PROBLEMAS DE APRENDIZAGEM POR ESTUDANTES DE GRADUAÇÃO SOBRE LIGAÇÕES QUÍMICAS Me. Júlio César Oliveira da Silva - [email protected] - Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte - Campus Caicó- Nova Caicó, RN-118, CEP 59300-000, Caicó/RN. Dra. Fabiana Roberta Gonçalves e Silva - [email protected] - Professora do Departamento de Química e Biologia, Universidade Tecnológica Federal do Paraná, CEP 80230-901, Curitiba/PR. Dr. Ótom Anselmo de Oliveira - [email protected] - Professor do Departamento de Química, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Caixa Postal 1524 - Campus Universitário Lagoa Nova, CEP 59072-970, Natal/RN. Resumo: Este trabalho teve o objetivo de identificar problemas de aprendizagem em alunos de graduação recém-ingressante na universidade, interpretar a natureza e as causas desses problemas, oferecendo subsídios para superação de tais dificuldades e possibilitando uma aprendizagem significava através da qual o aluno atribua sentido em seu aprendizado. Para o desenvolvimento desse trabalho foi escolhido o tema Ligações Químicas - onde se estudam as forças que agem entre os átomos para formar moléculas, íons compostos ou estruturas cristalinas iônicas -, que se caracteriza como um dos mais importantes assuntos da Química. Para isso, utilizou-se um questionário com cinco perguntas abertas, respondidas por 147 estudantes dos períodos iniciais das graduações em Química da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. As respostas obtidas revelaram insegurança dos estudantes, tanto em termos conceituais quanto de representação, com justificativas superficiais, recorrendo sempre à regra do octeto para descrever modelos de ligações químicas. As observações feitas levam à conclusão de que, para mudanças futuras, é necessário que escolas de ensino médio e dos períodos iniciais nas universidades privilegiem a adoção de métodos pedagógicos contextualizados, aplicando estratégias para superar o ensino memorístico e superficial sobre Ligações Químicas, o que, provavelmente, se aplica ao ensino de outros temas da Química. Palavras-chave: Ligações Químicas, Modelos, Problemas de Aprendizagem, Regra do octeto. 1 INTRODUÇÃO Em pesquisas sobre ensino de química é fundamental que se busque desenvolver mecanismos facilitadores da aprendizagem dos estudantes (NUÑES & RAMALHO, 2004). Neste sentido, muitas dessas pesquisas se voltam para a criação de instrumentos de inquirição capazes de descobrir fragilidades intelectuais e com isso desenvolver estratégias que contribuam para que os discentes possam construir seu aprendizado de forma significativa (AUSUBEL, 1976), (GALAGOSKY & ADURIZ-BRAVO, 2001), (RIBOLDI et al., 2004). A procura de estratégias de ensino, que facilite a construção do aprendizado vem passando por numerosas investigações sobre problemas de aprendizagem no ensino de ciências (MENDONÇA et al., 2006). Em contra partida, observam-se poucas investigações com a finalidade de apurar as concepções dos estudantes sobre ligações químicas em nível de graduação (POSADA, 1999), (POSADA, 1997), especificamente com pesquisas que possam identificar problemas de aprendizagem dos estudantes, oferecendo subsídios teóricos ao professor, para poder desenvolver estratégias de ensino que venham a superar tais problemas e viabilizar a construção de conhecimentos cientificamente corretos. No ensino de Química, o tema Ligações Químicas é adotado nos currículos para alunos no 9º ano do ensino fundamental ou no 1º ano do ensino médio, sendo considerado tema fundamental para o desenvolvimento do conhecimento Químico (CAAMAÑO, 2003), (CAAMAÑO & CASASSAS, 1987), (POSADA, 1999). Neste contexto, a aplicação de instrumentos investigativos é necessária para se conhecer as concepções dos estudantes e perceber a existência de dificuldades e obstáculos no ensino de ligações químicas. Talvez pela imaturidade e, certamente, pela falta de vivência, esses alunos frequentemente apresentam explicações diferentes daquelas que seriam aceitáveis cientificamente, com concepções alternativas que muitas vezes são geradas quando se trata de temas abstratos, diferentes das experiências cotidianas (FERNANDEZ & MARCONDES, 2006). Um pressuposto para a aprendizagem é que os estudantes sejam capazes de desenvolver o raciocínio abstrato da observação para a formulação de modelos (GALAGOSKY & ADURIZ-BRAVO, 2001). Isso é necessário porque a maior parte dos conceitos químicos é de natureza abstrata, e a sua compreensão necessita que os estudantes tenham capacidade de imaginar e modelar partes para poder incorporá-las mentalmente (MENDONÇA et al., 2006). Em resultados de pesquisas sobre as concepções referentes às ligações químicas expostas pelos estudantes, destacam-se como principais constatações: confusão entre ligação iônica e covalente, antropomorfismo, dificuldade de representar a diferença entre ligação iônica e covalente pela Estrutura de Lewis, compreensão sobre as energias das ligações químicas e considerar a regra do octeto como uma das principais explicações para interpretar as ligações químicas e as reações (FERNANDEZ & MARCONDES, 2006). Mortimer e colaboradores (MORTIMER, 1994), (MORTIMER, 1996) verificaram que existe a tendência entre os estudantes em considerar a regra do octeto como única resposta para a formação da ligação química e, consequentemente, explicar as propriedades e mudanças das substâncias. Mortimer (MORTIMER, 1994) ressalta a simplificação das respostas dos estudantes tendo como ponto fundamental apenas a regra do octeto como um “dogma” inabalável até mesmo por evidências experimentais (E que esta “crença” não é abalada facilmente nos alunos por evidências experimentais). A maior parte do conhecimento dos discentes (ou de qualquer outro indivíduo) provém do seu cotidiano, e muitas vezes o conhecimento formal é compreendido com base nesse conhecimento, o que pode ser positivo ou não (RIBOLDI et al., 2004). Assim, cabe ao professor a tarefa de desenvolver estratégias de ensino que tenha como ponto de partida o diaa-dia dos estudantes, mas amplie a compreensão do senso comum sobre os fenômenos, com a inclusão de significados produzidos em termos científicos, de modo que o aprendizado possa ser gradativo e participativo, para que os estudantes se tornem aptos a dar sentido ao que se aprende (GALAGOSKY & ADURIZ-BRAVO, 2001). Com o trabalho ora apresentado procurou-se contribuir como uma ferramenta, que possa ser parte das estratégias desenvolvidas por professores na orientação de um processo de ensino mais significativo para os estudantes, sobre ligações químicas. 2 METODOLOGIA A pesquisa foi realizada com a aplicação de um questionário investigativo, respondido por alunos de graduação dos dois períodos iniciais do curso de Química da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Licenciatura e Bacharelado em Química e do Bacharelado em Química do Petróleo. A opção por questionário escrito foi feita para possibilitar a coleta de dados de um número significativo de alunos de forma rápida. Por outro lado, a opção por alunos do curso de Química da UFRN, ocorreu por ser o local de curso de pós-graduação de um dos pesquisadores e a opção sobre o tema ocorreu por existirem poucos trabalhos investigativos dessa natureza sobre Ligações Químicas nesse nível de ensino. Em termos de metodologia, a pesquisa foi dividida em duas etapas, em que a primeira foi à escolha do instrumento de investigação para analisar os problemas de aprendizagem por estudantes de graduação sobre o conteúdo de ligações químicas. O critério utilizado foi à escolha de um instrumento já validado por outro autor, que apresentasse questões abertas para a interpretação livre dos estudantes, permitindo assim mais liberdade para expressar sua opinião. Com essa premissa, foi escolhido o artigo: Concepciones de los alumnos sobre El enlance químico antes, durante y después de La ensenãnza formal. Problemas de aprendizaje, de José Maria de Posada de 1999, (POSADA, 1999). O questionário utilizado nesta pesquisa – apresentado no Apêndice A – foi constituído por cinco perguntas escritas, questões abertas, possibilitando que o aluno desenvolvesse livremente, tanto suas concepções adquiridas no ensino formal, cursos pré-vestibulares, primeiros períodos da graduação e o próprio cotidiano do aluno. O questionário foi aplicado aos estudantes do curso de graduação em Química dos períodos inicias, em que não existe distinção entre as modalidades de: bacharelado, licenciatura e química do petróleo, turmas mistas, com objetivo de possibilitar uma análise mais abrangente do nível de conhecimento desses discentes sobre o tema de ligações químicas. A segunda etapa dessa investigação constituiu da aplicação do questionário, seguida da análise das respostas dadas pelos 147 estudantes pesquisados, com faixa etária entre 17 a 25 anos. Por imposição da cronologia estabelecida na programação da pesquisa, a primeira fase de aplicação do questionário ocorreu no segundo semestre de 2009, em 13 de novembro de 2009, sendo respondido por estudantes do segundo período, que já haviam estudado ligações químicas na disciplina Química Fundamental II. A aplicação do questionário aos alunos do primeiro período do curso foi realizada no dia 26 de março de 2010 nas turmas que estavam cursando a Química Fundamental I, e ainda não tinham estudado o tema de Ligações Químicas em nível de graduação. O tempo de aplicação foi de aproximadamente trinta minutos, e antes da entrega dos questionários em cada turma, foi feita uma explanação sobre os objetivos do trabalho que estava sendo desenvolvido e sobre a importância da participação dos estudantes, apresentando suas respostas com clareza e seriedade, mas sem preocupação com acertos e erros, que tratassem com naturalidade, sendo informado também que os questionários não seriam identificados, havendo concordância dos estudantes em participar da pesquisa. Terminado a execução em todas as turmas, a análise dos questionários foi realizada a partir da leitura cuidadosa das respostas dos estudantes, identificando padrões comuns de respostas, agrupando as respostas em categorias, como está mostrado nos gráficos dos resultados e discussão. Foi elaborado uma planilha na plataforma microsoft Excel, com todas as perguntas do questionário sociocultural, e das cinco questões, para facilitar o exame dos questionários. A categorização das respostas do questionário foi analisada de forma a ter um parâmetro de resposta coerente com o que se pedia. Foram determinadas as respostas aproximadas, por exemplo: um aluno respondeu na quinta questão que ligações iônicas são ligações entre metal e ametal, enquanto outro aluno respondeu para a mesma questão que ligações iônicas ocorriam entre metal e não metal, sendo as duas consideradas como respostas iguais. 3 RESULTADOS E DISCUSSÃO A primeira questão envolve a elaboração de desenhos para representar os átomos de oxigênio, de modo a esclarecer como os estudantes compreendem a estabilidade dos átomos, natureza da ligação covalente, estrutura interna dos gases e ligações intermoleculares em compostos com ligações covalentes. O objetivo desta questão é verificar se os estudantes compreendem que, nas condições normais de temperatura e pressão, não existem átomos de oxigênio na forma elementar, só existindo em sua forma molecular, nesse caso específico, combinado com outro átomo de oxigênio. Formando uma ligação e gerando uma substância cuja energia é sempre menor do que a soma das energias que os dois átomos teriam se permanecessem separados (OLIVEIRA & FERNANDES, 2006). É uma questão que propicia o estudante a expor sua competência em diferenciar o átomo estudado separadamente na forma elementar e como encontramos os elementos na natureza. Também, que os alunos compreendessem que, se os átomos estão separados, têm maior energia e são instáveis, tendem a se unir e ao final do processo diminuir sua energia livre (para ligações tendendo a ser mais iônicas), ou interação coulômbica entre dois elétrons e os núcleos (para ligações tendendo a ser mais covalentes), formando moléculas do gás oxigênio, pois não existem na natureza átomos separados, com exceção dos gases nobres (ATKINS & JONES, 2006), (BROWN et al., 2005). Para melhor entendimento, a 1ª questão foi dividida em parte 1A, 1B e 1C. A parte 1A analisa como os estudantes representam os átomos no recipiente através de desenhos. O modelo considerado como resposta coerente ocorrerá se o aluno desenhar um recipiente fechado, com pequenas bolas ou pequenos pontos isolados, soltos dentro do recipiente, podendo colocar setas como se estivessem tendendo a se unir umas as outras (POSADA, 1999), (POSADA, 1997). O diagrama do resultado das respostas da 1ª questão - parte 1A está apresentada na Figura 01. Aproximadamente 57% dos estudantes não apresentaram um modelo, deixando a resposta em branco, tendo dificuldade de percepção abstrata em escala microscópica, dificuldade esta ocorrida por não conceberem a representação do átomo no estado elementar, ou seja, o átomo isolado. Como nos resultados encontrados por Caamaño e Casassas (CAAMAÑO & CASASSAS, 1987), em situação equivalente a esta pesquisa, torna evidente que existe um número significativo de alunos que não conseguem reconhecer os átomos isolados, os estudantes não conseguem descrever os modelos aceitos cientificamente para representar os átomos, usando uma concepção microscópica. Figura 01: Diagrama dos resultados das respostas da 1ª questão - parte 1A. REPRESENTAÇÃO DOS ÁTOMOS NO RECIPIENTE PORCENTAGEM DOS ESTUDANTES 57,14% 60,00% 50,00% 40,00% NÃO DESENHOU 30,00% 22,45% ÁTOMOS JUNTOS 20,41% ÁTOMOS DISTANTES 20,00% 10,00% 0,00% 1 TOTAL DE 147 ESTUDANTES Apenas 30 estudantes, 20,41%, Figura 01, de acordo com a pergunta, compreenderam que os átomos estariam separados e tenderiam a se unir para a formação das moléculas do gás oxigênio. Alguns mostraram setas representando a tendência da união dos átomos. Uma das explicações equivocadas dada por um aluno para a 1ª questão está apresentada na Figura 02. Figura 02: Uma das explicações para a união dos átomos pela regra do octeto. Na 1ª questão, parte 1B pede-se que o estudante, após desenhar os átomos no recipiente, justifique se os átomos estarão estáveis ou não, nesse caso o aluno teria que justificar que os átomos isolados tendem a unir-se, diminuindo sua energia livre e adquirindo estabilidade. Considera-se a resposta correta se o estudante compreender que os átomos de oxigênio não estão estáveis. O oxigênio nas condições normais de temperatura e pressão, CNTP, é encontrado no estado gasoso, formando moléculas diatômicas de forma molecular O2. Devido a sua elevada afinidade eletrônica, o oxigênio diminui sua energia combinando-se, nesse caso, com outro átomo de oxigênio, como consequência, diminuindo sua energia e se estabilizando (ATKINS & JONES, 2006), (OLIVEIRA & FERNANDES, 2006). Figura 03: Diagrama dos resultados das respostas da 1ª questão - parte 1B. QUANTO A ESTABILIDADE DOS ÁTOMOS NO RECIPIENTE PORCENTAGEM DOS ESTUDANTES 45,00% 40,00% 35,00% 40,14% 34,69% 30,00% 25,17% 25,00% NÃO RESPONDEU NÃO ESTÃO ESTÁVEIS 20,00% ESTÃO ESTÁVEIS 15,00% 10,00% 5,00% 0,00% 1 TOTAL DE 147 ESTUDANTES Na figura 03, observa-se que cerca de 35% dos alunos responderam corretamente que átomos de oxigênio não são estáveis e tendem a unir-se. Estes alunos compreenderam que as substâncias encontradas na natureza, neste caso, estão na forma molecular, de forma que, compreenderam que os átomos de oxigênio em seu estado fundamental são instáveis e, portanto, bastante reativos. Observa-se que 37 estudantes, correspondendo a 25%, responderam que os átomos separados são estáveis, cometendo um erro significativo, e se tratando de estudantes universitários, os estudantes ainda não sabem que átomos separados não são estáveis, com exceção dos gases nobres. Na 1ª questão, parte 1C, após o aluno desenhar os átomos no recipiente, pede-se que justifique a resposta anterior, quanto à estabilidade do átomo. Nesse caso considera-se a justificativa correta se o aluno descrever que os átomos de oxigênio não estão estáveis, pois os átomos de oxigênio estão com alta energia potencial e reticular, e que para diminuir essa energia o átomo liga-se a outro, formando moléculas diatômicas O2 (OLIVEIRA & FERNANDES, 2006). Na 1ª questão parte 1C, os alunos limitaram a explicar a ligação somente pela regra do octeto, que os átomos estabilizariam quando completassem a camada de valência com oito elétrons (MORTIMER, 1994), (MORTIMER, 1996). Figura 04. Diagrama dos resultados das respostas da 1ª questão – parte 1C. PORCENTAGEM DOS ESTUDANTES QUE JUSTIFICARAM A UNIÃO DOS ÁTOMOS 70,00% 63,64% 60,00% 50,00% 36,36% 40,00% SATISFAZER A REGRA DO OCTETO DIMINUIR SUA ENERGIA 30,00% 20,00% 10,00% 0,00% 1 TOTAL DE 33 ESTUDANTES Como mostrado na Figura 04, dos 33 alunos que responderam que os átomos tenderiam a se unir, 21 explicaram que a união ocorreria para satisfazer a regra do octeto, confirmando o que Mortimer (MORTIMER, 1994) encontrou em seus resultados, evidências do caráter dogmático existente no ensino de química. Apenas 12 alunos responderam corretamente, que a união seria para diminuir a energia livre. Nem todos os alunos completaram a 1ª questão. Na parte 1A, 66 alunos desenharam, apresentaram um modelo do recipiente contendo os átomos de oxigênio. Na parte 1B, 88 estudantes responderam quanto à estabilidade e na parte 1C, apenas 33 estudantes indicaram que pode ocorrer à união dos átomos para a formação de moléculas. A 2ª questão foi dividida em parte 2A e 2B para melhor entendimento. A parte 2A analisa como os estudantes explicariam a formação da ligação entre os átomos de flúor. E a parte 2B investiga, na mesma questão, as ligações intermoleculares entre as moléculas de flúor. Na figura 05 são mostrados os resultados obtidos na 2ª questão – parte 2A. A questão refere-se ao tipo de ligação química entre os átomos de flúor. Apenas 70 estudantes, 48%, responderam corretamente que os átomos estão ligados predominantemente por ligação covalente. Figura 05. Diagrama dos resultados das respostas da 2ª questão – parte 2A. QUAL O TIPO DE LIGAÇÃO PORCENTAGEM DOS ESTUDANTES 60,00% 51,70% 50,00% 47,62% 40,00% NÃO RESPONDERAM 30,00% LIGAÇÃO COVALENTE LIGAÇÃO IONICA 20,00% 10,00% 0,68% 0,00% 1 TOTAL DE 147 ESTUDANTES Uma grande quantidade de estudantes não respondeu a questão, 76 alunos, 51,7% do total, sendo um dado preocupante. Com esses dados pode-se comparar com os problemas de aprendizagem apontados no artigo de Fernandez (FERNANDEZ & MARCONDES, 2006), segundo esses autores uma das causas é a dificuldade de diferenciar entre uma ligação iônica e covalente e que “átomos de elementos com alta afinidade eletrônica tendem a unir-se através da ligação iônica”, pois para os alunos uma ligação covalente é mais fraca que a iônica. Quanto às forças intermoleculares que ligam as moléculas de Flúor, parte 2B, investigado na mesma questão, apenas 10 estudantes, cerca de 7% deles, acertaram, Figura 06. Um dado novamente preocupante é que 120 alunos, 82% do total de questionários aplicados, não explicaram sobre as forças que atuam entre os átomos - intermoleculares - não entenderam o que são as ligações intermoleculares e, consequentemente, não distinguem entre ligações intra e intermolecular. Figura 06: Diagrama representacional dos resultados das respostas da 2ª questão – parte 2B. QUAL O TIPO DE LIGAÇÃO INTERMOLECULAR PORCENTAGEM DOS ESTUDANTES 90,00% 81,63% 80,00% 70,00% 60,00% NÃO RESPONDERAM 50,00% REGRA DO OCTETO 40,00% FORÇA DE LONDON DIPOLO-DIPOLO 30,00% 20,00% 10,00% 7,48% 6,80% 4,08% 0,00% 1 TOTAL DE 147 ESTUDANTES Se comparado com os dados analisados com o artigo de Petersont (PETERSON et al., 1989), os alunos confundem ligações intermoleculares com ligações intramolecular (FERNANDEZ & MARCONDES, 2006). A figura 06 mostra como os alunos descrevem as forças intermoleculares somente para satisfazer a regra do octeto. Na figura 07 são apresentados os resultados da 3ª questão, em que é investigado se os alunos estão aptos para representar, a partir do símbolo de Lewis, as ligações entre os átomos para a formação de moléculas. Para que os resultados apresentados ficassem mais claros, as respostas foram analisadas para cada composto separadamente. No composto KCl, apenas 15 alunos, 15,2%, representaram corretamente e os 108 alunos que erraram, 73% do total, representaram o composto com uma linha entre os símbolos de Lewis, como se a ligação fosse predominantemente covalente. Comparamos os resultados analisados nesta pesquisa com as principais dificuldades dos estudantes apontados no artigo de Fernandez (FERNANDEZ & MARCONDES, 2006), em que os estudantes apresentam muita dificuldade em explicar a natureza da ligação química entre os átomos. Figura 07. Diagrama representacional dos resultados das respostas da 3ª questão. ESTRUTURA DE LEWIS PARA AS SEGUINTES SUBSTÂNCIAS PORCENTAGEM DOS ESTUDANTES 80% 73% 70% 60% 54% 48% 50% 35% 40% ERRADO 26% 30% 20% CORRETO 37% 37% 33% 16% 16% EM BRANCO 13% 10% 10% 0% KCl N2 HCl Ca TOTAL DE 147 ESTUDANTES Com relação à representação de uma ligação covalente, percebe-se que há certa facilidade na representação, pois o HCl foi corretamente representado por 80 alunos, 54%. Percebe-se pelos resultados que os estudantes têm dificuldade de representar ligações triplas como na molécula de N2. Apenas 54 dos estudantes souberam representar o símbolo de Lewis para o átomo de Cálcio no seu estado fundamental, sem nenhum tipo de ligação. Desses resultados, conclui-se que uma quantidade significativa de alunos ainda apresenta dificuldade e falta de familiaridade na representação das Estruturas de Lewis. A 4ª questão, cujos resultados estão apresentados na figura 08, analisa a capacidade de observação dos alunos, os quais poderão explicar que os átomos tendem a diminuir sua energia após ligar-se a outro átomo, formando moléculas para estabilizar energeticamente. De acordo com os resultados obtidos, 80 estudantes, 54%, responderam corretamente, que os átomos tendem a se estabilizar para diminuir sua energia. No entanto 25 alunos, 17%, ainda explicaram a estabilização na formação das moléculas para satisfazer como consequência a regra do octeto, razão determinante em que os átomos estabilizam-se a partir da transferência e ou compartilhamento de elétrons na camada de valência para completar o octeto. Figura 08. Diagrama representacional dos resultados das respostas da 4ª questão. JUSTIFICATIVA DOS ESTUDANTES PARA A FORMAÇÃO DAS MOLÉCULAS PORCENTAGEM DOS ESTUDANTES 60,00% 54,42% 50,00% 40,00% 28,57% 30,00% 20,00% 17,01% ADQUIRIR ESTABILIDADE OBEDECE A REGRA DO OCTETO EM BRANCO 10,00% 0,00% 1 TOTAL DE 147 ESTUDANTES Os erros apontados por Fernandez (FERNANDEZ & MARCONDES, 2006), também foram verificados nesta pesquisa, no caso mais específico esta 4ª questão os alunos explicam de forma errônea que a união dos átomos para a formação de compostos, seja molecular ou iônica, simplesmente acontece para satisfazer a “regra do octeto”. Não compreendendo que a regra não explica por que ocorre a ligação, sendo a regra apenas um fato observado em ligações de compostos mais simples (ATKINS & JONES, 2006), (BROWN et al., 2005). Os resultados da 5ª questão estão expostos na figura 09, que serviu para avaliar como os alunos definem as ligações iônicas e covalentes. A maioria dos estudantes respondeu pela diferença de energia de ionização e afinidade eletrônica (ou seja, a eletronegatividade), caracterizando os elementos como metal e não metal, em que uma ligação iônica ocorre pela transferência e doação de elétrons na formação do composto iônico. Alguns deles responderam que a ligação covalente ocorre através do compartilhamento de elétrons na camada de valência, sendo uma ligação entre um não metal e um não metal. Todos os 104 alunos definiram, tanto a ligação iônica como covalente, do ponto de vista simplificado tal como visto no ensino médio, quase todos os estudantes explicaram um não metal, como ametal, atualmente os livros didáticos de graduação utilizam a nomenclatura de não metal. Figura 09. Diagrama representacional dos resultados das respostas da 5ª questão. QUAL A DIFERENÇA ENTRE A LIGAÇÃO IÔNICA DA LIGAÇÃO COVALENTE? PORCENTAGEM DOS ESTUDANTES 50% 45% 40% 35% 30% 25% 20% 15% 10% 5% 0% 46% 45% TRANSFERENCIA DE ELÉTRONS 29% 21% METAL MAIS NÃO METAL COMPART. DE ELÉTRONS 21% NÃO METAL MAIS NÃO METAL OUTROS 5% 1%0% 1%0% LIGAÇÃO IÔNICA EM BRANCO 3% LIGAÇÃO COVALENTE EM BRANCO TOTAL DE 147 ESTUDANTES A ligação covalente acontece pelo compartilhamento de elétrons. 31 alunos, 21%, responderam que as ligações químicas ocorrem pela diferença entre metais e ametais na formação do composto, para diferenciar uma ligação iônica da ligação covalente, e que a junção de um metal a um “ametal” caracteriza uma ligação iônica e a junção entre dois “ametais” ocorre uma ligação covalente. Na figura 09, observa-se que um número significativo de estudantes soube diferenciar uma ligação iônica da ligação covalente, no entanto de forma superficial. Encontra-se na Figura 10 umas das respostas que explica a diferença da ligação iônica e covalente através da transferência e compartilhamento de elétrons, respectivamente. Figura 10. Um dos questionários com resposta mais encontradas entre os estudantes. A seguir apresentamos a figura 11, que é um diagrama que compara os alunos de Química Fundamental I, que corresponde aos alunos do primeiro período, e os alunos de Química fundamental II, correspondendo a alunos do segundo período, como foi desenvolvido na metodologia. Essa comparação entre períodos é para ter uma análise de como os alunos desenvolvem suas explicações de acordo com o nível de escolaridade, em que se encontram aqueles que tiveram o ensino de ligações químicas no ensino médio, dos alunos que já estudaram esse mesmo tema na graduação. Como trabalho realizado por Posada (POSADA, 1999), existe diferença entre os níveis de estudo, como era de se esperar, pois os estudantes de Química Fundamental II, que já tinham estudado o Tema de Ligações Químicas em nível de graduação, tiveram no geral melhor desempenho tanto no número de respostas corretas quanto nas explicações apresentadas. Mesmo assim, esses estudantes ainda tiveram algumas explicações fora do que é considerado cientificamente correto. Figura 11: Diagrama da diferença de desempenho dos alunos entre períodos. Os alunos do primeiro período - Química Fundamental I – apresentaram explicações claramente macroscópicas ao mundo atômico, responderam na maioria dos casos de forma superficial, não desenvolvendo justificativas em nível atômico, diferente dos estudantes do segundo período, estes desenvolveram melhores explicações a nível microscópico, evidencias equivalentes àquelas apresentadas por Posada (POSADA, 1999), em seu trabalho e também o que analisamos nesta pesquisa encontrou que à medida que aumenta o nível de estudo dos alunos, diminuem as explicações a nível macroscópico. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS De acordo com os resultados obtidos no questionário investigativo, percebemos alguns obstáculos que ainda surgem com alunos já na graduação, problemas de aprendizagem e muitas vezes a solidez de noções claramente macroscópicas ao mundo atômico (FERNANDEZ & MARCONDES, 2006), (FRANÇA et al., 2009). Mesmo com um nível mais elevado de conhecimento, alguns ainda têm dificuldade de diferenciar um átomo no estado elementar de molécula, como observado nos dados analisados na 1ª questão, outros têm dificuldade de analisar e diferenciar ligações intramoleculares de ligações intermoleculares, apresentados na 2ª questão (POSADA, 1999), (POSADA, 1997). Os estudantes utilizam a regra do octeto para explicar quase todos os fenômenos que envolvem as ligações químicas e ligações intermoleculares, negligenciando a energia de ionização e afinidade eletrônica (DUARTE, 2001), (TOMA, 1997), característico de cada elemento e suas particularidades, para explicar a estabilidade das substâncias. Isto ocorre devido à tendência generalizada no ensino de química em atribuir à formação do octeto como sendo o fator mais importante (MORTIMER, 1994). 5 REFERÊNCIAS ATKINS, P.; JONES, L. Princípios de Química: questionando a vida moderna e o meio ambiente. Trad. Ricardo Bicca de Alencastro. 3.ed. 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DEPARTAMENTO DE QUÍMICA Programa de Pós-Graduação em Química Pesquisa em Ensino de Química QUESTIONÁRIO: Este questionário não é uma avaliação das disciplinas de Química, mas uma pesquisa sobre as concepções alternativas dos estudantes sobre alguns temas da área de Química. Pedimos que responda a cada questão de modo sincero e exponha de forma clara suas idéias. O questionário é anônimo, mas necessitamos que nos forneça alguns dados a fim de poder trabalhar melhor. Por favor, não omita nenhuma pergunta. Sexo: ____Idade: __________ Ano de ingresso:______________ Matéria que cursa: _____________Ou cursou: ______________________ Em que nível de ensino começou a estudar Química? _____________ Com quantos anos? _______________ Estudou o ensino médio em escola: ( ) Pública ( ) Privada. Terminou o ensino médio com quantos anos: _______________ 1ª Questão: Suponha, por um momento, que você tem uma garrafa cheia de átomos de oxigênio (apenas gás no recipiente, não há uma única molécula). Desenhe, em escala atômica, os átomos. Justifique se será estável ou não. O que pode acontecer? 2ª Questão: A molécula de Flúor (F2) é diatômica (constituída por dois átomos de flúor). Indique como podem ser unidos os dois átomos. Discuta sobre a interação entre estas moléculas de Flúor. 3ª Questão: Faça a estrutura de Lewis para as seguintes substâncias, nas CNTP. KCl; N2; HCl; Ca 4ª Questão: Por que os átomos se unem para formar moléculas? 5ª Questão: Qual a diferença entre uma ligação iônica e uma ligação covalente? CHEMICAL BONDS LEARNING PROBLEMS ON UNDERGRADUATE STUDENTS Abstract: This research aims at identifying the learning problems in newly undergraduate students at university, interpreting the nature and causes of these problems, offering subsidies to overcome these difficulties and enabling a meaningful learning through which students give meaning to their learning. As an object for this work was chosen the theme Chemical Bonds - where were studied the forces between atoms to form molecules, compound ions and ionic crystalline structures - and is characterized as one of the most important subjects of Chemistry. In research, it was used a questionnaire with five open questions, answered by 147 students from the early periods of degrees in Chemistry at Universidade Federal do f Rio Grande do Norte. The answers revealed uncertainty on the part of students, both conceptual and representation, with superficial justifications, always using the octet rule to describe models of chemical bonds. These observations have led to the conclusion that for future changes, it is necessary for high schools and in the early periods in universities favoring the adoption of pedagogical approaches in context and applying strategies to overcome the teaching of superficial memorization on Chemical Bonds, which probably have applied to the teaching of other subjects of chemistry. Key - Words: Chemical Bonds, Models, Learning disability, Octet rule.