional de Educação25, a Meta n. 6 “oferecer educação em
tempo integral em cinquenta por cento das escolas públicas de educação básica” se materializa neste momento por meio de ações indutoras da política com
o Programa Mais Educação26 proposto pelo Ministério de Educação.
Em consonância com as políticas em implementação em todo o país, a presença Marista contribui para as políticas de Educação e Assistência Social ao
articular em seus territórios as escolas e as organizações não-governamentais
nos diversos serviços, programas e projetos que desenvolve juntamente com
a comunidade. Especialmente neste contexto, a Educação Básica pela Educação e o Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos na Assistência
Social estão no centro de nossas reflexões e trajetórias realizadas, pois trata-se
aqui das ofertas de atendimento a crianças, adolescentes e jovens nos Centros
Sociais e Educacionais e Escolas Maristas.
4 A PRODUÇÃO DE SENTIDO NAS TRAJETÓRIAS VIVENCIADAS
Favoreceremos o diálogo com novas práticas e outras formas de
conhecimento, expressões culturais, abordagens teóricas, que nos levem a
incorporar criticamente tudo aqui que pode enriquecer o desenvolvimento
de nossos itinerários solidários27. (2013, p. 189)
24
Arroyo, Miguel. O direito a tempos-espaços de um justo e digno viver. In: Moll, Jaqueline. Caminhos da educação integral no Brasil: direito a
outros tempos e espaços educativos. Porto Alegre: Penso, 2012, p. 34-45.
25 http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&id=16478&Itemid=1107
26
Programa Mais Educação, instituído pela Portaria Interministerial nº 17/2007 e regulamentado pelo Decreto 7.083/10: http://portal.mec.gov.
br/index.php?option=com_content&id=16689&Itemid=1115
27
Caminhos de Solidariedade Marista nas Américas: crianças e jovens com direitos. Subcomissão Interamericana de Solidariedade. Porto
Alegre: EDIPUCRS, 2013
23
A opção da Rede Marista de Solidariedade pelo desenvolvimento do Curso
de Formação para Educadores Maristas responde a uma iniciativa dialogada e atenta às especificidades da organização presente em todas as regiões
do país. Neste percurso, os posicionamentos internacionais e interculturais
da instituição contribuíram para a seleção dos temas relevantes das políticas públicas em desenvolvimento bem como nos contextos em que os Centros Sociais e Educacionais e Escolas Maristas estão inseridos.
·· Promover maior conhecimento dos princípios e valores fundacionais do
instituto por meio de estudo e vivência do carisma Marista;
·· Articular modelos de gestão que garantam o jeito Marista de ser e de educar
e a excelência dos serviços educativo-evangelizadores, atualizados a partir
das demandas e desafios das sociedades e sujeitos contemporâneos, à luz
dos apelos do Instituto Marista;
·· Desenvolver as competências e habilidades na gestão educacional,
pastoral, administrativa, tecnológica e de pessoas numa perspectiva
sistêmica e estratégica.
·· Promover o intercâmbio de pessoas, saberes, iniciativas, experiências e
projetos para potencializar a atuação em rede.
O itinerário formativo, desenvolvido por meio da educação a distância, promovido pela PUCRS, contou com módulos articuladores das temáticas que
integram as propostas socioeducativas em desenvolvimento no Brasil Marista.
A participação de educadores sociais, docentes e assessores educacionais no
curso proporcionou diálogos ricos em possibilidades e construção de conhecimento ao tratar de temas que permeiam os currículos e projetos em desenvolvimento. Portanto, o curso proporcionou aos educadores sociais, que desenvolvem seus projetos na educação básica e na assistência social, articularem
saberes e práticas sobre os contextos vivenciados. Os temas e os conteúdos
desenvolvidos no curso por meio de módulos permitiram um itinerário que contribuísse para o alinhamento conceitual, o retorno aos princípios institucionais
acerca do currículo, as políticas públicas de educação em desenvolvimento e
PARTE I
Os itinerários do programa do curso e a definição dos objetivos respondem
aos propósitos educativos de:
Educadores Sociais Maristas
24
suas interfaces com a política de assistência social, culminando na reflexão sobre as práticas e metodologias em desenvolvimento no cotidiano dos espaços
educativos.
O tema Infâncias, adolescências e juventudes apresentou concepções para
leitura da realidade dos educandos, considerando aspectos contemporâneos
como a tecnologia, a geração da imagem, a globalização e a perspectiva de
construção de trajetória e contextos com enfoque em direitos.
Educação Integral e Apoio Socioeducativo como tema contribuiu para a
apresentação dos conceitos, dos aspectos legais dos serviços e programas do
Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos e da Educação Básica,
considerando as prerrogativas da Constituição, da Lei Orgânica da Assistência
Social, do Estatuto da Criança e do Adolescente, e da Lei de Diretrizes e Bases.
Observados os contextos e legislações, destaca-se o pressuposto do Sistema
de Garantia de Direitos, no qual os espaços educativos se integram, e da Política Nacional de Educação (PNE), que estabelece metas a serem desenvolvidas
nos próximos dez anos.
O tema Ação Socioeducativa Marista ressaltou a contribuição da Instituição
Marista na educação das Infâncias e Juventudes, com destaque para a educação popular e a mediação pedagógica como chave da ação socioeducativa.
A atenção para os currículos desenvolvidos e suas conexões com o Projeto
Educativo do Brasil Marista nos Centros Sociais, Educacionais e Escolas Maristas permitiu reflexões sobre rotina e convivência. Os desenhos curriculares
possíveis e em desenvolvimento, bem como a identificação de boas práticas
presentes no cotidiano, foram objetos de atenção e reflexão.
A Metodologia de projetos permitiu aos educadores o estudo sobre conceitos de
programas, projetos e serviços sociais; trabalho e elaboração de projetos; a relevância da construção de indicadores de resultados e impactos, do monitoramento
e avaliação de projetos, do estabelecimento de parcerias e gestão compartilhada.
O itinerário formativo termina com o estudo sobre o perfil e a identidade dos
Educadores Sociais Maristas, observando a coerência entre reflexão e prática,
os princípios da pedagogia Marista e as peculiaridades dos Centros Sociais,
25
Educacionais e Escolas Maristas.
A proposta de formação para a área social contribuiu na formação de profissionais que atuam nas realidades de maiores vulnerabilidades, especialmente na perspectiva dos direitos de crianças e adolescentes, em um constante
movimento da própria ação em desenvolvimento, considerando a pesquisa, a
investigação, a ação e a reflexão na construção coletiva de saberes e fazeres
da proposta socioeducativa28.
Os educadores que contribuem na sistematização de suas experiências e itinerários formativos representam também a diversidade de temas e percursos
possíveis nos itinerários formativos dos espaços educativos do país. Revelam o
potencial de cada comunidade educativa na construção de conhecimento e
na formação de educandos, sujeitos de direitos.
O fomento a experiências formativas indica novos acenos e práticas nas comunidades educativas ao possibilitar a construção de currículos com enfoque
em direitos, por meio da reflexão sobre a práxis cotidiana na perspectiva de
proporcionar a formação integral dos sujeitos nas propostas educativas e práticas cotidianas.
28 http://www.solmarista.org.br/deas-home-deas-rede-proposta-socioeducativa/d63
PARTE I
A produção de artigos – sistematização das práticas – possibilitou a identificação de temáticas relevantes para os currículos em desenvolvimento nos
Centros Sociais, Educacionais e Escolas Maristas. Os temas mais presentes na
produção realizada pelos educadores tratam de suas experiências e práticas
cotidianas: educadores – atuação e formação do educador social; múltiplas linguagens – artes, tecnologias, corpo e movimento, Educomunicação; educação
infantil, infâncias e o brincar; educação integral; valores Maristas; conhecimento, cultura e diversidade.
26
Educadores Sociais Maristas
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Jaqueline. Caminhos da educação integral no Brasil: direito a outros tempos
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Moll, Jaqueline. Caminhos da educação integral no Brasil: direito a outros
tempos e espaços educativos. Porto Alegre: Penso, 2012.
27
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www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/2014/lei-13005-25-junho-2014-778970-norma-pl.html
Programa Mais Educação, instituído pela Portaria Interministerial nº 17/2007 e
regulamentado pelo Decreto 7.083/10: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&id=16689&Itemid=1115
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PARTE I
Política Nacional de Assistência Social. In: http://www.mds.gov.br/assistenciasocial/arquivo/Politica%20Nacional%20de%20Assistencia%20Social%20
2013%20PNAS%202004%20e%202013%20NOBSUAS-sem%20marca.pdf
28
Educadores Sociais Maristas
AÇÃO SOCIOEDUCATIVA:
CONCEPÇÕES E PRÁTICAS NO
PROCESSO PEDAGÓGICO
Gillys Vieira da Silva29
Neuzita de Paula Soares30
Paulo Fioravante Giareta31
RESUMO
O presente texto se propõe a dialogar sobre possibilidades de uma ação que
promova a participação dos sujeitos no movimento educativo por meio de
uma prática pedagógica articulada com a perspectiva da educação libertadora e emancipatória, enquanto ação socioeducativa. Assim, objetiva construir
uma leitura analítica do processo pedagógico, a partir da ação socioeducativa, reconhecendo a imperatividade da cultura como princípio educativo e,
consequentemente, buscando nova significação à mediação pedagógica. O
referido exercício analítico se apresenta, metodologicamente, mediado pela
leitura bibliográfica e aportado na releitura das experiências da Rede Marista
de Solidariedade – RMS. A análise indica a necessidade de pensarmos a ação
pedagógica para além dos muros e do tradicionalismo da escola, ainda depositária de espaçotempos educativos conservadores, perpetuando propostas
29
Mestranda em Educação pela PUCPR. Atualmente responde pela Direção do Centro Social Marista Ecológica, em Almirante Tamandaré/PR.
E-mail: [email protected]
30
Especialista em Educação pela UFPR. Assessor Educacional do Grupo Marista. E-mail: [email protected]
31
Doutor em Educação pela UFPR. Docente da UFMS. E-mail: [email protected]
29
educativas centradas em currículos fragmentados e com foco no cumprimento
do conteúdo estabelecido por matrizes curriculares previamente definidas e
com dificuldades de dialogar com a realidade concreta dos sujeitos. A análise
indica a necessidade de focar nos processos pedagógicos como a mediação
na construção do novo e na perspectiva da integralidade do conhecimento em
um currículo que respeita as diferenças, o território, a vivência de mundo e a
cultura dos sujeitos envolvidos na ação, articulando o conhecimento, científico
e empírico, para a formação cidadã como direito dos sujeitos em formação e
demanda à educação contemporânea.
Palavras-chaves: Ação Socioeducativa; Educação Popular; Mediação Pedagógica.
É possível afirmar, de imediato, que no contexto educativo brasileiro a
denominada ação socioeducativa surge, num primeiro momento, no âmbito da
assistência social, enquanto proposta de atendimento às crianças, adolescentes e jovens em atividades lúdicas de contra turno ofertado por municípios e/
ou Organizações Não Governamentais (ONGs), não desprovido de forte carga
e significado assistencialista e compensatório. Progressivamente, vem ganhando espaço no campo da educação, fortemente vinculada ao ideário de desenvolvimento de uma educação integral, ampliando, assim, as possibilidades de
trabalho pedagógico pautado, ao menos em tese, na perspectiva da formação
para a autonomia intelectual e para a emancipação cidadã.
Esse ideário parece se materializar pelo trabalho integrado entre as linguagens
e as diferentes áreas do conhecimento, utilizando as vozes da comunidade
educativa para a construção de projetos que efetivamente contribuam para
uma educação integral numa perspectiva emancipatória, promovendo um saber construído coletivamente a partir de aspectos sociais e culturais.
A caracterização mais contundente desta proposta parece se materializar na
denominada educação popular, enquanto organização curricular e mediação
pedagógica para consolidação de uma prática educativa em que o sujeito e o
meio, no qual se encontra inserido, são elementos significativos e considerados
no processo de ensino-aprendizagem.
PARTE I
1 INTRODUÇÃO
Educadores Sociais Maristas
30
Assim, compreendemos que se apresenta pertinente a releitura constante da
expressão objetiva e concreta dos sujeitos no processo educativo, dito de outra
forma, do reconhecimento da cultura como princípio educativo, consequentemente, também da releitura dos processos de mediação pedagógica como
direito e condição à significação cidadã da formação dos sujeitos.
2 EDUCAÇÃO POPULAR COMO CHAVE DA AÇÃO SOCIOEDUCATIVA
A denominada Educação Popular, aqui falando especificamente do
contexto brasileiro, parece carregar a forte intencionalidade de conferir novos significados aos processos educativos, acenando para movimentos que
se caracterizam como rompimento ao modelo tido como educação bancária,
para usarmos um conceito freiriano, no qual o educador se coloca detentor do
conhecimento e o educando um receptor.
A educação popular se apresenta como uma concepção educativa que reclama a interação entre educando e educador enquanto sujeitos de ações marcadas pela troca de experiências de vida. Proposição problematizada na pedagogia freiriana, quando elucida que o ato de educar é uma prática social
onde educador e educando encontram-se no mesmo nível de igualdade, ambos na condição de sujeito aprendiz, promovendo a troca cultural de saberes
e a produção de conhecimento (FREIRE, 2005). Concepção que reclama a
capacidade do diálogo da intencionalidade educativa com uma prática cultural
cunhada no princípio da liberdade e da emancipação, portanto, promotora da
criatividade epistemológica dos sujeitos, possibilitando o olhar para a inteireza, a integralidade dos sujeitos e o acompanhamento do itinerário de uma
aprendizagem significativa e prazerosa por meio de atividades artísticas, como
a música, a dança, as artes plásticas, as artes circenses e outras que vão além
do desenvolver o gosto pela produção. Elas exercitam percepções e ampliam
conhecimentos de mundo.
A educação popular, na perspectiva freiriana, possibilita tanto o olhar para o
sujeito na sua inteireza quanto reconhece o princípio da incompletude humana, reivindicando a necessidade constante da aproximação ao conhecimento
pelo pressuposto da coletividade e da participação, aportado no reconheci-
31
mento de que nossos saberes se complementam cotidianamente e o conhecimento nunca está pronto, mas sempre em construção. Concepção reconhecida também por Coelho (2004) quando, em seu artigo “Educação Integral:
concepções e práticas na educação fundamental”, diz que a educação se dá
concomitantemente aos movimentos sensitivo, intelectual, artístico, esportivo,
filosófico, profissional e, obviamente, políticos.
Na concepção da ação socioeducativa, a Rede Marista de Solidariedade, ao
longo de sua trajetória e no desenvolvimento de seus projetos, tem buscado
promover ações na perspectiva de
Nos espaços educativos já consolidados na Rede Marista de Solidariedade é
perceptível a finalidade das ações socioeducativas como desenvolvimento de
projetos fortemente pautados na perspectiva da promoção e defesa de direitos de crianças, adolescentes e jovens. Perspectiva que se materializa na
construção de espaços de aprendizagem que contribuam para a formação de
sujeitos autônomos, pesquisadores, comunicativos, comprometidos com suas
comunidades, conscientes das questões sociais, e com forte aderência aos
princípios da educação Marista – pedagogia da presença, da escuta e da acolhida. Neste movimento o conhecimento passa a ser um objeto de partilha e a
aprendizagem um resultado significativo do processo para os sujeitos.
Assim, tal movimento possibilita pensar uma educação pautada na formação integral dos sujeitos e na construção de um currículo integrado com
enfoque em direitos, garantindo as especificidades para o desenvolvimento
de uma prática pedagógica significativa, o que reclama uma prática pedagógica aportada na cultura, tendo-a como princípio educativo, como construção de significados.
PARTE I
(...) consolidar uma prática e pensar uma pedagogia social que identifique
nos espaços de aprendizagem as limitações e possibilidades, reconhecendo
esses espaços como espaço social e privilegiado de convivência e sendo
ponto de referência fundamental para a constituição das identidades dos
educandos, aproximando famílias e comunidade ao contexto educativo e de
aprendizagem (REDE MARISTA DE SOLIDARIEDADE, p.39 2010
32
Educadores Sociais Maristas
2.1
A Cultura como Imperativo Pedagógico
Se o mundo que nos cerca é tão imprevisível e sujeito a tantas variações e
a tanta criatividade, como conviver com uma educação fundamentada no
estudo do comportamento, nos usos e costumes dominantes transferidos
através do tempo por comportamentos reforçados em que homem, mundo e
natureza são coisas separadas? Como aceitar uma educação que vê o mundo
como algo externo ao indivíduo, distante, uma realidade a ser manipulada
e submetida aos caprichos do homem? Como conviver com uma escola
burocrática, hierárquica, rígida, estruturada e organizada por especialidades
ou funções, com visão fragmentada do conhecimento e, consequentemente,
da prática pedagógica, com sistemas rígidos de controle, dissociada do
mundo e da vida? (MORAES, 2005, p. 136).
A afirmativa de que a educação popular se pauta na concepção de formação
integral dos sujeitos e na construção de um currículo com enfoque em direitos,
portanto, construtor de sentidos e significados humanos, materializando-se na
cultura dos sujeitos como princípio educativo, implica, na linguagem de Freire
(2005), no reconhecimento do “saber de experiência feito”. Experiências que,
enquanto conjunto de relações sociais e experiências corporificadas na vida
concreta das pessoas, conferem identidade ao sujeito.
Conceito de cultura que, na perspectiva da educação popular, está especificado contrariamente às concepções que a restringem a depósitos de conhecimentos, formas, práticas sociais e valores armazenados e transmitidos aos
estudantes, mas, sim, como “esfera de lutas e contradições que deve ser vista
como inacabada, como parte de uma luta contínua de indivíduos e grupos para
definir e afirmar suas histórias e espaços de vida.” (GIROUX, 1988, p. 46-47).
Razão pela qual se apresenta imperativo pensar a ação docente que se sustente sobre a concepção de que “a partida esteja sempre nos homens, no seu aqui
e no seu agora, que constituem a situação em que se encontram ora imersos,
ora emersos, ora insertados.” (FREIRE, 2005, p. 74), enquanto sujeitos que se
reconhecem na dinâmica das suas relações com o mundo; o que redesenha
a missão da prática educativa, reforçando a compreensão do foco educativo
no aprendiz enquanto sujeito relacional e contextualizado; na aprendizagem
e na busca da construção do conhecimento para além do ensino e da mera
instrução; na educação construtiva educador-educando que tem a aprendi-
33
zagem como decorrente de processos reflexivos e dialógicos que traduzem
os movimentos existentes no processo educacional; no autoconhecimento e
reconhecimento do outro; e na mudança de percepções e valores, enquanto
elementos essenciais para a sobrevivência do indivíduo num mundo em conflito, num contexto em contínua modificação de parâmetros e referências. Ou
seja, afirma a importância da incorporação do contexto cultural do educando na
prática pedagógica, fazendo da ação educativa parte do contexto do indivíduo.
Para Giroux (1988), a abordagem educativa que prima pela política de valorização da voz do estudante gesta tanto o reconhecimento das formas subjetivas
de vontade política e de empenho que conferem significado à vida dos estudantes, quanto questionamento dos modos nos quais as pessoas criam suas
histórias, memórias e sentidos.
Ele busca, assim, a construção de um espaço escolar que desenvolva uma pedagogia comprometida com as concepções e problemas que afetam profundamente os estudantes em suas vidas diárias. Construção de um espaço escolar capaz de associar questões pessoais e sociais no projeto pedagógico,
ajudando os educandos a se tornarem críticos e ativos, a partir da problematização de sua realidade existencial.
Para Freire, as terminologias “respeito ao saber popular”, “valorização do contexto cultural”, “reconhecimento do saber de experiência feito”, “leitura do
mundo”, entre outras, encerram uma abordagem pedagógica que prima pela
relação dialógica, não inserida na relação eu – tu, mas entre eles e deles com o
mundo. Abordagem, esta, que reconhece que todo ato educativo é uma forma
de intervenção no mundo – a educação é intervenção sociopolítica e ideológica – e respeito para com a realidade e identidade cultural dos educandos e de
seus saberes. Portanto, condição prévia a uma ação educativa popular que se
PARTE I
Este deslocamento, para a prática pedagógica, diz respeito muito mais ao trabalho “sobre” as experiências culturais do que o trabalho “com” as experiências
culturais para além da natureza funcional, diz da natureza ontológica da prática educativa. Esta abordagem repousa, essencialmente, no reconhecimento de
que toda ação educativa é um exercício de conferir voz ao educando, em sua
capacidade política de re-significar suas experiências vividas.
34
Educadores Sociais Maristas
pauta pela perspectiva de direito, também este como constructo social, cultural, histórico, portanto, humano.
3 MEDIAÇÃO PEDAGÓGICA: UM OLHAR PARA AS ROTINAS
Os movimentos educativos com seus embates e contradições sofrem, constantemente, influenciados por estudos e reflexões da Antropologia, da Psicologia Social e Cognitiva e da Linguística, dentre outras ciências humanas que
possuem convergências e divergências acerca das concepções societárias e,
consequentemente, da ciência, do conhecimento, da educação, da função do
educador, do papel do educando, das temáticas, dos métodos, dos objetivos e
do processo avaliativo na organização e nos sistemas educacionais.
Assim, torna-se imprescindível trabalhar com diversas fontes de informações, abordagens e situações diferenciadas, tendo em vista o desenvolvimento das potencialidades dos educandos, propiciando uma ruptura da simples reprodução de saberes para a apreensão dos procedimentos da dinâmica
de produção de novas informações e conhecimentos. Os objetivos ultrapassam a base informacional e orientam uma formação mais ampla e integral.
(...) o educador dificilmente poderá desempenhar seu papel na práxis
pedagógica se não tiver certa compreensão da realidade na qual atua. Precisa
compreender: a sociedade na qual vive, a história, a cultura, as relações de
classe, de produção, suas perspectivas de transformação ou reprodução.
Enfim, o educador não poderá ser ingênuo no que se refere ao entendimento
da realidade na qual vive e trabalha. Caso contrário, sua atividade profissional
nada mais será que reprodutora da sociedade via o senso comum hegemônico.
(Luckesi, 1990, p.116 apud Proposta Socioeducativa, 2010)
Na dinâmica pedagógica cotidiana os processos de mediação têm figurado
como um elemento de suma importância no desenvolvimento de uma prática
que considere o sujeito nas suas múltiplas dimensões, potencializando, assim,
a aprendizagem. A dinâmica afeta tanto a identidade do educador quanto do
educando que, progressivamente, reclama o direito de aproximarem-se dos
elementos veiculados na escola a partir da organização de seu próprio imaginário, ou seja, reinterpretando-os e ressignificando-os de acordo com seus
interesses, motivações e necessidades.
35
Assim, diante do cenário educativo, pensar no movimento de aprendizagem é
considerar as relações didático-pedagógicas que acontecem nos espaços educacionais, discutir e possibilitar alternativas para um planejamento que atenda
às necessidades de um currículo que considere a diversidade, os tempos e o território dentre outros elementos os quais fazem parte do processo de mediação.
O educador é aquele que, por dever, é mais experiente. Exerce a mediação
entre o educando, os conhecimentos historicamente construídos e a cultura
para a ampliação da sua visão de mundo e a formação de valores humanos.
(...) Essa relação é determinante no processo socioeducativo, pois qualquer
um dos sujeitos poderá sair de uma condição de aprendiz à medida que
for se apropriando de conhecimentos que permitam a releitura da realidade,
superando o sendo comum e avançando na direção da autonomia. (REDE
MARISTA DE SOLIDARIEDADE, 2010, p.30)
Estudos como o de Becker (1993) sobre o cotidiano escolar e as orientações
das abordagens dos professores no exercício da docência têm mostrado que,
em sua base epistemológica, ainda mantêm o foco e concentram atividades
em polos extremistas. Ora apostam na atuação do professor, enquanto único
sujeito em movimento na ação educativa e responsável pela aquisição e posterior transmissão dos conhecimentos, acentuando a valorização das relações
hierárquicas na escola e confirmando a teoria do conhecimento como dado
a ser transmitido, negando ao educando a sua condição de sujeito da aprendizagem, ora apostam na mediação centrada no educando, opostamente a
anterior, delineando uma abordagem pedagógica não diretiva, que atribui ao
educando qualidades que este ainda não tem, tais como: informações organizadas, domínio das didáticas, capacidade de abstração e sistematização de
conhecimento. Não tem o educando como ser passivo e receptor de estímulos,
nem o conhecimento como mera cópia da realidade; por outro lado, considera
que esta é uma elaboração subjetiva, com forte apego a certo autodidatismo.
Figurando necessária a afirmação do autor de que tanto a abordagem centrada
no professor quanto a centrada no aluno têm conferido excessiva ênfase ao indiví-
PARTE I
Ainda, mediar ações pedagógicas significa possibilitar e garantir um processo
de aprendizagem focalizado nos sujeitos envolvidos ora que ensina e ora que
aprende, tornando-se protagonistas do movimento educativo, pressupondo
repensar a epistemologia docente.
Educadores Sociais Maristas
36
duo particular como sujeito de aprendizagem e reforçado o enfoque cognitivo, reclamando a necessidade da emergência, na ação educativa, de um novo polo, este
centrado nas relações que se estabelecem entre educadores e educando, tendo
por intenção promover uma prática docente dialética entre os polos pedagógicos apresentados. Isto implica admitir que nem educador nem educando devem
dispor de hegemonia – ao contrário, precisam estar em estreita relação dialogal.
Este enfoque acentua a concepção da escola como espaço ecológico de interação social, onde a vida da aula responde pela perspectiva de trocas socioculturais.
Assim, na ação socioeducativa, a mediação pedagógica tem se constituído enquanto elemento central para o desenvolvimento de uma prática significativa
que garanta a aprendizagem dos sujeitos envolvidos e os torne produtores de
conhecimentos, além do repensar as rotinas de forma coletiva, co-responsabilizando toda a comunidade educativa.
4 PALAVRAS FINAIS
O diálogo estabelecido no presente texto traz alguns elementos da prática pedagógica vivenciada no cotidiano das ações socioeducativas, cujo foco são os
sujeitos envolvidos no movimento.
Neste processo, o olhar para o cotidiano, para o território e a participação dos
sujeitos nos processos possibilitam um resultado significativo no que se refere
à aprendizagem por meio de movimentos que integram conhecimentos científicos e ações culturais.
O Projeto Educativo Marista (2010) preconiza que a educação integral necessita de
um “projeto histórico, cultural e social, caracterizado pela diversificação de conteúdos, de atividades educativas e de metodologias que atendam às necessidades e
potencialidades de crianças e adolescentes envolvidos no processo educativo”.
O currículo, que não é neutro, se efetiva por meio da qualidade da mediação,
das práticas educativas, pelo respeito às culturas, a territorialidade e as diversidades, pelo protagonismo das infâncias e juventudes, pelo engajamento dos
atores do processo educativo e pela clara opção por um projeto societário
fundamentado na justiça social.
37
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CAVALIERE, Ana Maria Vil Ella. Educação Integral: uma nova identidade para
a escola brasileira. In: Revista Educação & Sociedade. Campinas, n.81, dezembro/2002;
COELHO, Lígia Martha. Educação Integral: concepções e práticas na educação fundamental. In: ANPED, GT: educação fundamental, 2004. Acessado:
http://www.anped.org.br/reunioes/27/gt13/t137.pdf.
PARTE I
GIROUX, H. Escola crítica e política cultural. 2. ed. São Paulo: Cortez/Autores
Associados, 1988;
2
PARTE II
A SISTEMATIZAÇÃO
DA PRÁXIS
(...) Reafirmamos a nossa fé, na capacidade humana de sonhar, de se transcender, de se projetar e de transformar a realidade e os contextos
sociais. (Caminhos de Solidariedade Marista,
2013, p. 196)
A diversidade de temas e estudos desenvolvidos pelos
educadores sociais Maristas resultou na bonita construção de artigos e ensaios aqui apresentados e organizados a partir dos eixos estruturadores da formação vivenciada. Nas tramas e tessituras dos discursos e saberes
construídos, revela-se numa nova práxis incorporada ao
fazer-refletir-sentir da comunidade socioeducativa. Textos impregnados de conhecimentos adquiridos, ressemantizados, reconfigurados e, que constituem marcas
das aprendizagens individuais e coletivas construídas
no itinerário formativo. Textos reveladores do compromisso com a missão Marista junto às crianças, adolescentes e jovens e com a defesa de seus direitos. Uma
escritura impregnada de apaixonado zelo pela educação e cuidado com os sujeitos e situações de vulnerabilidade e de fronteira, revelando importante e inédita
construção de vasta gama de conhecimentos acerca da
ação-reflexão do educador social.
40
Educadores Sociais Maristas
TEMÁTICA 1 DO CURSO
INFÂNCIAS, ADOLESCÊNCIAS E
JUVENTUDES
(...) a concepção aqui adotada compreende a pessoa humana como sujeito
– ao mesmo tempo como sujeito sócio-histórico, sujeito da cultura, sujeito
desejante, sujeito epistêmico, sujeito de relações interpessoais, sujeito do
brinquedo e da brincadeira, sujeito da ética e da estética. (Projeto Educativo
do Brasil Marista, 2010, p. 56)
O primeiro tema apresentado refere-se às Infâncias, Adolescências e Juventudes. No artigo Formação de Valores: Reflexões e Possibilidades, Giovanna
Cristina Gomes de Melo Viol Suzuki contextualiza a educação infantil no Brasil
com o intuito de levantar uma reflexão acerca da importância da formação
ética e moral em parceria com a formação intelectual no ambiente escolar.
Analisa pontos relevantes sobre a formação de valores em ambientes educativos e ressalta a importância do educador em meio a esse processo, apontando
caminhos e indicando possibilidades. Renato dos Santos, em seu artigo Na
busca pelo direito a Infância, retrata o direito da infância e pontos de vista em
relação à garantia dos direitos de a mesma vivenciar de fato sua condição. O
artigo de Valéria Santos, Reflexões e práticas para a Educação Infantil, analisa a
importância da dinâmica utilizada na educação infantil para o desenvolvimento integral dos educandos.
41
FORMAÇÃO DE VALORES:
REFLEXÕES E POSSIBILIDADES
Giovanna Cristina Gomes de Melo Viol Suzuki
32
O presente artigo visa apresentar uma rápida contextualização sobre a educação infantil no Brasil, com o intuito de levantar uma reflexão acerca da importância da formação ética e moral em parceria com a formação intelectual no
ambiente escolar. Busca analisar pontos relevantes sobre a formação de valores
em ambientes educativos e realçar a importância do educador em meio a esse
processo, apontando caminhos e indicando possibilidades. Para isso, compartilha das ideias de Vinha (1999), Cortella; La Taille (2005), Moscheto; Chiquito
(2007), Arantes (2007), Moreno (1998), Goergen (2007), entre outros.
Palavras-chaves: Educação Infantil; Formação de Valores; Prática Pedagógica.
32
Graduada em Artes Cênicas pela Universidade Estadual de Londrina/PR e pós-graduada em Gestão Educacional pela Unicesumar/PR. Foi
educadora social do Centro Educacional Marista Ir. Beno, em Maringá/PR. E-mail: [email protected].
PARTE II
RESUMO
42
Educadores Sociais Maristas
1 INTRODUÇÃO
Durante a história da humanidade, a maneira de se ver, pensar e discutir educação passou por uma série de transformações. Segundo Mantovani (2011),
desde antes do surgimento das instituições de ensino, o processo educativo já
acontecia no meio social. A chamada educação primitiva era baseada, principalmente, na tradição oral, em que os mais velhos passavam o conhecimento
aos mais novos, que observavam e imitavam. Assim, a aprendizagem ocorria
de forma espontânea, primeiro no núcleo familiar e depois no convívio social.
Segundo Nóvoa (1995), até o século XVI, a profissão docente ficava a cargo da
Igreja. Em meados do século XVIII, passa por um processo gradativo de transferência para responsabilidade do Estado. A partir daí, a educação se torna “o
ensino que gera a necessidade de uma ‘pedagogia’ capaz de traçar as teorias
que determinarão as práticas de transmissão do saber” (MANTOVANI, 2011, p.
44). A escola, então, assume o papel de transmissora de conhecimentos científicos.
A sociedade contemporânea se caracteriza cada vez mais pelas mudanças
aceleradas e contínuas em âmbitos políticos, sociais, culturais, econômicos,
científicos, tecnológicos e educacionais. Com a globalização e a popularização
da internet, houve um grande avanço na velocidade e na facilidade do acesso à
informação. Isso estabeleceu profundas transformações e avanços científicos e
tecnológicos que refletiram não só na sociedade de forma geral, mas também
no âmbito educacional.
Para Cortella e La Taille (2005), a sociedade atravessa uma crise de valores, ou
ainda, os próprios valores estariam em crise. “Crise de valores” implicaria em
valores morais ‘doentes’, com risco de extinção. Já “valores em crise” evidenciaria que os valores não correm o perigo de desaparecer, mas estão sendo
distorcidos, com outras interpretações a significá-los.
Atualmente, o papel da escola vai muito além da transmissão de conhecimentos científicos. Na verdade, a função e os objetivos da escola vão se redefinindo ao longo do tempo.
43
De mera transmissora de conhecimentos científicos, esta instituição
passou a ser responsável pela formação social, moral e cultural do aluno,
ou seja, assumiu um papel ainda mais amplo e complexo, necessitando de
uma reorganização do sistema de ensino para alcançar esses objetivos.
(CARDOSO, 2006, p. 45).
O espaço educativo é responsável pela formação integral do indivíduo em sujeito crítico, autônomo e atuante na sociedade em que vive. Por isso, a formação de valores na educação infantil é fundamental na construção desse indivíduo, uma vez que é nessa fase que a criança começa a desenvolver e construir
sua identidade intelectual e moral.
2 EDUCAÇÃO INFANTIL: UM POUCO DE HISTÓRIA
Com base no documento institucional Projeto Marista para a Educação Infantil,
serão tecidas algumas considerações e apontamentos a respeito do percurso
histórico da Educação Infantil no Brasil.
Com o aumento crescente da necessidade de creches e pré-escolas, o surgimento das instituições privadas se tornou inevitável, uma vez que o Estado não
conseguia atender a demanda existente.
As escolas particulares passaram, então, a prestar serviços a uma clientela
exigente. “Prometiam diferenciar suas crianças, capacitando-as em prontidão
para exames classificatórios da época.” (MOSCHETO; CHIQUITO, 2007, p.25).
Dessa forma, o número de instituições com esse objetivo aumentaram consideravelmente, pois se acreditava que o necessário para a criança era preparo e
treino para ingressar com louvor no ensino fundamental.
A primeira lei a considerar, ainda que de forma tímida, a Educação Infantil foi a
Lei n. 5.692/71, que através do artigo 61 mencionou a necessidade de se pensar
na educação que precedia o primeiro grau.
PARTE II
A partir do movimento de inserção da figura feminina cada vez mais no mercado de trabalho, as creches e pré-escolas procuravam atender às necessidades
básicas das crianças pequenas, caracterizando-se predominantemente de forma assistencialista.
Educadores Sociais Maristas
44
Na década de 80, houve um movimento de renovação devido à influência de
Piaget e Vygostski, que tratavam do desenvolvimento e da aprendizagem infantil. Com isso, foi proposto à escola a responsabilidade de transpor essas
pesquisas para a prática pedagógica.
Nos anos 90, a educação dessa faixa etária passou a ter mais visibilidade no
Brasil e no mundo. Com a Lei de Diretrizes e Bases, Lei nº 9.394/96, a educação
infantil foi considerada a primeira etapa do Ensino Básico, promovendo sua
transferência do Ministério da Assistência Social para o Ministério da Educação.
O foco centrado só no cuidar foi ampliado para o cuidar e o educar. Foi um
período de grandes mudanças na alfabetização.
Cartilhas, ditados, cópias, treino ortográfico e caligrafia cederam lugar
aos processos da escrita embasada na pesquisa de Emília Ferreiro.
Começou-se a entender como a criança reconstruía o código linguístico.
[...], o socioconstrutivismo se fortalecia, e todos os processos de ensinoaprendizagem tinham como base as interações, a preocupação em ampliar
a zona de possibilidades do conhecer. (MOSCHETO; CHIQUITO, 2007, p.28).
O planejamento passou a ser mais participativo e integrado e o conteúdo deixou
de ser o centro do processo educativo, voltando-se para as aprendizagens possíveis e os indicadores avaliativos que pudessem mensurar essas aprendizagens.
As concepções dos termos ‘criança’ e ‘infância’ variaram muito ao longo da
história,
com a constituição das democracias modernas, a criança passa a ser um
indivíduo com direitos particulares, como o de ser protegido, o de ser
cuidado em suas necessidades físicas, psicológicas e mentais, e o de ter uma
participação relativa em sua própria vida e no meio em que está inserido.
(MOSCHETO; CHIQUITO, 2007, p. 43).
Com a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei nº 8.069, de
13 de julho de 1990 e Lei nº 8.242, de 12 de outubro de 1991, há uma profunda
reflexão sobre a criança enquanto sujeito de direitos e sobre o papel e a perspectiva da escola na formação desse indivíduo.
45
Atualmente, a imagem de criança assumida está fundamentada em duas convicções:
1. A criança, desde pequena, é um ser capaz de produzir ideias, cultura,
objetos concretos e simbólicos; de desenvolver sentimentos que serão
válidos para toda a vida; de questionar a realidade que a cerca e a que
está distante no tempo e no espaço; de produzir significados sobre si,
sobre o outro e sobre o mundo.
2. As interações, ou seja, as relações da criança consigo mesma, dela com
outras pessoas, com situações e objetos diversos, com os pensamentos
e com as sensações que experimenta, com um aspecto transcendente,
que ultrapassa os limites da existência, estabelecem as possibilidades de
ampliação e aprimoramento das capacidades inerentes ao ser humano.
(MOSCHETO; CHIQUITO, 2007, p.49).
Ao assumir a capacidade que as crianças têm de aprender interagindo com o
outro e com o meio ambiente e, assim, transformar seu relacionamento com o
mundo adulto, mostra-se essencial a reflexão e a análise acerca da formação
de valores a partir da educação infantil.
‘Formar’ tem origem no latim formare, dar o ser e a forma, organizar, estabelecer. Segundo Houaiss (2001), formação deriva do latim formatione, e está
relacionada ao que dá forma:
1. O ato, o efeito ou o modo de formar, de constituir; a criação, a construção;
2. A maneira como uma pessoa é criada, tudo o que lhe molda o caráter, a
personalidade;
3. O conjunto de conhecimentos e habilidades específicos a um determinado
campo de atividade prática ou intelectual;
4. O conjunto dos cursos concluídos e graus obtidos por uma pessoa;
5. O ato ou efeito de dar forma, modelar. (HOUAISS, 2001, p. 1372).
PARTE II
3 FORMAÇÃO DE VALORES: CONCEITOS E REFLEXÕES
Educadores Sociais Maristas
46
Considerando-se ‘formar’ como construção, transformação e o conjunto de conhecimentos e habilidades de uma atividade prática ou intelectual, que forma
ou molda, nota-se que o ser humano está em constante processo de formação,
necessária para se adequar à cultura e à sociedade na qual está inserido.
Diante disso, pode-se citar a família como uma instituição informal que contribui para a formação do indivíduo.
Cada família possui uma estrutura formada por normas e princípios que
se organizam a partir das demandas, interações e comunicações ocorridas
internamente e com o exterior. Estas normas regulam seu ciclo vital e seu
funcionamento, procurando manter sua estrutura. Mas a família, por si só,
não é capaz de promover a formação do indivíduo. Para envolver os aspectos
culturais, sociais, políticos, econômicos e científicos da formação, faz-se
necessária a complementação de conhecimentos, os quais as instituições
formais podem oferecer. (CARDOSO, 2006, p. 44).
A partir disso, Araújo (2003) aponta dois objetivos centrais da educação: a
instrução, por meio dos conhecimentos historicamente construídos pela humanidade, e a formação ética por meio da
busca pelo desenvolvimento de aspectos que deem aos jovens e às crianças as
condições físicas, psíquicas, cognitivas e culturais necessárias para uma vida
pessoal digna e saudável e para poderem exercer e participar efetivamente
da vida política, da vida pública, da sociedade, de forma crítica e autônoma.
(ARAÚJO, 2003, p. 31).
O processo de formação de valores geralmente é efetivado no ambiente familiar, mas, diante do contexto atual, o espaço educativo também deve contribuir
no desenvolvimento de aspectos sociais, culturais, políticos, afetivos, morais e
éticos. Os Parâmetros Curriculares Nacionais reforçam essa ideia, pois temas
transversais foram instituídos para serem trabalhados nas escolas, nas quais se
encontram, entre outros, a ética e a pluralidade cultural.
Para Piaget, os valores estão diretamente ligados à dimensão geral da afetividade e às projeções afetivas que o sujeito faz sobre objetos ou pessoas. Os
valores não são predeterminados geneticamente, são resultados das ações do
sujeito no mundo e na sociedade nos quais está inserido. Telma Vinha afirma
que um valor nada mais é do que uma norma revestida de afetividade.
47
Para Arantes (2007, p. 110), ter valores
significa estar disposto a repetir comportamentos desejáveis, algo próximo
das virtudes, mas, além disso, comportamento desejável que assumimos não
apenas por tê-los aprendido, que seria apenas um hábito mecânico, mas
porque temos a convicção de que devemos manifestá-los.
E Moreno (1998, p.35) aponta a importância de os conteúdos curriculares serem o meio para se atingir a formação em valores.
É preciso retirar as disciplinas científicas de suas torres de marfim e deixá-las
impregnar-se de vida cotidiana sem que isto pressuponha, de forma alguma,
renunciar às elaborações teóricas imprescindíveis para o avanço da ciência.
Vinha (1999, p. 17) ressalta que não basta só ter juízo moral, é preciso querer
agir de acordo com os princípios e as regras. Para a autora, a moral está associada ao dever, enquanto a ética associa-se ao desejo.
Segundo a autora, Piaget divide a moral em autônoma e heterônoma. Na moral
heterônoma o ser humano é governado pelos outros e justifica o que faz e o
que sente em nome do outro. A moral autônoma se caracteriza pelo governo
de si por si mesmo, levando em conta o outro antes de suas decisões.
A construção de valores, o desenvolvimento da moral, se dá a partir da
interação da criança com pessoas e situações. Não existe moral sem o
outro. A moral, necessariamente, envolve o outro, porque se refere a regras,
a normas, como as pessoas devem agir perante o outro. A construção de
valores se dá a partir das experiências com o outro. (VINHA, 1999, p.18).
A autora aponta, ainda, algumas possibilidades para que o educador possa
mediar a construção dessa moral de forma positiva. Primeiramente, nunca
abusar da sua autoridade de adulto; valorizar a verdade, seja ela agradável
ou não; e associar a regra a um sentimento de bem-estar e de consequências
no caso do não cumprimento. É importante que o educador compreenda que
PARTE II
O desenvolvimento da moral refere-se ao desenvolvimento das crenças, dos
valores, das ideias dos sujeitos sobre a noção do certo, do errado, dos juízos.
[...] A moral refere-se ao que eu devo ser, como eu devo agir perante o outro.
Como eu devo e não como eu ajo.
Educadores Sociais Maristas
48
com cada resposta que ele dá, ou com as que ele não dá, a moralidade e
a ética são abordadas. [...] Cada ato do relacionamento com o aluno serve
para algo e faz parte da construção da personalidade que a criança está
formando. (VINHA, 1999, p. 20).
É preciso incentivar e permitir que as crianças resolvam os problemas. A princípio, as soluções não serão as mais adequadas, mas só vão começar a ser na
medida em que vivenciarem as consequências de suas escolhas. A intervenção
deve ser sempre adequada e construtiva. Deve levar a criança à reflexão para
que ela chegue por si mesma à conclusão. É importante permitir que a criança
tome pequenas decisões e assuma responsabilidades para o desenvolvimento
da construção da sua personalidade moral. O que vai potencializar ou não esse
desenvolvimento é o ambiente autoritário ou democrático.
Autoritário é o que o adulto faz pela criança que ela pode fazer por si
mesma. [...] O democrático é o contrário, é aquele ambiente em que a
criança planeja junto com o professor quais atividades vão ter naquele
dia. Ela vai tomar decisões, escolher, dentre as opções oferecidas pelo
professor, quais quer fazer. [...] A criança é quem decide e o ritmo dela é
respeitado. (VINHA, 1999, p.23).
Para que a criança tenha um sentimento de obrigação ou aceitação a uma
norma ou a uma recomendação de um adulto, são necessárias duas condições
simultâneas: estar acostumada a receber regras ou recomendações e que a
norma parta de alguém significativo para ela, que ela respeita por meio de um
vínculo afetivo.
As relações de respeito mútuo, entre pessoas que se consideram iguais,
levam a uma moral autônoma. Autônoma é a pessoa que governa a si mesma,
mas considerando sempre o outro por vontade própria. Não é simplesmente
eu fazer o que eu quero. É eu considerar o que é melhor para nós, ao tomar
uma decisão. (VINHA, 1999, p.26).
Para que a criança consiga desenvolver a autonomia, precisa vivenciar e experienciar relações de respeito mútuo e, como não consegue se colocar em igualdade com o adulto, precisa conviver com crianças da mesma idade. Entretanto,
o adulto, no caso, o educador, pode mediar e facilitar o desenvolvimento dessa
autonomia por meio da formação de valores.
49
Proporcionar a formação moral e ética da criança
é criar condições para que ela, aos poucos, possa assumir-se como autora de
sua própria identidade, constituindo-se como sujeito moralmente autônomo
e capaz de tomar nas próprias mãos o seu destino no interior da comunidade.
(GOERGEN, 2007, p.747).
Portanto, a formação de valores é uma tarefa extremamente complexa, que
exige fundamentação teórica, compreensão dos processos cognitivos e afetivos relacionados a cada faixa etária, e uma pluralidade de fatores que movimentam e promovem a reflexão contínua e constante da prática pedagógica.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O papel da escola, hoje, vai muito além da transmissão de saberes científicos e
curriculares. O espaço educativo é responsável pela formação integral do indivíduo em cidadão consciente e atuante na sociedade em que vive.
E para que se tenha clareza e certeza dos procedimentos e intervenções mais
adequados para cada situação, é preciso saber qual o ser humano que se quer
formar e compreender a importância do papel do educador nesse processo.
Diante disso, a formação de valores, a partir da educação infantil, é uma
possibilidade rica e poderosa na obtenção desse objetivo. Somente contribuindo de maneira positiva no desenvolvimento da construção da personalidade moral das crianças é que é possível pensar em cidadãos mais críticos,
éticos e responsáveis por seus atos na construção de uma sociedade mais
justa e democrática.
PARTE II
As aceleradas mudanças tecnológicas e científicas afetam não só a cultura e
a sociedade de forma geral, mas também a educação em todos os seus aspectos. A formação do homem é um processo constante e contínuo. No que
tange à literatura, um número considerável e crescente de autores tem realizado pesquisas sobre valores, educação, moral e ética. E o grande consenso é a
necessidade de se refletir sobre a crise de valores pela qual a sociedade está
passando e a responsabilidade do ambiente educativo frente a ela.
50
Educadores Sociais Maristas
REFERÊNCIAS
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e bases da educação nacional. Brasília, 20 de dezembro de 1996; 175º da Independência e 108º da República.
______. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: Brasília: MEC/SEF, 1997.
______. LEI Nº5692, DE 11 DE AGOSTO DE 1971. Fixa Diretrizes e Bases para o
ensino de 1º e 2º graus, e dá outras providências. MEC. Ensino de 1º e 2º grau.
ARANTES, Valéria A.; ARAÚJO, Ulisses F.; PUIG, Josep M. (org.). Educação e
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ARAÚJO, Ulisses F. Temas transversais e a estratégia de projetos. São Paulo:
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CARDOSO, A. M. da L. Um olhar sobre a formação continuada de professores
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HOUAISS, A.; VILLAR, M. de S. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio
de Janeiro: Objetiva, 2001.
MANTOVANI, M. R. Educação, Trabalho e Ética. Maringá: Centro Universitário
de Maringá/Núcleo de Educação à Distância, 2011.
MORENO, Montserrat. Temas transversais em educação: bases para uma formação integral. São Paulo: Ática, 1998.
51
MOSCHETO, Marta D.; CHIQUITO, Ricardo S. (org.). Projeto Marista para a Educação Infantil. São Paulo: FTD, 2007.
NÓVOA, (Org.). Vidas de Professores. 2. ed. Porto: Porto Editora, 1995.
PARTE II
VINHA, Telma P. O educador e a moralidade infantil numa perspectiva construtivista. Revista do Cogeime. Seminário de Educação Infantil, n. 14, p. 15-38,
jul/1999.
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52
REFLEXÕES E PRÁTICAS PARA
EDUCAÇÃO INFANTIL
Valeria Terezinha dos Santos33
RESUMO
O presente trabalho suscita qual a importância da dinâmica utilizada na Educação Infantil para o desenvolvimento integral dos estudantes. Para isso, descreve-se uma ideia de como organizar o ambiente de trabalho nesta etapa,
que atitudes os educadores podem ter com seus educandos nesta fase que os
auxiliem em seu crescimento pessoal, afetivo e escolar, observando por quais
caminhos esses educadores deverão seguir, buscando desenvolver em seus
estudantes a capacidade de reconhecimento de si como agente social importante na transformação da realidade atual no mundo.
Palavras–chave: Educação Infantil. Organização Pedagógica. Relação Teoria/
Prática.
33 Graduada em Pedagogia pela Universidade Federal de Santa Maria/RS. Trabalhou até 2012 como educadora social da Escola Marista Santa
Marta, em Santa Maria/RS.
53
1 REFLEXÕES E PRÁTICAS
A educação vem sofrendo grandes transformações ao longo dos séculos.
Nestes últimos tempos, a educação infantil passou por mudanças consideráveis diante do que chamávamos de “educação pré-escolar” e deixa para
trás a concepção de assistencialista, inovando a maneira de agir e de pensar de educadores, educando e família. De assistencialista, então, passa a
ser objetivo da educação infantil o desenvolvimento integral da criança,
complementando a ação da família e da sociedade/comunidade em que
está inserida.
Pensando nesta etapa da educação e nestes novos fundamentos teóricos,
esse trabalho tem por objetivo repensar a prática pedagógica na educação
infantil, idealizando uma proposta integrada de educação-evangelização,
compreendendo a criança como sujeito capaz de produzir ideias e sentidos,
de expressar opiniões por meio de diferentes linguagens e de compreender
e significar suas experiências.
2 INTERAÇÕES E REFLEXÕES DIANTE DA PRÁTICA EDUCACIONAL
Hoje, a Educação Infantil constitui segmentos importantes no sistema educacional brasileiro, pois é reconhecida como primeira etapa da Educação Básica.
Logo, repensando esta realidade, é necessário refletir em como atuar profissionalmente na Educação Infantil, já que esta busca um contexto de uma aprendizagem mais significativa, construída através de conhecimentos prévios de
cada educando, levando em consideração suas fases de desenvolvimento.
PARTE II
Logo, percebe-se que a organização do trabalho pedagógico na educação infantil deve partir de um princípio básico de proporcionar à criança o desenvolvimento da autonomia, ou seja, capacidade de construir em seu processo
de aprendizagem conhecimentos que a leve a compreender seu importante
envolvimento com sua sociedade, vivenciando, interagindo e diagnosticando,
em cada etapa de seu desenvolvimento, valores e atitudes solidárias para atuar
na comunidade/sociedade que convive.
Educadores Sociais Maristas
54
É necessário que o educador dedique-se a atender as expectativas escolares
de cada criança, pois chegará à escola em sua primeira experiência contendo
várias curiosidades. Faz-se, então, sentido que o educador estimule o desejo
pela aprendizagem, deixando-os seguros distantes de suas famílias e fazendo-os perceber que, ao retornarem a seus lares, estarão novamente construindo sua aprendizagem, pois levarão consigo suas ansiedades e curiosidades e,
logo, retornarão à escola com novos pensamentos e novas experiências.
Estudos apontam para uma imagem de criança ativa, competente, agente de
participação social, envolvida na construção de sua vida e na produção de
cultura. Todavia, a participação infantil dentro das escolas tem se constituído
como um desafio que exige novas pedagogias para as infâncias.
O educador não é mero espectador do caminho que a criança vai percorrendo,
mas é o mediador do processo que oportuniza desafios e conquistas das crianças, considerando cada estágio do desenvolvimento infantil. Para consistência
e êxito do trabalho, reconhecemos a importância da leitura, da pesquisa e dos
estudos, tendo em vista as constantes transformações no campo educacional.
O educador, consciente de sua missão, desafia e problematiza situações de
aprendizagem, estimulando, transformando e promovendo o conhecimento.
A escola prioriza e valoriza o ambiente familiar como promissor de uma educação de qualidade, buscando interação dos pais e familiares nas atividades
escolares. A estrutura familiar das crianças se difere como em qualquer meio
escolar – pais separados, mães solteiras, filhos adotados, com ou sem problemas de saúde e outros.
Segundo Rocha (1999), a Pedagogia da Infância tem como objeto de preocupação a criança, seus processos de constituição como seres humanos em
diferentes contextos sociais, suas culturas, capacidades intelectuais, criativas,
estéticas, criativas, expressivas e emocionais. Complementa a autora:
(...) a tarefa das instituições de Educação Infantil não se limita ao domínio do
conhecimento, assumindo funções de complementariedade e socialização
relativas tanto à educação como ao cuidado e tendo como objeto as relações
educativas-pedagógicas, estabelecidas entre e com as crianças pequenas
– 0 a 6 anos. Essas relações envolvem, além da dimensão cognitiva, as
55
dimensões expressiva, lúdica, criativa, afetiva, nutricional, médica, sexual,
física, psicológica, linguística e cultural. Dimensões humanas que têm sido
constantemente esquecidas numa sociedade onde o que prevalece é um
privilegiamento de um conhecimento parcializado resultante da fragmentação
em diferentes disciplinas científicas. (ROCHA ,1999, p. 8).
Quanto às atitudes em sala de aula, na educação infantil os problemas que
se apresentam são comuns como em todas as escolas. Os mais comentados
são os problemas de indisciplina, mas a maioria dos educandos tenta seguir
os “limites” impostos pelas regras da escola; além deste mais comum, existe
também desrespeito entre colegas, desatenção e desinteresse; porém, existem
educandos que possuem muita atenção e sempre se disponibilizam nas horas
das atividades. Para tentar resolver os problemas relacionados à aprendizagem ou disciplina, a escola deverá usar de todos os meios que dispõe (diálogo,
técnicas de autoajuda, investigação...) e sempre incluir a participação da família no processo de resolução; assim, conseguirá resultados positivos. Vygotsky
(1984) considera que o desenvolvimento ocorre ao longo da vida e que as funções psicológicas superiores são construídas ao longo dela. Ele não estabelece
fases para explicar o desenvolvimento como Piaget e para ele o sujeito não é
ativo nem passivo: é interativo.
A brincadeira é, sem dúvida, uma das principais atividades da infância. No entanto, ao mesmo tempo em que ela aponta a capacidade criadora das crianças,
geralmente os adultos negam-lhes a possibilidade de a vivenciarem com intensidade, pois as manifestações culturais das crianças são compreendidas em
termos de estágios de desenvolvimento cultural em que o adulto é o modelo
a ser seguido, mas, durante as brincadeiras, elas podem ser muito mais do que
são, expressando as diferentes dimensões humanas, tornando-se crianças a
sua moda. Na pesquisa de Agostinho (2003, p.80), observou- se que:
[...] as crianças, durante as brincadeiras, davam outros sentidos e
significados aos objetos, interagindo com eles de outro jeito, fugindo ao
convencionalmente colocado, mas em outras ocasiões ou num momento
PARTE II
A criança usa as interações sociais como formas privilegiadas de acesso a
informações: aprendem a regra do jogo, por exemplo, através dos outros
e não como o resultado de um engajamento individual na solução de
problemas. (VYGOTSKY, 1984, p.85).
Educadores Sociais Maristas
56
seguinte utilizavam um objeto de forma real, demonstrando que a criança
não se comporta de forma puramente simbólica no brinquedo. Assim,
quando brincam, as crianças repetem e também inovam as ações esperadas
pelos adultos. Nessa sua inovação, nesse seu outro jeito de se apropriar dos
objetos, por vezes, confrontam-se com a lógica adulta.
As crianças, atribuindo outros sentidos e significados aos objetos, inventam
brincadeiras, recriando no mundo da ordem uma outra ordem. Muitas vezes
entendida pelo adulto como desordem ou bagunça, o que geralmente leva a
submeter às crianças as normas preestabelecidas, impossibilitando-as de manifestarem sua espontaneidade e liberdade. “A criação de uma situação imaginária não é algo fortuito na vida da criança; pelo contrário, é a primeira manifestação da emancipação da criança em relação às restrições situacionais”.
(VYGOTSKY, 1984, p. 130).
Este trabalho gira em torno da importância do lúdico, mostrando o quão importante a brincadeira pode ser na vida de uma criança para o seu desenvolvimento físico, emocional, cognitivo e intelectual. O lúdico pode ser usado como
um recurso que propicia um ensinar de forma correta, simples e divertido. A
criança também constrói seu conhecimento em brincadeiras próprias, as quais
chamamos de livres. O educador, neste caso, não é o dono do saber, mas, sim,
o mediador, ajudando-a através do lúdico a fazer descobertas e, juntos, construírem e reconstruírem seu conhecimento. Desta forma, percebemos que a
educação infantil deve propiciar o desenvolvimento e as descobertas de forma
prazerosa, compreendendo que a criança tem seu “mundo” repleto de brincadeiras e imaginação, e devemos procurar utilizar estas características para
nos tornarmos cada vez mais próximos de suas necessidades, proporcionando à criança um desenvolvimento completo em todos os aspectos. Buscamos
construir um referencial da compreensão do significado da infância através
dos séculos, pontuando o espaço que a criança frequentava e que passou a
frequentar.
Acredito que este trabalho é válido para nossa formação como educadores. A
escola está ainda em fase de reconstrução e reconhecimento, com vistas que
esse processo é inevitável à educação, pois esta convive com esse processo de
transformação.
57
3 REFLETINDO SOBRE A PRÁTICA
Pude constatar, através das leituras realizadas, que o trabalho do educador de
educação infantil é muito importante para a formação da personalidade da
criança.
É necessário fazer do educando um indivíduo ativo, despertar a curiosidade e a
vontade de aprender novas situações, que vão além de simplesmente decorar
e realizar as atividades mecanicamente.
É de tamanha importância que o educador mantenha os limites no cotidiano
escolar em relação às crianças, proporcionando um grande vínculo entre
educação/evangelização, que desenvolve em seus educandos valores morais
de extrema importância para a vida.
O desafio está lançado e cabe ao educador tentar se utilizar de vários meios
para progredir nos diferentes aspectos de ensino e aprendizagem. Este trabalho foi muito importante para o desenvolvimento do curso, pois possibilitou
detectar problemas e refletir sobre possíveis soluções. Acredito que a educação está em um processo de transformação e segue um caminho enriquecedor
para a trajetória da educação infantil.
AGOSTINHO, Kátia Adair. O Espaço da Creche que Lugar é Esse? Dissertação
(Mestrado em Educação) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2003.
ROCHA, Eloísa Candal. Princípios Pedagógicos para a Educação Infantil Municipal. Subsídios para a reorganização Didática da Educação Básica Municipal.
Florianópolis: 1999. (mimeo).
VYGOTSKY, Lev. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1984.
PARTE II
REFERÊNCIAS
58
Educadores Sociais Maristas
TEMÁTICA 2 DO CURSO
EDUCADORES SOCIAS MARISTAS
(...) Promovemos a participação e o diálogo permanente entre os diferentes
atores do processo socioeducativo para atender às necessidades das
crianças e jovens pobres e desenvolver metodologias adequadas. (Caminhos
de Solidariedade Marista, 2013, p. 193)
O segundo tema, Educadores Sociais Maristas, trata da atuação do educador social e a construção do conhecimento nos espaços educativos. Lucirene Mikoski contribui com o artigo Educador Social: limites e possibilidades
para a prática socioeducativa ao apresentar reflexões acerca do trabalho
desempenhado pelo profissional intitulado Educador Social. O artigo de Patrícia da Costa Santos Rosado, O papel da Afetividade na Construção do
Conhecimento, destaca a importância da afetividade nas relações escolares
e sociais, evidenciando a relevância da relação entre educando e educador
e o impacto deste na construção cognitiva, e ressalta a importância da família neste processo. Eliane Teresinha Eismann Vivian, no artigo A atuação
do educador na educação inclusiva, faz uma análise crítica sobre o processo
de inclusão de portadores de necessidades especiais e o papel do educador
nas escolas regulares, relacionando aspectos teóricos a questões da prática
pedagógica. Narra a necessidade de políticas públicas eficazes nas áreas da
saúde, educação e assistência social.
59
EDUCADOR SOCIAL: limites e
possibilidades para a prática
socioeducativa
Lucirene Mikoski34
O objetivo deste artigo é apresentar reflexões acerca do trabalho desempenhado pelo profissional intitulado Educador Social. Trata-se de pesquisa bibliográfica embasada na experiência prática da autora do artigo, envolvendo
a temática acerca dos limites e possibilidades para a prática socioeducativa
deste profissional. A partir da pesquisa, desencadeia-se a discussão no que diz
respeito ao tema com o intuito de contribuir para o seu reconhecimento e a
construção da sua identidade. O presente trabalho busca, ainda, trazer à tona
algumas questões norteadoras relevantes ao trabalho socioeducativo do Educador Social, bem como uma conceituação do profissional em questão diante
das atividades que desenvolve no dia a dia de sua profissão.
Palavras-chave: Educador Social; Formação Contínua; Pedagogia Social.
34
Educadora Social no ProAção Irmã Eunice Benato, pertencente à Rede Marista de Solidariedade desde 2008 até os dias atuais (2013). Atua
nos programas SASE – Serviço de Apoio Socioeducativo e Jovem Aprendiz. Trabalha ministrando a Oficina de Teatro, por meio do Projeto
Ágora. E-mail: [email protected] ou [email protected].
PARTE II
RESUMO
60
Educadores Sociais Maristas
1 INTRODUÇÃO
O presente artigo é o trabalho de conclusão do curso de educação a distância
“Educadores Sociais Maristas” e traz reflexões acerca dos limites e possibilidades para a prática socioeducativa do Educador Social.
Para a escolha do tema, levou-se em consideração o contexto do curso em si,
bem como a realidade profissional da autora deste texto. Para tanto, em primeira instância, a opção foi conceituar o profissional em questão diante das
ações que desenvolve cotidianamente. Em seguida, há o desenrolar da discussão no que concerne ao tema em si, trazendo de forma implícita a vivência
profissional, as necessidades, as reflexões e as descobertas acerca da profissão
do Educador Social.
Para finalizar a discussão, considerou-se o desafio diário do Educador Social
de estar sempre em construção ou formação diante do constante movimento
inerente a sua experiência profissional.
2 EDUCADOR SOCIAL: LIMITES E POSSIBILIDADES PARA A
PRÁTICA SOCIOEDUCATIVA
Ao iniciar a discussão acerca dos limites e possibilidades para a prática socioeducativa do Educador Social, convém problematizar a conceituação da
expressão relacionada a este profissional que atua em dois campos essenciais
ao ser humano em desenvolvimento. De forma mais clara, o Educador Social
age como colaborador no processo educacional de crianças e/ou adolescentes
e jovens, tendo como pano de fundo de sua atuação a inserção na Política de
Assistência Social. Destarte, cabe ressaltar que Santos e Nogueira (2010 s/p)
argumentam que o educador social é o
profissional que trabalha com usuários em situação de vulnerabilidade social,
os quais são partícipes de programas e projetos sociais, não sendo satisfatório
apenas o seu domínio quanto ao saber teórico ou na boa intenção. Suas ações
não são unicamente pedagógicas, mas também políticas ou ideológicas.
61
Em colaboração à citação anterior, destaca-se que o Educador Social é um
técnico superior capacitado para mediar ações com diferentes públicos em
distintas circunstâncias socioculturais e educacionais. Ainda,
o Educador Social não trabalha só com indivíduos em situação de
vulnerabilidade, mas também com pessoas, independentemente da
etapa de vida em que se encontram, estejam ou não em situação de
vulnerabilidade social. Com todas estas, o Educador Social, enquanto
profissional, estabelece uma relação de proximidade que permite valorizar
a importância de cada situação de forma particular, de modo que cada
indivíduo se sinta único e uno. Um Educador Social é um profissional que
está apto para intervir nas mais diversas situações, é importante salientar
que, apesar desta profissão não ser muito divulgada e conhecida, é um
profissional que está competente para intervir e educar a sociedade lá
fora. (LEMOS, 2012, s/p).
Isto posto, revela-se a necessidade de estabelecer algumas questões as quais
norteiam a atuação do Educador Social:
a. A necessidade de conhecer a conjuntura de seu contexto de atuação,
incluindo, principalmente, as histórias de vida de cada um dos sujeitos
que fazem parte de um coletivo maior.
35
O Sistema Único de Assistência Social (Suas) é um sistema público que organiza, de forma descentralizada, os serviços socioassistenciais no
Brasil. Com um modelo de gestão participativa, ele articula os esforços e recursos dos três níveis de governo para a execução e o financiamento da Política Nacional de Assistência Social (PNAS), envolvendo diretamente as estruturas e marcos regulatórios nacionais, estaduais,
municipais e do Distrito Federal. (http://www.mds.gov.br/assistenciasocial/suas).
36
Lei de Diretrizes e Bases (LDB), Lei nº9394/96, que em seu artigo 1º diz: “A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem
na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais”.
PARTE II
As duas citações acima esclarecem a ação do educador social nos campos
da educação e da assistência social. Ou seja, ao atuar com os usuários em
situação de vulnerabilidade social, o profissional trabalha diretamente com
o público atendido pelo Sistema Único da Assistência Social (SUAS)35. Concomitantemente, ao agir numa perspectiva educativa atende ao artigo 1º da
LDB36, pois há a responsabilização dos atores envolvidos na medida em que
declara que os espaços de vivência e convivência de crianças e adolescentes são espaços formativos e, portanto, de educação em sua significação
mais profunda.
Educadores Sociais Maristas
62
Nesse sentido, vale ressaltar que a Proposta Socioeducativa: referenciais teórico-metodológicos37, da Rede Marista de Solidariedade, estabelece que “para
acolher é importante conhecer e compreender a realidade de cada localidade” (2010, p. 15). Ou seja, na ação do Educador Social ainda postula-se como
pressuposto de atuação profissional a dimensão da acolhida, que traz em si o
movimento da escuta sensível e da presença significativa enquanto características relevantes.
b. A formação contínua dos sujeitos que atuam nestas realidades direta
ou indiretamente, abrangendo também as trocas de experiências entre
estes atores numa perspectiva interdisciplinar.
Desta maneira, conhecer a(s) realidade(s) de atuação é primordial para o Educador Social, pois só assim ele poderá utilizar práticas pedagógicas que vão ao
encontro das necessidades dos educandos e, ainda, ampliar as possibilidades
já existentes. Neste ponto, esta questão se funde à necessidade de formação
contínua, visto que aprofundar-se nas realidades dos educandos torna-se desafio diário da prática profissional.
Cabe aqui, deste modo, uma reflexão sobre o vídeo contendo a fala de Tião
Rocha, no Espaço PUC, em 201138. Entre outras colocações, ele faz uma excelente explanação, abordando que “todo conhecimento deveria ser baseado na Carta da Terra” e, ainda, que “bons educadores produzem a boa
educação”, “para educar é preciso aprender” e traz a relevância da “ação-reflexão-ação”.
c. O reconhecimento da Pedagogia Social como área de atuação inclusive
pelos trabalhadores da educação social. De forma mais específica,
verifica-se também a necessidade do reconhecimento da profissão do
Educador Social.
37
Documento que orienta as ações socioeducativas nas unidades sociais da Rede Marista de Solidariedade, integrante do Grupo Marista.
38
http://www.youtube.com/watch?v=TUPGZ_mp8Tk
63
De acordo com Machado (2008, s/p), compreende-se a Pedagogia Social sob
dois aspectos distintos:
o primeiro referente à socialização do indivíduo, socialização compreendida
como ciência pedagógica da educação social do indivíduo, que pode ser
desenvolvida por pais, professores e família; o segundo relacionado ao
trabalho social, com enfoque pedagógico, direcionado ao atendimento às
necessidades humano-sociais, desenvolvido por equipe multidisciplinar da
qual participa o Educador Social, como profissional da Pedagogia Social.
Com tal concepção, percebe-se que estas três questões podem ser colocadas
em qualquer ordem, pois uma complementa a outra. O ciclo multidirecional a
seguir demonstra a maneira como estas podem ser observadas, sem que uma
se sobreponha a outra, mas confiando a cada uma as especificidades inerentes
a elas e revelando seus pontos em comum de forma simultânea:
Formação
Contínua
Reconhecimento
da Pedagogia
Social
Assim sendo, as duas primeiras questões se conectam à terceira, que diz respeito ao reconhecimento da Pedagogia Social enquanto área de atuação e do
reconhecimento da profissão do educador social – tanto do ponto de vista
legal quanto da relevância da educação social em si. Tal situação pode ser observada, de acordo com o texto “Pedagogia Social no Brasil”, ao se constatar
que a nossa Carta Magna e a Lei de Diretrizes e Bases (LDB/96) “fragmentam
o conceito de educação ao reduzirem a responsabilidade do Estado e a legislação focalizando as questões da “educação escolar” e do “ensino” sem estabelecer relações com as demais perspectivas educativas.” (2009, p. 3).
PARTE II
Conhecer as
Realidades
64
Educadores Sociais Maristas
Ainda, as três questões norteadoras elencadas se justificam, também, embasadas pela fala de Moacir Gadotti, no IV Congresso de Pedagogia Social39:
·· Necessidade de entender a realidade, pois “o novo nasce dentro do velho”;
·· Educação tendo como ponto de partida uma visão “transformadora e
emancipadora”, entendendo sua função agregadora e despertando para
o termo “educações” – “Para mudar a realidade é preciso compreender
a realidade”.
As duas possibilidades colocadas por Gadotti justificam as problematizações
supracitadas, pois se depreende a necessidade de conhecer a profissão do
educador social e a pedagogia social em suas nuances mais detalhadas. Ainda,
ressaltam a necessidade de apropriação das realidades vividas pelos sujeitos
envolvidos na educação social com o intuito de formação contínua, haja vista
a transformação constante experimentada por estes sujeitos.
Outrossim, cabe enfatizar a questão da construção da identidade do educador social para o seu reconhecimento profissional. Desta maneira, Silva (2009) considera
que a reivindicação de qualquer ocupação profissional prevê o desenvolvimento
de competências e habilidades específicas por meio de cursos de formação que
contribuam para o desenvolvimento e o fortalecimento da identidade profissional.
O autor também declara que a construção de uma identidade profissional
implica, ainda, considerando o exercício da prática como uma das formas
de relação do sujeito com o meio no qual está inserido e no qual intervém,
o olhar do outro e a clareza de que o que se busca é o reconhecimento pelo
seu fazer e não pelo seu ser. (SILVA, 2009, p. 484).
Entretanto, tal concepção não deve ser compreendida de maneira a descartar
a integralidade do Educador Social, tendo em vista que, em sua atuação profissional, ele deve também colaborar para a educação integral do educando
enquanto sujeito da ação socioeducativa. Então, levando em consideração a
construção da identidade profissional do Educador Social, as ações de formação contínua perpassam seu “crescimento como ser autônomo e autodeterminado, porém socialmente responsável.” (SERVA, 2011, p. 15).
39
http://www.youtube.com/watch?v=XGFJR0g-Njc
65
Para tanto, é necessário fomentar o desenvolvimento humano do Educador
Social no sentido de envolver seus conhecimentos específicos e promover
uma formação política para além de conhecer as políticas restritas à sua
atuação. Ainda, convém favorecer o processo de inserção do educador na
comunidade onde desenvolve suas ações, corroborando em sua missão de
transformação social.
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir das práticas cotidianas do Educador Social aliadas à formação continuada, é possível concluir que o desenvolvimento de seu trabalho é desafiante
e estimulante.
Entretanto, desafio e estímulo percorrem juntos o caminho profissional trilhado pelo Educador Social para garantir a qualidade do atendimento socioeducativo. Neste sentido, para finalizar, vale ressaltar que, embora o Educador Social seja um profissional habilitado para desenvolver suas atividades, ele é um
ser em permanente construção e, portanto, em constante estado de formação.
PARTE II
O desafio coloca-se diante das condições para que este trabalho aconteça
permeado pelos conceitos de educação integral, educação para autonomia e
educação para a responsabilidade social – relembrando o despertar para o termo “educações”, utilizado por Gadotti. Também é desafiadora a necessidade,
intrínseca ao trabalho do Educador Social, de estar presente de maneira significativa no território onde atua, conhecendo sua conjuntura histórica, social e
cultural. Já o estímulo surge a partir do desafio em si, que nasce das histórias
vividas pelos sujeitos compreendidos na ação socioeducativa e da interação
entre esses sujeitos, que gera um ciclo de aprendizagem significativo para os
atores envolvidos.
66
Educadores Sociais Maristas
REFERÊNCIAS
GADOTTI, Moacir. IV Congresso de Pedagogia Social. <http://www.youtube.
com/watch?v=XGFJR0g-Njc> Acesso em dezembro de 2012.
LEMOS, Henrique Cardoso. O Educador Social no Amapá. Jan/2012. <http://
www.webartigos.com/artigos/o-educador-social-no-amapa/83353/> Acesso
em fevereiro de 2013
MACHADO, Evelcy Monteiro. A Pedagogia Social: diálogos e fronteiras com a
educação não-formal e educação sócio comunitária. Set/2008. <http://www.
am.unisal.br/pos/stricto-educacao/pdf/mesa_8_texto_evelcy.pdf> Acesso em
fevereiro de 2013.
SANTOS, André Michel dos e NOGUEIRA, Vanessa dos Santos. Perfil do Educador Social: experiências e reflexões. Jan. 2010. <http://www.partes.com.br/
educacao/perfileducadorsocial.asp.> Acesso em dezembro de 2012.
SERVA, Mauricio. A formação do educador social e as bases da educação para
um mundo melhor. In: RAMOS, Marcos Fadanelli e ROMAN, Artur (orgs). Educadores Sociais: a importância da formação na implementação de tecnologias
sociais. Brasília: Fundação Banco do Brasil, 2011.
SILVA, Gerson Heidrich da. Educador Social: uma identidade a caminho da
profissionalização? In: Revista Educação e Pesquisa: São Paulo, v. 35, n. 3, p.
479-493, set/dez, 2009.
SOLIDARIEDADE Rede Marista de. Proposta Socioeducativa. Referenciais Teórico-Metodológicos. São Paulo: FTD,
67
A ATUAÇÃO DO EDUCADOR NA
EDUCAÇÃO INCLUSIVA
RESUMO
O presente artigo pretende fazer uma análise crítica sobre o processo de inclusão de portadores de necessidades especiais e o papel do educador nas
escolas regulares, relacionando aspectos teóricos a questões da prática pedagógica. Ressalta a necessidade de políticas públicas eficazes nas áreas da
saúde, educação e assistência social.
Palavras-chave: Atuação. Educador. Educação Inclusiva.
40 Graduada em Pedagogia pela Faculdade Porto–Alegrense/RS, pós-graduada em Orientação e Supervisão Escolar pelo Instituto Educacional
do Rio Grande do Sul/RS. Atualmente, atua como Educadora Social do Centro Social Marista de Porto Alegre – CESMAR. E-mail: ee.vivian@
hotmail.com.
PARTE II
Eliane Teresinha Eismann Vivian40
68
Educadores Sociais Maristas
1 INTRODUÇÃO
Falar de inclusão em um país marcado por tantas desigualdades sociais, com
sinais de exclusão evidente no dia a dia, torna o assunto, no mínimo, polêmico, sabendo-se que o educador é o agente que articula todos os membros da
escola torna-se um papel cada vez mais desafiador dentro dessa expectativa.
Considerando a inclusão social como a possibilidade mais abrangente do acolhimento cidadão, entendemos a inclusão dos portadores de necessidades especiais como uma parcela deste processo humanizador, sabendo que o processo de inclusão é muito mais que lançar o portador de necessidade especial
no contexto social, é uma preparação da sociedade para conviver com a diferença de maneira mais harmoniosa, buscando qualidade de vida.
Nesta perspectiva, este artigo suscita reflexões acerca dos fundamentos legais
e teóricos na relação com os projetos políticos e nas práticas pedagógicas
existentes nas escolas.
O jeito Marista de educar procura estabelecer uma relação de confiança, uma
presença significativa, um olhar atento ao que está acontecendo, busca contemplar os talentos de cada um na coletividade e, acima de tudo, fazer de cada
um de nós bons cristãos e virtuosos cidadãos.
Com estes desafios, o educador busca novas práticas pedagógicas para qualificar o trabalho que focalize nos processos com mediação na construção de
um novo currículo que respeita as diferenças, que conheça a realidade e a cultura de seus educandos, buscando desenvolver sua integralidade. 2 INCLUSÃO: UM INTERVALO ENTRE A TEORIA E A PRÁTICA
Nos dias atuais, a legislação mundial e nacional está toda estruturada para
efetivar a inclusão escolar dos portadores de necessidades especiais. Paralelo
a isto, todo discurso oficial enfatiza, carregando de urgência, a necessidade
de que isto aconteça. A base legal, o discurso, o tempo da história que tem
por trás conceitos fortes, como democratização, direitos humanos, igualdade
de condições, respeito às minorias, respeito às diferenças num sonho político-
69
-social anti-conservador e antiautoritário, embalam as vontades políticas nem
sempre com uma interpretação e aplicação coerente e correta das leis. Neste
sentido, o autor afirma que:
Os movimentos internacionais no âmbito educacional, ocorridos em 1990
(Jomtien, Tailândia) e em 1994 (Salamanca, Espanha), embora colocados nos
mesmos princípios e voltados aos mesmos ideais, curiosamente têm gerado
algumas incompreensões quanto ao alunado aos quais se referem. Do primeiro,
já com mais de uma década, resultou a Declaração Mundial de Educação
para todos, contendo uma série de recomendações voltadas à melhoria da
qualidade do processo de ensino-aprendizagem para qualquer aluno, sem
discriminações. Do segundo resultou a Declaração de Salamanca que reitera
as recomendações de Jomtiem e enfatiza a urgência de atendermos às
necessidades de nossos alunos, evitando todas as práticas discriminatórias e
excludentes. Muitos de nossos colegas educadores, inevitavelmente, consideram
que a Conferência de 1990 dirigiu se às necessidades de aprendizagens dos
alunos ditos normais, ficando os outros, os deficientes e os que apresentam
distúrbios de aprendizagem, como sujeitos das recomendações de Salamanca.
Na verdade, poucos educadores, por inúmeras razões, já examinaram os dois
textos discutindo-os em equipe em busca de subsídios para o aprimoramento
de sua prática. (CARVALHO, 2004, p.155).
Estes redimensionamentos passam por adaptações do espaço físico; reestruturação curricular; revisão de conceitos e concepções em educação; criação
de espaços pedagógicos de apoio, como laboratórios de aprendizagem, salas
de recursos, brinquedoteca, entre outros; criação de parcerias com profissionais da saúde e assistência social, como psiquiatras, psicólogos, fonoaudiólogos, terapeutas, psicopedagogos, assistentes sociais e fisioterapeutas. Mas, o
mais importante ainda é uma pedagogia inclusiva, que implica ter, paralelo ao
conhecimento, uma postura, uma prática de acolhida.
Esta atitude pedagógica ainda é pequena, comparando com a dimensão do
discurso oficial para a inclusão, percebendo-se aí o intervalo entre a teoria inclusiva e a prática inclusiva.
PARTE II
Isto mostra o quanto a escola ainda não está preparada para a inclusão, pois,
certamente, além de uma análise crítica sobre estas declarações e outras leis,
faz-se necessário um redimensionamento no espaço escolar, criando condições básicas para acolher um educando portador de necessidades.
Educadores Sociais Maristas
70
E é de extrema importância que o educador trabalhe a inclusão em conjunto com o grupo escolar, sendo articulador, animando e direcionando, buscando contato constante para troca de experiências, diálogo aberto, confiança e
apoio mútuo, criando espaços de formação continuada, de fala, de escuta, de
reflexão e de troca de experiência.
Com a experiência de educadora Marista, esses desafios fundamentam minha
prática pedagógica e é muito importante refletir e buscar novas práticas para
qualificar o trabalho. É muito importante o educador conhecer o contexto dos
educandos trabalhando as diferenças, criando vínculos, ser um educador de
presença e escuta, pois, dessa forma, facilita o fazer pedagógico.
A escola inclusiva, de acordo com Cardoso (2003, p. 25), “educa todos os
educandos, proporcionando programas educacionais apropriados às necessidades deles e também prevê apoio para que o seu educando tenha sucesso na
integração”. Mas, sabemos que, na prática, inclusão e integração têm grande
diferença. A realidade das salas de aula é bem diferente do que é relatado na
teoria: professores com turmas grandes e educandos com todas as dificuldades existentes, como frio, fome, famílias desestruturadas, dificuldades cognitivas e de aprendizagem.
O termo “inclusão” pressupõe que todos, sem exceção, devam participar da
vida acadêmica; a socialização é fundamental para esse educando se sentir
incluído no processo, pois, independentemente de ter necessidade especial,
o ser incluído em grupo permite que o ser humano se sinta seguro para demonstrar suas fraquezas e necessidades. Mas, na prática, é diferente – eles são
incluídos, mas não integrados; a maioria destes educandos tem dificuldade de
se integrar e acaba desistindo da escola. É importante reconhecermos a educação inclusiva como condição indispensável para uma vida melhor.
É dever da escola promover a integração no tempo e no espaço de toda comunidade, através do estudo e comemoração de sua história, e o educador é o
responsável por essa ligação. Ele tem o compromisso de realizar o levantamento das instituições sociais, dos problemas e das possibilidades da comunidade,
a fim de relacioná-los com atividades escolares, ter atualizado o levantamento
dos recursos para incentivar o seu aproveitamento.
71
Na escola todos são atores e têm um papel a ser desempenhado, posicionando dinamicamente, aproveitando as sinergias oriundas das interações com a
sociedade e com as outras instituições e fomentando, em seu seio, interações
interpessoais e reconhecer a educação inclusiva como condição indispensável
para a formação do cidadão livre e consciente.
Todos devem discutir e debater sobre a educação integral de qualidade buscar
articulações dos processos escolares com outras políticas sociais, ampliando
ações nas perspectivas de garantir o sucesso escolar.
A Missão Educativa Marista focaliza a educação integral e apresenta a identidade e a visão de intervenção social que deve ser compartilhada e desenvolvida por todos, sobretudo pelos educadores Maristas que, por meio de seus
trabalhos, mantêm vivo o sonho de Champagnat.
3 INCLUSÃO: POLÍTICAS PÚBLICAS QUE PERPASSAM A EDUCAÇÃO, SAÚDE E ASSISTÊNCIA SOCIAL
A urgência de dar satisfação ao mundo e, consequentemente, aplicar a legislação
vigente, desencadeou um processo de inclusão no Brasil, imposto verticalmente.
Neste contexto, cabe ao profissional da educação questionar a ordem imposta, interpretar o que está posto, posicionar-se com conhecimento de causa sobre cada inclusão a ser feita, não entendendo que deva, de um dia para o outro, tornar-se um ”super-herói” da educação, dando conta de tudo e de todos. Nunca negar-se, mas, sim,
fazer a sua parte com competência, buscando parcerias com outros profissionais.
A escola poderá ser o núcleo do processo de inclusão, mas não deve ser visto
como o único lugar onde isto possa ser realizado.
Por isso, faz-se necessária a construção de Políticas Públicas que atendam, de
fato, a realidade que se apresenta. Desta forma, é da competência da Assistência Social acompanhar e assistir o sujeito incluso e sua família.
PARTE II
Aos educadores pouca análise está sendo oportunizada, como também está
sendo reduzida a participação na construção de uma política inclusiva.
Educadores Sociais Maristas
72
Nessa lógica, o conceito de inclusão na educação passa pelo viés da inclusão
social, onde estas políticas se harmonizam em formação de equipe de trabalho
que realmente favorecem a inclusão de portadores de necessidades especiais
não somente nas instituições de ensino, mas na vida, pois podem passar de
simples indivíduos a sujeitos de sua história.
Reforçando estas ideias, cabe citar os itens 14,15 e 16 da Declaração de Salamanca, que diz:
1. A legislação deveria reconhecer o princípio de igualdade, de oportunidade
para crianças, jovens e adultos com deficiências na educação primária,
sempre que possível em ambientes integrados.
2. Medidas legislativas paralelas e complementares deveriam ser tratadas nos
campos da saúde, bem-estar social, treinamento vocacional e trabalho no
sentido de promover apoio e gerar total eficácia à legislação educacional.
3. Políticas educacionais em todos os níveis, do nacional ao local, deveriam
estipular que a criança portadora de deficiência deveria frequentar a
escola de sua vizinhança, ou seja, a escola que seria frequentada caso a
criança não portasse nenhuma deficiência. Exceções a esta regra deveriam
ser consideradas individualmente, caso a caso em que a educação em
instituição especial seja requerida.
Portanto, da mesma forma que a educação não poderá arcar sozinha com
a responsabilidade da inclusão, a escola regular não será o único local a
incluir estes educandos. Haverá casos em que o educando estará melhor
atendido em suas necessidades psicopedagógicas numa escola especial,
por exemplo.
Um espaço não deverá excluir o outro, ao contrário, este espaço pedagógico
deverá articular-se para melhor atender o educando.
Todos nós devemos colaborar na educação destas pessoas para que elas possam ter uma integração normal com a sociedade que abrirá novos horizontes
profissionais, para quem deseja se comunicar e transmitir conhecimento para
com algum tipo de deficiência.
73
Neste sentido, a proposta surge de uma convicção política-pedagógica fundamentada na missão Marista e de outros campos do conhecimento que possam embasar este projeto. Mas, ainda, o mais importante é a visão de mundo,
de sociedade, de homem que a equipe de trabalho possui. Segundo Santos
(1998 p. 4):
A inclusão, parece-nos, nunca poderá ser uma imposição. Não se cria
uma escola inclusiva obrigando a cumprir despachos ou decretos-leis! A
inclusão é um conceito antes de ser uma prática. E os conceitos têm que ser
interiorizados, ou seja, terão que estar na cabeça das pessoas antes de serem
usados. “Os conceitos interiorizados tornam-se tão naturais que a prática
surge espontânea”.
Em suas diferentes frentes de atuação, a proposta Marista possui uma expressiva contribuição na promoção, defesa e garantia de direitos, fundamentadas
no ideário de Champagnat com apelo prioritário a promoção, defesa e garantia
dos direitos das crianças e jovens, especialmente os mais necessitados.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
É importante dizer que o relacionamento destas experiências pedagógicas
não tem a intenção de apresentar verdades prontas e únicas. Pelo contrário,
pretende mostrar que práticas inclusivas podem acontecer quando são
construídas na dialética de um grupo.
Sem dúvida, é imprescindível a presença do educador como instigador na prática e teoria pedagógica, destacando a necessidade de adquirir conhecimento
e condições de estar se preparando a todo o momento com seu grupo escolar
para administrar as constantes mudanças na educação especial, no nosso contexto escolar e fora dele.
PARTE II
Aos educandos é oportunizada a participação em atividades, como oficina de
artesanato, capoeira, dança cênica, dança gaúcha, teatro, hip-hop, etc. As turmas com educandos inclusos atuam normalmente; quando não se adaptam,
existem alternativas para poder incluí-lo. Normalmente, o número de educandos na turma é reduzido, para melhor atendimento pedagógico.
Educadores Sociais Maristas
74
É preciso investir na formação continuada do educador, pois são momentos
importantes nos quais os educadores usam para buscar, individual e coletivamente, soluções para os problemas de sala e refletirem sobre sua prática
pedagógica.
Inclusão é atender os educandos portadores de necessidades especiais o mais
próximo da sua residência e propiciar a ampliação do acesso destes às classes
comuns, percebendo que as crianças podem aprender juntas, embora tendo
objetivos e processos diferentes, levando os educadores a estabelecer formas
criativas de atuação com as crianças portadoras de deficiência e propiciar um
atendimento integrado ao professor de classe comum. Mas sabemos que o dia
a dia é bem diferente; mesmo tendo várias leis que amparam a escola, ela não
está preparada para a inclusão. Porém, sabemos que a atuação do educador
não é tão simples assim, ele tem que ter clareza e refletir muito, investir na
mudança de suas atitudes e todas as pessoas envolvidas no processo escolar.
Nós, educadores, temos que valorizar nosso trabalho e fazer a diferença dentro ou fora da escola, porque sabemos que a escola seleciona e tudo que seleciona acaba excluindo. A educação é para todos!
75
5 REFERÊNCIAS
CARDOSO, M.S. Aspectos Históricos da Educação Especial: da exclusão a inclusão uma longa caminhada. In MOSQUERA J. & STOBÄUS C. (ORG) Educação Especial: em direção a educação inclusiva. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2003
p. 15-26.
CARVALHO, Roleta Edler. Educação inclusiva com os Pingos nos is. Porto Alegre: Mediação, 2004.
MISSÃO Educativa Marista: Um projeto para o nosso tempo: 2 ed São Paulo:
Comissão Internacional de Educação Marista, 2000.
UNESCO (1994). Declaração de Salamanca e Enquadramento da Ação na
Área das Necessidades Educativas Especiais: Acesso e Qualidade – Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais, realizada em Salamanca,
de 7 – 10 de Junho em 1994. Lisboa. Instituto de Inovação Educacional.
PARTE II
SANTOS, Jorge. O que é, afinal, a escola. Disponível em: <http://www.grupos.com.br/group/ethos-paideia/Messages.html?action=message&id=461&year=04&month=7&prev=1> Acesso em: 16/01/2013
76
Educadores Sociais Maristas
TEMÁTICA 3 DO CURSO
AÇÃO SOCIOEDUCATIVA MARISTA
(...) Acreditamos na capacidade e potencialidade dos sujeitos, reconhecendo
que as crianças e os jovens não são apenas destinatários da nossa ação
solidária, mas também participantes ativos na definição de iniciativas,
metodologias e itinerários que promovam o exercício de seus direitos.
(Caminhos de Solidariedade, p. 190)
A Ação Socioeducativa Marista, terceiro tema objeto desta publicação, conjectura possíveis mediações e estratégias para os projetos em desenvolvimento. Darlla Barbosa Spínola inicia esta seção com o artigo A prática pedagógica
do Educador Social: a importância de ensinar de um jeito diferente, e frisa a
importância de uma ação educativa diferente por parte do educador social,
das concepções acerca da pedagogia da presença, do trabalho com as cinco
dimensões do ser humano e da construção do projeto de vida. No artigo O uso
de cadernos de registros como estratégia para trabalhar a escrita e a leitura
com crianças e adolescentes: relato de experiência da oficina de Educomunicação, Claudia Aparecida dos Santos Azevedo narra as experiências vivenciadas
por educandos na oficina de Educomunicação no Serviço de Apoio Socioeducativo.
77
A PRÁTICA PEDAGÓGICA DO
EDUCADOR SOCIAL:
a importância de ensinar
de um jeito diferente
Darlla Barbosa Spínola41
O presente texto pretende dialogar sobre a importância de uma ação educativa diferente por parte do educador social, lançando mão de concepções
acerca da pedagogia da presença, do trabalho com as cinco dimensões do ser
humano e da construção do projeto de vida. Propõe-se, ainda, mensurar sobre
a influência deste profissional no desenvolvimento do protagonismo juvenil
do educando e como se torna essencial conhecê-lo, respeitá-lo e dar significado aos saberes que o mesmo traz de casa e de outros espaços. O trabalho,
que foi elaborado a partir de estudos bibliográficos, procurou evidenciar que o
processo de aprendizagem e, principalmente, da construção de um projeto de
vida coerente depende bastante de quais práticas o educador social irá adotar.
Palavras-chave: Educador Social. Protagonismo Juvenil. Projeto de Vida.
41
Formada em Pedagogia (UNIMONTES) com pós-graduação em Psicopedagogia (ISEIB). Atualmente atua como Pedagoga do Centro Marista de Juventude de Montes Claros. E-mail: [email protected].
PARTE II
RESUMO
78
Educadores Sociais Maristas
1 INTRODUÇÃO
Será discutido em linhas gerais o quanto se faz importante que a prática dos
educadores sociais se mostre diferente aos jovens. Certamente, a motivação,
a emancipação e o aprendizado só acontecem quando o sujeito é atraído por
algo que é significativo e encantador ao mesmo. Sendo assim, torna-se essencial traçar aspectos e concepções fundamentais para que a prática pedagógica destes educadores influencie na construção dos educandos.
A motivação é, portanto, o processo que mobiliza o organismo para a ação,
a partir de uma relação estabelecida entre o ambiente, a necessidade e o
objeto de satisfação. Isto significa que, na base da motivação, está sempre
um organismo que apresenta uma necessidade, um desejo, uma intenção,
um interesse, uma vontade ou uma predisposição para agir. Na motivação
está também incluído o ambiente que estimula o organismo e que oferece
o objeto de satisfação. E, por fim, na motivação está incluído o objeto que
aparece como a possibilidade de satisfação da necessidade. (BOCK apud
LIMA, 2008, p. 3).
É por meio do encantamento das atividades e admiração pelas atitudes do
docente que o jovem pode ser atraído para que produza algo diferente e significativo, isto é, aprendizados que serão necessários para a sua vida como cidadão autônomo e participativo que deseja concretizar seu projeto de vida. O
educador social possui a grande responsabilidade de educar para transformar.
Segundo Gadotti (2000, p. 9):
Os educadores, numa visão emancipadora, não só transformam a informação
em conhecimento e em consciência crítica, mas também formam pessoas.
Diante dos falsos pregadores da palavra, dos marketeiros, eles são os
verdadeiros “amantes da sabedoria”, os filósofos de que nos falava Sócrates.
Eles fazem fluir o saber (não o dado, a informação e o puro conhecimento),
porque constroem sentido para a vida das pessoas e para a humanidade e
buscam, juntos, um mundo mais justo, mais produtivo e mais saudável para
todos. Por isso, eles são imprescindíveis.
Neste sentido, fica evidente que a prática do educador social possibilita, com
uma ação diferenciada, a promoção da juventude, isto é, juventudes. Dayrell
(2005, s/p) ressalta que “Não existe uma juventude, mas sim juventudes, no
plural, enfatizando, assim, a diversidade de modos de ser jovem na nossa so-
79
ciedade”. Então, uma prática focada na pedagogia da presença e no desenvolvimento não só das potencialidades do jovem, mas da sua emancipação
como cidadão reflexivo e autônomo, oportunizará a construção de um projeto
de vida que, verdadeiramente, terá significado para sua caminhada enquanto
pessoa que pensa no bem comum.
2 A PROMOÇÃO DO PROTAGONISMO JUVENIL A PARTIR DA
CONSTRUÇÃO DO PROJETO DE VIDA
O educador social é um ator imprescindível para a promoção dos jovens com
os quais atua. Neste sentido, Dayrell diz que:
Desta forma, a ação socioeducativa precisa considerar e validar todas as
potencialidades do educando, a fim de construir uma parceria (educador x
educando), para que haja mediação e complementação do conhecimento e
a elaboração de um projeto de vida coerente e significativo. Infelizmente, o
sistema escolar, na sua atual estrutura, mostra-se cada vez mais frágil no que
diz respeito a atingir o jovem na sua totalidade, isto é, desenvolver suas potencialidades e promover sua emancipação como cidadão consciente. Santos
e Nogueira dizem que:
[...] encontramos desafios para educar na atualidade, pois educar nos exige:
rigorosidade metódica; pesquisa; respeito ao educando; corporificação das
palavras pelo exemplo; aceitação do novo; rejeição de qualquer forma de
discriminação; reflexão crítica sobre a prática; bom senso; humildade; alegria;
tolerância e, essencialmente, convicção de que a mudança é possível. (2010,
p. 1).
Verifica-se que cada vez mais os aspectos quantitativos são levados em consideração, ou seja, privilegia-se o quantitativo ao invés do qualitativo. O discente demonstra a todo momento necessitar de um olhar socioeducativo que
a instituição escola não possui para propiciá-lo. Sendo assim, percebe-se o
quanto se torna essencial uma intervenção socioeducacional para agir nessa
PARTE II
Um primeiro aspecto é reconhecer e lidar com o jovem como sujeito. Implica
percebê-lo como realmente é, além de sua condição de aluno. É um indivíduo
que ama, sofre, se diverte, pensa a respeito de suas experiências, interpreta
o mundo, tem desejos e projetos de vida. (2005, p. 3).
Educadores Sociais Maristas
80
lacuna deixada pela maioria das escolas públicas. O educador social, com uma
prática diferenciada, atua justamente com o foco nas dimensões do ser humano para a elaboração de um projeto de vida pessoal que, geralmente, não são
trabalhadas nos estabelecimentos de ensino formal. SILVA (2009, 32-33) fala
sobre as cinco dimensões do ser humano:
1. Psicoafetiva: a relação do jovem consigo mesmo. É o momento de
descobertas, autoaceitação e administração de conflitos. É o processo da
personalização.
2. Psicossocial: a relação do jovem com o outro (nos diversos grupos),
discussão de ideias, convivência e valorização do diferente. É o processo
de integração.
3. Mística: a relação do jovem com Deus. A vivência da espiritualidade.
A busca do sentido da vida e do lugar que Deus ocupa. É o processo
teológico espiritual.
4. Sociopolítica: a relação do jovem com a sociedade. A descoberta do
mundo e do ser cidadão atuante. A responsabilidade de tornar a sociedade
mais humana. É o processo de participação-conscientização.
5. Capacitação: a relação do jovem com a ação. A capacidade de planejar,
executar e avaliar para construção de um projeto pessoal de vida. É o
processo metodológico.
O autor, ainda, ressalta que:
O projeto de vida é o nosso segundo nascimento: uma decisão de vida
tomada na liberdade, a partir do que somos e daquilo que queremos ser. Ele
é formado de compromissos que nós mesmos determinamos e assumimos,
dentro da nossa consciência, visão, sensibilidade, oportunidades, liberdade.
(SILVA, 2009, p. 24).
A partir da mediação do educador social é possibilitado o protagonismo juvenil, haja vista que a sua ação focada na metodologia do projeto de vida
contempla essa potencialidade. Será oportunizado ao educando o desenvolvimento da sua totalidade e a construção de um projeto que possa ser via de
transformação de sua realidade. O educador social, por sua vez, passa a fazer
um movimento de ação-reflexão-ação para atingir um número cada vez maior
81
de educandos. O conhecimento e a aprendizagem tornam-se via de mão dupla, já que o educador media e o educando traz suas experiências, enriquecendo, assim, a ação educativa que se realiza.
O educador é aquele que, por dever, é mais experiente. Exerce a mediação
entre o educando, os conhecimentos historicamente construídos e a cultura
para ampliação da sua visão de mundo e a formação de valores humanos.
(...) Essa relação é determinante no processo socioeducativo, pois qualquer
um dos sujeitos poderá sair de uma condição de aprendiz à medida que
for se apropriando de conhecimentos que permitam a releitura da realidade,
superando o senso comum e avançando na direção da autonomia (UMBRASIL,
2010, p. 30).
Portanto, evidencia-se que a construção do projeto de vida como base para
o protagonismo juvenil vai ao encontro com a proposta Marista de educação.
A proposta Marista de educação foi gestada pelas reflexões e práticas de São
Marcelino Champagnat e seus primeiros companheiros, pois Champagnat propõe uma educação integral – educar o sujeito na sua totalidade. A proposta
visa promover o desenvolvimento integral da pessoa humana, trabalhando todas as suas dimensões, e educá-la a partir da humanização e transmissão de
valores. Esse processo educativo possui três eixos: a educação da consciência,
da inteligência e da vontade que, por sua vez, estabelecem uma relação direta
com os quatro pilares da educação, descritos pelo documento da UNESCO
(Organização para a Educação, a Ciência e a Cultura das Nações Unidas) e pelas Diretrizes Curriculares Nacionais. Segundo Alves:
Falar de Marista é falar de uma novidade que o Espírito Santo faz surgir
no seio da Igreja e da humanidade. Esse novo modo de ser, viver e agir é
dado em vista de um serviço, de um projeto (proposta) a ser respondido
por aqueles que aderem a esse projeto, engajando nele a sua própria vida.
(ALVES, 1999, p. 3).
A Pedagogia Marista é a pedagogia da presença, isto é, da proximidade. Essa
ação educativa visa preocupar-se com cada um e demonstrar tal interesse. É
PARTE II
3 A PEDAGOGIA DA PRESENÇA COMO ESTRATÉGIA DE
AÇÃO EDUCATIVA DO EDUCADOR SOCIAL
Educadores Sociais Maristas
82
conhecer cada um na sua individualidade (vida, qualidades, habilidades, potenciais, limitações e dificuldades). É poder auxiliar também nas suas ações
existenciais, vocacionais e profissionais. Para atingir estes objetivos, o educador social lança mão de sua afetividade com o grupo, que é algo constante
na pedagogia da presença. Ele constrói o conhecimento junto com o discente
através do afeto, da ternura e do amor. O educando, por sua vez, sente-se
amado, experimenta o sentido de uma educação realmente voltada para o seu
crescimento como pessoa humana, percebendo quão grande é o seu significado. A disciplina, neste contexto, assume um profundo equilíbrio entre firmeza e
doçura, formando a vontade da pessoa sem sufocá-la, portanto, uma disciplina
preventiva. Afinal, é ganhando a confiança dos jovens e escutando-os que o
educador pode influenciar positivamente em suas vidas, além de conhecer sua
realidade, sua caminhada, acolhendo cada um com o seu próprio jeito de ser.
Desta forma, o educando estará aberto a participar das atividades propostas
pelo educador, posto que haverá um sentimento de pertença construído ao
logo dos encontros na relação educador-educando. É necessário ressaltar que
o educador social, além de se fazer presente, ser mediador e buscar compreender o jovem na sua complexidade, é essencial para fazer o jovem acreditar
em sua própria capacidade e fazer do espaço de aprendizagem um local de
produção de ações, saberes e relações para que a construção do projeto de
vida – a partir do trabalho das dimensões do ser humano – seja o mais agradável possível. É por isso que é tão importante que este profissional paute sua
prática educativa com base na pedagogia da presença.
O educador social deve apoiar a pessoa individualmente para alcançar
e satisfazer seus objetivos, bem como o exercício da cidadania. Aqui nos
referimos à pessoa (crianças, adolescentes e suas famílias). Isto implica, por
exemplo: apoiar as pessoas em seu desenvolvimento para que elas mesmas
possam desenvolver e solucionar os seus problemas individuais ou grupais;
potencializar as habilidades de cada um, permitindo com que o mesmo
decida por si mesmo. (SANTOS; NOGUEIRA, 2010, p. 2).
A proximidade com o educando tornará a relação mais promissora a alcançar
suas metas no processo educativo e fará com que o mesmo realmente veja
significado ao construir seu projeto de vida.
83
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente texto buscou discutir algumas questões relevantes acerca da prática educativa do educador social. É fundamental ressaltar que a escrita foi
elaborada a partir de um estudo bibliográfico. Procurou-se demonstrar como
se faz essencial que este profissional atue de maneira diferente, encantadora
e reflexiva para atingir o seu público-alvo, que são as juventudes. Para que sua
prática seja coerente e promova o educando na sua totalidade, é importante
utilizar como estratégias a pedagogia da presença e a construção do projeto
de vida, para que o mesmo tenha a possibilidade de ser um protagonista de
sua própria história.
PARTE II
Conclui-se que o educador social e o educando são partes de um processo que
pode transformar a realidade, construir conhecimentos e tornar sonhos possíveis, principalmente quando há uma parceria de ambas as partes. É preciso que
o projeto de vida não seja só uma produção, mas algo imbuído de significados
e possível de ser realizado, pois só assim esses atores estarão cumprindo sua
missão. De fato, a proposta Marista auxilia e muito a ação do educador social,
basta que o mesmo esteja disposto a atuar de maneira que o educando deseje,
realmente, construir um projeto de vida promissor que transforme sua realidade e que o torne um cidadão de bem, autônomo e participativo.
84
Educadores Sociais Maristas
5 REFERÊNCIAS
ALVES, Manoel. Missão Educativa Marista: Texto elaborado pelo Irmão Manoel
Alves para uma conferência no Congresso Marista de Educação, ocorrido na
Cidade do México, em 15 de março de 1999, por ocasião do centenário de chegada dos Irmãos Maristas àquele país.
DAYRELL, J. Por uma pedagogia da juventude. Disponível em: http://www.
revistaondajovem.com.br/materiadet.asp?idtexto=89. acesso em: 03/01/2013
GADOTTI, M. Perspectivas atuais da educação. Porto Alegre: Ed. Artes Médicas, 2000.
LIMA, Sandra Vaz de. A importância da motivação no processo de aprendizagem.
Disponível em
http://www.artigonal.com/educacao-artigos/a-importancia-da-motivacao-no-processo-de-aprendizagem-341600.htmlacesso em:
05/01/2013.
SANTOS, André Michel dos; NOGUEIRA, Vanessa dos Santos. Perfil do Educador Social: experiências e reflexões. Disponível em: www.partes.com.br/educacao/perfileducadorsocial.asp . Acesso em: 03/01/13.
SILVA, Eduardo Pinheiro da. Projeto pessoal de vida. 2ª ed. Brasília: Ed. Cisbrasil-CIB, 2009.
UMBRASIL. Projeto Educativo do Brasil Marista: nosso jeito de conceber a
Educação Básica/União Marista do Brasil. Brasília: UMBRASIL, 2010.
85
O PAPEL DA AFETIVIDADE
NA CONSTRUÇÃO DO
CONHECIMENTO
Patrícia da Costa Santos Rosado42
RESUMO
O artigo abaixo tem como principal objetivo destacar a importância da afetividade nas relações escolares e sociais, evidenciando a relevância da relação
entre educando e educador e o impacto desta na construção cognitiva. Objetivamos, ainda, elencar reflexões que evidenciem a importância da família neste
processo e como isto ocorre.
1 INTRODUÇÃO
Atualmente, fala-se muito da dificuldade enfrentada pelos agentes envolvidos
no meio escolar para conseguir desenvolver um processo de construção de
conhecimento, e da dificuldade que os educadores, especialmente, têm tido
para qualificar sua atuação, a fim de resolver tal impasse.
Hoje, o que realmente ocorre em âmbito escolar não passa de uma relação
“comercial”, onde o papel do educador é de repasse de conhecimento, e o do
42
Graduada em História – Licenciatura Plena, pela Faculdade Porto-Alegrense – FAPA/RS. Atualmente, atua como educadora social do Centro
Social Marista de Porto Alegre – CESMAR/RS. E-mail: [email protected].
PARTE II
Palavras-chave: Afetividade. Desenvolvimento Infantil. Construção de Conhecimento.
Educadores Sociais Maristas
86
educando, que deve processar esta informação, é de produção de seu próprio
conhecimento. Infelizmente, pouco se tem falado da relação entre estes agentes e como uma eventual aproximação afetiva pode qualificar o desenvolvimento cognitivo.
Desta forma, é fundamental que se faça uma reflexão acerca do papel dos
demais elementos sociais, como a influência da família, durante o período de
desenvolvimento deste conhecimento.
Acredito ser importante ressaltar que a influência dos aspectos emocionais
está presente em todo o processo, e a interação entre educando, educador, família e sociedade necessários é necessária para evitar problemas que possam
prejudicar a construção.
Segundo Taglietti (2004), o professor tem a missão de conduzir e orientar os
educandos. Mas, para isso, é preciso, antes de tudo, cativá-los, mesmo que
nem sempre encontre um público interessado. Fica mais fácil aprender quando
o aluno tem carinho pelo professor que soube conquistá-lo. (...) Por isso, o tom
de sua voz, a maneira como se apresenta em aula, o charme, o humor, o otimismo, o jeito de ser do mestre poderão incentivar ou desmotivar os estudantes.
Fica evidente que o processo de conquista e envolvimento entre educando e
educador deve ultrapassar, na maioria das vezes, o papel de prestador de serviço. É com este convívio que o ser social constrói ligações afetivas e sentimentos que facilitam sua interação e possibilitam acessar novos conhecimentos.
Desta forma, é preponderante que haja um sentimento de confiança e respeito
mútuos entre aqueles que estão envolvidos no movimento de aprendizagem
para que o mesmo ocorra com mais facilidade.
2 DESENVOLVIMENTO
Durante a infância, uma grande parte da construção cognitiva se dá com o
apoio familiar. Porém, o papel da instituição de ensino e, mais especificamente,
do educador, é fundamental. É com este profissional que, muitas vezes, o educando divide a maior parte de sua infância e as maiores experiências em seu
novo contato com o mundo do conhecimento.
87
De acordo com Balestra (2007), o educador é o sujeito indispensável para
estabelecer a interação entre o educando e o conhecimento, e para que esta
interação ocorra, os laços de confiança e afetividade entre o agente que ensina
e aquele que aprende devem estar bem consolidados, pois “a afetividade deve
ser vista como a força motriz que impele o sujeito para o conhecimento.”
(PIAGET apud BALESTRA, 2007, p. 42).
Um exemplo interessante disto é o resultado da produção de um projeto
desenvolvido no Centro Social Marista de Porto Alegre (CESMAR), no Rio Grande
do Sul, localizado em uma região com um dos menores índices de desenvolvimento humano do estado. O projeto teve como objetivo fundamental desenvolver
uma autobiografia de cada um dos educandos de 10 turmas distintas. Os educandos tinham idades entre 10 e 14 anos, durante o período de maio a dezembro de
2011, e nunca haviam desenvolvido nenhuma produção sobre suas vidas.
Buscamos, neste projeto, criar um espaço de reflexão sobre as características
de linguagem escrita, e promover situações de leitura e exposição das criações
feitas para o grande grupo.
Desta forma, usando uma metodologia de conscientização e de aproximação,
buscando de forma empática a desmistificação dos conceitos da condição social, que tornava vexatório para muitos deles a transparência de diversas informações, foi possível produzir mais de 200 trabalhos, que foram expostos no
maior evento da instituição, o CESMAR Cultural, em 2011.
Durante este evento, foi possível visualizar, de forma clara, imagens e informações do cotidiano destes educandos, através de fotos e relatos produzidos
neste período, e, ainda, perceber sentimentos projetados em ambições sociais,
como que tipo de profissão desejavam seguir.
Este projeto somente pôde ter este nível de sucesso devido a um dos pilares
do desenvolvimento dos trabalhos que estava baseado na aproximação e na
PARTE II
Porém, o principal desafio que se revelou em pouco tempo foi a exposição de
suas condições sociais e familiares, visto que a condição humana destas crianças, em sua maioria, era de miséria.
Educadores Sociais Maristas
88
criação de laços afetivos entre os educandos e os educadores, ultrapassando,
muitas vezes, o meio escolar, trazendo uma grande quantidade de familiares
destes educandos para apreciar os trabalhos e poder levar para sua casa a autobiografia de seus filhos.
É importante ter ciência que, independentemente da idade, o educando que
chega até a escola já possui alguma construção de conhecimento adquirida no
dia a dia, e é papel do educador perceber em que momento isso se encontra.
Respeitar o momento do indivíduo é fundamental para a geração de laços
afetivos, além de identificar o tempo que cada sujeito tem para a construção
do seu conhecimento. Segundo Ferreiro (1981, p. 17), “saber algo a respeito de
certo objeto não quer dizer, necessariamente, saber algo socialmente aceito
como ’conhecimento‘. Saber quer dizer ter construído alguma concepção que
explica certo conjunto de fenômenos ou de objetos da realidade”.
De acordo com Piaget (2001, p. 22), “a afetividade e a inteligência são, portanto, indissociáveis, e constituem os dois aspectos complementares de toda
conduta humana.”. Desta forma, o respeito ao momento do educando se torna
aspecto fundamental no processo de aprendizagem e na formação da conduta
do ser humano.
Piaget (2001), ainda, referencia que em todas as fases da vida humana, os vínculos afetivos são cruciais para uma integração adequada do aluno com seu mundo
social, sem que existam lacunas para possíveis distúrbios de aprendizagem.
Assim, fica evidente que o processo de aprendizagem está intrinsicamente ligado à afetividade, e que a criação ou adaptação do meio escolar para que a
construção cognitiva seja prazerosa, é fundamental. O educador e o educando
são responsáveis por isso, e a conjuração eficiente deste processo pode, sim,
transformar este momento em uma das principais etapas do desenvolvimento
da personalidade humana. De acordo com Balestra (2007, p. 36), “o objeto a
ser conhecido deve contemplar os interesses que caracterizam a fase de desenvolvimento mental em que se encontra a criança.”.
Contudo, não basta mais ser educador atualizado, com uma boa formação e titulação. As relações necessitam de mais contato humano, empá-
89
tico, pessoal. A conexão educando-educador tornou-se obrigatória, pois
o grau de afetividade que envolve a relação do (a) professor (a) com os seus
pares representa o fio condutor e o suporte para a aquisição do conhecimento
pelo sujeito. O aluno, especialmente o da educação infantil, precisa sentir-se
integralmente aceito para que alcance plenamente o desenvolvimento de
seus aspectos cognitivo, afetivo e social. (BALESTRA, 2007, p. 50).
Em outro prisma, como já se sabe, a família é o grande pilar que determina a
trajetória de todos os sujeitos sociais. É com ela que a criança dá seus primeiros passos na construção do conhecimento, no dia a dia com estes entes.
Antes de ingressar em um ambiente escolar, todo o conhecimento construído,
seja intelectual ou social, é construído de forma natural, sem regras pré-determinadas, com o contato humano guiado pela família e seus familiares.
Porém, na sociedade atual, percebemos que existe uma falta de responsabilidade por parte dos pais em relação a este momento na vida de seus filhos.
Assim, percebemos um aumento do número de crianças que chegam ao ambiente escolar sem este alicerce já formado e sem envolvimento de seus pais
no decorrer de sua vida escolar.
A vida afetiva deste indivíduo irá determinar de forma positiva ou negativa o
desenvolvimento e, consecutivamente, o desempenho na escola. A expectativa que a criança tem em relação a seus familiares, no que diz respeito à admiração e à motivação, quando não atendidas, podem desencadear sensações
pouco interessantes, e acabar gerando uma sensação de insatisfação no ato de
aprendizagem, comprometendo todo este processo.
É fundamental ressaltar a importância que a participação e o acompanhamento
do dia a dia no meio escolar por parte dos pais têm neste processo de desen-
PARTE II
É com sua família que a criança desenvolve seus primeiros vínculos afetivos e
é por meio dela que o indivíduo é inserido no mundo da informação. Ela é a
grande responsável pela educação das crianças e também da sua aprendizagem, e é por meio desta aprendizagem que o indivíduo começa a construir e
desenvolver conhecimento.
Educadores Sociais Maristas
90
volvimento. De acordo com Balestra (2001, p. 49), “o acompanhamento de
seu desempenho escolar, ou seja, do processo cognitivo, é importante, mas o
aspecto afetivo não pode ser negligenciado em nenhum momento do desenvolvimento infantil, principalmente na vida escolar.”.
Todos os eventos ocorridos dentro do convívio familiar podem refletir no processo de construção da aprendizagem em âmbito escolar. Se isso realmente
ocorrer, ou seja, se não há vínculo afetivo entre pais e filhos, a vida acadêmica
deste indivíduo pode se tornar um fracasso.
Desta forma, cabe às famílias propiciar um ambiente saudável, que ofereça e
estimule o desenvolvimento afetivo e cognitivo da criança. O ambiente familiar
é o local onde, de fato, a criança desenvolve suas capacidades emocionais e
intelectuais. E os aspectos emocionais, conforme Weiss (2008), estariam ligados ao desenvolvimento afetivo que tem extrema importância na construção
do conhecimento e na expressão deste através da produção escolar.
Ao contrário do ambiente escolar, onde o aprendizado se dá de maneira mais
objetiva, no contexto familiar a aprendizagem ocorre, sem dúvida, de forma
bem mais subjetiva, livre, significativa e espontânea.
Contudo, a afetividade familiar é fundamental, assim como é importante também que escola e família trilhem caminhos em uníssono, buscando interação
constante, pois, assim, o educando poderá ter um desenvolvimento cognitivo
mais adequado e um ajustamento cultural e emocional mais eficaz.
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Mais do que um fato relevante para o aprendizado, a afetividade é o fator primordial que molda os campos que a criança irá trilhar durante o processo de
cognição. Assim sendo, tanto família como educadores devem se conscientizar
deste papel para que este processo não se torne um fracasso.
Mais do que nunca, dentro do ambiente escolar, metodologias vanguardistas
de ensino, equipamentos modernos e titulação adequada não bastam para que
o educador tenha sucesso em sua jornada. Precisa-se ter consciência de que
91
há uma barreira a ser superada, onde a motivação, a empatia, o interesse e o
prazer passam a ter papel fundamental no cotidiano da sala de aula. E é ele
quem precisa despertar no educando o gosto pelo aprendizado e conduzi-lo
pela vida escolar de forma a desenvolver esta construção com excelência.
Porém, se as condições em âmbito familiar não forem favoráveis, esta relação
educador-educando pode ser prejudicada. A família representa a instituição
mais importante na vida de cada ser humano, e os familiares têm deveres que
precisam ser recuperados de tempos antigos. Sem este alicerce, dificilmente o
desenvolvimento cognitivo do educando terá sucesso.
Contudo, fica evidente que escola e família precisam trilhar o mesmo caminho, desenvolvendo um ambiente adequado e oportunizando aos educadores
e educandos momentos de prazer na construção cognitiva. Mais do que educador, este representa a família desta criança em âmbito escolar e precisa começar a agir desta forma. Do outro lado, a família precisa se envolver mais com
estas etapas, trazendo elementos prazerosos para o cotidiano. E tudo isso, sem
dúvida alguma, deve ser conduzido com afetividade, pois este elemento é o
elo eficiente em todo este processo.
4 REFERÊNCIAS
FERREIRO, Emília. Reflexões sobre alfabetização. 24ª edição atualizada. São
Paulo: Cortez Editora, 1981.
PIAGET, J. Seis estudos de psicologia. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001.
TAGLIETTI, Idília Miozzo. Caderno Marista de Educação. V. 3 – N. 3. Porto Alegre: CMC/ACOMK, 2004
WEISS, Maria Lúcia Lemme. Psicopedagogia Clínica – uma visão diagnóstica
dos problemas de aprendizagem escolar. 13 ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro:
Lamparina, 2008.
PARTE II
BALESTRA, Maria Marta Mazaro. A Psicopedagogia em Piaget: uma ponte
para a educação da liberdade. Curitiba: Ibpex, 2007.
92
Educadores Sociais Maristas
TEMÁTICA 4 DO CURSO
EDUCAÇÃO INTEGRAL E APOIO
SOCIOEDUCATIVO
(...) Reafirmamos que a educação integral e de qualidade é
um direito que sustenta e possibilita outros direitos humanos. (Caminhos de Solidariedade Marista, 2013, p. 193).
Quarto e último tema em destaque neste itinerário, Educação Integral e Apoio
Socioeducativo é apresentado por três educadores. O artigo Educação integral
e tempo integral, de Anna Karolina Soares, trata dos movimentos educativos
na perspectiva da formação integral do sujeito em tempo integral, destacando
fatores relevantes para o desenvolvimento de uma prática pedagógica significativa, como a relação espaçotempo e o papel do educador na elaboração
de uma proposta integradora. O artigo de Juliana S. Menecucci, Artes Visuais
no contexto da Educação Integral: contribuindo para o processo de desenvolvimento do ser humano, trata da compreensão do papel das Artes Visuais na
Educação Integral. Bibiane Baldassari das Neves destaca, em seu artigo Educação Integral: desafios para o Centro Social Marista Caçador, questões acerca
da educação integral enquanto direito, seus objetivos e resultados para a comunidade em Santa Catarina.
93
EDUCAÇÃO INTEGRAL COMO
TEMPO INTEGRAL
Anna Karolina Soares43
RESUMO
Nos anos 90, foi decretado o aumento progressivo da jornada escolar na direção do regime de tempo integral, através da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBN/1996. O objetivo deste estudo é reconhecer as iniciativas educacionais da proposta Marista e o que a educação em tempo integral
engloba em suas diferentes dimensões sobre elementos fundamentais para
a definição de Educação Integral. Considerando especificamente a proposta
escolar, surgem outras questões a serem analisadas, tais como o cotidiano dos
espaços educativos Maristas; a relação espaçotempo; a pluralidade de funções
que a ela se atribui; o papel do educador relacionando a teoria-prática.
1 INTRODUÇÃO
A educação integral é a formação e o desenvolvimento humano pleno da pessoa na sua integridade e inteireza (do corpo, da mente, do coração e do espírito). “Contemplar uma interligação entre as diferentes dimensões da pessoa
humana”. (PROJETO EDUCATIVO DO BRASIL MARISTA, 2010, p. 103).
Reafirmar esse humanismo integral carrega significados peculiares diante do
reducionismo da visão que o mercado impõe sobre o ser humano reduzido à
mercadoria eficaz porque competente, escolarizada, qualificada, titulada.
43 Graduada em Educação Física. Educadora do Centro Social Marista Ecológica, em Almirante Tamandaré/PR. E-mail: [email protected].
PARTE II
Palavras-chave: Educação. Educação Integral. Educação Marista.
Educadores Sociais Maristas
94
A educação integral Marista explicita-se, com clareza, que o central em toda
ação educativa formadora são os sujeitos: educadores, profissionais e educandos. Destaque especial merecem os educadores, aqueles profissionais
que têm por ofício ensinar, aprender e tornarem-se humanos. Mostra-se,
dentro da proposta de ensino integral, a fiel concepção de educação integral como direito, e destaca o ofício de educar, que é urgente recuperar na
identidade e cultura docente.
A educação Marista, empenhada na luta por justiça e por
estrutura de solidariedade, valoriza o indivíduo como sujeito de direitos e cria oportunidades para seu acesso a
espaçotempos sociais, culturais e educacionais. (PROJETO EDUCATIVO DO BRASIL MARISTA, 2010, p. 8).
2 A PROPOSTA DE EDUCAÇÃO INTEGRAL
Na perspectiva de compreensão do homem como ser multidimensional, a educação deve responder a uma multiplicidade de exigências do próprio indivíduo
e do contexto em que vive.
[...] A educação, como constituinte do processo de humanização, que se
expressa por meio de mediações, assume papel central na organização da
convivência do humano em suas relações e interações, matéria-prima da
constituição da vida pessoal e social. (GUARÁ, 2006, p. 16).
Assim, a educação integral deve ter objetivos que construam relações na direção do aperfeiçoamento humano, conectando as diversas dimensões do sujeito (cognitiva, afetiva, ética, social, lúdica, estética, física, biológica), sendo
necessário um grande movimento, também da instituição escolar, no sentido
da construção de um projeto político-pedagógico que contemple princípios e
ações compartilhados na direção de uma educação integral.
Dando um passo além de possíveis acalorados “prós e contras” da escola de
tempo integral, cabe construir um campo de debates que estabeleça, de modo
substantivo, elementos que nos ajudem a significar, compreender e construir
práticas de educação integral que eduquem integralmente, que coloquem
95
o desenvolvimento humano como horizonte (...), a necessidade de realização
das potencialidades de cada indivíduo para que possa evoluir plenamente com
a conjugação de suas capacidades, conectando as diversas dimensões do
sujeito (cognitiva, afetiva, ética, social, lúdica, estética, física, biológica).
(GUARÁ, 2006, p. 16).
É nesse cenário que os diversos atores ligados à educação buscam a articulação
entre a escola em tempo integral – jornada ampliada – com atividades de educação integral. Buscar trabalhar a educação integral de maneira mais ampla e
múltipla possível, sempre buscando atingir os mais amplos horizontes, porém,
sem perder a base do currículo. Um ensino que possibilita uma formação mais
completa para o educando enquanto ser humano e não apenas como estudante, trabalhando os aspectos didáticos com outros aspectos da vida. Seguindo
esse princípio, as crianças devem ser incentivadas a desenvolver diferentes formas de expressão, como a artística, física, intelectual, digital e social. “É importante não ficar preocupado só com os conteúdos. As crianças e adolescentes
precisam ser formados em atitudes e valores que caminhem para a tolerância
e a participação na vida pública, uma preocupação com o coletivo”, explica
Silva (2011). Mas é necessário que essas atividades sejam integradas com os
conteúdos escolares tradicionais, pois não adianta a jornada ser ampliada se
o educando pensar separadamente – de manhã, aula regular, e, à tarde, atividades de educação integral – ou vice-versa, para evitar que o educando sinta
que está em “dois mundos” enquanto do seu período dentro da escola. Ele tem
que ter a certeza de que tudo aquilo que ele participa faz parte de um processo, onde tudo está integrado e interagindo, e, para isto, o educador tem papel
fundamental neste processo.
As formas de se trabalhar educação integral podem variar em função do contexto, das necessidades e das características da comunidade, da instituição
e dos próprios estudantes. Segundo Estela Bergamin (2011), “o planejamento
dessas ações tem de partir da cultura local e do repertório dos alunos”. A par-
PARTE II
De acordo com a coordenadora do Programa de Educação do Unicef Brasil,
Maria de Salete Silva (2011), “não basta aumentar o tempo, até porque, se você
aumentar o tempo de funcionamento de uma escola em que as condições são
muito precárias, você está aumentando o tempo de uma aprendizagem precária, e não resolve”.
Educadores Sociais Maristas
96
tir daí, é possível expandir as opções de atividade e fazer pontes com outras
referências culturais, pois se tem conhecimento do ambiente onde aquele educando está inserido. Para ampliar o diálogo com o contexto de vida de meninos e meninas, a educação integral não deve ficar restrita ao espaço escolar.
Muito pelo contrário, espaços fora da escola, como parques, praças e museus,
também podem ser aproveitados como ambientes de aprendizagem. Buscar
sempre agregar ambientes e atores, seja do poder público, privado ou da sociedade civil tem que ser uma opção presente e importante para o projeto de
educação integral ser eficaz.
3 O COTIDIANO DOS ESPAÇOS EDUCATIVOS MARISTAS
Os espaçotempos devem responder ao cotidiano de cada unidade Marista. No
caso do Centro Social Marista Ecológica, os espaços correspondem às aulas-oficinas, onde dispomos de salas de aula interativas e cada disciplina tem sua
própria sala. Isto proporciona uma maior participação e conforto por parte dos
educandos, que já estão no ambiente certo para a aula certa, conforme relata
um dos educandos: “Vamos para as salas de aula onde já têm todos os materiais
necessários para cada disciplina. Exemplo da sala de Artes, que já tem lápis, tintas, pincéis, telas, papéis, etc., e também o tempo que passamos em cada sala
com os professores e colegas é ótimo porque convivemos e nos conhecemos
mais”. Isto facilita o bom andamento e aproveitamento por parte dos educandos
nas aulas. Também existe o “Espaço Convivência”, onde todos os educadores e
educandos convivem juntos em um ambiente descontraído para se conhecerem
melhor, conversar, realizar atividades juntos, tirar dúvidas, sem aquele compromisso de ensinar, aprender conteúdos, e, sim, valores humanos.
4 A RELAÇÃO EDUCADOR E EDUCANDO
O educador deve buscar desenvolver com os educandos um senso crítico para
tudo o que lhes é passado como conhecimento, ou o que eles conseguem adquirir por meios próprios.
Educador social é aquele que valoriza as relações humanas e se compromete
com seus alunos a partilhar valores, promover debates consistentes para a
integração social, disseminar conhecimentos culturais e artísticos, e despertar
a conscientização dos Direitos Humanos. (BRANDÃO, 2012 p. 1).
97
Fato muito claro nos dias de hoje é a internet, que tem que ser entendida como
um meio e um instrumento de educação, e não uma finalidade da mesma. A
missão é ajudar os educandos a verem a informação do ponto de vista crítico,
mostrando que nem tudo o que encontramos na internet e em outras fontes
é bom, e que não precisamos aceitar tudo sem discussão. Segundo Brandão
(2012), a internet deve ser vista apenas como uma possibilidade de melhorar
nosso trabalho como educador; ela é apenas um instrumento e não uma finalidade da educação, fazendo com que se busque outras fontes de informação
para poder provocar no educando a busca pela procura e a capacidade de
absorver informação. O educando tem que se sentir capaz de fazer a conexão
com o que encontramos na internet como outro meio de conhecimento, e, para
isto, novamente o educador tem papel fundamental, tornando o educando independente, diretamente valorizando a relação educador-educando.
Essa gama de ensinamentos, norteadas pelo educador social, faz parte da
informação e encaminha o conhecimento para chegar ao saber, e isto mostra
a responsabilidade dos educadores sociais no que tange à formação cidadã
dos educandos.
Outro fator importante que um educador envolvido com a educação integral
precisa saber, é que ele estará indo contra informações absorvidas pelos educandos dos mais variados canais informativos. E isto deve levar a atenção para
que o educador entenda que estará tratando com indivíduos que podem ser o
mais extremo possível (do educando com uma vida normal até ao educando
com diversos tipos de problemas, que acarreta no comportamento e socialização com outros educandos do meio), entre um grupo e outro, até mesmo dentro da própria sala. O educador deve, acima de qualquer educando, entender
que a educação Marista vai ser o diferencial na vida de todos os envolvidos no
processo, que ela vai ser diferente do que muitos educandos conviviam antes
de entrar em uma instituição Marista de educação integral. Para mostrar isto,
vale a citação:
PARTE II
Ele (educador social) não apenas instrui tecnicamente, mas lida com o
despertar da consciência humana e a integridade do cidadão. Não podemos
nos contentar apenas com a compreensão de assuntos relacionados às
disciplinas escolares, mas que as pessoas sejam capazes de pensar com a
sua própria cabeça. (BRANDÃO, 2012, p. 1).
Educadores Sociais Maristas
98
Em vários lugares no mundo, inclusive no Brasil, a educação virou um
mercado para gerar lucro, vender curso, enriquecer. A educação Marista
procura conviver com essa realidade, mas num aspecto mais espiritual, mais
humano. (AKARRI, 2009, p. 25).
O educador deve ser, obrigatoriamente no ensino integral, alguém que vai muito além do papel de educar dentro de sala de aula. Este papel de educador
deve também ser integral, buscando, no convívio com os educandos, abordar
todos os temas que fazem parte da vida deste educando. Sem uma abordagem ampla e integral do educador, com certeza a proposta de educação
integral, por melhor que seja, não conseguirá atingir seus objetivos. A busca
do educador social deve ser, a cada dia, norteada no rumo de ser um fator
diferencial na vida do educando, dando entendimento a este que ele é capaz,
que ele pode ser um agente diferenciado dentro do ambiente escolar, familiar
e social. Para Brandão (2012), um médico que não apenas verifica exames, mas
que também dialoga com os seus pacientes sobre os malefícios do cigarro, do
álcool e de outras práticas que desencadeiam doenças graves é, por vocação,
um educador social, pois visualiza no próximo um ser humano e não apenas
mais um paciente.
5 CONCLUSÃO
Diferente de outras formas educacionais, na educação Marista o objeto de resultado tem que ser um educando completo, independente, formado e compreendido em uma multidisciplinaridade. Hoje, se encontra uma educação muito voltada para o fator econômico, procurando apenas formar educandos, não
se preocupando com o ser humano e deixando apenas o lado dos números
financeiros falar mais alto. A educação integral Marista pode (e deve) ser o diferencial durante a vida escolar do educando, portanto, ela vai buscar sempre
o melhor para o indivíduo nela inserido, pois terá papel central na formação do
educando, tanto na sua formação educacional quanto na sua formação familiar
e social.
99
6 REFERÊNCIAS
AKARRI, Abdeljalil. O papel do Educador na Sociedade do Conhecimento.
Entrevista concedida à Mariana Vicili, na Revista PUCRS INFORMAÇÃO, nº 141,
Set/Out. 2008.
BERGAMIN, Estela. http://www.mercadoetico.com.br/arquivo/educacao-integral-ou-tempo-integral-qual-a-diferenca / acesso em Out. 2011
BRANDÃO, Carlos. EDUCADOR SOCIAL. http://marista.edu.br/social/2012/05/04/
professor-carlos-brandao-discute-papel-do-educador-social-na-contemporaneidade/. Acessado em 04/02/2013.
GUARÁ, Isa Maria F. Rosa. É imprescindível educar integralmente. Caderno
CENPEC, nº. 2, 2006. p. 15-24.
LIBERATO, Edineide; COSTA Josenildo; PEREIRA Telma ; CABRAL Rozana.
Projeto Educativo do Brasil Marista http://marista.edu.br/nsconceicao/files/2011/10/PFC-Outubro-2011
PARTE II
SILVA, Maria Salete. http://www.mercadoetico.com.br/arquivo/educacao-integral-ou-tempo-integral-qual-a-diferenca / acesso em Out. 2011.
Educadores Sociais Maristas
100
ARTES VISUAIS NO CONTEXTO
DA EDUCAÇÃO INTEGRAL:
contribuindo para o processo de
desenvolvimento do ser human
Juliana Silva Menecucci44
RESUMO
Este presente artigo reflete a busca de compreender o papel das artes visuais
na educação integral. Para tanto, precisamos nos reportar à grande transformação que a educação tem passado nos últimos anos; operando com a linguagem escrita, a nossa cultura atual dominante vive impregnada por uma nova
linguagem, a da mídia, e, particularmente, a linguagem da internet. Esta transformação também diz respeito ao reconhecimento cultural que a sociedade
traz como bagagem. Entende-se, hoje, que os indivíduos aprendem efetivamente à medida que interagem com o mundo a sua volta.
Palavras chave: Educação Integral. Artes Visuais. Formação do Ser Humano.
1 INTRODUÇÃO
O ensino de artes é abordado como construção de conhecimento, do aprofundamento estético e da reflexão política. Pensando desta maneira, há um amplo
debate acerca do ensino de artes visuais no contexto da educação integral.
44 Graduada em Educação Artística pela UNG e pós-graduada em História da Arte pela PUC/SP. Educadora Social no Centro Social Marista
Irmão Justino, em São Paulo/SP. E-mail: [email protected].
101
Diversidade, pluralidade, sensibilidade e expressividade são aspectos fundamentais para mudanças cada vez mais radicais nas práticas educativas, e estes
fatores compõem a linguagem da Arte.
É necessário quebrar paradigmas em relação às ideias como as de que oficinas
de artes visuais são espaçotempos de lazer, de relaxamento, decoração em
datas comemorativas e reprodução de modelos estigmatizados.
Se pensarmos no momento atual de implantação de uma política nacional de
educação integral no Brasil, é essencial nos perguntarmos: que tipo de ensino
de artes queremos na realidade? Como educar usando a linguagem das artes
visuais? O que as artes visuais significam na educação integral?
Para compreender o objetivo destes questionamentos, é necessário retomar o
conceito de educação integral.
A partir destas mudanças na educação do Brasil, surgiram diferentes concepções explicativas para a educação integral. O estudo dessa concepção refere-se à educação integral como possibilidade de formação integral de indivíduos percebidos como multidimensionais (CAVALIERI, 2002; COELHO, 2007). A
análise de Guará (2007) cita: “a educação integral supõe o desenvolvimento
de todas as potencialidades humanas, com equilíbrio entre os aspectos cognitivos, afetivos, psicomotores e sociais.” (GUARÁ, 2007, p. 1).
Nesta perspectiva, a educação integral visa o desenvolvimento pleno do homem, considerando todas as suas capacidades, em suas múltiplas relações, di45
Anísio Teixeira foi um intelectual, educador, escritor, jurista e político, personagem central da história da educação integral.
46
Escola Nova foi um movimento de renovação do ensino brasileiro na década de 1920 e exerceu grande influência quando o Brasil passava
por uma série de transformações sociais, políticas e econômicas.
PARTE II
Desde as décadas de 1930 – 1960, a educação integral vem sendo cogitada
por vários educadores, políticos e intelectuais, entre eles destaca-se Anísio Teixeira45, o qual toda sua obra e filosofia de educação perpassam pelo
tema da formação integral do ser humano; ele é considerado o grande modernizador da educação brasileira e principal personagem do Movimento da
Escola Nova46.
102
Educadores Sociais Maristas
mensões e saberes, reconhecendo-o como sujeito singular em sua constituição
plena de integralidade.
Em consonância a esta concepção de educação integral, há o contexto da Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), n° 9.394/96, que determina que “inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade
humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.
Envolvendo a arte visual na necessidade da implantação da educação integral
e de tempo integral, podemos analisar que, através do processo de aprendizagem em artes, desenvolvemos aspectos relevantes para a construção integral
do ser humano.
A cognição, recepção, apreensão e processamentos de informações, percepção sensorial, memória e pensamento são alguns dos inúmeros aspectos importantes para agregar ao desenvolvimento do educando.
Segundo Barbosa (2005), através da potência da arte podemos desenvolver
formas de pensar, diferenciar, comparar, generalizar, interpretar, conceber possibilidades, construir, formular hipóteses e ressignificar sentido.
Sendo assim, as artes, de um modo geral, favorecem o desenvolvimento integral do indivíduo, possibilitando a expressão livre do pensamento e das emoções, desenvolvendo seu raciocínio com criatividade e imaginação, e objetivando uma preparação dos educandos para uma vida plena de cidadania.
Trabalhando o educando em sua totalidade, corpo, mente e espírito, estaremos
proporcionando a ele uma releitura da razão sob uma nova ótica e um encontro com sua identidade pessoal no mundo em que vive correlacionando com
o outro.
A linguagem, como possibilidade de dizer o mundo, de expressão, é o
que há de mais humano nos sujeitos. É modo de representação simbólica,
culturalmente localizada, produzida pelos sujeitos em interação. Não
podemos falar de linguagem, mas sim linguagens, pois são produtos de
interações sociais que possibilitam a criação e recriação de culturas por meio
103
das múltiplas maneiras como falamos de nós e do outro, entre nós e com o
outro, para nós e para o outro. (PROJETO EDUCATIVO DO BRASIL MARISTA,
2010, p. 121).
Os processos de ensino de arte devem ser comprometidos com o campo de
conhecimento específico da área para que não sejam compreendidos como
atividades de recreação e de lazer.
Pensando que para a efetivação dos pressupostos de um ensino de arte comprometido com o empoderamento do sujeito, é necessário que seja superada
a ideia das oficinas de artes como simples relaxamento ou de ocupação do
tempo, como eram vistas em um passado bem próximo.
As propostas para as oficinas de artes visuais têm que ter a intencionalidade
de ampliar a oportunidade de fruição em arte e da expressão das crianças
e adolescentes com vistas a possibilitar experiências significativas em artes
visuais, levando o educando a ser um produtor de cultura no contexto da
educação integral. Ou seja, propiciar uma formação que contemple arte/educação, estética, expressão e construção do conhecimento, a partir dos novos
parâmetros colocados em relação aos novos tempos, espaços, conteúdos e
sujeitos envolvidos.
Trazendo estes estudos para a prática, o Centro Social Marista Ir. Justino47 vem desenvolvendo o projeto “Entre Trilhas e Trilhos Conhecendo os Caminhos da Vila”,
o qual tem, como objetivo geral, garantir às crianças e adolescentes o direito de
acesso à história do bairro de União de Vila Nova, como também ao patrimônio
material e imaterial do distrito de São Miguel Paulista e da cidade de São Paulo,
disseminando a cultura popular, a criticidade e o sentimento de pertença.
Nesta perspectiva, a Oficina de Artes Visuais, juntamente com a equipe de
Pastoral e o trabalho social desta unidade, contempla o objetivo proposto em
47
Centro Social Marista Ir. Justino, União de Vila Nova, São Miguel Paulista/SP, atendendo 200 crianças e adolescentes, de 6 a 14 anos e 11
meses.
PARTE II
2 ENTRE TRILHAS E TRILHOS CONHECENDO OS CAMINHOS
DA VILA
Educadores Sociais Maristas
104
uma ação de estudo de meio48 feito com os educandos, posteriormente com
os familiares e os colaboradores do Centro Social. Fizemos uma visita à Igreja
de São Miguel Arcanjo, considerada a capela mais antiga do estado de São
Paulo e situada no bairro de São Miguel Paulista.
O agente de Pastoral preparou um material contendo informações sobre a história do que íamos visitar e foi exposto aos grupos antes de irmos à igreja. Esta
ação trouxe aos educandos o estímulo, a apreciação da arte tanto do ponto
de vista arquitetônico do prédio, quanto dos objetos49 que lá estão, que foram
trazidos da Europa no século XVI. E, com as informações prévias obtidas, os
educandos puderam interagir com o monitor que nos guiou na visita.
A riqueza das influências culturais existentes neste patrimônio também são observadas e reconhecidas como conhecimento da origem da história do bairro, as
técnicas que outras culturas e povos têm de construção, o movimento artístico da
época e a herança deixada pelos índios; até mesmo a linha do tempo que trouxe
esclarecimentos sobre a colonização deste distrito por imigrantes nordestinos, os
quais, hoje em dia, são a maioria dos habitantes deste território.
Foto nº 1
50
Foto nº 2 51
48 Estudo de meio: método de aprendizagem que procede a observação de fatos e ou fenômenos reais, analisando-os e objetivando o compreender, conhecer o problema pesquisado.
49 Objetos mencionados são várias imagens de santos, algumas ferramentas e aparatos para celebração de missas.
50 Foto feita pelo educando do SASE Ir. Justino, Everton, 13 anos – grupo de educandos chegando à capela.
51
Foto feita pelo monitor da capela – grupo de educandos no cruzeiro da capela.
105
Outro aspecto da aprendizagem, talvez o mais importante, são as observações
que permeiam estas visitas a curiosidade de conhecer o mundo, o maior contato com os outros educandos e com o educador, até mesmo com o próprio
território, surpresas52 que encontramos e que, no dia a dia, não percebemos.
Foto nº 3 53
Foto nº 4
54
Foto nº 5 55
PARTE II
52 Como exemplo, os educandos se surpreenderam com uma planta que brota a “bucha vegetal”, a qual é usada para o banho – árvore do
Jacarandá. Dois ninhos de João de Barro. A Catedral de São Miguel que muitos não conheciam. A lasca de osso do joelho do Padre José
de Anchieta que está no altar da catedral. Um minúsculo pedaço de madeira da Cruz de Jesus Cristo e os jazidos dos bispos que estão
enterrados na catedral.
53 Foto feita pela educadora de Artes, Juliana – árvore centenária com as raízes expostas semelhantes a cipós.
54 Foto feita pela educanda do SASE Ir. Justino, Thainá, 9 anos – conhecendo as flores de Hortência.
55 Foto feita pelo pastoralista do SASE Ir. Justino, Diego – Hortência.
Educadores Sociais Maristas
106
A pedagogia da presença e da escuta é realçada por surpresas e falas que eles
vivenciam durante o trajeto e, até mesmo, o exercer de valores, os quais tanto
almejaram no ser humano. A solidariedade em carregar a bolsa do amigo, a
preocupação com o outro, se trouxe ou não o lanche, a divisão do lanche, a responsabilidade que eles têm sobre o outro ao atravessar a rua, o companheirismo para o amigo não se perder, enfim, uma vivência rica no desenvolvimento
do processo da educação integral dos nossos educandos.
O artigo “Sair para poder Entrar: os trabalhos de campo como ferramenta educacional”56 nos alerta no sentido de pensar em estudo de campo como uma
metodologia que nos leva sempre a uma descoberta, fazendo com que o educando se conheça e aprofunde seu conhecimento sobre a realidade circundante, demonstrando a importância na sua participação quanto à realidade e ao
conhecimento que adquiriu.
Quando voltamos para nossa rotina, após as visitas à capela, relembramos e
compartilhamos com cada grupo nossas opiniões e apreciações. Esta oportunidade de troca de informações fez com que nossos educandos tivessem a
possibilidade de refletir e, novamente, fazer o exercício de construir um aprendizado sob vários pontos de vista, observações, comparações, leituras, estética, únicas de cada qual. Registramos estes momentos em forma de desenhos,
murais, fotos e socializamos com a unidade.
Foto nº 6 57
Foto nº 7 58
56 Publicação feita por Leandro Gaffo na edição de Educação Marista (Ano XI n. 22 do 1º semestre)
57 Desenho em grafite feito pelo educando do SASE Ir. Justino, Roney, 14 anos – capela de São Miguel Paulista, 1622.
58 Desenho em grafite feito pelo educando do SASE Ir. Justino, Roney, 14 anos – desenhos indígenas feitos no interior da capela.
107
O fato é que, em todo este processo/ação, há a interdisciplinaridade, o
contexto histórico da capela e as demais descobertas; observações e indagações que surgiram no decorrer contemplaram várias áreas de conhecimentos, como Biologia, Ciências, Geografia, Matemática, Artes e História,
ampliando sua visão de mundo, aguçando a novos voos e ao aprendizado,
fomentando a disseminação da cultura popular, a criticidade e o sentimento de pertença, 59 garantindo, assim, a base integral do ser humano com
direitos assegurados no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) em
seus artigos:
Art. 4º. É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do
poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos
referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer,
à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à
convivência familiar e comunitária.
Art. 58. No processo educacional respeitar-se-ão os valores culturais,
artísticos e históricos próprios do contexto social da criança e do adolescente,
garantindo-se a estes a liberdade da criação e o acesso às fontes de cultura.
E, na Constituição Federal de 1988,
3 CONCLUSÃO
As questões abordadas neste artigo, antes de tudo, referem-se a uma visão da
educação para a contemporaneidade e à educação integral, onde é primordial a interação e integração com os envolvidos. Desta maneira, o processo da
aprendizagem perpassa pelas múltiplas linguagens, pela interdisciplinaridade,
e contextualiza ao educando o mundo em que ele vive.
Em todo este movimento nota-se o real objetivo do ensino de artes visuais que
queremos. Um ensino significativo e alicerçado para contribuir com o desenvolvimento do ser humano em sua totalidade. Não podemos mais explorar as
59 Disseminação da cultura popular, criticidade e sentimento de pertença são os objetivos do projeto “Entre Trilhos e Trilhas encontrando os
caminhos da Vila”, o qual as oficinas do SASE Ir. Justino estão inseridas e conduzindo as ações.
PARTE II
Art. 6º. São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho a moradia, o
lazer, a segurança, a previdência social, a proteção.
108
Educadores Sociais Maristas
oficinas de artes como um espaço que produz adornos para o ambiente e, sim,
que lá se produza culturas e se torne ambiente educativo.
Educar, por meio das artes visuais, trabalha com o aspecto mais precioso do
ser humano, a sensibilidade. Através dela, afiamos nosso olhar, a observação
e a percepção, nos expressamos com a liberdade da alma com o subjetivo de
cada um que traz outra visão para os demais. Refletimos e criamos, produzimos e nos movimentamos dentro de um desenvolvimento humano em todas
as suas dimensões.
É este o sentido das experiências das oficinas de Artes Visuais que precisa ser
ressaltado. Mesmo que sejam vivências estéticas fluidas e experimentais, que
sabemos não ser apenas isso, a oficina deve ser capaz de gerar conhecimento
e conteúdo.
109
4 REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição Federal, Brasília. 1988.
________ Estatuto da criança e do adolescente: Lei federal nº 8069, de 13 de
julho de 1990. Rio de Janeiro: Imprensa Oficial, 2002.
________LEI Nº 9394, DE 20 DE DEZEMBRO DE 1996. Estabelece as diretrizes
e bases da educação nacional. Brasília, 20 de dezembro de 1996; 175º da Independência e 108º da República
BARBOSA, Ana Mae. Arte Educação Como Mediação Cultural e Social. São
Paulo: UNESP, 2008.
CAVALIERE, Ana Maria Villela, Educação Integral: uma nova identidade para a
escola brasileira, Educ. Soc., Campinas, vol. 23, n. 81, p. 247-270, dez. 2002. Disponível em http://www.scielo.br/pdf/es/v23n81/13940.pdf. Acesso em Fev. 2015
GUARÁ, Isa Maria F. Rosa. Educação Integral ­Articulação de projetos e espaços e aprendizagem. Disponível em http:/www.cenpec.org.br/modules/xt_
conteudo/index.php?id=46. Acesso em Out. 2012
PROVÍNCIA MARISTA BRASIL CENTRO-SUL, Projeto Marista para o ensino
Fundamental (Currículo em Movimento vol. 3) São Paulo: FTD, 2010.
PARTE II
COELHO, Lígia MarthaC. da Costa. Tempo em uma instituição moderna: a escola. In :SCHWARTZ, Cleonara et ali. Desafios da educação básica – a pesquisa em
educação». Vitória: EDUFES, 2007.
Educadores Sociais Maristas
110
EDUCAÇÃO INTEGRAL:
desafios para o Centro Social
Marista Caçador
Bibiane Baldassari das Neves60
RESUMO
Este artigo abordará questões acerca da educação integral enquanto direito,
quais seus objetivos e os resultados que poderão trazer à comunidade. Quais as
habilidades inerentes aos educadores e algumas das dificuldades que surgirão
em sala de aula, a estrutura que está sendo preparada, bem como as diferentes
relações que serão estabelecidas com o território onde o espaço educativo está
inserido, e os desafios que o Centro Social Marista Caçador irá encontrar são
alguns dos apontamentos próprios à implantação da educação integral.
Palavras-chave: Educação Integral. Ensino Fundamental II. Educadores Sociais.
1 INTRODUÇÃO
Novos papéis foram sendo desenhados para a escola com o passar dos anos:
questões sociais, psicológicas e culturais, anteriormente eram demandas sanadas plenamente pelas famílias. Este novo quadro repleto de complexidades
não tem encontrado suporte em nossas escolas, de educação integral ou não,
nem entre os docentes, mesmo com a oferta de formação continuada.
60 Graduada em Pedagogia, pós-graduada em Educação Especial e Inclusiva. Foi Coordenadora Pedagógica do Centro Social Marista Caçador em Caçador/SC. E-mail: [email protected]
111
A educação integral, direito de todos, pode ser traduzida como a formação mais
completa possível do sujeito, porém não há como definir como seria esta educação nem de que forma se daria, pois cada tempo histórico, cada realidade
social e cultural exige uma forma diferente de ensino e aprendizagem, e também
possui diferentes objetivos. A preparação do ambiente e do corpo docente, os
estudos acerca do tema, bem como os alinhamentos pertinentes à ampliação
da jornada escolar são maneiras de prevenir a fragmentação e tentar superá-la,
desenhando uma educação em que o educando tenha plena consciência dos
espaços que ocupa, dos seus significados e valorize suas raízes, tornando-se
sujeito que exercite plenamente sua cidadania, protagonizando sua história.
No ano de 2013, o Centro Social Marista Caçador enfrentou inúmeros desafios
com a implantação do Ensino Fundamental II – 6º ao 8º ano – nos moldes de
educação integral. O público atendido, bem como o território em que vive,
apresentam limitações e potencialidades que precisam ser problematizadas e
trabalhadas, visando mudança significativa na participação da comunidade, na
busca e no fortalecimento de sua identidade.
A educação, enquanto direito de todos, não pode ser parcial nem pela metade;
a educação tem por base e fundamentos o dever de ser por inteiro: educação
integral, aquela onde o sujeito aprende tudo sobre todas as coisas. Mas será
possível ensinar tudo a todos? A educação, direito fundamental da criança e
do adolescente, precisa ser íntegra, mas de que forma poderemos levar esta
educação a todas as crianças?
Hoje, no Brasil, a Constituição Federal, a Lei de Diretrizes e Bases (Lei 9.394/96)
e o Estatuto da Criança e do Adolescente oferecem base legal para a educação
integral: a Constituição Federal aponta a educação como um direito social e
diz que promover seu acesso é competência comum da União, Distrito Federal
e dos municípios, conforme Art. 205:
A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será
promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno
desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua
qualificação para o trabalho. (1988, s/p).
PARTE II
2 EDUCAÇÃO INTEGRAL: DIREITO DE TODOS
112
Educadores Sociais Maristas
O Estatuto da Criança e do Adolescente em seu Art. 53 diz que:
A criança e o adolescente têm direito à educação visando ao pleno
desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício de sua cidadania
e qualificação para o trabalho, assegurando ainda igualdade de condições
para o acesso e permanência na escola, direito de ser respeitado por seus
educadores. (1990, s/p).
A Lei de Diretrizes e Bases (1996, s/p), em seu Art. 34, nos traz o seguinte: “A
jornada escolar no ensino fundamental incluirá pelo menos quatro horas de
trabalho efetivo em sala de aula, sendo progressivamente ampliado o período
de permanência na escola”. Na prática, esses direitos garantidos em lei não estão conseguindo cumprir suas responsabilidades, pois sabemos que o acesso
e a permanência na escola têm encontrado entraves tanto da oferta quanto da
motivação das crianças e adolescentes, quão menos a garantia de educação
de qualidade está sendo cumprida.
O texto referência para o Debate Nacional sobre Educação Integral (2009, p.
13), diz que:
O direito à educação de qualidade é um elemento fundamental para a ampliação
e para a garantia dos demais direitos humanos e sociais, e condição para a
própria democracia, e a escola pública universal materializa este direito.
Garantir acesso à educação integral corresponde a garantir um futuro melhor,
onde as crianças e adolescentes terão formação adequada, discernimento em
suas escolhas, independência e autonomia. É importante ressaltar que a educação integral independe de ampliação de jornada, mas, sim, de uma ressignificação do espaço escolar, da articulação dos processos escolares com as
políticas sociais, profissionais preparados e abertos ao novo, e equipamentos
públicos, tudo objetivando garantir o sucesso escolar. Entretanto, a escola pública tem mostrado não possuir espaço físico e maturidade pedagógica para
atender a totalidade da demanda de ensino na modalidade educação integral.
Os novos papéis da escola foram sendo desenhados com o passar do tempo e
a escola pública incorporou um “conjunto de responsabilidades” que não eram
vistas como tipicamente escolares, mas que, se não estiverem garantidas,
podem inviabilizar o trabalho pedagógico. (TEXTO REFERÊNCIA, 2009, p.17).
113
Ainda segundo Cavaliere (2002, p. 250), “a ampliação das funções da escola,
de forma a melhor cumprir um papel sócio integrador, vem ocorrendo por
urgente imposição da realidade, e não por uma escolha político-educacional
deliberada”.
Mas como se dá na prática oferecer ensino de qualidade e garantir outros direitos, que foram transformados também em demandas escolares?
Garantir um espaço, proteção, alimentação, ensino, lazer, acesso à informação,
cultura e demais serviços que hoje a escola oferece, é oferecer educação integral?
Esta demanda educacional é debatida há anos e continua atual, complexa e
sem receitas, um desafio contemporâneo aos espaços educacionais que se
preocupam com a oferta de apoio socioeducativo, educação com valores, com
presença significativa, escuta e acolhida, um desafio para o Centro Social Marista Caçador que, a partir de 2013, com o reposicionamento, ofertou em seu
espaço o Ensino Fundamental II – 6º ao 8º ano em período integral, “buscando
um processo formativo de subjetividades nos modos de ser sujeito em sua
integralidade e inteireza (corpo, mente, coração e espírito).” (PROJETO EDUCATIVO DO BRASIL MARISTA, 2010).
Quando falamos em educação integral, não podemos imaginar que todo este
processo aconteça dentro do espaço escolar. Hoje, sabemos que todos os espaços são educativos: a cidade, o bairro, a rua, a casa, o quintal, enfim, os espaços que a criança/adolescente ocupa, as relações que neles estabelece são extremamente importantes para seu desenvolvimento motor, cognitivo e social.
O Centro Social Marista Caçador conta com um espaço apropriado para receber
educandos em período integral. Possui, no piso superior, seis salas de aula, um laboratório de informática, equipado com 12 computadores, tela interativa, projetor
multimídia, auditório e banheiros. No térreo, conta com biblioteca interativa, refeitório, secretaria escolar, administrativo/pedagógico e banheiros. Possui, ainda,
uma quadra coberta com traves para futebol, tabelas de basquete, rede de voleibol, mesa de tênis e todo suporte material para jogos, horta e pequena estufa.
PARTE II
3 DENTRO E FORA DOS MUROS DA ESCOLA
Educadores Sociais Maristas
114
Olhar além dos muros da escola significa fortalecer os grupos locais e o sentimento de pertença, utilizar os espaços que a comunidade dispõe, potencializando seu
desenvolvimento. Em 2012, o Centro Social Marista Caçador explorou vários espaços do território, como ensaios do coral no Centro Comunitário; apresentações
diversas nas escolas do entorno; passeios nas áreas de lazer, como campinhos
de futebol; aulas práticas de educação ambiental que levaram os educandos a
conhecer os pontos vulneráveis de seu território; entre outros. Em 2013, a parceria
com os espaços do território foi retomada e ampliada, visando o desenvolvimento
integral dos educandos, bem como o fortalecimento de seus vínculos, reconhecendo a importância de suas raízes, de sua história, valorizando o bairro Martello.
4 DOCENTES E UMA PROPOSTA CURRICULAR EM DESENVOLVIMENTO
Os educadores sociais que atuaram junto ao Centro Social Marista Caçador, em
2012, permaneceram na Unidade em 2013, fortalecendo os vínculos estabelecidos no ano de 2012 e reduzindo o impacto causado com a mudança do atendimento, já que novos profissionais de educação ingressaram para desenvolver o
trabalho com as disciplinas curriculares. Os novos colaboradores contratados,
em parceria com a administração pública do município de Caçador, juntamente com os educadores sociais, tiveram Semana de Formação, oferecida antes
do início do ano letivo, objetivando a compreensão do serviço que será ofertado à comunidade do Bairro Martelo e seus objetivos.
É imprescindível que todos tenham entendimento de seus papéis nos espaços
educativos, da qualidade que deve haver em cada uma de suas práticas, desde
a acolhida até a última aula, destacando a relevância da oferta do atendimento
para a vida dos educandos.
É preciso se despir um pouco das visões que possuímos para poder olhar o
mundo através dos olhos das crianças e adolescentes, só assim poderemos
entender o apelo que nos é feito. Arroyo (2009) nos diz que:
Os alunos se mostram vulneráveis não apenas nas artes de aprender, mas nas
complexas artes de se afirmar como sujeitos éticos. Vulneráveis, parecem
pedir auxílio. Que ao menos nas escolas não sejam condenados, nem
culpados, mas acompanhados nos tensos percursos de sua formação.
115
Os educadores devem estar completamente despidos de pré-conceitos, de
fórmulas e de planos prontos; educandos, educadores e comunidade escolar
precisam fazer parte desta construção de educação, participando dela desde
o seu princípio. Desta forma, educandos participam dos processos de construção e elaboração dos projetos, tornando a escuta de fato qualificada e fazendo
do educador um mediador propulsor, problematizador de todas as ações; o
educando deve ser pensado em sua integralidade para podermos efetivar a
proposta de educação integral.
Na proposta socioeducativa da Rede Marista de Solidariedade (2010, p. 13) encontramos, na pedagogia da presença, um dos princípios da educação Marista:
A presença é, sem dúvida, uma das características mais fortes da educação
Marista. Champagnat, fundador do Instituto Marista, nos deixou o legado:
“para bem educar uma criança ou jovem é preciso, antes de tudo, amálo.” (...) A presença do educador na vida do educando, seja por meio do
diálogo ou do exemplo, contribui para a formação de pessoas mais éticas,
justas e solidárias.
Desde o ano de 2005, o Centro Social Marista Caçador atende, nesta cidade,
crianças e adolescentes de 7 a 17 anos, oferecendo apoio socioeducativo no
contra turno escolar. A partir de maio de 2011, o atendimento que era realizado próximo ao centro da cidade passou a ser oferecido no bairro Martello,
garantindo aos educandos acesso facilitado ao serviço, visto que dependiam
de transporte ofertado pelo município para deslocamento até o centro da cidade. As oficinas oferecidas eram: Dança, Musicalização, Artes Plásticas, Artes Cênicas, Comunicação Social, Informática Educativa, Jogos Cooperativos e
Educação Ambiental. Os educandos também contavam com uma brinquedoteca para empréstimo de brinquedos e jogos, educador de Pastoral realizando
acompanhamento espiritual e vocacional, assistente social acompanhando os
educandos, suas famílias e demais demandas sociais do território.
A partir de 2013, a Unidade passou a ofertar o Ensino Fundamental II – 6º ao
8º ano, modalidade de ensino: educação integral. Os desafios para a unidade
foram muitos, afinal, a comunidade do território ainda estava se apropriando
PARTE II
5 DESAFIOS PARA O CENTRO SOCIAL MARISTA CAÇADOR
Educadores Sociais Maristas
116
do equipamento ofertado, dos serviços e dos benefícios. Com a oferta do novo
serviço, apenas os educandos que frequentavam esta etapa de ensino poderiam ser matriculados, o que ocorre regularmente por volta dos 11 anos.
As crianças menores participaram de projetos que previam a redução do impacto do encerramento da oferta do atendimento do contra turno escolar. Entre os projetos em destaques, está a brinquedoteca, que funcionou anexo ao
Centro Social Marista, com empréstimo de brinquedos e espaço para jogos,
brincadeiras, contação de histórias e outras atividades lúdicas. As crianças participantes destes projetos não precisavam estar matriculadas no Centro Social,
permitindo, assim, o acesso de crianças que ainda não tinham nenhum contato
com a unidade. Também foi disponibilizada a biblioteca interativa com literaturas e material de pesquisa para empréstimo, além de computadores conectados à internet disponíveis para toda a comunidade.
Tanto as matrizes curriculares quanto a comunidade escolar como um todo,
devem estar preparadas e organizadas para assumir este desafio, conforme
Mota (2006, p. 1):
Um projeto como a Escola de Tempo Integral, que pretende redimensionar
e enriquecer a estrutura organizacional da escola com novos espaços e
oferecer maior tempo de permanência aos alunos, pressupõe matrizes
curriculares ampliadas e disposição da equipe escolar(...) no que se refere a
tempo e espaço escolar, só poderão transformar-se em ação histórica, isto
é, em história atuada e atuante, se forem assumidas por agentes realmente
envolvidos com a educação e dispostos a assumirem uma vontade de
mudança de atitude.
Os educandos que frequentaram as oficinas do Centro Social durante o ano
de 2012, apresentavam, em número expressivo, baixo rendimento escolar, advindo de dificuldades de escrita e leitura bastante acentuadas, especialmente nos educandos adolescentes. Com a proposta de educação integral, estes
educandos puderam ser acompanhados neste espaçotempo por profissionais
de diversas áreas (oficinas e ensino fundamental), que auxiliaram no desenvolvimento efetivo de suas habilidades através de projetos inter e transdisciplinares, ampliando, assim, capacidades motoras, cognitivas, matemáticas,
de leitura, escrita e interpretação, base para o bom desempenho em todas as
áreas. Além dos problemas de aprendizagem, muitos dos educandos possuíam
117
postura resistente, com enfrentamentos frente ao trabalho dos educadores.
Arroyo (2009, p. 147) cita o conceito encontrado na Paidéia que irá justificar,
por séculos, a pedagogia e o nosso trabalho enquanto docentes:
(...) o ser humano, desde a infância, é imperfeito, inconcluso, porém é
perfectível, educável. A descrença na perfectibilidade e educabilidade do ser
humano nunca teria dado origem nem à docência, nem à pedagogia. Todo
ser humano é educável.
Os desafios foram muitos. Garantir uma escuta qualificada implica em profissionais com olhos e ouvidos livres de preconceitos, prontos para mediar, tendo
sempre, como ponto de partida, a realidade do educando. A presença significativa nos impele a uma postura firme, dedicada, com olhar atento e carinhoso,
na mediação, na orientação e nosso exemplo, que é capaz de educar bem mais
que nossas palavras.
Segundo Arroyo (2009, p. 148),
Conforme já abordado, novos papéis se desenharam à escola ao longo dos
anos, porém se fez necessário fazer essa nova leitura para atender as demandas sociais. O respeito e a interação com os educandos devem ser inerentes às
práticas do cotidiano, mesmo quando não correspondidos, o exemplo do educador arrasta mais que suas palavras. Ainda segundo Arroyo (2009, p. 150),
não podemos ter uma visão naturalista dos comportamentos dos educandos:
São assim mesmo. Nasceram para ser como são, para se comportar como
se comportam. Como temos ainda a tendência a pensar que alguns alunos
nasceram com uma inteligência precoce, com ritmos acelerados para aprender
enquanto outros nasceram com ritmos lentos e capacidades minguadas,
assim pensamos no campo moral: alguns nasceram com inclinação inatas
para o bem, o esforço, o trabalho, a dedicação e generosidade; outros chegam
à maternidade com inclinações inatas para o mal, a preguiça, a violência, o
alcoolismo ou a droga.
PARTE II
a formação moral, ética, é inseparável da formação intelectual, científica,
estética, social, cultural de qualquer ser humano. Seria incompreensível
separar a formação de cada uma dessas dimensões do humano e delegar
às famílias e às igrejas a formação ética e às escolas a formação intelectual
e científica.
Educadores Sociais Maristas
118
Essa postura cômoda nos deixa incapazes de fazer a diferença, através dela
só nos resta classificá-los em do bem ou do mal, fazendo com que, desde
cedo, ao chegarem à escola, as crianças sejam catalogadas. Isto é, no mínimo,
assustador; tornar esta visão cômoda em vontade de transformar a realidade
também é desafio.
6 CONCLUSÃO
Pensar educação integral sempre instiga pesquisa e debate. Pensar educação
integral para adolescentes com baixo rendimento escolar e em situação de
vulnerabilidade social é tão desafiante quanto olhar para uma educação que
de tempo ampliado passou a ser definida como formadora de cidadãos autônomos e críticos.
O Centro Social Marista Caçador continuará pensando na manutenção e garantia de direitos. O principal direito a garantir com a mudança do atendimento foi
o de acesso e permanência na escola com educação de qualidade, conforme a
Proposta Socioeducativa: Referenciais Teórico Metodológicos, da Rede Marista
de Solidariedade (2010). A importância da educação integral na vida de nossos educandos vai além da permanência na escola; com necessidades básicas
atendidas, ela perpassa pela escuta, pela presença, pela formação com valores. Precisamos nos perguntar o que entendemos por ser humano, que tipo
de pessoas queremos formar, para que estamos preparando, assim, teremos
um norte para nossas ações que continuarão sendo pautadas na justiça e no
bem comum. Nossos educandos são adolescentes cheios de potencialidades e
também de possibilidades; cabe a nós, enquanto educadores, auxiliar na construção deste caminho.
Por vezes, identificamos pensadores que apresentam a educação como se
houvessem encontrado a verdade. No entanto, entendemos que nossa busca
deve ser constante, nada é definitivo, os seres humanos mudam, evoluem, suas
necessidades e anseios também; precisamos ter o olhar sempre atento às mudanças de tempo, de espaço e de pessoas, cada qual com suas peculiaridades.
E a nós, Maristas, além do conhecimento, da busca incessante pelo melhor aos
nossos educandos, cabe ainda muito mais: ousadia, fé, coragem, discernimento, amor. Juntos com Maria vamos depressa para uma nova terra.
119
7 REFERÊNCIAS
ARROYO, Miguel G. Imagens Quebradas. Trajetórias e tempos de alunos e
mestres. Ed. Vozes. 5ª ed. 405 p. Petrópolis/RJ, 2009
BRASIL. Educação Integral: texto referência para o debate nacional. Brasília:
MEC, 2009. 52 p.
_______. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, 1998.
_______ Estatuto da criança e do adolescente: Lei federal nº 8069, de 13 de
julho de 1990. Rio de Janeiro: Imprensa Oficial, 2002.
_______ LDB: Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei 9394, de
20 de Dezembro de 1996. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/
leis/L9394.htm. Acessado em 18 de Dezembro de 2012.
CAVALIERE, Ana Maria Villela. Educação Integral: Uma nova identidade para
a escola brasileira? CAMPINAS, 2002. Disponível em: HTTP://www.cedes.unicamp.br.
Projeto Educativo do Brasil Marista: nosso jeito de conceber a Educação Básica / União Marista do Brasil. Brasília, UMBRASIL, 2010. 132 p.
Proposta Socioeducativa: referenciais teórico-metodológicos / Rede Marista
de Solidariedade. São Paulo: FTD, 2010.
PARTE II
MOTA, Silvia Maria Coelho. Escola de tempo integral: da concepção à prática.
UERJ, 2006.
120
Educadores Sociais Maristas
O USO DE CADERNOS DE
REGISTROS COMO ESTRATÉGIA
PARA TRABALHAR A ESCRITA
E A LEITURA COM CRIANÇAS
E ADOLESCENTES: relato
de experiência da oficina de
Educomunicação.
Claudia Aparecida dos Santos Azevedo 61
RESUMO
O presente artigo tem por finalidade relatar as experiências vivenciadas pelos
educandos do Serviço de Apoio Socioeducativo – SASE, da oficina de Educomunicação, no ano de 2012. O objetivo é a socialização de uma prática que
está sendo significativa, dentre as várias que foram desenvolvidas, voltadas
para a questão dos registros e elaboração de estratégias para os projetos.
Palavras-chave: Serviço de Apoio Socioeducativo. Registros. Educomunicação.
61
Foi educanda no Centro Social Marista Ir. Lourenço, formada em Pedagogia pela PUC/SP, com habilitação em OE\SE Orientação e Supervisão Pedagógica; aluna bolsista de Iniciação Cientifica em Pedagogia Hospitalar – CNPQ 2006; aluna com bolsa Monitoria da habilitação OE\
SE pela PUC/SP. Atualmente é educadora da oficina de Educomunicação no Centro Social Marista Ir. Justino/SP. E-mail: clausantos@marista.
org.br.
121
1 INTRODUÇÃO
No ano de 2012, trabalhamos com o Projeto Território, entendendo-o como a
construção coletiva do espaço, sendo o território parte de cada criança e adolescente, família, educador, e todos da comunidade educativa.
A oficina de Educomunicação, na perspectiva de trabalhar a escrita e a leitura de forma prazerosa e significativa, partindo de relatos e das necessidades
apresentadas pelos educandos, propôs o uso de cadernos para que os mesmos
pudessem realizar os registros diários; fizessem sistematizações de seus sentimentos e anseios; iniciassem a construção do projeto de vida ou, simplesmente, relatassem suas vivências e experiências dentro e fora do espaço Marista.
Por conta dessa carência de educação de qualidade, nos momentos em que
se precisava realizar um registro ou relato por escrito, muitos se remetiam aos
traumas vivenciados na escola e não queriam por assim fazê-lo, uma vez que
a questão da escrita e leitura era vista como algo negativo, numa extensão da
prática escolar de copiar repetidas vezes, com total ausência de elementos
que pudessem trazer as opiniões críticas e propostas dos educandos, além da
relação com a realidade dos mesmos.
Com base nos princípios dialógicos de Paulo Freire63, a oficina de Educomunicação tem por objetivo construir com os educandos um olhar crítico e reflexivo
sobre a mídia e sua atuação na sociedade. Como trabalhar esse objetivo sem
esbarrar na questão da importância da escrita e leitura, considerando que a
oficina aborda os principais meios de comunicação, e usa muitos textos, leituras, pesquisas em jornais, revistas, internet, livros, etc. Nesta perspectiva, era
de suma importância que os educandos desenvolvessem a prática e tivessem
prazer em ler e escrever bem, com qualidade e vontade. Segundo SILVA (1990,
62
www.nossasaopaulo.org.br
63
FREIRE (2005).
PARTE II
Não foi uma ação fácil de ser desenvolvida, pois muitos foram os desafios ao
longo do caminho. Nosso Centro Social está inserido em uma comunidade com
alto índice de vulnerabilidade social e que tem os piores índices escolares no
ranking classificatório das escolas públicas do estado de São Paulo62·.
Educadores Sociais Maristas
122
p.32), “[...] A leitura, enquanto um elemento fundamental do processo de ensino, é, também sem dúvida, um poderoso meio para a compreensão e transformação da realidade.”.
Tomando por base essa definição, foram realizadas ações que justificavam um
aprimoramento cada vez maior das práticas de escrita e leitura.
2 DESENVOLVENDO O TRABALHO
Os educandos receberam cadernos com o objetivo de os utilizarem como um
diário de bordo, e cada um ficou livre para personalizar sua capa, registrando suas vivências. Nesta etapa, foram trabalhadas diversas questões, como o
relacionamento interpessoal, a troca de saberes e experiências por parte da
educadora com os educandos, educandos com a educadora, e educando com
educando, além de cooperação, técnicas fotográficas, técnicas de desenhos
e pinturas artísticas, tudo partindo dos conhecimentos prévios de cada um,
além das mediações realizadas pela educadora que também confeccionou seu
caderno.
Passada a etapa de confecção das capas, havia chegado a hora de tratarmos
dos registros que seriam colocados no mesmo. A proposta era que cada um
começasse pela sua história/trajetória de vida/nome. Neste momento, alguns
educandos não tinham conhecimento da mesma, então, para estimulá-los e
reforçar a valorização e a construção da identidade e da autoestima, a educadora começou contando sua história, abordando diversas questões como os
novos arranjos familiares e a importância da família na vida de cada um.
Os educandos que não conheciam suas histórias pesquisaram com seus familiares, e os que já conheciam começaram o processo da escrita.
Para esta ação se tornar significativa, cada um teve a opção de querer ou não
fazer o registro sobre a sua trajetória. Alguns poucos não quiseram fazê-lo, o
que também foi respeitado e em nenhum momento questionado, entendendo que cada um está em um processo e tempo de desenvolvimento diferente do outro. “Entende-se que os registros de aprendizagem são instrumentos
individuais de avaliação e de documentação pedagógica, tanto por parte do
123
educando quanto por parte do educador”. (Proposta Socioeducativa Marista,
2010, p. 66).
A ideia de trabalhar com os cadernos nasceu após assistirmos o filme Escritores da liberdade64. Os cadernos de registros começaram a fazer todo um
movimento nas demais oficinas, pois cada vivência era relatada por fotos, registros escritos, desenhos, histórias em quadrinhos, onde os educandos faziam
propostas e avaliações sobre os acontecimentos no Centro Social, o que contribuiu para os educadores visualizarem como suas práticas eram vistas pelas
crianças e adolescentes.
Todo esse movimento trouxe estímulo ao grupo, fato que contribuiu para outras ações que estavam sendo desenvolvidas, como produção de vídeos, pesquisas na comunidade, produção de matérias para o jornal do bairro, mostra
de fotos da comunidade, e participação no III Congresso de Literacia Marista
com a produção de um artigo por parte de uma educanda sobre sua realidade
educacional.
As vivências das oficinas e as atividades fora do Centro Social (palestras, seminários, congressos, passeios, etc.) foram registradas neste caderno, tornando-o um diário de bordo de cada educando que, ao sair do socioeducativo, terá
uma retrospectiva de todas as suas experiências.
Escrever, para mim, vem sendo tanto um prazer profundamente experimentado
quanto um dever irrecusável, uma tarefa política a ser cumprida. [...] Escrever
não é uma questão apenas de satisfação pessoal. Não escrevo somente
porque me dá prazer escrever, mas também porque me sinto politicamente
comprometido, porque gostaria de convencer outras pessoas, sem a elas
mentir, de que o sonho ou sonhos de que falo, sobre que escrevo e porque
luto, valem a pena ser tentados.
64
Uma jovem e idealista professora chega a uma escola de um bairro pobre que está corrompido pela agressividade e violência. Os alunos se mostram rebeldes e sem vontade de aprender, e há entre eles uma constante tensão racial. Assim, para fazer com que os alunos aprendam e também
falem mais de suas complicadas vidas, a professora Gruwell (Hilary Swank) lança mão de métodos diferentes de ensino. Aos poucos, os alunos vão
retomando a confiança em si mesmos, aceitando mais o conhecimento, e reconhecendo valores, como a tolerância e o respeito ao próximo.
PARTE II
Nesse sentido, Freire (1994, p.15-16) afirma que:
Educadores Sociais Maristas
124
Foram muitos os resultados deste trabalho que ainda está em construção, com
ganhos significativos. Educandos que não tinham opiniões críticas quando
questionados sobre o que achavam das oficinas e ações desenvolvidas, com
a prática foram criando hipóteses e propostas para as mesmas. Por não terem
uma prática de escrita, apresentavam grandes dificuldades ortográficas, o que
ainda continua, mas com muitos avanços significativos. O desenvolvimento do
hábito pela leitura e escrita, de forma prazerosa e espontânea, por meio da
participação, formulação e exposição de ideias e opiniões durante as ações,
a reflexão sobre a importância da construção do projeto de vida; o aumento
significativo da participação crítica e o poder de argumentação e sugestão dos
mesmos se destacam nesta proposta.
3 CONCLUSÃO
Está sendo um processo de grande aprendizado para a educadora e educandos. A cada dia, a educadora se surpreende com as devolutivas e com o aumento da reciprocidade, com seu crescimento pessoal e intelectual, com os
avanços importantes e significativos deste processo. Em 2013, o objetivo foi
continuar contribuindo cada vez mais, elaborando estratégias para trabalhar
com as crianças de 7 e 8 anos que ainda estão no processo de alfabetização, iniciando com linguagens lúdicas, como desenhos, contação de história,
construção de histórias em quadrinhos, teatro de sombras e fantoches, entre
outros, para estimular os pequenos neste processo e fortalecer esta e outras
ações.
Também é importante abordar, de forma cuidadosa, os educandos mais tímidos
que não gostam muito de fazer relatos e não demonstram nenhum interesse
pela leitura, com outras formas de registros que já foram usadas anteriormente, como produção de vídeos, documentários, stop motion, fotoscape e outros.
É preciso continuar com as ações e parcerias com outras oficinas e com a educação infantil, criando novas ações para a continuação do trabalho em rede,
atingindo os objetivos do projeto e da unidade Ir. Justino.
125
PARTE II
4 ANEXOS
Educadores Sociais Maristas
126
PARTE II
127
Educadores Sociais Maristas
128
129
5 REFERÊNCIAS
FREIRE, Paulo. Cartas a Cristina. São Paulo: Paz e Terra, 1994.
_____________. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Ed. Paz e Terra, 2005;
SOLIDARIEDADE, Rede Marista de. Proposta Socioeducativa: Referenciais Teórico-Metodológicos. São Paulo: FTD, 2010.
PARTE II
SILVA, Ezequiel Teodoro Da. O ato de ler: Fundamentos Psicológicos para uma
nova pedagogia da leitura. 7ª edição, São Paulo: Cortez, 1990.
PALAVRAS FINAIS
As experiências aqui compartilhadas permitem identificar possíveis itinerários desenvolvidos pelos educadores Maristas, bem como oportunizam reflexão sobre a
participação nos projetos educativos e suas inúmeras
possibilidades de construção de conhecimento com
educandos, educadores e comunidade.
Em consonância com os Maristas das Américas, nos
mobilizamos para construir caminhos de solidariedade
com crianças, adolescentes e jovens. Desejamos ao leitor que esta publicação fomente novos acenos e práticas nas comunidades educativas e que possamos caminhar juntos na construção de currículos com enfoque
em direitos, que busquem a formação integral do sujeito e respeitem e considerem os direitos humanos em
suas propostas e práticas cotidianas.
Com a intensão de contribuir para a reflexão e socialização de práticas, envolvendo temas de interesse e discussão mundial, direitos humanos e cidadania, a riqueza e a diversidade das experiências apresentadas nesta
publicação oferecem ao leitor uma mostra significativa
do potencial e da relevância das ações de compromisso social da Rede Marista, na construção crítica e em
permanente renovação dos caminhos que precisam ser
percorridos face à luta pelos direitos humanos consagrados constitucionalmente.
Os percursos continuam na expectativa de novos itinerários educativos com crianças, adolescentes e jovens.
2017
um novo começo
Itinerários Formativos dos Educadores Sociais Maristas
maristas
Itinerários
Formativos dos
Educadores
Sociais
Maristas
O currículo com enfoque
em direitos na
Educação Integral
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Baixe aqui a publicação e boa leitura.