Não se aluga uma barriga, isso não existe, aluga-se uma mulher.
Estávamos todos ainda envolvidos nas festas de Natal, misturadas com as preocupações da
crise, quando fomos confrontados com um projecto de lei que pretende alterar a
Regulamentação da Procriação Medicamente Assistida (PMA). Pretende-se que esta passe a
permitir que em Portugal se possa alugar uma mulher durante 9 meses (40 semanas) para ter
um filho que não vai ser dela.
Esta proposta de alteração à lei é altamente discriminatória, diria mesmo ofensivamente
discriminatória.
E discriminatória porquê?
Porque trata uma mulher como algo que pode ser utilizado para fins e benefício de outros.
Preciso duma mulher que tenha um filho que eu quero ter. Alugo uma. E vou exigir que ela
durante 9 meses mude a sua vida em função de mim. Dependente totalmente de mim
Todos sabemos o que implica uma gravidez a todos os níveis. É-se mãe quando nos
confrontamos com o teste positivo de gravidez. Sabemos que vamos mudar drasticamente
durante 40 semanas. Mudam os gostos, alteram-se os cheiros, morre-se de sono, incham os
pés, estica o peito, cresce a barriga. Mas o que é ainda mais evidente é que surgem, em
turbilhão, sensações, emoções, sentimentos, interesses completamente novos e que nos
perturbam na identificação e reconhecimento de nós próprias.
Somos mulheres, mas passamos a ser mulher-mãe. E toda a sociedade nos trata de forma
diferente. Dão-nos prioridade nas caixas, perguntam se é menino ou menina, quando nasce, se
é o primeiro. Falam de quando tiveram filhos também e do que é ser mãe. E tudo isto é
inevitável, não se passa despercebido no café, na rua, no trabalho e na família. Não é como se
nada fosse.
É-se muito mãe durante uma gravidez e transmite-se muito de nós ao bébé durante uma
gestação. É a relação mais íntima que se tem com alguém. Durante todo o tempo de gestação
esse filho está em diálogo com a mãe e manifesta-se através de mil gestos.
A maternidade não acaba no dia do parto. Mesmo que esse seja o dia em que se vai deixar de
ver o filho que se teve. Ou que se vai entregar o filho a quem o encomendou. Mantem-se mais
uns meses até se recuperar fisiologicamente, psicologicamente (não sei se se recupera) mas
ninguém fica igual ao que era antes de ser mãe. Ninguém!
Se existir alguma mãe, que depois de ter um filho, tenha ficado igual ao que era antes, que se
apresente!
Não se tem o direito por questões de jogos políticos e económicos ou outros quaisquer
interesses de brincar com a maternidade e muito menos com a mulher. Legalizar o recurso a
barriga de aluguer é fazer da mulher um objecto utilitário.
Teresa Tomé Ribeiro
Mãe, professora adjunta da ESEP
[email protected]
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Não se aluga uma barriga, isso não existe, aluga