B O L E T I M NÚMERO DO DIA OFERECIMENTO US$ 150 mi Q U I N TA - F E I R A , 2 8 D E M A I O D E 2 0 1 5 foram desviados por corrupção pelo futebol nas Américas, segundo a Justiça americana EDIÇÃO • 264 Escândalo no futebol levará a revisão de contratos de TV POR ADALBERTO LEISTER FILHO, DUDA LOPES, ERICH BETING E PRISCILA BERTOZZI O estouro de um escândalo de corrupção envolvendo diversos dirigentes de alto escalão do futebol nas Américas do Sul, Central e do Norte deve ter, como primeira consequência para o mercado, a renegociação dos direitos de TV das principais competições que são organizadas pela Conmebol e pela Concacaf, entidades que controlam o futebol nas Américas. Isso tudo, porém, deve ocorrer após a realização da Copa América, no Chile, entre 11 de junho e 4 de julho próximos. Segundo fontes do mercado ouvidas pela reportagem, a tendência é que a Traffic, uma das empresas que tem colaborado com as investigações da Justiça americana, perca boa parte dos acordos que têm com a Conmebol e a Concacaf. A Traffic e seu dono, J. Hawilla, estão no centro do escândalo. O empresário concordou em pagar US$ 151 milhões para atenuar as acusações envolvendo seu nome e suas empresas nos Estados Uni- DIRIGENTES DA CONMEBOL E DA CONCACAF, EM 2012, QUANDO DECIDIRAM A COPA AMÉRICA DE 2016, INVESTIGADA NOS EUA dos. Além disso, Hawilla tem dito às autoridades como funcionava o esquema de pagamento de propina a dirigentes para a assinatura de contratos e, também, quem eram os principais operadores dos esquemas nas Américas. A saída da Traffic do mercado deixaria vagos os direitos de se comercializar a Copa América e, também, parte da Libertadores. Além disso, os direitos de transmissão sofreriam uma enorme reviravolta, já que boa parte dos negócios é gerida pela agência. 1 Entre os indiciados pela Justiça dos Estados Unidos estão dois executivos que comandaram a Traffic USA, braço americano da agência de marketing esportivo: Aaron Davidson e Enrique Sanz. Até agora, a prisão de sete alto dirigentes do futebol, entre eles o ex-presidente da CBF José Maria Marin, não gerou nenhuma mudança nos acordos comerciais envolvendo Copa América, Copa Ouro, Libertadores e Sul-Americana, torneios que foram citados pela Justiça dos Estados Unidos. Municiada pelos EUA, PF faz busca em agência ligada à CBF POR REDAÇÃO Era início da manhã do dia 27 no Brasil quando a polícia suíça prendeu sete dirigentes esportivos acusados de corrupção pela Justiça americana. No início da noite, a Polícia Federal do Brasil deu sequência às investigações americanas e fez busca e apreensão de materiais na agência de marketing esportivo Klefer, parceira da CBF, no Rio de Janeiro. As buscas foram feitas após o Departamento de Justiça dos Estados Unidos municiar a PF brasileira com detalhes das denúncias feitas pelo empresário J. Hawilla no acordo para atenuar as penas em troca da delação do esquema de corrupção ligado ao futebol. A Klefer foi acusada de pagar propina para assegurar os direitos de comercialização da Copa Sadia do Brasil de 2015 a 2022. Seu dono, Kleber Leite, negou a acusação e creditou a acusação feita por Hawilla nos EUA a um problema de saúde dele. “Jamais usamos deste expediente para obtenção de qualquer contrato ao longo dos 32 anos de vida da Klefer. Talvez por isso, tenhamos um tamanho normal para uma empresa de marketing esportivo. Soube que neste período, J. Hawilla passou por momentos difíceis em função de grave doença. Provavelmente, pelo que ouço e leio, a cabeça dele deve ter sido afetada. A cabeça, o caráter e, principalmente, o sentimento de gratidão. Lamentável!!! Que fim de vida...”, 2 afirmou Leite em comunicado. O executivo, que já foi presidente do Flamengo, diz ter colocado a empresa à disposição das autoridades nas investigações. Além da Klefer, a PF tem mandado de busca e apreensão na sede da CBF. Mas, até o fechamento desta edição, a polícia não havia feito uso do mandado para pegar documentos na entidade. Entre empresas, apenas Visa peita e ameaça deixar a Fifa POR REDAÇÃO A maior parte dos patrocinadores da Fifa e da Copa do Mundo da Rússia-2018 reagiu de modo cauteloso em relação ao escândalo de corrupção na entidade. A Visa foi a exceção, ao pedir providências imediatas da Fifa e afirmar que irá “reavaliar” o patrocínio. Coca-Cola e Adidas também se posicionaram. A empresa de bebidas admitiu que a imagem do futebol ficou manchada com a detenção de sete dirigentes. Mas diz que con- fia que a Fifa irá apoiar as investigações. Já a marca de material esportivo diz que apoia a entidade em seguir “padrões transparentes”. Gazprom e Hyundai-KIA não comentaram o assunto. Entre os patrocinadores da próxima Copa do Mundo, Bud e McDonald’s também foram prudentes em suas notas oficiais. A única empresa citada, mesmo que indiretamente, foi a Nike, que teria pago propina a Ricardo Teixeira por meio da Traffic. O comunicado do Departamento de Justiça dos EUA, diz que “outro esquema investigado está relacionado ao pagamento e recebimento de subornos e propinas ligadas ao patrocínio de uma grande empresa americana de material esportivo com a CBF”. A empresa afirmou que irá cooperar com as investigações, defendendo o bem do futebol. Veja abaixo parte dos comunicados de cada marca sobre o escândalo dentro do futebol. AS REAÇÕES DAS MARCAS “Nosso desapontamento e preocupação em relação à Fifa com a evolução dos acontecimentos de hoje é profundo. Esperamos que a Fifa tome medidas rápidas e imediatas para resolver questões internas da organização”. “Essa longa polêmica manchou a missão e os ideais da Copa do Mundo e temos repetidamente expressado nossa preocupação sobre essas sérias acusações. Esperamos que a Fifa continue tratando dessas questões”. “Após as notícias de hoje, só podemos encorajar a Fifa a continuar estabelecendo e seguindo padrões transparentes de procedimento em tudo o que fazem. Queremos criar uma cultura que promova o padrão ético”. “Esperamos que todos nossos parceiros mantenham fortes padrões éticos e ajam com transparência. Continuamos acompanhando de perto a situação através de nossas comunicações com a Fifa”. “O McDonald’s leva questões de ética e corrupção muito a sério, e as informações são extremamente preocupantes. Estamos em contato com a Fifa sobre esse assunto e vamos continuar acompanhando a situação de perto”. “Como todos os nossos fãs pelo mundo, nós somos apaixonados pelo jogo e estamos preocupados com essas acusações muito sérias. A Nike acredita fortemente em ética e fair play tanto nos negócios como no esporte”. 4 D A R E D A Ç Ã O Indústria do futebol tem uma chance única para se reinventar POR ERICH BETING diretor da Máquina do Esporte O dia 27 de maio pode se tornar histórico para a indústria do futebol. Pela primeira vez prenderam-se dirigentes de futebol pelos abusos que são cometidos por eles praticamente desde que se chutou a primeira bola. O que ocorreu na quarta-feira tende, porém, a ser pouco perto do que pode se desenrolar do caso. Se o escândalo subir as escadarias da Fifa, o futebol terá pela frente uma chance única de vivenciar a reinvenção. A fórceps, como costumam ser as mudanças no mercado da bola, mas uma profunda e necessária transfor- mação na cadeia produtiva do futebol, esporte que mais mobiliza pessoas e, naturalmente, dinheiro. Se as lideranças que hoje estão no mundo da bola forem, uma a uma, sendo extraditadas para uma prisão no “Padrão Fifa”, o futebol terá de, à força, reciclar seus dirigentes. E isso tem uma ligação direta com o perfil de quem trabalha no mercado. Muito do que se estourou no escândalo que tem J. Hawilla na delação premiada é sabido, há tempos, como prática de mercado. Mas será que não há outro meio de se fazer negócio com o esporte sem ser de forma escusa? Será que o futebol não poderia ser maior do que é se as empresas jogassem limpo em vez de se submeterem ao suborno? É possível ser honesto e bem sucedido profissionalmente. As marcas não precisam pagar por fora para ter um bom negócio. Essa ainda parece ser a regra em boa parte da vida. E, pelo visto, é esse o maior legado do escândalo desenvolvido pelo FBI. O futebol terá de se repensar como estrutura. Isso obriga, de fato, a se ver e agir como uma indústria. Envolvida em denúncias, CBF diz que vai rever contratos e “culpa” gestão Teixeira POR DUDA LOPES José Maria Marin e Marco Polo Del Nero passaram os últimos dois anos quase sempre juntos após a renúncia do antigo presidente da Confederação Brasileira de Futebol, Ricardo Teixeira. Agora, o atual chefe da entidade, Del Nero, quer distância de seus antecessores. Após a prisão de José Maria Marin, na Suíça, a CBF logo de pronunciou. A entidade se colocou a favor das investigações e fez questão de ressaltar que, a partir da gestão de Del Nero, há “compromisso com a verdade e a transparência”. Em entrevista à “Folha de S.Paulo”, Del Nero foi além. Admitiu que os escândalos são “péssimos” para a imagem da CBF, mas ligou Teixeira às denúncias desta quarta-feira. “São contratos firmados antes da administração de Marin”. A referência do dirigente está nas acusações da FBI que relatam corrupção em acordos 5 comerciais da entidade. Nas negociações envolvendo patrocinadores, entre eleas a Nike, haveria pagamento de suborno aos dirigentes. “A entidade aguardará, de forma responsável, sua conclusão, sem qualquer julgamento que previamente condene ou inocente”, diz a CBF. Sem seu nome citado diretamente, por ora, Del Nero tem tentado se desvencilhar dos escândalos. O dirigente, no entanto, foi o presidente em exercício da entidade quando Marin, que era um dos vices de Ricardo Teixeira, assumiu o poder.