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Terça-feira
22 de abril de 2014
Jornal do Comércio - Porto Alegre
Política
Torturada, Dilma foi alvo da
Lei de Segurança Nacional
Fernanda Bastos
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O regime militar instaurado
no Brasil há 50 anos marcou a trajetória política da mais poderosa
chefe de Poder Executivo do País:
a presidente da República, Dilma
Rousseff (PT). Empenhada na resistência ao governo autoritário, a
então estudante Dilma Vana Rousseff Linhares se engajou na luta
contra o regime e sofreu os reveses
da violência institucionalizada em
departamentos organizados pelas
Forças Armadas, chegando a ser
torturada e condenada à prisão.
Um prontuário – digitalizado
e disponibilizado pelo Arquivo
Público de São Paulo, que reúne fichas de diversas lideranças políticas que atuaram contra a ditadura
– relata a detenção da jovem Dilma Vana Rousseff Linhares, com
apenas 22 anos. A prisão integrou
a Operação Bandeirantes, criada
pelo regime militar para acabar
com as organizações de esquerda.
A militante foi enquadrada na Lei
de Segurança Nacional, a norma
que dava segurança jurídica ao
regime para combater, por meio
da violência, os chamados grupos
subversivos.
O registro do Departamento
de Ordem Política e Social (Dops)
registra a prisão de Dilma no dia
18 de janeiro de 1970. Detida na
capital paulista, ela é submetida a
sessões de tortura. É libertada somente quase três anos depois, em
1972. No auge das atividades clandestinas – o Ato Institucional nº
5, que dava plenos poderes para
a repressão do regime, havia sido
instituído pouco mais de um ano
antes, em 13 de dezembro de 1968
-, Dilma chegou a adotar os nomes
de Maria e Luiza para despistar investigações sobre sua atuação.
O prontuário ressalta essa tática dos militantes clandestinos
como forma de escapar da perseguição do Estado. Ao detalhar
as características do carro apreendido com a hoje presidente, o
tenente responsável pelo registro
da prisão mencionou a “subversiva-terrorista Dilma Vana Rousseff
Linhares, que usa diversos outros
nomes, falsos, entre os quais o de
Maria Lúcia Santos”.
Presa em janeiro de 1970, Dilma foi identificada como uma integrante do comando-geral do grupo
Colina e chefe do comando regional do Var-Palmares em São Paulo, duas organizações da esquerda.
Na ficha policial, Dilma é vinculada a seu primeiro marido, Claudio
Galeano de Magalhães Linhares.
O documento detalha ainda
que Dilma, “antiga militante da esquerda subversivo-terrorista”, pertenceu ao comando-geral da Colina e foi coordenadora dos setores
operário, estudantil e de operações
da VAR-Palmares de São Paulo”.
Dilma ainda foi acusada por manipular “grandes quantias para
a VAR-Palmares”. O documento
destaca que, “através de seu interrogatório, verifica-se ser uma das
molas-mestras e um dos cérebros
dos esquemas revolucionários
postos em prática pela esquerda
radical”. “Trata-se de pessoa de
dotação intelectual apreciável”,
ressalta o documento.
Trecho da ficha que indica
que, Dilma, no momento da pri-
ARQUIVO PÚBLICO DE SÃO PAULO/REPRODUÇÃO/JC
Passado de militante acabou sendo explorado na campanha de 2010
Quando estudante, Dilma Rousseff foi fichada pelo Dops em São Paulo
são, disse não ter religião, o que
causaria muita polêmica nas
eleições de 2010, em que suas
escolhas religiosas e suas possíveis ligações com a luta armada
– Dilma negou – seriam usadas
por outros candidatos como razão para a população ter desconfiança sobre a afilhada política
e ex-ministra da Casa Civil do
ex-presidente Luiz Inácio Lula da
Silva.
Lei da Anistia é tratada com cautela pela presidente
Apesar das agruras da violência e da repressão da ditadura, a
presidente Dilma Rousseff (PT)
tem tido cautela ao emitir opinião
quanto à necessidade de alteração
da Lei da Anistia, ao contrário de
de outros ex-presos políticos, que
pedem a revisão da legislação
para punir militares que participaram de atos de violência.
“Hoje, podemos olhar para
esse período e aprender com ele,
porque o ultrapassamos. O esforço de cada um de nós, de todas as
lideranças do passado, daqueles
que viveram e daqueles que morreram fizeram com que nós ultrapassássemos essa época”, disse no
dia 31 de março, que marcou os 50
anos do golpe militar que instalou
a ditadura no País.
Em 2008, ministra da Casa
Civil do governo Lula, Dilma se
emocionaria ao falar da tortura sofrida no período na prisão: “Mentir sob tortura não é fácil, porque
aguentar a tortura não é fácil”, declarou. Ela fez essa afirmação após
o senador José Agripino (DEM-RN)
lembrar que a ministra disse em
uma entrevista que “mentia adoidado” nos interrogatórios realizados durante a ditadura militar. A
intenção do senador foi comparar
as mentiras sob tortura ao suposto
dossiê elaborado pelo PT sobre os
gastos do então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB).
“Qualquer comparação entre
a ditadura e a democracia brasileira só pode partir de quem não
dá valor à democracia brasileira.
Eu tinha 19 anos. Fiquei três anos
na cadeia. E fui barbaramente torturada. Qualquer pessoa que ouse
dizer a verdade para os seus interrogadores compromete a vida dos
seus iguais. Entrega pessoas para
serem mortas”, respondeu Dilma,
emocionada.
Na instalação da Comissão
Nacional da Verdade, em 2012,
Dilma aludiu as críticas de setores
da sociedade e das Forças Armadas que acusavam o órgão de ter
o intuito de promover uma perseguição àqueles militares que já haviam sido anistiados. “Ao instalar
a Comissão da Verdade não nos
move o revanchismo, o ódio ou o
desejo de reescrever a história de
uma forma diferente do que aconteceu, mas nos move a necessidade imperiosa de conhecê-la em sua
plenitude, sem ocultamentos, sem
camuflagens, sem vetos e sem
proibições”, enfatizou Dilma.
Neste ano, em que se completou o cinquentenário do início
da ditadura, a presidente voltou a
falar sobre as vítimas da ditadura.
“Aprendemos o valor de eleger por
voto direto e secreto, de todos os
brasileiros, governadores, prefeitos; de eleger, por exemplo, um ex-exilado, um líder sindical que foi
preso várias vezes e uma mulher
que também foi prisioneira”, discursou a petista, no dia 31 de março, em ato no Palácio do Planalto.
Na cerimônia, a petista defendeu novamente a manutenção da
interpretação da Lei da Anistia:
“Nós reconquistamos a democracia à nossa maneira, por meio de
lutas e de sacrifícios humanos irreparáveis, mas também por meio
de pactos e acordos nacionais,
muitos deles traduzidos na Constituição de 1988”.
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