LEITURA E PRODUÇÃO DE SENTIDO: OS DESAFIOS DA ESCOLA NA
FORMAÇÃO DE LEITORES
Marilei Lima Dias Messias ¹
Solimar Patriota da Silva, MSc ²
A leitura é uma atividade que vem ganhando cada vez mais importância no contexto social da
atualidade. Seja como um ato de prazer ou para obtenção de informação, o domínio da leitura vem
se mostrando indispensável na vida daquele que deseja estar inserido em uma sociedade centrada na
leitura e na escrita.
Segundo Kleiman (1989), a capacidade leitora e a de interpretar fatos do dia-a-dia estão
relacionadas intimamente, ou seja, o indivíduo que conseguir desenvolvê-la de modo satisfatório,
certamente terá mais facilidade para lidar com as questões cotidianas com mais autonomia e
praticidade do que aquele que não teve esta capacidade bem desenvolvida.
Naturalmente, espera-se que esta capacidade seja adquirida nas séries iniciais, uma vez que a leitura
seja considerada como uma das conseqüências do processo escolar e, portanto, imagina-se que um
indivíduo que seja alfabetizado esteja apto a realizar tal atividade. Contudo, dados mais recentes do
INAF (indicador de alfabetismo funcional) divulgados na revista Nova Escola de fevereiro/março
de 2011, apontam que quatro em cada dez brasileiros que cursaram até a quarta série e hoje têm
entre 15 e 24 anos têm sua capacidade de interpretação limitada, mostrando-se capazes de
compreender somente frases simples e/ou curtas como bilhetes e anúncios.
Ainda segundo o artigo da revista, este fracasso se deve, em parte, a uma concepção de ensino
inadequada, na qual a leitura e a escrita eram trabalhadas deixando de lado o aspecto comunicativo
da linguagem. Durante muitos anos, considerava-se que, para ser leitor, o aluno deveria tão
somente, dominar a capacidade de decodificação, ou seja, transformar os sinais gráficos do texto em
sonoros, mas, então, fica a pergunta: ”Bastará porém decifrar palavras para acontecer a
leitura?”(MARTINS,2007, p.7)
Nos dias atuais já se sabe que a leitura não pode ser reduzida a um simples ato de decifração do
código escrito. Muito pelo contrário, a ela estão atrelados muitos outros saberes, que por sua vez,
também devem ter sua importância ressaltada pela escola, já que é no ambiente escolar que a leitura
inicialmente se desenvolve.
Portanto, além de ensinar a decodificar, o mais importante é que é escola ensine a ler, fornecendo
aos alunos subsídios para isto. Pois se a leitura continuar sendo encarada como um ato de
decifração, esta apresentará grandes probabilidades de ser realizada de modo deficitário para a vida
inteira.
E para abordar este assunto com maior profundidade destacamos como objetivos deste trabalho
discutir as concepções de leitura, os conhecimentos necessários para que ela aconteça e como a ação
escolar pode influenciar positiva ou negativamente na formação de leitores.
Segundo Martins (2007) as concepções de leitura podem ser sintetizadas em duas caracterizações
distintas: decodificação mecânica de signos lingüísticos e processo de compreensão no qual está
envolvida a mobilização de diversos saberes e fatores dos mais diversos.
Na primeira concepção, a leitura é vista como mero ato de decifração do código escrito, no qual o
leitor, visto como decifrador, assume uma postura totalmente passiva com relação ao texto, sem
valorizar a compreensão que se tem deste. Ou seja, a função social da leitura além de não ser
valorizada, sequer é levada em consideração.
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¹ Discente do Curso de Especialização em Língua Portuguesa, UNIGRANRIO
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² Docente da Escola de Educação, Ciências, Letras, Artes e Humanidades, UNIGRANRIO
Ao trabalhar sob esta concepção de leitura, a escola “prepara a criança para habituar-se a não
compreender” (VILLARDI, 1999, p.19). Isto é, quando a escola deixa de mostrar ao aluno a função
social que a leitura exerce em nossa sociedade, ela acaba por anular grande parte das possibilidades
deste indivíduo desempenhar com eficiência seu papel de cidadão agente em uma sociedade
fundamentada na leitura e na escrita.
Todavia, ao observarmos a segunda concepção que se refere à leitura como “processo de
compreensão”, podemos perceber que nesta, a decodificação é usada como meio para alcançar o
produto final: a compreensão do texto.
Para que este tipo de leitura aconteça é essencial que o leitor mantenha uma interação com o texto.
Deixando de lado o papel passivo que outrora ocupava e desempenhe o papel de leitor ativo, que
por sua vez, contesta informações, atualiza dados, que estabelece relações. Enfim, que participa
ativamente da construção do sentido do texto, visto que, segundo Kleiman(1989, p.36) “o texto não
é um produto acabado, que traz tudo pronto para o leitor receber de modo passivo.”
Assim sendo, para que a leitura ocorra, são necessárias ativações de diversos conhecimentos
armazenados na memória, um conjunto de conhecimentos adquiridos ao longo da vida,
armazenados na memória, desde bem pequenos, como cheiros, lugares, emoções, enfim, todo o
histórico de vida de alguém, e que interferem diretamente na compreensão que se tem de um texto.
Aliás, sobre este assunto, Freire (2006) e Martins (2007) concordam, afirmando que a leitura
começa antes mesmo de que tenhamos contato com as primeiras letras. Segundo eles este processo
se inicia no momento em que começamos a conhecer o mundo e dar sentido a ele. Portanto, cada
leitor, por possuir experiências de vida únicas, permitirá ao texto uma pluralidade de leituras. E
podemos afirmar ainda, que o mesmo leitor possa ter leituras diferentes de um mesmo texto, tantas
quantas forem as vezes que este texto for lido. Isto é, “Assim como há tantas leituras quantos são os
leitores, há também uma nova leitura a cada aproximação do leitor com um mesmo texto, ainda
quando mínimas suas variações.” (MARTINS, 2007, p.79).
Diante de tal afirmação nos deparamos com outra questão primordial: Como ajudar um leitor a
compreender o caráter plural da leitura lhe oferecendo somente atividades de interpretações
restritas, cujas respostas já estão explícitas no texto?
Segundo Villardi (1999), a solução para este problema seria trabalhar com os alunos questões de
interpretações que permitissem respostas “possíveis” e não “corretas”. Isto é, ajudar o aluno a
desenvolver um pensamento crítico, fazendo-o perceber que as vivências pessoais de cada indivíduo
podem interferir consideravelmente na interpretação de um texto e, além disso, ele deve ser
estimulado a mobilizar conhecimentos e estabelecer relações com outros textos, outros fatos, outras
realidades, a fim de que o valor social e comunicacional da leitura sejam sempre valorizados.
Na visão de Chartier (2001, p.37), a leitura deve ser encarada como um “processo de produção de
sentido” no qual a visão de cada leitor sobre um determinado texto pode variar de acordo com sua
bagagem cultural, e portanto, não deve ser reduzida a uma “ técnica de decifração.” Muito pelo
contrário, é algo extremamente pessoal, que varia de acordo com as vivências de cada um, pois na
verdade ler não é decodificar mais compreender.
De acordo com Paulo Freire (2009, p.20) “A leitura do mundo precede sempre a leitura da palavra
e a leitura desta implica a continuidade da leitura daquele.” Diante de tal afirmação, podemos
concluir, que o processo no qual a leitura está envolvida é um processo inacabado e inesgotável, no
qual o leitor participa ativamente e no qual está envolvida a mobilização de diversos tipos de
conhecimentos que interagem entre si para a produção de sentido.
Braga e Silvestre (2009), afirmam que cabe ao professor ajudar seus alunos a mobilizar estes
conhecimentos no momento da leitura. Fazer intervenções pertinentes à leitura do texto em questão.
E além de tudo, estabelecer objetivos claros para o trabalho com leitura deixando estes objetivos
bem definidos para o aluno, pois segundo Koch e Elias (2010), são os objetivos que norteiam o
processo de leitura, eles são os responsáveis pelo foco do leitor e pela intensidade de interação deste
com o texto, ou seja, traçando objetivos claros o professor ajuda o aluno a saber o que buscar no
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texto, tornando a leitura deste mais significativa e até mesmo prazerosa, favorecendo assim, a
relação entre aluno e leitura.
Enfim, para que a escola forme cidadãos realmente leitores é necessário oferecer subsídios tais, que
orientem este aluno a realizar uma leitura que será eficiente para a vida inteira, visto que a função
da escola seja justamente esta, formar cidadãos capazes de desempenhar com eficiência seu papel
em sociedade.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BAMBERGER, Richard. Como incentivar o habito de leitura. Ática. São Paulo. 1995
BRAGA, Regina Maria e SILVESTRE, Maria de Fátima Barros. Construindo o leitor competente:
atividades de leitura interativa para a sala de aula. 3ª Ed. São Paulo: Global, 2009
CHARTIER, Roger. Práticas da leitura. 2ªed. São Paulo: Estação liberdade, 2001
FERREIRA, Aurélio B. de Hollanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. 4ªed. Rio de Janeiro:
Nova Fronteira, 2001.
FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. 48ª Ed. São Paulo:
Cortez, 2006.
KLEIMAN, Angela. Texto e leitor: Aspectos cognitivos da leitura. 2ª Ed. Campinas, São Paulo:
Pontes, 1989.
KOCH, Ingedore Vilaça e ELIAS, Vanda Maria. Ler e compreender: os sentidos do texto. 3ªed. São
Paulo: Contexto, 2010.
MARTINS, Maria Helena. O que é leitura. São Paulo: Brasiliense, 2007.
MOÇO,Anderson. Seis práticas essenciais na alfabetização. Nova escola. Abril. São Paulo. v. 239.
n.XXVI. p.51, janeiro/fevereiro 2011.
VILLARDI, Raquel. Ensinando a gostar de ler e formando leitores para a vida inteira. Rio de
Janeiro: Dunya, 1999.
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