Artigo - A guarda compartilhada - Por José Carlos Teixeira Giorgis
A demolição do prédio conjugal por consenso implica no acertamento do destino
dos filhos: é opção traumática, pois ninguém abdica de pedaços de coração ou dos
frutos
genéticos
do
afeto.
Quando não acontece solução pacificada cabe ao juiz decidir a sorte dos menores
apontando o guardião que os vai cuidar; e o direito de visitas para o genitor
carente.
Esses assuntos constituem instantes de tormento para o magistrado e para as
partes; é que muitos usam o filho como objeto de ressentimento e laurel de
disputa.
A previsão do código era entregar o infante a quem tivesse melhores condições, o
que não coincidia com a situação econômica, mas com um lar que proporcionasse
calor e afeição para o sadio desenvolvimento do pequenino ou adolescente; agora
se projeta substituir a expressão por melhor interesse da criança, o que mais se
coaduna
com
imperativo
constitucional.
Até aqui a prática forense e a doutrina haviam sugerido a possibilidade de uma
guarda compartilhada, acepção que continha um paradoxo interno, pois presumia
um condomínio de sentimentos do casal que só ocorre quando juntos no mesmo
ninho.
Agora, a lei pretende conceituá-la como um sistema de co-responsabilidade no
exercício do dever parental em caso de dissolução da sociedade matrimonial ou do
companheirismo, em que os pais participem em igualdade da guarda material.
As vantagens do modelo devem ser evidenciadas pelo juiz na audiência de
conciliação; e não havendo acordo na separação judicial, divórcio ou afastamento
de fato, toca ao julgador estabelecer a guarda compartilhada, sempre que possível;
não sendo, escolhe um dos genitores como guardião, depois de ponderar o melhor
proveito do descendente; em casos extremos, a guarda é atribuída a um terceiro,
de preferência o parente que demonstre afinidade com o menor.
Os tribunais acham que o melhor interesse da criança é medido pelo apego ou
indiferença a algum dos pais; condições materiais, como alojamento, proximidade
da escola, círculo de amizades, ambiente social, qualidade dos cuidados;
convivência
com
os
irmãos,
que
não
devem
ser
separados.
É necessário esclarecer que a guarda compartilhada não será o remédio milagroso
para a cura dos distúrbios familiares; nem divisão de tempo ou de semana, para
folgança dos pais; não é a intromissão lá e cá, principalmente quando se cuidam de
entidades reconstituídas; não tem lugar quando há mágoas, litígio ou difícil
relacionamento
na
parceria.
Mas uma verdadeira co-gestão na autoridade parental, segundo Rolf Madaleno,
para que os filhos não percam suas referências; ou uma pluralização de
responsabilidades, para Maria Berenice, o que funciona como freio a uma guarda
individual
nociva.
Esse cooperativismo familiar exige que continue a convivência harmoniosa dos pais
separados; que haja um trânsito natural do filho entre dois lares; e transpareça a
convergência de esforços para um processo educacional eficiente e prazeiroso; que
haja diálogo e entendimento cotidianos; e o filho se sinta querido e não alijado da
companhia por desculpas ou banalidades; que preserve a permanente paternidade
ou
maternidade,
sem
invejas
ou
frustrações.
Embora possível custódia em uma única casa ou até prestação de alimentos, a
guarda compartilhada restará para situações restritas que pedem abdicação,
desprendimento e eterno esquecimento das agruras que conduziram à separação; e
onde as ambições devem submeter-se à disciplina do amor maior.
É a prática pedagógica da solidariedade humana e o exílio da soberba.
José Carlos Teixeira Giorgis: desembargador do TJRS, aposentado
Fonte: Espaço Vital
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