Justiça Em Ilhavo, a GNR deteve uma mãe que conduzia, com os quatro filhos no carro, com 2,27 g/l de álcool no sangue. Em Lagos, a uma outra mulher, também com os dois filhos na viatura, foi detectada uma taxa de alcoolemia de 1 ,46. Em ambos os casos as crianças foram temporariamente retiradas à família. Será a melhor forma de as autoridades lidarem com estas situações? O i tentou encontrar respostas textos Marta F.Reis infograha Carlos F. 'Monteiro Pais com álcool no sangue e filhos no carro deviam ser sinalizados Em 1 5 dias duas mães foram apanhadas filhos, com taxas que configuram a guiar alcoolizadas crime. Que lições tirar? Dados da Comissão Nacional de Protecção de Menores revelam que em 2013 estavam sinalizados 132 menores por exposição a álcool com os MARTA F. REIS mana. [email protected] GETTYIMAGES No espaço de 15 dias duas mães foram Aveiro apanhadas a conduzir com taxas de álcool no sangue que configuram crime e filhos menores no carro. Ambas foram detidas 6 DE NOVEMBRO e as crianças entregues provisoriamenPeritos em direito da família ouvidos pelo i explicam que o delito é grave mas não é o suficiente para retirar definitivamente uma criança à família. A lei de protecção e promoção de menores procura que se perceba bem todo o historial e se dê prioridade a medidas de apoio à família, que podem paste a instituições. Uma mulher de 30 anos foi apanhada a conduzir com uma taxa de 2,27 g/l no sangue. Seguia no carro com os quatro filhos. O pai foi mandado parar poucos minutos depois e também seguia alcoolizado. A mulher foi acusada por um crime de condução de veículo em estado de embriaguez e vai ser julgada no dia 19. As quatro crianças, de cinco e 1 7 meses e de quatro e oito anos, foram retiradas aos pais naquela provisoriamente noite. A família já estava sinalizada pela comissão de protecção de menores local. Lagos 15 DE NOVEMBRO Uma operação da PSP em Lagos apanhou uma mulher que conduzia alcoolizada com os dois filhos de 18 meses e seis anos. Tinha uma taxa de alcoolemia de 1 ,46 g/l e as crianças foram-lhe retiradas. O marido foi ter à esquadra mas, segundo a PSP, tinha um forte odor a álcool. As crianças foram colocadas numa temporariamente instituição e decorre um processo de protecção de menores. sar por um tratamento de alcoolismo. Mas defendem que não se devia esperar por situações extremas para sinalizar este tipo de perigo às Comissões Nacionais de Protecção de Menores. Dulce Rocha, presidente do Instituto de Apoio à Criança, admite que todos os casos de pais apanhados a guiar com uma taxa de alcoolemia acima dos 0,5 g/l de sangue deviam ser participados. Para a especialista, mais do que retirar as crianças às famílias, a medida poderia ter um papel preventivo. "Por vezes continua a existir uma percepção errada das consequências do álcool até porque culturalmente temos hábitos muito fortes nesta área. É para isso que servem precisamente os processos no âmbito das comissões de menores: para salien- tar que determinados comportamentos são perigosos e dar-lhes alguns exemplos de outras situações que possam ter ocorrido e que mostrem o quão gravosas podem ser as consequências." Se para Dulce Rocha o facto de o país ter cada vez menos crianças justifica todas as medidas que possam protegê-las, Maria Filomena Neto, advogada especialista em direito da família e protecção de menores, salienta que deve ser obrigatório sinalizar todos os casos e não só os extremos até por uma questão de coerência. "Se achamos que não e aceitável que alguém circule com excesso de álcool acima do que está na lei, se existe uma criança metida no meio está em risco. E se está em risco, deve ser sinalizada. Ou então somos todos doidos", ironiza a advogada do escritório de advogados JPAB, que explica que a intenção não é haver uma punição das famílias mas um despiste mais precoce de eventuais problemas. Para Maria Filomena Neto, esta deveria ser uma rotina das polícias da mesma forma que as escolas estão obrigadas a sinalizar situações em que as crianças dão demasiadas faltas injustificadas. "A comissão até pode chegar à conclusão de que havia uma justificação excelente, mas tem de ser sinalizado." E para a mesma perita, todos os casos deveriam ter o desfecho imediato que ocorreu com as duas situações registadas nos últimos em Aveiro e a segunda em Lagos. O í tentou perceber junto da GNR e da PSP quais são neste momento os procedimentos. Até à hora de fecho, foi apeda nas possível ter um esclarecimento Polícia de Segurança Pública que explidias, a primeira cou que a informação sobre se existem menores no momento de uma infracção rodoviária - seja taxa de alcoolemia ou uso de telemóvel - pode constar do auto de notícia que é remetido à Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, em ou ao Ministério Público, em caso de crime, como caso de contra-ordenação, perigosa ou sob embriaguez (quando a taxa é superior a 1,2 g/l). Fonte oficial admitiu contudo que só condução se houver indícios que chamem "grosa atenção dos agentes é que é feita uma comunicação à Comissão de seiramente" Protecção de Menores, já que não existe uma obrigação nesse sentido. Só perante situações mais graves, como as que aconteceram nos últimos dias, está previsto ser feita uma sinalização à emergência infantil. "Isso poderá vir a ser estabelecido no âmbito das nossas normas de execução permanente e pode até já ter sido identificada essa necessidade", admite Paulo Flor. O porta-voz da PSP acrescenta, contudo, existe um dever mais lato que obriga todos os polícias a serem "juizes de rua" e a alertarem os condutores para o risco que estão a correr e para o facto de estarem a colocar crianças em risco - avisando inclusive que essa informação pode ser remetida para a justiça. Para Maria Filomena Neto, o problema pode resolver-se com directivas mais claras, embora não falte legislação. "Qual- quer pessoa que conduza com uma taxa de alcoolemia superior a x está a cometer uma contra-ordenação ou crime. Qual é a razão de ser desta norma? É a protecção da integridade física e da vida. Não me oferece dúvidas de que existiria uma obrigação de comunicar, da mes- tica. Este ano, no primeiro requisitada 50 vezes. semestre, foi Segundo os peritos ouvidos pelo i, as situações não serão muito comuns. E mesmo o álcool, muitas vezes associado a violência e negligência, acaba por não ser muito significativo cas sinalizadas. nas problemáti- Segundo dados da Comisde Protecção de Menores, são Nacional em 2013 foram caracterizadas 5524 situações de jovens expostos a situações de perigo e só em 132 casos (2,4%) o problema era a exposição a consumo de álcool. O consumo de estupefacientes é ligeiramente mais prevalente, tendo sido sinalizado no historial de 171 jovens (3,1%). Mas a violência doméstica, patente em 5215 casos, é muito mais expressiva. Na hora de fazer um balanço sobre a protecção das crianças, os peritos são unânimes: há trabalho a fazer mas elas estão mais protegidas do que os adultos em Portugal. A advogada Rita Sassetti é dessa opinião e diz que a retirada provisória das crianças testemunha isso, mes- ma forma que qualquer cidadão que assista a maus-tratos de crianças tem o dever de os denunciar." mo que não seja desejável ou expectável não havendo outros que um caso destes indícios de maus-tratos - termine com esse veredicto. "Não é drama nenhum CASOS NÃO SERÃO COMUNS O I tentou que fiquem uns dias afastadas, mas o tribunal prefere sempre dar oportunidade a família biológica para poder endireitar a sua vida. Não é de ânimo leve que perceber junto das polícias se dois casos num intervalo tão curto serão indício de um problema comum. Até à hora de fecho não foi possível obter essa informação. Já o Instituto de Segurança Social, que gere a Linha Nacional de Emergência Social (LNES) - a que as policias recorreram para perceber para onde encaminhar as crianças - informou não ser possível especificar o número de situações similares nos últimos anos. No geral, a linha foi solicitada 98 vezes em 2013 para acolhimento de emergência de crianças e jovens, que pode resultar também de situações de abandono ou violência domés- - um tribunal retira crianças à família." Luís Villas Boas, responsável pelo refúgio Aboim Ascensão que acolhe crianças retiradas às famílias, diz que cada caso é um caso mas à partida uma só situação nunca dita o desfecho. Está contudo menos optimista com a evolução da protecção das crianças: "Faltam locais de acolhimento de emergência infantil preparados para receber crianças nestas situações extremas", avisa. Isso significa que os pais vão perder a guarda dos filhos? Não necessariamente. Após este encaminhamento dos menores, as circunstâncias da ocorrência a resposta de protecção imediata são comunicadas e pelas polícias ao Ministério Público, que avalia a necessidade de abertura de um processo de promoção e protecção. A situação poderá também ser analisada pelas comissões nacionais de protecção de menores competentes. São pesados os laços afectivos da família e condições das crianças. O que acontece em casos como o de Aveiro e o Quais são os timings? O tem 48 horas para tribunal confirmar as providências tomadas ou aplicar outras, prosseguindo depois o g/l, crime punido com pena de prisão até um ano ou com processo por via judicial, sendo que medidas provisórias só podem durar seis meses. Habitualmente, os processos começam nas comissões de protecção de menores e só quando não existe entendimento com as famílias seguem para tribunal. pena de multa até 120 dias. Nestas circunstâncias, os condutores são levados à Que outras medidas de protecção existem? Apoio de Lagos Por que é as crianças foram retiradas aos pais? As mães estavam a guiar com uma taxa de alcoolemia superior a 1 ,2 esquadra. Como era de noite e dado que foi considerado que as crianças estavam em risco, as autoridades cumpriram o que está previsto na Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo, que é assegurar o acolhimento temporário. Existe uma Linha de Emergência Nacional (144) à qual pode ser pedida uma resposta por um período de 72 horas. junto dos pais ou familiares, confiança a pessoa idónea, apoio para autonomia de vida, acolhimento familiar, confiança a pessoa seleccionada para adopção ou a instituição com vista à adopção.