ESTUDO DO RESUMO ACADÊMICO NUMA VISÃO SÓCIO-INTERACIONISTA DA LINGUAGEM Hellane Cristina Gomes de Azevedo (UFPB- Campus IV) [email protected] Roseane Batista Feitosa Nicolau (UFPB- Campus IV) [email protected] RESUMO Considerando que o gênero resumo é de grande importância no contexto escolar/acadêmico, buscamos através de uma pesquisa exploratória e explicativa realizar um estudo sobre o processo de produção desse gênero, solicitado em diferentes disciplinas. Neste artigo observamos como o aluno retextualiza e reconduz o resumo a partir do uso de metarregras, mostrando os problemas identificados na teoria dos gêneros e da retextualização para que o aluno apresente êxito nesse tipo de produção textual. Temos como suporte teórico os estudos de Machado (2010) sobre o resumo numa visão sócio-interacionista, Matencio (2010) sobre a retextualização desse gênero e Charolles (1978 apud MARQUESI; CABRAL, 2008) sobre o estudo das metarregras na composição textual. Percebemos que o resumo deve ser produzido a partir do conhecimento do processo de retextualização e que os alunos ainda precisam se aprimorar mais na prática desse gênero. PALAVRAS-CHAVE: Gênero Resumo. Retextualização. Metarregras. 1 Introdução O projeto, intitulado: “O Resumo Acadêmico sob o olhar da Teoria Sóciointeraciocional”, que está inserida no Programa Institucional de Voluntários de Iniciação Cientifica (PIVIC) da Universidade Federal da Paraíba - Campus IV visa promover a compreensão do gênero resumo, levando os alunos a práticas de retextualização e recondução desse gênero para situações que demandem seu uso com mais proficiência. O nosso alvo é o gênero resumo, tendo em vista que esse gênero é ponto de partida para o estudo e prática de outros gêneros acadêmicos - resenha, relatório, artigo, monografia etc. Nosso objetivo, neste trabalho, é precisamente observar e analisar o processo de retextualização em resumos produzidos na sala de aula observando como são produzidos através da utilização das regras/estratégias de apagamento e/ou substituição, aplicadas na elaboração, como também do uso das metarregras de Charolles (1978 apud MARQUESI; CABRAL, 2008) na composição textual. Temos como suporte teórico os estudos de Machado (2010) sobre o resumo numa visão sócio-interacionista e Matencio (2010) sobre a retextualização do gênero resumo e Charolles (1978 apud MARQUESI; CABRAL, 2008) com as metarregras responsáveis pela boa formação de um texto. Dando continuidade ao artigo, vimos como se dá o processo de retextualização na prática, apresentando um recorte da análise do corpus coletado, sob a visão sóciointeracionista, na qual, no processo de interação, os interactantes se modificam reciprocamente. Além disso, observamos principalmente nesta análise, o uso das metarregras no processo de retextualização. Enfim, buscamos através deste trabalho auxiliar professores no ensino e aprendizagem do gênero resumo, já que percebemos a grande dificuldade dos alunos na elaboração deste gênero que é muito solicitado na escola ou na universidade. 2. O processo de retextualização na visão sócio-interacionista O resumo no contexto escolar/acadêmico segundo a visão sócio-interacionista não é visto apenas como um instrumento de comunicação, mas também objeto de ensino/aprendizagem (DOLZ e SCHINEUWLY, 1999). Para a realização de uma interação eficiente é fundamental o conhecimento do gênero, ou seja, uma competência metagenérica (KOCH e ELIAS, 2009). A Competência metagenérica propicia a escolha adequada do que produzir textualmente nas situações comunicativas. Por isso, não contamos piada em velório, não cantamos o hino de nosso time em uma conferência acadêmica etc. A retextualização voltada para a produção de texto deve ser vista também como um treino de conhecimento consciente que leve o aprendiz a conhecer as características próprias da atividade que realiza e as estabelecer uma relação entre o desempenho e o resultado. Sautchuk (2003), refletindo sobre o ato da escrita, diz que o aluno deve reescrever o textobase, depois fazer as correções necessárias com o intuito de torná-lo mais claro considerando a adequação linguística e a seleção vocabular apropriada. Para Marcuschi (2001) que centra seus estudos na retextualização da fala para a escrita, a retextualização deve ser concebida como a passagem de uma ordem para outra. Há, nas atividades de retextualização, um aspecto muito importante: a compreensão. Antes de qualquer atividade de transformação textual é preciso que se compreenda o que foi dito para que não ocorram problemas no plano da coerência no processo de retextualização. Na visão de Marcuschi (2001), quando fazemos uma atividade de retextualização, causamos interferência na forma e substância da expressão e na forma e substância do conteúdo. Ao escrever um resumo, o aluno está de certa forma livre para organizar um conjunto de palavras, orações e parágrafos de acordo com suas intenções e habilidades. Porém, essa liberdade é restrita uma vez que o texto que ele vai escrever está baseado num texto que já existe. Conforme o princípio proposto por Matencio (2010), de que retextualizar é produzir um novo texto a partir de um texto-base, iremos nos aprofundar no uso das regras/estratégias de Machado(2010) como também das metarregras postuladas por Charolles(1978 apud MARQUESI; CABRAL, 2008) na elaboração do resumo. 2.1 Descrição da retextualização Uma vez que o texto-resumo é um novo texto, resultado de um novo enquadre, ou seja, apresentar-se o texto num novo formato, condensado, ou seja, resumido, a partir de um exercício de leitura. De acordo com essa estudiosa do processo de retextualização “a realidade do gênero é a realidade do enquadre dado, pelo sujeito, ao evento de interação no qual atua, que vai levá-lo a recuperar em sua memória esquemas cognitivos e a construir um modelo mental de representação da situação efetiva.” (MATENCIO, 2010, p. 2). Ou seja, aluno, a partir do que compreendeu do texto-base, vai elaborar o seu próprio texto. Este aspecto abordado pelo autor é a do gênero como realidade sócio-cognitiva, que é construído no seio das práticas discursivas, sendo uma realidade ao mesmo tempo coletiva, pois se constrói na atividade, ou seja, na inter-ação entre sujeitos e, individualmente, quanto ação do sujeito. Na retextualização é preciso levar em conta a modificação que o texto-base sofre, uma vez que este pertence a um determinado gênero e é retextualizado, resultando o gênero resumo. Para que ocorra a retextualização no resumo, o aluno deve acionar conhecimentos sobre o processo desse tipo de produção escrita, saber utilizar de mecanismos linguísticos que o levem à paráfrase e não à cópia, considerar a continuidade e progressão do texto-base; enfim, saber retomar e modificar o texto-base para que se identifique que se trata de um resumo de um texto. Matencio (2010) relata o universo da retextualização como prática fundamental do ensino/aprendizagem. Há basicamente de dois conjuntos de regras/estratégicas que podem se postas em prática na elaboração do resumo: as de apagamento e as de substituição. As primeiras, segundo Machado (2010, p.152), “seriam seletivas, pois, por meio delas, selecionam-se os conteúdos relevantes do texto, com o apagamento de informações desnecessárias à compreensão de outras proposições ou de informações redundantes”. As outras, de substituição, seriam constitutivas, nas quais exigem a construção de novas proposições e que ainda podem ser divididas em dois tipos: as de generalização e as de construção. Na de generalização, o escritor do texto substitui os termos (expressões) específicos por outros de ação mais geral. Já na de construção, substitui-se uma sequência de proposições expressas ou pressupostas por proposições inferidas delas. Ainda segundo esta pesquisadora os leitores já utilizam e aplicam regras mais ou menos constantes e de forma inconsciente, no decorrer da leitura e da produção textual. Mas é necessário, que se busque identificar estas regras/estratégias no processo de sumarização dos diferentes tipos de texto: descritivos, narrativos, expositivos e argumentativos. (MACHADO, 2010). 2.2 Descrição das metarregras No artigo “Enunciação e Práticas Discursivas na Universidade: uma reflexão sobre dificuldades de escrita” as autoras, Maquesi e Cabral (2008), fazem a seguinte pergunta: “Quais são (ou quais deveriam ser) as qualidades de um texto produzido por uma redação proficiente?” e recorrem a um estudioso dos princípios da Linguistíca Textual chamado Charolles (1978, 1995 e 2002) para responder a essa questão. Marquesi e Cabral (2008) descrevem a obra de Michel Charolles (1978) como sendo de competência textual em que postula a existência de critérios de boa formação, nas quais estão inseridas as quatro metarregras responsáveis pela boa formação de um texto: repetição, progressão, não-contradição e relação. Estas metarregras são de fundamental importância para elaboração textual, em nosso caso, para o resumo, pois nelas encontramos formas eficazes de redigi-lo com proficiência. Para Charolles (1978 apud MARQUESI; CABRAL, 2008) a metarregra repetição é uma condição necessária, embora não suficiente, para uma sequência se desenvolva sem ruptura, de forma homogênea e contínua. Ele apresenta algumas estratégias linguísticas que garantem o uso proficiente da repetição como: a pronominalização que é a retomada do que foi dito por pronomes; a definitização em que se retoma o que é dito definindo-se; as referenciações dêiticas contextuais como lá, aqui e hoje; a substituições lexicais, que no resumo, são as palavras genéricas; por exemplo emprega-se a palavra “droga” em vez de “maconha” por ser “droga” mais genérica do que “maconha”; as recuperações pressuposicionais e retomadas de inferência que dizem respeito respectivamente as pressuposições e as inferências feitas a partir do que foi dito no texto-base. Marquesi e Cabral (2008) ressaltam que embora os elementos de repetição sejam importantes, o texto não deve contentar-se em repetir indefinidamente os mesmos elementos; é preciso que o seu conteúdo semântico sempre renovado, pois é necessário que haja um equilíbrio entre repetição e informatividade. Segundo elas, num texto produzido por um redator proficiente, os elementos de repetição normalmente contemplam a progressão, visto que na produção de um texto a continuidade temática e a progressão semântica devem estar aliadas de forma equilibrada. Portanto, daí surge a segunda metarregra, a da progressão, que de um texto se dá quando nele contém uma ampliação do sentido constantemente renovado, ou seja, devemos respeitar a ordem das ideias apresentadas no texto-base até o final do texto. Ainda sobre a metarregra da progressão Costa Val (2000) nos diz que, se o texto precisa manter a unidade temática, precisa também se desenvolver, mostrando que tem alguma coisa a dizer. Segundo a autora podemos dizer isto com expressões do tipo “ir para frente”, “não ficar amarrando o barro”, “não ficar dando volta no mesmo lugar”. Existe também a metarregra da contradição que corresponde ao não uso no desenvolvimento do texto de elementos que contradigam o que já foi enunciado anteriormente. Segundo as autoras Marquesi e Cabral (2008) pudemos encontrar na obra de Charolles (1978) uma divisão de contradições em: enunciativas, inferenciais e pressuposicionais, de mundo e representações. Ainda segundo elas são exemplos de contradições enunciativas a falta de manutenção dos tempos verbais, ou a falta de correlação dos tempos verbais e a falta de manutenção da enunciação. Também as autoras nos mostram a diferença entre a contradição inferencial e a pressuposicional, que são semelhantes, exceto pelo fato de que na contradição pressuposicional o conteúdo pressuposto é que se encontra contradito por uma proposição anterior e não na dedução de uma proposição. E nos lembram que algumas contradições tornam o discurso incoerente e outras não, Já a metarregra da relação trata da representação dos fatos, que estejam relacionados no texto, ou seja, que já foram ditos. No resumo, usamos esta metarregra apresentando as ideias do autor e relacionando-as com o que foi dito. Segundo as estudiosas, Marquesi e Cabral(2008), a metarregra da relação tem a ver com a competência lógica, que diz respeito aos raciocínios utilizados pelo sujeito e que lhe possibilitam a formalização, no texto, das relações entre os enunciados ou entre suas partes. 3 Análise dos resumos sob a visão sócio-interacionista tendo como suporte as metarregras Os resumos analisados, representativos do corpus do projeto de pesquisa, foram coletados de alunos do Curso de Redação e Produção Textual realizado na UFPB - Campus IV, período 2010.1 e 2010.2, como também, do Curso de Secretariado Executivo Bilíngue (período 2010.2), aos quais podemos ver como os alunos organizam o gênero resumo a partir do texto-base. Tantos os alunos do Curso de Redação e Produção Textual quanto do Curso de Secretariado Executivo Bilingue buscam um aprimoramento na prática dos gêneros textuais ao longo do curso para alcançarem um ótimo desempenho na elaboração desses gêneros. A partir desta constatação, lançamos a proposta de analisar resumos, produzidos por eles, no tocante à retextualização para descobrirmos como estão desenvolvendo as práticas de produção textual, especificamente no gênero resumo. Sendo assim, pedimos para os alunos resumirem o texto Vamos ao que interessa, do autor Eugênio Mussak (In: Vida simples. Edição: 07 de julho de 2003), em dez a quinze linhas, mas que fizessem a leitura do texto-base várias vezes antes de começarem a produzilo, procurando compreende o texto. Escolhemos este texto por tratar do excesso de informação nos dias atuais e de como devemos lidar com essa questão, e também por ser uma leitura bastante interessante e de fácil compreensão para os alunos. Neste trabalho, foram coletados sessenta e seis resumos, sendo que apenas dez são analisados neste artigo. Na análise com já foi mencionado, temos como pressuposto teórico os estudos de Machado (2010) sobre o resumo numa visão sócio-interacionista e Matencio (2010), sobre a retextualização do gênero resumo e o uso das metarregras postuladas por Charolles (1978 apud MARQUESI; CABRAL, 2008). Na presente análise, optamos pela transcrição de trechos dos resumos analisados que iremos observar. Queremos ressaltar que chamaremos os mesmos de R1 a R10 no sentido de preservar a identidade dos alunos. Constatamos ao longo da análise que na maioria dos resumos analisados havia o processo de colagem das partes principais do texto. Observação ressaltada por Platão e Fiorin (1990) na sua obra Para entender o texto: leitura e redação, quando diz que ao se colar os trechos do texto-base, apropriam apenas das ideias do autor, neste caso em análise, das ideias de Mussak, bem como das metarregras usadas por ele, quando se deveria aplicar as metarregras na retextualização e não copiar as metarregras do autor do texto-base, como em R8 quando diz que:“Outro autor kevin Desmond, estudou a evolução das tecnologias, afirmava antigamente o conhecimento era produzidopela humanidade(...)”, neste caso, a o aluno utilizou a metarregra de repetição já utilizada pelo autor Mussak quando esse diz o que Desmond disse no livro, e no resumo ocorre o mesmo. Ainda percebemos que alguns alunos não tiveram a compreensão global do texto base; pois ao produzir o resumo, eles não definiram quem era o autor do texto misturando com os autores citados na obra, como Alvin Toffler e Kelvin Desmond. Um desses exemplos está em R1 que logo no início diz: “Nas últimas décadas o livro de maior impacto, refere-se ao que está por vir. Chama-se O choque do Futuro, do jornalista americano Alvin Toffler, e começa a partir de uma análise da evolução da sociedade humana (...)”. No trecho (R2) a seguir, o (a) aluno (a) utilizou as estratégias de apagamento e substituição, porém não soube manejá-las de maneira adequada, quando na estratégia de substituição o (a) aluno (a) generalizou, porém não construiu novas expressões a partir das idéias relevantes que selecionou - “O livro ‘O choque do Futuro’ do jornalista Alvin Toffler analisa a evolução da sociedade humana. Afirma que temos cerca de 800 gerações e desse total 650 viveram nas cavernas. Através da leitura e das aulas de histórias, nota como o mundo foi diferente. O britânico kevin Desmond afirma no seu livro, A timerable of Inventions and Discoveries, que o nosso conhecimento dobrou duas vezes até a Revolução Industrial (...)” No trecho de R3, o aluno inicia seu texto dizendo: “O livro O choque do Futuro do jornalista Alvin Toffler analisa a evolução da sociedade humana. Temos notícia de que o mundo foi muito diferente por longos anos, através da leitura e das aulas de história (...)” ele não seguiu a metarregra da repetição, pois não usou a pronominalização, caraterística desta metarregra, apenas usou a regra-estratégia de apagamento, apagando o que julgou desnecessário sem construir novas proposições, também não usou a quarta metarregra, a da relação, pois não relacionou a ideia do primeiro parágrafo com a do segundo. Outro aspecto que observamos nos resumos analisados foi a não obediência à progressão, ou seja, a segunda metarregra em que se deve respeitar a ordem das ideias apresentadas no texto-base até o final do texto, como no R4, R6 e R7. Todos os resumos analisados respeitaram a regra da não-contradição, no que se refere a não contradizer a proposta do autor. Para Costa Val (2000), devemos atentar na elaboração de um texto para verossimilhança de relatos e narrativas, para a consistência e a veracidade dos argumentos. Houve uma quebra da metarregra da relação no início do parágrafo de R5, quando se iniciou da seguinte maneira: “Nas últimas décadas o livro de maior impacto, chama-se O choque do Futuro, do jornalista americano Alvin Toffler, que analisa a evolução da sociedade humana, (...)”. E no trecho seguinte disse-se: “Outro autor kevin Desmond, estudou a evolução das tecnologias, ele afirmava que antigamente o conhecimento era produzido pela humanidade (...)”. Como pudemos ver não houve uma correlação dos tempos verbais entre o verbo analisar que está no presente do indicativo e os verbos estudou e afirmava que estão no pretérito perfeito do indicativo e no pretérito imperfeito respectivamente. Outro fato que nos chamou atenção foi que alguns dos alunos praticamente não usaram a metarregra da relação, pois não apresentaram as ideias do autor, relacionando-as conforme foram ditas. Isso resulta na ausência da regra/estratégia de substituição por generalização e por construção. Mas podemos destacar o uso dessa quarta metarregra no R9 quando o aluno usa o marcador temporal logo após no seguinte trecho: “Logo após o autor cita outro livro o do britânico kevin Desmond, conhecido estudioso da evolução das tecnologias, (...)”. No processo de retextualização vimos que os alunos não têm total domínio das metarregras. Foram poucos os que conseguiram usar todas as metarregras. Os R9 e R10 foram os que mais se aproximaram da forma ideal estudada de se realizar um resumo, quando usaram da generalização e a de construção, quando registra as informações de ordem geral e insere novas proposições com base nas informações dadas ou pressupostas, para melhor criar seu próprio texto. 4 Considerações Finais Consideramos de suma importância o processo de retextualização no ensino/aprendizagem do gênero resumo, levando em conta que este serve de suporte para outros gêneros escolares/ acadêmicos - como a resenha, o relatório, artigos e monografias etc. -, e que, geralmente, surgem muitas dúvidas quanto a sua produção. Observamos dificuldades na criação de um novo texto a partir de um texto-base; dentre elas: a não utilização das regras/estratégias de Machado (2010), como também as metarregras postuladas por Charolles(1978 apud MARQUESI; CABRAL, 2008), como vimos na seleção das idéias consideradas principais, colando partes dos textos, assim copiando as mesmas metarregras do autor do texto-base. Enfim, nos resumos analisados, há em alguns casos, o processo de retextualização do texto-base, em que o aluno realiza regra/estratégia de apagamento, ou seja, retirando do textobase somente as ideias mais relevantes como também a regra/estratégia de substituição por generalização e por construção, criando um novo texto, quanto ao uso das metarregras postuladas por Charolles(1978 apud MARQUESI; CABRAL, 2008), alguns conseguiram outros não desenvolver todas elas na elaboração do resumo. Pudemos ver que muitos alunos têm dificuldades na retextualização do texto, usando os mecanismos citados anteriormente. Acreditamos que este tipo de gênero precisa ser revisto quanto às práticas de ensino/aprendizagem. Há a necessidade de um ensino pertinente a respeito do gênero resumo, nos moldes do sócio-interacionista aliado as metarregras de Charolles (1978), que são de grande importância para uma boa formação textual dos alunos. Por isso, lançamos a proposta de ensino do resumo tendo como suporte as metarregras para dar mais sentido ao ensino e aprendizagem deste gênero, resultando em uma produção eficaz da parte dos alunos. A aplicação consciente do processo de retextualização é uma das melhores maneiras de se trabalhar o resumo para alcançarmos melhorias no ensino/ aprendizagem. Neste trabalho percebemos a necessidade de um ensino pertinente a respeito do gênero resumo, a partir da reflexão desta prática que contribua para dar mais sentido ao ensino e aprendizagem desse gênero. 5 Referências COSTA VAL, Maria da Graça. Repensando a textualidade. In: AZEREDO, José Carlos (Org.). Língua portuguesa em debate: conhecimento e ensino. Petrópolis: Vozes, 2000. DOLZ, J.; SCHINEUWLY, B. Os gêneros escolares: das práticas acadêmicas da linguagem aos objetos de ensino. In: Revista Brasileira de Educação, nº 11, 1999. KOCH, Ingedore V.; ELIAS, Vanda M. Ler e escrever: estratégias de produção textual. São Paulo: Contexto, 2009. MACHADO, A. R. Revisitando o conceito de resumos. In: DIONÍSIO, A. P.; MACHADO, A. R.; BEZERRA, M. A. (Orgs). Gêneros textuais e ensino. São Paulo: Parábola Editorial, 2010. p. 149- 162. MARCUSCHI, Luis Antônio. Da fala para a escrita: atividades de retextualização. São Paulo: Cortez, 2001. MARQUESI, S. C.; CABRAL, A. L. T. Enunciação e práticas discursivas na universidade: uma reflexão sobre dificuldades na escrita. In: MICHELETTI, G. (Org.). Enunciação e gêneros discursivos. São Paulo: Cortez, 2008. MATENCIO, M. L. M. Referenciação e retextualização de textos acadêmicos: um estudo do resumo e da resenha. Disponível em: http://www.ich.pucminas.br/posletras/Referenciacao%20e%20retextualizacao.pdf. Acesso em: 25 set. de 2010. PLATÃO, F.; FIORIN, J. L. Para entender o texto: leitura e redação. 2. ed. São Paulo: Ática, 1990. SAUTCHUK, Inez. A produção dialógica do texto escrito: um diálogo entre escritor e leitor interno. São Paulo: Martins Fontes, 2003. Anexo VAMOS AO QUE INTERESSA (por Eugênio Mussak, In: Vida simples. Edição: 07 de julho de 2003) Um dos livros de maior impacto nas últimas décadas referia-se ao que está por vir. Chama-se O choque do Futuro, do jornalista americano Alvin Toffler, e começa a partir de uma análise da evolução da sociedade humana. Diz ele que se considerarmos um período de evolução de 50 mil anos para espécie humana e dividirmos esse tempo em gerações de 62 anos cada, teremos cerca de 800 gerações. Desse total, 650 viveram nas cavernas. A escrita surgiu há 70 gerações, permitindo o início de uma comunicação mais efetiva (a maioria da população só viu alguma página impressa há seis gerações). Nas últimas quatro levas, começamos a medir o tempo com precisão, e somente nas duas últimas é que começamos a utilizar o motor elétrico. Diz Toffler, também que a imensa maioria dos bens matérias que usamos na vida diária de hoje foi desenvolvida dentro da atual geração, que seria mais ou menos a 800ª. Só temos notícia de que o mundo foi muito diferente, por tão absurdamente longos, por meio da leitura ou das aulas de História. O choque maior acontece quando olhamos para o passado e percebemos a velocidade das mudanças na atualidade. Porque da todas as características dos tempos em que estamos vivendo, as mais marcantes são as ligadas à velocidade. Seja no transporte, seja na comunicação, estamos extremamente rápidos. Tanto que nosso cérebro, depois de séculos, acostumado a um determinado ritmo, tem dificuldades para acompanhar, ou entender, o que se passa. Outro bom autor, o britânico Kevin Desmond, conhecido estudioso da evolução das tecnologias, publicou o livro A timetable of Inventions and Discoveries (ainda não lançada no Brasil). Nessa obra, ele apresenta uma curiosa e ao mesmo tempo preocupante visão de nossa evolução. Desmond afirma que todo o conhecimento produzido pela humanidade até o início do cristianismo foi multiplicado por dois até a Revolução Industrial. Desse ponto – teoricamente o ano de 1750 – em diante, o conhecimento voltou a dobrar, primeiro em 250 anos depois em 50 e finalmente em dez anos. Mas isso até surgimento dos primeiros computadores pessoais, no início dos anos 80. Porque, na penúltima década do século XX, o conhecimento foi multiplicado por quatro e na última – ora, ora – por dez! O resultado conhecemos e sentimos bem. Temos sido cruelmente assaltados por uma verdadeira avalanche de informações, que chegam até nós graças a meios de comunicação cada vez mais diversos e competentes. Nesse cenário de velocidade alucinante, surge um novo tipo de ansiedade: a de lidar com o excesso de informações – mal que aqui, de improviso, vamos chamar de “informatite”. Diante dessa nova preocupação, o homem moderno e inteligente faria duas perguntas: 1) Como separar a informação que interessa daquela que não tem qualquer utilidade? 2) Como transformar essa avalanche de informações em conhecimento de verdade? A primeira questão está relacionada com o tipo de dilema que enfrentamos sempre com certa dificuldade: a relação entre a escolha e a renúncia. Perceba que, sempre que escolhemos alguma coisa, renunciamos a muitas outras. Um exemplo de vida comum: você resolve comprar um par de tênis. O vendedor da loja mostra dezenas, de várias marcas, com tecnologias novas, com materiais revolucionários. E também com preços distintos, é claro. É além de tênis, de automóveis e computadores, hoje temos de decidir o tempo todo a respeito de informações que iremos assimilar. A quantidade de dados é desmedida, exagerada, absurda e, então vem a ansiedade. Há livros disponíveis nas livrarias, lojas, e até nos supermercados. Há revistas disputando nosso interesse com capas chamativas, dezenas de canais de televisão, anúncios, outdoors, folhetos entregues nos semáforos, propagandas que chegam pelo correio, por telefone, por e-mail, sem falar nas navegações pelo mundo virtual, um hábito relativamente novo que nos permite entrar em arquivos, bibliotecas, museus e até na intimidade de pessoas comuns. O mecanismo de defesa para o excesso de informações deriva da consciência e da serenidade. Consciência para separar o que interessa daquilo que é supérfluo, excedente ou desnecessário, e serenidade para conviver sem se incomodar ou acabar prejudicado. A pessoa consciente e serena não é vítima fácil do turbilhão, pois tem capacidade estruturada, que sabe o que quer, tem alvos fixos, está aberta às novidades, mas mantém o controle sobre seus centros de interesse. Para sorte de todos, e não apenas dos bem equilibrados, o cérebro humano é seletivo, abre-se para receber as informações que pertencem aos seus centros de interesse e bloqueia a entrada daquelas que estão distantes dos mesmos. Ou, mais uma vez o tênis, se passar na frente da loja que está expondo mais de cem modelos diferentes, você não olha para um sequer, a menos que esteja mesmo precisando de um par. Mas, insisto, são muito necessárias a consciência e serenidade. As pessoas vulneráveis à informatite são justamente aquelas cujos centros de interesse não estão sobre seus próprios desejos. Ou seja, quando a personalidade está passando por um período de busca, de definição, de estruturação – e para algumas pessoas esse período de busca, de definição, de estruturação ocupa a vida inteira – os tais dispositivos do cérebro podem não funcionar direito. O que tem de ficar claro é que a informação só é excessiva quando não encontra um centro de interesse que a receba. E nós podemos ter vários centros de interesse: o cérebro agüenta, sem problemas. As pessoas mais angustiadas não as que recebem muitas informações, mas aquelas que não sabem o que querem – e, nesse caso, a culpa não é do excesso de oferta, mas da indefinição da procura. Com relação à segunda grande questão do homem moderno – a de como transformar informação em conhecimento – antes é bom esclarecer a diferença entre ambos. Conhecimento é informação com significado, aquela capaz de criar movimento, modificar fatos, encontrar caminhos, construir utilidade, fabricar beleza. Conhecimento é a grande vantagem de nosso tempo, já que estamos na era que leva esse nome. E, como explicou Piaget – estudioso do pensamento, da linguagem e do desenvolvimento intelectual – não podemos transferir conhecimento, mas podemos construí-lo. Cada pessoa constrói seu próprio conhecimento, e isso, vale para o aluno no colégio, para o funcionário na empresa ou para o cidadão na rua. Construímos nosso próprio conhecimento usando as informações como unidades morfológicas. Esse fenômeno começa por volta dos 2 anos de idade, quando entendemos o significado das primeiras palavras e a sua utilidade na comunicação, e também passamos a utilizá-las com substância na construção de nosso conhecimento. Crescemos e o processo continua: se compreendermos o significado de uma informação, podemos transformá-la em conhecimento. É por isso que o mundo contemporâneo, pós-muro de Berlim, busca tanto a educação. Porque a informação vem pelos chamados, meios de comunicação, mas o amálgama dessa enxurrada, bem como a separação do joio do trigo, só pode ser conseguido pela educação. E a educação saiu da escola, ou melhor, não está apenas nela: agora está também em trabalho, em nossas relações, em nossa diversão. E aprendemos que conhecimento é um produto perecível; quando não usado, degrada, quando não aumentado ou reciclado, devaloriza-se. Conhecimento não se transfere, mas se constrói. Conhecimento é algo pessoal, propriedade de quem o possui, e não pode ser transferido como todas suas características, sentimentos, detalhes e significados de uma pessoa para outra. Sabemos, entretanto, com relação às informações que estas sim, podem ser transferidas. E a partir das mesmas, outra pessoa poderá construir seu próprio conhecimento. Quando os professores estão dando uma aula, estão na verdade passando informações, dados, conteúdos ou conhecimentos seus, na expectativa de que seus alunos utilizem essa matéria-prima com a finalidade de construírem, eles próprios, seu conhecimento. (...)